- Introdução
- A veneração de S. Josemaria por Sta. Catarina
- As obras de Sta. Catarina
- Sta. Catarina, intercessora do apostolado da opinião pública
- Relíquias e iconografia
- Comentários em momentos de vida em família
- Conclusão
Introdução
Sta. Catarina, filha de Giacomo di Benincasa, um tintureiro de Sena, e Lapa di Puccio di Piagente nasceu no ano de 1347 em Sena e morreu com apenas 33 anos em 29 de abril do ano 1380 em Roma[1]. A sua sepultura na venerável Basílica de Santa Maria sopra Minerva é até hoje meta de muitos peregrinos de todo o mundo que vêm a Roma. Catarina foi elevada à honra dos altares pelo seu compatriota Pio II no ano de 1461, Paulo VI declarou a santa doutora da Igreja (juntamente com Sta. Teresa de Jesus) no ano de 1970; João Paulo II declarou-a no ano de 1999 padroeira da Europa (com Sta. Benedita da Cruz [Edith Stein] e Sta. Brígida da Suécia). Em Itália há uma devoção muito particular a Sta. Catarina: o Papa Pio XII declarou-a padroeira de Itália (com S. Francisco de Assis) e a cidade de Roma venera-a como co-padroeira da urbe (com os Santos Apóstolos Pedro e Paulo e S. Filipe Neri). Também outras cidades como Varazze e – obviamente – Sena a têm como Santa padroeira.
Sendo ainda menina, Catarina já demonstrava uma piedade profunda. Quando tinha uns seis anos, teve uma visão de Cristo sobre um trono, acompanhado por santos. A propósito deste acontecimento, fez um voto de virgindade, decisão que foi recebida com incompreensão e oposição na família. A mãe, especialmente, fez todos os possíveis para a dissuadir da sua oração cada vez mais intensa e as suas severas práticas de penitência. Catarina obteve, no entanto, o apoio dos frades dominicanos da cidade e, com a idade aproximada de 18 anos conseguiu –superando uma quantidade de obstáculos – ser admitida entre as Mantellate, devotas mulheres terciárias dominicanas da cidade. Nos anos sucessivos viveu, conforme os costumes das Mantellate, em casa dos pais, mas totalmente retirada na cela do seu coração, como lhe ensinou o próprio Senhor Jesus numa das múltiplas visões que a jovem terciária tinha. Só saía de casa para assistir à Santa Missa e às reuniões da sua comunidade religiosa.
Uma mudança importante na vida da Santa deu-se no ano 1368 – Catarina tinha nesse momento 21 anos – quando teve uma visão do seu casamento místico com Nosso Senhor, e Jesus, seu esposo místico, encarregou-a pouco depois noutra visão que se dedicasse com todas as suas forças a obras de caridade e à conversão dos pecadores. Começando pela família, Catarina alargava pouco a pouco o seu raio de ação, especialmente nos hospitais de Sena. Incluía cada vez mais pessoas no seu trabalho caritativo: por um lado, ocupava-se da sua comunidade religiosa, mas também de religiosos, clérigos e leigos, que foram formando pouco a pouco a Famiglia, em que também pessoas de mais idade lhe chamavam com afeto e veneração Mãe.
A sua obra caritativa e o seu carisma conduziram muitas pessoas a uma profunda conversão, e foi acompanhada por milagres. Como consequência, a sua fama difundiu-se rapidamente para além de Sena e da Toscana até atingir toda a península de Itália. Catarina começou a escrever cartas, ou melhor a ditá-las a um dos seus fiéis amigos, porque carecia de formação académica e tinha dificuldade para redigir[2]. Eram dirigidas a leigos e clérigos próximos, mas também a bispos, abades e cardeais, e inclusivamente aos papas da sua época. O estilo destas cartas, de que se conservam mais de 380, é surpreendente: Catarina fala com uma grande força e insistência e, ao mesmo tempo, anima o destinatário com palavras doces e convincentes a fazer sempre a vontade de Nosso Senhor. Afirma que «scrive nel sangue di Cristo» e acaba muitas das suas cartas com a exclamação «Gesù dolce, Gesù amore».
Nas suas cartas aos Papas conjuga um amor filial e obediente – é muito característica a expressão il dolce Cristo in terra que costuma usar para se referir ao romano pontífice – com as exigências que apresenta sem vacilações: vida pessoal exemplar, reforma dos costumes – sobretudo entre os colaboradores do Papa –, regresso do Papa a Roma, paz e concórdia nos Estados Pontifícios e um esforço comum, começando pelo Papa, de libertar os lugares santos e os cristãos da Terra Santa.
Ponto culminante do seu fervor pelo Pontífice e seu ministério é a viagem a Avinhão que Catarina realizou com alguns amigos no ano de 1376, para apresentar em nome de Nosso Senhor a Gregório XI as mesmas exigências que tinha manifestado antes nas suas cartas; e depois, na situação trágica do Cisma do Ocidente, a partir de setembro de 1378, luta com determinação pela causa do Papa Urbano VI e muda-se para Roma, onde permanece até à sua morte[3].
A obra-prima de Sta. Catarina é o Dialogo della divina Provvidenza[4], obra ditada aos seus discípulos sobre as visões da santa nos últimos anos da sua vida.
A veneração de S. Josemaria por Sta. Catarina
S. Josemaria tinha uma veneração por Catarina muito arreigada no coração, e por isso chamava Catarinas aos seus Apontamentos íntimos – anotações pessoais ainda inéditas que recolhem, a modo de diário, sucessos biográficos, ideias para a meditação ou fruto dela, etc. – por devoção à Santa: «São notas ingénuas – chamava-lhes ‘catarinas’, por devoção à Santa de Sena –, que escrevi durante muito tempo de joelhos e que me serviam de lembrança e de despertador. Creio que, normalmente, enquanto escrevia com simplicidade pueril, fazia oração»[5]. Provavelmente, ao usar este nome tinha presente a ligação entre as inspirações da Santa de Sena e as suas manifestações posteriores nas cartas e no Diálogo. Assim servem para documentar o progresso da vida interior de S. Josemaria e ao mesmo tempo a sua aplicação à obra que Deus lhe tinha encomendado, o Opus Dei[6].
S. Josemaria, numa carta de 1932 aos fiéis do Opus Dei, faz o seguinte comentário: «Os santos são necessariamente pessoas incómodas, homens ou mulheres – a minha Sta. Catarina de Sena! – que com o seu exemplo e com a sua palavra são um contínuo motivo de desassossego, para as consciências comprometidas com o pecado»[7].
S. Josemaria admirava por um lado a franqueza com que Catarina defendia a verdade. Por temperamento e porque considerava esta sinceridade uma virtude fundamental: «Tenho a certeza – escreveu já no ano de 1957 – de que haverá quem não me perdoe facilmente que fale com esta clareza, mas devo fazê-lo em consciência e diante de Deus, por amor à Igreja, por lealdade à santa Igreja, e pelo carinho que vos devo. Tenho uma especial devoção a Sta. Catarina – aquela “grande murmuradora”! –, porque não se calava e dizia grandes verdades por amor a Jesus Cristo, à Igreja de Deus e ao romano pontífice»[8].
Numa carta escrita em 15 de agosto de 1964 volta a tocar o tema da verdade que é preciso dizer com valentia, quando há confusão que obscurece o claro juízo da consciência: «Em todas as épocas houve divergências, erros, exageros ou atitudes violentas: e a voz que ultrapassou estas barreiras, foi sempre a voz da verdade ungida pela caridade. A voz dos verdadeiros sábios, a voz do Magistério; a voz, meus filhos, dos santos, que souberam falar em mil tons, para esclarecer, para exortar, para chamar a uma autêntica renovação. (…) Meus filhos, conheceis bem a história da Igreja, e sabeis como Nosso Senhor costuma servir-se de almas simples e fortes, para fazer o seu querer em momentos de confusão ou de modorra da vida cristã. Gosto muito da fortaleza duma Sta. Catarina, que diz verdades às mais altas pessoas, com um amor ardente e uma clareza diáfana; enchem-me de fervor os ensinamentos dum S. Bernardo (…) Tantas e tantas vozes proféticas, juntamente com o Magistério iluminado da Igreja, inundam de luz todo o Povo de Deus»[9].
Impressionava-o o amor incondicional da Santa à Igreja, que era por sua vez o motor que o fazia falar com tanta clareza. Encontramos um eco disto na homilia Lealdade à Igreja de S. Josemaria, pronunciada em 4 de junho de 1972: «Esta Igreja Católica é romana. Saboreio esta palavra: romana! Sinto-me romano, porque romano quer dizer universal, católico; porque me leva a amar ternamente o Papa, il dolce Cristo in terra, como gostava de repetir Sta. Catarina de Sena, que tenho por amiga queridíssima»[10]. Encontramos amiúde a expressão il (dolce) Cristo in terra e as suas variações no epistolário de Catarina, e no Diálogo.
Sta. Catarina, que, em reuniões pessoais, cartas, o Diálogo e outros escritos, criticava asperamente com frequência a má conduta de sacerdotes que não viviam em sintonia com a sua vocação, tinha ao mesmo tempo grande estima pelo sacerdócio como tal. Na homilia Sacerdote para a eternidade, de 13 de abril de 1973, o fundador do Opus Dei cita um texto chave: «O sacerdócio leva a servir a Deus num estado que não é, em si, nem melhor, nem pior do que outros: é diferente. Mas a vocação de sacerdote aparece revestida com una dignidade e com uma grandeza que nada na terra supera. Sta. Catarina de Sena põe na boca de Jesus Cristo estas palavras: “Não quero que diminua a reverência que se deve professar aos sacerdotes, porque a reverência e o respeito que se lhes manifesta, não se dirige a eles, mas a Mim, em virtude do Sangue que lhes dei para que o administrem. Se não fosse por isto, devíeis dedicar-lhes a mesma reverência que aos leigos, e não mais... Não devemos ofendê-los: ofendendo-os, ofende-se a Mim, e não a eles. Por isso o proibi, e dispus que não admito que se toque nos meus Cristos”»[11]. A consideração da Santa, que por sua vez faz referência ao Salmo 105, 15, já tinha deixado, há anos atrás, uma marca no pensamento de S. Josemaria: «Não quero – por já ser sabido – deixar de te recordar outra vez que o Sacerdote é “outro Cristo”. – E que o Espírito Santo disse: “nolite tangere Christos meos” – não queirais tocar nos “meus Cristos”»[12]. Também noutros pontos de Caminho se podem ver certos paralelismos com expressões ou modos de pensar da Santa no Diálogo, como diz Pedro Rodríguez[13].
«Si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum (Jo 12, 32), quando for levantado no alto sobre a terra, atrairei tudo a mim. Cristo com a sua Encarnação, com a sua vida de trabalho em Nazaré, com a sua pregação e milagres pelas terras da Judeia e da Galileia, com a sua morte na Cruz, com a sua Ressurreição, é o centro da criação, Primogénito e Senhor de toda a criatura»[14]. Noutro texto da pregação de S. Josemaria, a homilia Cristo Rei, de 22 de novembro de 1970 comenta novamente a passagem neotestamentária: «Jesus Cristo recorda a todos: “et ego, si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum” (Jo 12, 32), se me colocardes no cume de todas as atividades da terra, cumprindo o dever de cada momento, sendo meu testemunho no que parece grande e no que parece pequeno, “omnia traham ad meipsum”, atrairei tudo para Mim. O meu reino entre vós será uma realidade!»[15]. O passo de S. João tinha grande importância para S. Josemaria, desde 7 de agosto de 1931, então festa da Transfiguração de Nosso Senhor na diocese de Madrid-Alcalá, dia em que sentiu no coração uma intervenção divina durante a celebração da Santa Missa, que ele próprio anotou nos seus Apontamentos íntimos: «Chegou a hora da consagração: no momento de levantar a Sagrada Hóstia, sem perder o devido recolhimento, sem me distrair (…) veio ao meu pensamento, com força e clareza extraordinárias, aquilo da Escritura: “et si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum” (Jo 12, 32) (…). E compreendi que seriam os homens e mulheres de Deus, que levantarão a Cruz com as doutrinas de Cristo sobre o pináculo de todas a atividades humanas… E vi triunfar Nosso Senhor, atraindo a si todas as coisas»[16].
Este texto de S. João também tinha muita importância para Sta. Catarina de Sena. No Diálogo comenta-o com uma certa extensão, quando fala da «doutrina da ponte», que ocupa os capítulos 25 a 30 da segunda parte do livro. No segundo dos capítulos, o 26, explica como esta ponte está constituída entre o céu e a terra. Esta ponte, elevada no alto, mas não separada do mundo, está construída com os méritos de Cristo na Santa Cruz, e sem o sacrifício da Cruz ninguém pode passar pela ponte. Cristo na Cruz atrai a si pelo seu ilimitado amor; o coração do homem deixa-se atrair sempre pelo amor. Se se diz que Cristo atrai todas as coisas a si, isto significa por um lado que o homem é atraído com todas as potências da alma: memória, inteligência e vontade. Por outro lado, com o homem são atraídas todas as realidades terrenas, criadas para ele[17].
As obras de Sta. Catarina
S. Josemaria conhecia as obras da Santa? Pelas referências que faz à sua vida parece evidente que tinha lido o Diálogo e a Lenda maior ou alguma biografia moderna. Do princípio dos anos sessenta sabe-se que pediu aos que trabalhavam no gabinete de informação da Obra que conseguissem uma edição completa do epistolário da Santa de Sena[18].
Na sede central do Opus Dei conserva-se uma coleção de livros, que foram levados de Madrid para Roma quando S. Josemaria se estabeleceu em Roma. Estes livros, juntamente com outros incluídos posteriormente até à morte do fundador em Roma em 1975, formam um depósito que se manteve inalterado, e que pode ser considerado – com precauções – biblioteca de trabalho de S. Josemaria[19]. Segundo o catálogo estabelecido por Jesús Gil, encontramos na referida biblioteca três edições do Diálogo em castelhano[20] e uma em italiano[21]. Entre os livros também está a biografia do autor dinamarquês Johannes Jørgensen[22].
Sta. Catarina, intercessora do apostolado da opinião pública
Enquanto os outros intercessores da Obra, quer dizer, S. Pio X, S. Nicolau de Bari, S. João Maria Vianney e S. Tomás Moro já tinham sido nomeados em anos precedentes, parece que a ideia de S. Josemaria de invocar Sta. Catarina para o apostolado da opinião pública remonta a 1964[23], como se lê numa carta dirigida ao Pe. Florencio Sánchez Bella, conselheiro do Opus Dei naqueles anos em Espanha, em 10 de maio deste ano: «Vou contar-te agora que se avivou em mim a devoção, que em mim é velha, a Sta. Catarina de Sena: porque soube amar filialmente o Papa, porque soube servir sacrificadamente a Santa Igreja de Deus e… porque soube falar heroicamente. Estou a pensar declará-la internamente padroeira (intercessora) celestial dos nossos apostolados da opinião pública. Vamos ver!»[24].
Já alguns dias antes desta carta, o fundador comentava na tertúlia de 30 de abril, que antes da reforma litúrgica era o dia da festa de Sta. Catarina[25]: «Desejo que se celebre a festa desta Santa na vida espiritual de cada um, e na vida das nossas casas ou centros. Sempre tive devoção a Sta. Catarina: pelo seu amor à Igreja e ao Papa, e pela valentia que demonstrou ao falar com clareza sempre que foi necessário, levada precisamente por esse mesmo amor. Antes o que era heroico era calar-se, e assim fizeram os vossos irmãos. Mas agora o heroico é falar, para evitar que se ofenda a Deus Nosso Senhor. Falar; procurando não ferir, com caridade, mas também com clareza»[26]. Alguns dias antes, o romano pontífice S. Paulo VI também tinha falado numa audiência desta festa eminente: «Sim, a força do Papa é o amor dos seus filhos, e a união da comunidade eclesiástica, e a caridade dos fiéis que sob a sua guia formam um só coração e uma só alma. Esta contribuição de energias espirituais, que vem do povo católico para a hierarquia da Igreja, que procede de cada cristão e chega até ao Papa, faz-nos pensar na santa a quem amanhã a Igreja honrará dum modo especial, Sta. Catarina de Sena, a humilde, sábia, valente virgem dominicana que, como todos sabem, amou o Papa e a Igreja, a um nível e com uma força de espírito que não se conheceram em nenhum outro»[27].
Em 13 de maio de 1964, S. Josemaria decide pôr em prática o que tinha anunciado ao P. Florencio Sánchez Bella. Numa tertúlia voltou a tocar no tema da futura intercessora e, depois, sorrindo disse: «Para quê esperar mais? É a mim, como fundador, que corresponde nomeá-la, e em Casa fazemos as coisas de maneira simples, sem solenidades. Nomeio-a intercessora agora mesmo». Nesse momento pediu a José Luis Illanes que pegasse num papel e num lápis e ditou um aviso para enviar a todas as regiões: «No dia 13 de maio, considerando com quanta clareza de palavra e com quanta retidão de coração Sta. Catarina de Sena manifestou, com audácia e sem aceção de pessoas, os caminhos da verdade aos homens do seu próprio tempo, decretei que o apostolado que os membros do Opus Dei levam a cabo em todo o mundo, com verdade e com caridade, para informar retamente a opinião pública, estivesse confiado à especial intercessão desta Santa»[28].
A decisão de S. Josemaria tem como contexto histórico as celebrações em Roma do quinto centenário da canonização de Sta. Catarina pelo Papa Pio II em 1461. Com este motivo, João XXIII enviou uma carta ao geral dos dominicanos com grandes elogios à Santa[29]. O serviço italiano dos Correios – Poste italiane – emitiu um selo em honra de Catarina, e, no fim do centenário, colocou-se um monumento na Piazza Pia da Cidade Eterna, entre Castel Sant’Angelo e Via della Conciliazione, obra do escultor Francesco Messina[30].
É oportuno considerar que a decisão de S. Josemaria tem lugar por um lado no contexto de crescentes incompreensões que o Opus Dei sofria em Espanha e noutros sítios, e por outro na forma inadequada com que se difundiam informações sobre as trocas de impressões que tinham lugar na aula conciliar durante o Concílio Vaticano II. S. Josemaria temia que prevalecesse uma visão negativa do desenvolvimento desse grande concílio ecuménico: já em fins dos anos cinquenta, o fundador da Obra tinha criado um gabinete de informação para satisfazer a necessidade de dar com eficácia notícias sobre o Opus Dei e os seus apostolados, e, mais em geral, para estudar temas de atualidade na vida da Igreja e contribuir para divulgar notícias corretas –não distorcidas– sobre a Igreja e difundir a boa doutrina[31]. No que se refere ao Concílio Vaticano II, S. Josemaria via com preocupação que durante os trabalhos de preparação circulavam nos mass-media atitudes e delineamentos alheios ao espírito cristão e à doutrina da Igreja[32]. Comentava estes episódios com os seus colaboradores neste gabinete de informação, fazendo às vezes referência a Sta. Catarina de Sena, a quem chamava com carinho a grande murmuradora ou a grande desbocada[33] porque a Santa soube falar com clareza sem medo de nada nem de ninguém. Às vezes comentava frases das cartas da Santa.
Com o exemplo da nova intercessora, S. Josemaria teria desejado falar diretamente e com clareza ao Papa. Escreveu uma ampla carta que fez chegar a Paulo VI por meio do cardeal Angelo dell’Aqua[34].
Relíquias e iconografia
S. Josemaria mandou colocar um relicário da Santa junto das relíquias dos outros intercessores no oratório da Santíssima Trindade na sede central da Obra. Neste relicário há duas relíquias da Santa. A primeira, ex ossibus S. Catharinae Senensis V.O.P., tem um certificado de autenticidade do postulador geral da Ordem dos Dominicanos, Fr. Tarcisio M. Piccari OP, com data de 25 de junho de 1964[35]. A outra obteve-a do arcebispo de Sena, Mons. Mario Ismael Castellano OP, que assinou o certificado de autenticidade duma relíquia do véu da Santa, quer dizer, ex velo quo coopertum fuit sacrum Caput Sanctae Catherinae Virginis Senensis[36]. O relicário tem a inscrição: «Dilexit opere et veritate Ecclesiam Dei ac Romanum Pontificem»[37]. S. Josemaria comentou-o numa tertúlia do ano de 1972 com alunos do Colégio Romano, a propósito duma pergunta dum dos presentes sobre Sta. Catarina: «Tenho-lhe uma devoção extraordinária. Já sabeis que é uma das nossas intercessoras, e tenho uma relíquia sua em cima da mesa do altar onde celebro a Missa. Escrevi uma vez ao Papa atual [Paulo VI], e dizia-lhe: tenho esta relíquia por devoção, porque tinha tanto amor à Igreja e ao Papa como tenho eu. Não queria dizer que tinha mais, porque não é verdade. Todos nós temos o mesmo amor que Catarina [...]. Isto é: amou a Igreja e o romano pontífice de verdade e com obras, como vós e como eu»[38]. A seguir, comentava brevemente a difícil situação do século XIV, com a ausência do romano pontífice de Roma durante a sua estadia em Avinhão, os esforços eficazes dum dos legados do Papa, o cardeal Gil de Albornoz, para pacificar os estados pontifícios e tornar possível o regresso do sucessor de Pedro à sua sede natural, realçando o papel de Sta. Catarina, que insistiu com a sua oração, a sua penitência e as sus cartas, para que finalmente o Papa voltasse para Roma.
Nestes mesmos anos, quando se tratou de escolher uma imagem de Sta. Catarina, o fundador da Obra preferia a iconografia que corresponde ao tipo da Vergine di Fontebranda e não ao – mais difundido – tipo da Mantellata, com o típico hábito branco e preto da Ordem Terceira de S. Domingos[39]. Assim, ao fazer o projeto para o grande retábulo do santuário de Torreciudad, a partir da primavera de 1967, escolheu-se este tipo de representação, quer dizer uma donzela jovem com os atributos da autora do Diálogo: um livro e uma pena, símbolos da sua obra-prima, o Dialogo della Divina Provvidenza e da sua condição de doutora da Igreja[40].
Em fins de 1968, S. Josemaria ofereceu ao Instituto de Jornalismo da Universidade de Navarra, a futura Faculdade de Comunicação, uma representação da Santa que representa O casamento místico de Sta. Catarina, do pintor Pedro Atanasio Bocanegra[41]. Por sua vez a representação tinha-lhe sido oferecida em Sevilha[42]. Representa Sta. Catarina na companhia do seu anjo da guarda e da Sagrada Família[43]. S. Josemaria entregou a representação a Alfonso Nieto e a Francisco Gómez Antón, quando passaram nesse ano por Roma[44]. O quadro encontra-se hoje no gabinete do decano da Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra.
Comentários em momentos de vida em família
Nos encontros familiares com fiéis do Opus Dei, o fundador fazia algumas vezes referência à Santa de Sena. Assim, em 1973, aproveitou uma pergunta duma aluna do Colégio Romano de Santa Maria[45]sobre a vocação contemplativa para indicar o exemplo de Catarina: «Fazes muito bem em preguntar-mo. Eu também tenho vocação contemplativa. Trato de estar sempre com Deus, só que a minha cela é a rua. O que tu não sabes é que sou muito amigo de Sta. Catarina de Sena, por duas razões: a segunda, porque tinha uma linguazinha tremenda, não calava nada. Como nos fariam falta umas quantas Catarinas de Sena agora no mundo! E a primeira, porque não estava no convento, estava na rua, e fez a sua cela interior na sua alma, de forma que em qualquer lado em que estivesse, não saía da cela. Este é o caminho das almas no Opus Dei: estar no meio da rua e estar metidas em Deus»[46]. Na vida de Sta. Catarina há um momento concreto em que nasce a ideia da cela interior. Conta Raimundo de Cápua que a família, especialmente a mãe Mona Lapa, tentou dissuadir Catarina da sua decisão de viver em perpétua castidade e dedicar-se à penitência e à oração. Tiraram-lhe o quarto que tinha só para ela, despediram a rapariga de serviço e obrigaram-na a fazer trabalhos domésticos. Foi ali, no meio do cansaço dos trabalhos duma casa grande com muitas pessoas que tinha que servir, que fez, por inspiração do Espírito Santo, aquela cela interior, em que se podia recolher continuamente[47]. S. Josemaria tinha afirmado numa carta do ano 1954: «Nós vivemos na rua, aí temos a cela: somos contemplativos no meio do mundo»[48]. Noutra ocasião, durante uma tertúlia um ano mais tarde com o mesmo grupo de pessoas, voltou ao exemplo da Santa de Sena, afirmando que gostava muito dela e explicando ao mesmo tempo a vocação contemplativa na rua, no meio do mundo: «Mantelates, chamavam-lhes então. Punham uma espécie de manto negro para se taparem quando andavam na rua, porque aquelas boas mulheres passavam um bom bocado na rua. Um longínquo precedente vosso, porque elas queriam ser freiras sem o serem e vós e eu temos o propósito de não ser freiras nem frades, porque Deus não nos chama»[49].
Assim S. Josemaria une estima e amor pelo estado religioso em geral e o de Sta. Catarina em particular, com a convicção de viver a contemplação no meio do mundo segundo um espírito próprio, diferente do estado religioso: «Onde quer que estejamos, no meio do rumor da rua e dos afãs humanos – na fábrica, na universidade, no campo, na oficina ou em casa –, encontrar-nos-emos em simples contemplação filial, num diálogo constante com Deus. Porque tudo – pessoas, coisas, tarefas – nos oferece a ocasião e o tema para uma contínua conversa com Nosso Senhor: a mesma coisa que a outras almas, com vocação diversa, lhes proporciona a contemplação, o abandono do mundo – o contemptus mundi – e o silêncio da cela ou do deserto. A nós, meus filhos, Nosso Senhor pede-nos só o silêncio interior – calar as vozes do egoísmo do homem velho –, não o silêncio do mundo: porque o mundo não se pode nem se deve calar para nós»[50].
Na já mencionada tertúlia de 1973, outra pessoa perguntou se se pode chegar a amar Nosso Senhor da mesma maneira que se gosta dos pais. S. Josemaria recordou novamente o exemplo da santa: «Penso que tu vais chegar a amá-lo mais, sem gostar menos dos teus pais do que gostas deles agora, e com o mesmo coração. Tu tens dois corações? Eu, não. Sta. Catarina de Sena assegurava ao seu confessor que não tinha coração, durante muito tempo, que lho tinha levado Nosso Senhor; e depois disse-lhe que lho tinha devolvido, mas não o dela, mas o de Jesus. (…) Tu também podes amar com o Coração de Jesus, sem necessidade disso»[51]. O fundador da Obra faz com isto referência a uma passagem da Legenda maior, em que Raimundo de Cápua conta o episódio místico, tal como Catarina lho tinha confiado; quer dizer, que Nosso Senhor lhe tinha tirado o coração, e só lho tinha devolvido passado algum tempo, ou melhor dito, tinha-lhe dado o seu coração em vez do de Catarina[52]. Como consequência, sentia-se mudada, inundada de graça de Nosso Senhor, renovada interiormente em pureza e humildade, como uma menina pequena de 4 ou 5 anos, e cheia de amor ao próximo[53].
Noutra tertúlia, de 20 de maio de 1974, o fundador da Obra voltou a fazer referência à vida de Sta. Catarina, e às tentações que tinha tido que sofrer em certo momento da sua vida. Embora tenha afastado todas as insinuações do diabo, no entanto, ficou desconcertada pela violência do ataque e pelo aparente abandono de Nosso Senhor, e disse: «Meu Senhor, onde estáveis quando o meu coração foi acossado por tantas tentações? E o Senhor: “Eu estava no teu coração”»[54].
Quando S. Josemaria fazia referência às cartas da santa, chamava-lhe às vezes a «grande murmuradora»[55], e afirmava que «tinha uma língua muito dura, falava claramente»[56], «que dizia ao Papa umas barbaridades e chamava aos cardeais diabos encarnados»[57].
Conclusão
Na vida de S. Josemaria há um amor a Sta. Catarina de Sena que tem as raízes na sua vida de piedade já antes da fundação da Obra e que aumenta com o tempo. Por isso chamava aos seus apontamentos as Catarinas. S. Josemaria apreciava o amor incondicional de Catarina à Igreja e ao romano pontífice, que se unia com uma grande valentia para falar com clareza aos homens do seu tempo, também às autoridades mais elevadas, até ao Papa. Nisto, S. Josemaria via um exemplo para si próprio e para as suas filhas e para os seus filhos no Opus Dei. Nos últimos anos da sua vida, sublinhava outros dois aspetos da vida exemplar da santa: a união entre a vida contemplativa e a atividade exterior, em que se pode estar sempre com Deus, na cela da alma; e finalmente a unicidade do amor humano e divino, aquele amar Deus e os homens com um só coração, que devia ser segundo o exemplo da Santa de Sena o coração de Jesus, que ela tinha recebido no acontecimento místico da «troca de corações» do próprio Senhor Jesus Cristo.
[1] A fonte por excelência para a vida é a Legenda maior do confessor da Santa, o beato Raimundo de Cápua, O.P. (1330-1399) e a Legenda minor do postulador da causa de canonização de Catarina, o Beato Tommaso Caffarini (1350-1443); há várias edições de ambas em italiano e castelhano que citaremos ao longo deste trabalho. A bibliografía sobre a vida de Sta. Catarina é muito abundante: aqui basta indicar os dois volumes de Johannes Jørgensen, Santa Catalina de Siena, Voluntad: Madrid 1924; e a biografía de Adriana Carlotti Oddasso, Caterina Benincasa, in Filippo Caraffa et al. (dir), Bibliotheca Sanctorum, Roma, Istituto Giovanni XXIII della Pontificia Università Lateranense − [poi] Città Nuova, 1961-2000, vol. III, coll.1033-1035.
[2] Umberto Meattini (a cura di), Caterina da Siena, Le Lettere, Milano, Paoline, 1993. Edições em castelhano das cartas da primeira metade do século passado: Cartas de la Seráfica Virgen Santa Catalina de Siena, de la orden de predicadores, Vergara, El Santísimo Rosario, 1910; Ernesto J. Etcheverry (trad.),Santa Catalina de Siena, Cartas espirituales (selección), Buenos Aires, Emecé, 1947.
[3] Durante os anos 1305-1377 os papas não residiram em Roma, mas em França – a partir de 1309 em Avinhão –. Esta situação anormal de permanência do sucessor de Pedro durante tanto tempo fora da sua sede natural explica-se pelos distúrbios nos Estados Pontifícios, e particularmente em Roma, que tornaram difícil, senão impossível, que o governo da Igreja funcionasse sem problemas. As décadas passadas em França levaram a Igreja a um vínculo demasiado forte com a coroa francesa; esta tendência também se viu reforçada pela criação predominante de cardeais franceses, que por sua vez elegeram papas franceses. A dependência de França, um longo conflito com o imperador Luis de Baviera e com alguns dos franciscanos devido à disputa sobre a pobreza, a criação do sistema fiscal da cúria para compensar dalguma maneira a falta de ingressos dos Estados Papais, etc., fez com que a permanência do papado em Avinhão fosse julgada negativamente entre os contemporâneos e as gerações posteriores. Quanto mais durava esta situação, mais crescia o coro de vozes críticas: Petrarca, o imperador Carlos IV, Brígida da Suécia, Catarina de Sena e outros rogavam aos Papas que voltassem para a Cidade Eterna. Os apelos foram finalmente ouvidos, e depois do legado papal do cardeal espanhol Gil de Albornoz nos anos 1353-1357, que conseguiu pacificar pelo menos uma boa parte dos Estados Pontifícios, Urbano VI regressou em 1370, numa primeira tentativa falhada, a Roma, e finalmente Gregório XI pôde estabelecer a sua residência em Roma. No entanto, o regresso a Roma foi rejeitado pelos cardeais franceses que poucos meses depois elegeram um deles como Papa, iniciando assim o Cisma do Ocidente, que duraria até 1417 (cf. Vicente Ángel Palenzula, El cisma de Occidente, Madrid, Rialp 1982, pp. 25-92).
[4] Il Dialogo della Divina Provvidenza, Siena, Cantagalli, 1998. Edições em castelhano: Ángel Morta (Introd., trad. e notas),Obras de santa Catalina de Siena. El Diálogo, Madrid, La Editorial Católica, 1955 (= BAC 143); El Diálogo, Madrid, Rialp, 1956 (= Colección Nebli 5).
[5] S. Josemaría, Apuntes íntimos, n. 1862, Roma, 14-VI-1948 cit. en Andrés Vázquez de Prada, El Fundador del Opus Dei, Vol. I: ¡Señor, que vea!, Rialp: Madrid 1997, p. 338. As anotações dos seus Apuntes íntimos nas Catarinas escritas em cadernos começaram em 1928. No entanto, nem o primeiro dos cadernos, nem outras notas soltas se conservaram, porque o fundador da Obra os queimou. As Catarinas mais antigas encontram-se no segundo caderno de Apuntes, que começa em março de 1930 (cf. Ibid. pp. 337-347; San Josemaría, Camino. Edición crítico-histórica preparada por Pedro Rodríguez, Madrid, Instituto Historico Josemaría Escrivá – Rialp, 2004, p. 23.
[6] cf. Vázquez de Prada I, p. 338.
[7] Carta de 9-I-1932, n. 73 (AGP, ser. A.3., leg. 91, carp. 3, exp.1; Vázquez de Prada I, p. 338).
[8] Carta de 29-IX-1957, n. 49 (AGP, ser. 3., leg. 94, carp. 1, exp. 3).
[9] Carta de 15-VIII-1964, n. 3 (AGP ser. A.3, leg. 93, carp. 3, exp. 3).
[10] S. Josemaria, Amar a la Iglesia, Madrid, Palabra, 1986, p. 28.
[11] S. Josemaria, Amar a la Iglesia, Madrid, Palabra, 1986, p. 68. O texto citado encontra-se em: Sta. Catarina de Sena, El Diálogo, cap. 116. Para este texto S. Josemaria não usa a edição de Ángel Morta, Madrid 1955 (= BAC 143). Também não usou a edição de Rialp, Madrid, 1956. Provavelmente a citação é da edição Catalina de Siena, Libro de la Divina Doctrina vulgarmente llamado «El Diálogo», Ávila, Senén Martín, 1925. 607 pp.
[12] S. Josemaria, Camino, edición crítico-histórica preparada por P. Rodríguez, Madrid 2002, ponto 67, pp. 279-80. Como explica Rodríguez: Este modo de expressão – os sacerdotes meus Cristos (que procede do salmo 105) – foi tornado célebre por Sta. Catarina: «São os meus ungidos e chamo-lhes os meus Cristos porque os coloquei para que me administrassem a vós» (Diálogo 113) e «Estes são os meus ungidos; por isto disse na Escritura: não toqueis nos meus Cristos» (Diálogo, 115).
[13] Rodríguez indica os pontos de Caminho: 85, sobre a relação entre a oração vocal e mental (cf. ed. crít. pp. 294-95); 126, sobre a gula como vanguarda da impureza (cf. ed. crít. pp. 327-27); 183, sobre a guarda da vista e do coração (cf. ed. crít. pp. 373-74); e 258, sobre as visitas que Nosso Senhor faz à alma (cf. ed. crít. pp. 431-32).
[14] Homilia Cristo presente nos cristãos, pronunciada em 26-III-1967, Domingo de Ressurreição, em S. Josemaria, Cristo que passa, n 105.
[15] Ibid., n 183.
[16] S. Josemaria, Apuntes íntimos n. 217, 218 (cit. en Vázquez de Prada, El Fundador… Vol. I, p. 381; cf. Rodríguez, ed. crít. p. 473). Numa entrevista o fundador doOpus Dei comentava: «Desde há imensos anos, desde a própria data fundacional do Opus Dei, meditei e fiz meditar umas palavras de Cristo que nos relata S. João: Et ego, si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum (Jn 12, 32). Cristo, morrendo na Cruz, atrai a si a Criação inteira, e, em seu nome, os cristãos, trabalhando no meio do mundo, hão de reconciliar todas as coisas com Deus, colocando Cristo no cume de todas as atividades humanas» (Entrevistas a S. Josemaria, 59). Cf. P. Rodríguez, «A exaltação de Cristo na Cruz. João 12,32 na experiência espiritual do Beato Josemaria Escrivá de Balaguer», em Gonzalo Aranda Pérez – Claudio Basevi – Juan Chapa Prado (eds.), Biblia, exégesis y cultura: estudios en honor del prof. D. José María Casciaro, Pamplona, Eunsa, 1994, pp. 573-601.
[17] cf. O Diálogo, cap. 26.
[18] «Na opinião pública», Recuerdos de nuestro Padre, p. 398, AGP, Biblioteca, P21.
[19] Jesús Gil Sáenz, La biblioteca de trabajo de san Josemaria Escrivá de Balaguer en Roma, EDUSC, Roma, 2015.
[20] Santa Catarina De Sena, Diálogos, Madrid, Andrés García de la Iglesia, 1668; Ángel Morta (Introd., trad. e notas), Obras de Santa Catalina de Siena, El Diálogo, La Editorial Católica, 1955; Santa Catalina de Siena, El Diálogo, Madrid, Rialp, 1956.
[21] Il Dialogo di S. Caterina da Siena dettato in volgare dalla medesima essendo rapita in eccesso ed astrazione di mente. Trattato della Divina Provvidenza, Roma, Tipografia in Piazza di Monte Citorio, 1866 (= Le opere di Santa Caterina da Siena III).
[22] Johannes Jørgensen, Santa Catalina de Siena, Buenos Aires, Editorial Difusión, 1943? (o original: Den hellige Katerina af Siena, København, Gyldendalal, 1915). Jørgensen (1866-1956) é um escritor dinamarquês, que se converteu à Igreja católica em 1894 e, como resultado duma peregrinação a Assis, decidiu dedicar o seu talento de escritor em boa parte à realização de biografias de santos como Francisco de Assis, Brígida da Suécia, Catarina de Sena e outros. Os livros tiveram bom acolhimento e difusão em diferentes línguas.
[23] Assim se entende, que, quando se tratou de fixar o programa iconográfico do sacrário do oratório de Pentecostes em Villa Tevere entre 1954 e 1956, só se colocassem quatro intercessores. São pequenas estátuas de prata em quatro nichos à volta do sacrário em forma de relicário circular (cf. Vázquez de Prada, El Fundador… Vol. III, pp. 306-307; Crónica, março 1997, 26-32, AGP, Biblioteca, P01). O altar dos santos intercessores, colocado por trás duma grade na Aula de Villa Tevere, também foi concebido sem Sta. Catarina (cf. a descrição em Crónica, Maio 1960, pp. 63-67 e Fevereiro 1962, p. 48-49, AGP, Biblioteca, P01). Pode dizer-se o mesmo a respeito dum oratório de Villa delle Rose em Castelgandolfo, onde se puseram pequenos relicários com relíquias dos Santos Nicolau de Bari, Tomás Moro, Pio X e João Maria Vianney.
[24] Carta a Florencio Sánchez Bella, 10-V-1964 (AGP, ser. A.3.4., leg. 280, carp. 4; cit. em Vázquez de Prada III, p. 532).
[25] A Santa tinha sido declarada padroeira de Itália por Pio XII. João XXIII dispôs que em Itália se celebrasse a festa de Sta. Catarina –como a de S. Francisco de Assis– como festa do grau de I classe (cf. Communicatio da S. Congregação dos Ritos de 5 de agosto de 1961, AAS 53 [1961], p. 630).
[26] Apontamentos tomados numa tertúlia, 30 de abril de 1964, Crónica, maio 1964, pp. 61-62, AGP, Biblioteca, P01.
[27] Audiência geral de 29 de abril de 1964 (recorde-se que a festa de Sta. Catarina se celebrava então em 30 de abril), L’Osservatore Romano de 30 abril 1964. A tradução é nossa.
[28] Testemunho de José Luis Illanes, AGP, ser. A.5, 220-1-8.
[29] S. João XXIII, Carta Hoc anno ao Mestre Geral dos Dominicanos, Michael Browne, 20-VII-1961, AAS 53 (1961), pp. 555-557.
[30] Cartotti Oddasso, Caterina Benincasa, p. 1033. O culto da Santa de Sena ainda recebeu um último incremento: em 15 de outubro de 1967, Paulo VI anunciou a sua intenção de conferir a Sta. Catarina juntamente com Sta. Teresa de Ávila o título de doutora da Igreja. Desde o momento do primeiro anúncio até à proclamação efetiva ainda passaram três anos, até que o Romano Pontífice declarou solenemente as duas doutoras da Igreja na Basílica Vaticana, em 8 de outubro de 1970 (cf. G. Cavallini, Caterina da Siena, BSS, Appendice 1, col. 284-290).
[31] cf. «Na opinião pública», Recordações do nosso Padre, pp. 391-401, AGP, Biblioteca, P21.
[32] cf. Ibid., 393.
[33] Ibid., 398.
[34] Carta de Josemaria Escrivá ao Papa Paulo VI, 14 de junho de 1964, n. 1 (AGP, ser. A.3.4., leg. 281, carp. 1; cf. Vázquez de Prada III, pp. 534-536).
[35] Há uma pequena nota manuscrita de S. Josemaria no verso do certificado de autenticidade conservado em Villa Tevere que diz: «Está na arqueta do oratório do Padre. Enviou-ma, através de Álvaro, o P. Aniceto, geral dos dominicanos. Roma, 23-10-64». O mestre geral dos dominicanos foi de 1962 a 1974 Aniceto Fernández Alonso (†1981). Tarcisio M. Piccari era então postulador geral das causas de canonização da Ordem Dominicana.
[36] O certificado de autenticidade está datado em 9 outubro de 1964 e conserva-se também em Villa Tevere. No verso do certificado de autenticidade encontra-se também neste caso uma breve nota manuscrita de S. Josemaria: «Esta relíquia está dentro da arqueta, que já guarda outra da mesma santa, sobre a mesa do altar do oratório do Padre. Roma, 13 out. 1964. Mariano». Outra nota manuscrita conservada com os certificados de autenticidade, escrita em italiano com letra diferente, diz: «Lamentavelmente não há partes do corpo da Santa além da cabeça que se venera num relicário na igreja de S. Domingos em Sena e do resto do corpo, que está debaixo do altar-mor de Santa Maria sopra Minerva em Roma – Além desses sagrados restos, a única relíquia autêntica valiosa é este fragmento do véu da Santa, conservado pelo arcebispo de Sena». A tradução é nossa.
[37] cf. Ana Sastre, Tiempo de caminar. Semblanza de Monseñor Josemaría Escrivá de Balaguer, Madrid, Rialp, 1989, p. 488.
[38] Apontamentos dum encontro de família, 23 de outubro de 1972, AGP, ser. A.4.
[39] cf. Werner Pleister, Katherina (Caterina) von Siena, en Engelbert Kirschbaum (Begr.) – Wolfgang Braunfels (Hrsg.), Lexikon der christlichen Ikonographie, Freiburg im Breisgau, Herder, 1968-1976, vol. VII, coll. 300-306.
[40] cf. Manuel González-Simancas Lacasa, Un retablo de alabastro en pleno siglo XX, em Manuel Gómez Leira – Manuel Garrido González (eds.), Torreciudad, Madrid, Rialp, 2003, pp. 165-190. O escultor do retábulo, Juan Mayné Torras, publicou um extenso artigo sobre a sua obra: Retablo, em Ibid., pp. 191-214. Na p. 209 oferece-se uma reprodução da imagem de Sta. Catarina: a estátua está colocada sobre um capitel adornado com patos, no lado direito do retábulo (Crónica, 1990, pp. 380-389, AGP, Biblioteca, P01).
[41] Pedro Anastasio Bocanegra (Granada 12-V-1638 – Granada, 1689); cf. Alfonso E. Pérez Sánchez, Pintura Barroca en España, 1600-1750, Madrid, Cátedra, 1992.
[42] Carlos Barrera Del Barrio, San Josemaría de Balaguer y el Instituto de Periodismo de la Universidad de Navarra, SetD 2 (2008), pp. 245-246.
[43] Testemunho de Alfonso Nieto Tamargo, Islabe, 15 de agosto de 1975, AGP, ser. A.5, 230-02-12 «No gabinete do decano da Faculdade de Ciências da Informação da Universidade de Navarra, há um quadro que tem como tema o casamento místico de Sta. Catarina de Sena. Esse quadro foi oferecido pelo Padre. Recordo que, no ano de 1968, durante uma estada do Padre em Pamplona, me telefonaram para ir ao Colegio Mayor Aralar. Na sala da direção do Colegio Mayor, durante uns momentos de conversa com o Padre, contei-lhe alguns episódios e pormenores do trabalho que se fazia no então Instituto de Jornalismo da Universidade de Navarra. Com o Padre estava o Pe. Álvaro [del Portillo], o Pe. Javier [Echevarría] e o Pe. Florencio [Sánchez Bella]. Depois de contar ao Padre um pormenor do trabalho apostólico que se fazia, disse-nos que nos ia enviar, como presente especial, um quadro de Sta. Catarina de Sena. E indicou-me concretamente: quando te perguntarem porque é que o Padre vos ofereceu esse quadro, diz que foi para recordar aos jornalistas a obrigação de escrever e defender a verdade; assim fez Sta. Catarina de Sena, que não tinha “papas na língua” e, com caridade, disse sempre a verdade a todos …, até ao próprio Papa».
[44] «Surpreendeu-nos com um presente: o quadro de Sta. Catarina [...] para que – esclareceu – seguíssemos o seu exemplo e ensinássemos os alunos a fazê-lo, dizendo sempre que fosse necessário verdades como punhos, com firmeza e claramente, mas com caridade e compreensão»: Francisco Gómez Antón, Desmemorias, Pamplona, Eunsa, 2002, pp. 78-79; cf. Barrera, Josemaría Escrivá, p. 246).
[45] Sobre os começos deste centro internacional de formação, cf. María Isabel Montero Casado De Amezúa, L’avvio del Collegio Romano di Santa Maria, SetD 7 (2013), pp. 259-319.
[46] Apontamentos dum encontro de família, 21-IV-1973, Noticias, 1973, p. 434, AGP, Biblioteca, P02. (Noticias 1973, p. 434).
[47] cf. Raimondo Da Capua, Santa Caterina da Siena, Legenda maior, Siena, Cantagalli: Siena, 1998 (rist. della 5a edizione riveduta 1969), cap. 49, p. 62. Raimundo acrescenta que a santa lhe dava o conselho de proceder da mesma maneira quando ele próprio tivesse uns encargos muito exigentes: «Recordo [...] que, quando me encontrava oprimido pelas ocupações, ou quando tinha que fazer uma viagem, me advertia repetindo-me: “Faz uma cela na tua mente, de que não possas sair nunca”»: Ibid., pp. 62-63. A tradução é nossa.
[48] Carta de 31-V-1954, n. 7 § 2, citada por Manuel Belda, «Contemplativos en medio del mundo», Romana. Bolletino della Santa Croce e Opus Dei 14 (1998), p. 327. cf. também José Luis Illanes, La santificación del trabajo. El trabajo en la historia de la espiritualidad, Madrid, Palabra, 2001, p. 125, que também aduz este texto entre outras citações: «Almas contemplativas no meio do mundo: isso são os meus filhos no Opus Dei, isso tendes de ser sempre para assegurar a vossa perseverança, a vossa fidelidade à vocação recebida. E em cada instante do nosso dia, podemos exclamar sinceramente: “loquere, Domine, quia audit servus tuus” (1 S 3,9); fala, Senhor, que o teu servo escuta. Onde quer que estejamos, no meio do rumor da rua e dos afãs humanos – na fábrica, na universidade, no campo, na oficina ou em casa –, encontrar-nos-emos em simples contemplação filial, num constante diálogo com Deus» (Carta de 11 de março de 1940, n. 15).
[49] Apontamentos dum encontro de família, 24-V-1975, AGP, ser. A.4.
[50] S. Josemaria, Carta de 11 de março de 1940, n. 15.
[51] Apontamentos dum encontro de família, 24-V-1975, AGP, ser. A.4.
[52] Segundo os relatos, o episódio tem de se situar em julho 1370: «Uma vez, enquanto orava com mais fervor ao Senhor, disse-lhe com o profeta: “Cria em mim, meu Deus, um coração puro, e renova no meu interior um espírito firme” (Sl 50, 12), e pediu-lhe insistentemente que lhe tirasse o coração e a vontade. Ele consolou-a com esta visão: pareceu-lhe que o eterno Esposo tinha vindo como sempre visitá-la, lhe tinha aberto o peito pelo lado esquerdo e lhe tinha tirado o coração. E tudo isto coincidiu tão perfeitamente com o que Catarina sentia no seu interior, que quando se foi confessar disse ao confessor que o seu coração já não estava no seu peito. O confessor, no entanto, encolheu os ombros perante esta forma de se exprimir, e a brincar, de certo modo censurou-a por se exprimir dessa forma. Mas ela confirmou o que tinha dito: “Na verdade, Padre, por muito que possa saber e sentir, parece-me que não tenho coração, porque Nosso Senhor me apareceu, me abriu o peito pelo lado esquerdo, pegou no meu coração e foi-se embora”. O confessor recordou-lhe que é impossível viver sem o coração, mas Catarina respondeu que nada é impossível para o Senhor, e que estava convencida de que já não tinha o coração. Assim, durante um tempo insistiu em repetir que vivia sem o coração. – Um dia estava na capela da igreja dos frades Pregadores de Sena, onde se reuniam as irmãs da Penitência de S. Domingos. As outras tinham ido embora, mas ela tinha ficado ali para rezar e teve um êxtase. Finalmente recuperou e levantou-se para ir para casa. Uma luz do céu envolveu-a de repente, e na luz apareceu-lhe Nosso Senhor, que tinha nas suas mãos santas um coração humano, vermelho e brilhante. Embora ao aparecer o Autor da luz, ela tivesse caído toda a tremer no chão, Nosso Senhor aproximou-se dela, abriu-lhe de novo o peito pelo lado esquerdo, e introduzindo o mesmo coração que tinha nas mãos, disse-lhe: “Queridíssima menina, como no outro dia levei o teu coração, agora dou-te o meu, com que viverás sempre”. Dito isto, fechou a abertura que tinha feito no seu lado, e como sinal do milagre, ficou uma cicatriz nessa parte do corpo, como as suas companheiras, que a puderam ver, me disseram a mim e a outros. Quando quis saber a verdade acerca do sucedido, ela própria se viu obrigada a confessar-ma, e acrescentou que desde esse momento já não podia dizer: “Senhor, entrego-te o meu coração”»: Legenda maior, cap. 6, nn. 179-180, pp. 198-199; cf. Jørgensen, Santa Catalina de Siena, pp. 142-144. A tradução é nossa.
[53] A santa, dirigindo-se ao seu confessor, naquele momento, Frei Tommaso della Fonte, dizia: «A minha mente está cheia de tanta alegria e felicidade que me espanta o facto de que a minha alma permaneça no meu corpo». E acrescentou: «Este ardor gera na minha mente uma verdadeira renovação da pureza e da humildade, tanto que parece que volto à idade de quatro ou cinco anos. Daí que seja tal o meu amor ao próximo, que por ele estaria disposta a enfrentar a morte com alegria e grande felicidade de coração» (Ibid., p. 182). A legenda minor recolhe o mesmo acontecimento na parte II, cap. VI, pp. 90-91. A tradução é nossa.
[54] Legenda maior, 110, cf. Jørgensen 58-60.
[55] Apontamentos dum encontro de família, 26-VI-1974, AGP, ser. A.4.
[56] Apontamentos dum encontro de família, 28-IV-1974, AGP, ser. A.4.
[57] Tertúlia, 11-II-1962, AGP, ser. A.4.