Que é a Unção dos Enfermos?

Em que consiste a Unção dos enfermos? Tem algum efeito? Em que condições se pode receber? Estas são algumas das perguntas que se tratam neste artigo da série “Perguntas sobre a fé cristã”.

Que é a Unção dos Enfermos?

Sumário:

1. O enfermo perante Deus

2. Um sacramento especial para os enfermos

3. Como se administra o Sacramento da Unção dos enfermos?

4. Os efeitos do Sacramento da Unção dos enfermos


«Curai os enfermos!» (Mt 10, 8). A Igreja recebeu esta tarefa do Senhor e procura realizá-la tanto mediante os cuidados médicos e assistenciais que proporciona aos enfermos, como pela oração de intercessão com que os acompanha.

O Apóstolo S. Tiago, numa carta que se recolhe nas Sagradas Escrituras, escreve: «Está doente alguém entre vós? Mande chamar os presbíteros da Igreja para que orem por ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor. A oração feita com fé salvará o enfermo e o Senhor o restabelecerá; e se tiver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados» (Tg 5, 14-15).

A Tradição reconheceu neste rito um dos sete sacramentos da Igreja: a unção dos enfermos.


1. O enfermo perante Deus

A doença pode levar à angústia, ao fechar-se em si mesmo e até, por vezes, ao desespero e à revolta contra Deus. Mas também pode tornar uma pessoa mais amadurecida, ajudá-la a discernir, na sua vida, o que não é essencial para se voltar para o que o é. Muitas vezes, a doença leva à busca de Deus, a um regresso a Ele.

O homem do Antigo Testamento vive a doença à face de Deus. É diante de Deus que desafoga o seu lamento pela doença que lhe sobreveio e é d'Ele, Senhor da vida e da morte, que implora a cura. A doença torna-se caminho de conversão e o perdão de Deus dá início à cura. Israel faz a experiência de que a doença está, de modo misterioso, ligada ao pecado e ao mal, e de que a fidelidade a Deus em conformidade com a sua Lei restitui a vida: «porque Eu, o Senhor, é que sou o teu médico» (Ex 15, 26).

A compaixão de Cristo para com os doentes e as suas numerosas curas de enfermos de toda a espécie são um sinal claro de que «Deus visitou o seu povo» (Lc 7, 16) e de que o Reino de Deus está próximo. Assim, nos Sacramentos, Cristo continua a "tocar-nos" para nos sanar. Jesus tem poder não somente para curar, mas também para perdoar os pecados. A sua compaixão para com todos os que sofrem vai ao ponto de identificar-Se com eles: «Estive doente e visitastes-Me» (Mt 25, 36). O seu amor de predileção para com os enfermos não cessou, ao longo dos séculos, de despertar a atenção particular dos cristãos para aqueles que sofrem no corpo ou na alma. Este especial cuidado deu origem a incansáveis esforços para aliviar os que sofrem.

Pela sua paixão e morte na Cruz, Cristo deu um sentido novo ao sofrimento: desde então esta realidade configura-nos com Ele e nos une à sua paixão redentora.

(cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 1502-1510)

Textos de S. Josemaria para meditar

Criança. – Doente. – Ao escrever estas palavras, não sentis a tentação de as pôr com maiúscula?

É que, para uma alma enamorada, as crianças e os doentes são Ele.

(Caminho, n. 419)

Um filho de Deus não tem medo da vida nem medo da morte, porque o fundamento da sua vida espiritual é o sentido da filiação divina: Deus é meu Pai, pensa, e é o Autor de todo o bem, é toda a Bondade.

– Mas tu e eu procedemos, de verdade, como filhos de Deus?

(Forja, n. 987)

Todas as situações que a nossa vida atravessa nos trazem uma mensagem divina, nos pedem uma resposta de amor, de entrega aos demais. «Quando vier o Filho do homem em toda a sua majestade, acompanhado de todos seus anjos, há de sentar-se então no seu trono de glória. Perante Ele reunir-se-ão todas as nações e Ele apartará as pessoas umas das outras, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. À sua direita porá as ovelhas, e os cabritos à esquerda. O Rei dirá então, aos da sua direita: Vinde, benditos do meu Pai, recebei em herança o Reino que vos está preparado desde a criação do mundo. Porque tive fome e destes-Me de comer, tive sede e destes-Me de beber; era peregrino e recolhestes-Me; estava nu e vestistes-Me; adoeci e visitastes-Me, estive na prisão e fostes ter comigo. Então os justos responder-Lhe-ão: Senhor, quando é que Te vimos com fome e Te demos de comer, com sede e Te demos de beber? Quando é que Te vimos peregrino e Te recolhemos, ou nu e Te vestimos? E quando Te vimos doente ou na prisão e fomos visitar-Te? E o Rei dir-lhes-á em resposta: Em verdade vos digo, sempre que o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim o fizestes» (Mt 25, 31-40).

É preciso reconhecer Cristo que nos sai ao encontro nos nossos irmãos, os homens. Nenhuma vida humana é uma vida isolada; entrelaça-se com as demais. Nenhuma pessoa é um verso solto; todos fazemos parte de um mesmo poema divino, que Deus escreve com o concurso da nossa liberdade.

(Cristo que passa, n. 111)

Só se aproveitarmos com retidão – cristãmente – as épocas de bem-estar físico, os bons tempos, aceitaremos também com alegria sobrenatural os acontecimentos que habitualmente são considerados maus. Sem descer a demasiados pormenores, quero transmitir-vos a minha experiência pessoal. Quando estamos doentes, podemos ser impertinentes: não me atendem bem, ninguém se preocupa comigo, não me tratam como mereço, ninguém me compreende… O demónio, que anda sempre à espreita, ataca por qualquer flanco. E, na doença, a sua táctica consiste em fomentar uma espécie de psicose que nos afaste de Deus, que azede o ambiente ou que destrua esse tesouro de méritos, que, para bem de todas as almas, se alcança quando aceitamos a dor com otimismo sobrenatural – com amor. Portanto, se é da vontade de Deus que nos atinja o aguilhão do sofrimento, aceitemo-lo como sinal de que nos considera maduros para nos associar mais estreitamente à sua cruz redentora.

Torna-se, pois, necessária, uma preparação remota, feita todos os dias com santo desapego de nós próprios, para nos dispormos a aceitar com garbo a doença ou a desventura – se o Senhor tal permitir. Servi-vos das ocasiões normais, de alguma privação, da dor nas suas pequenas manifestações habituais, da mortificação, para exercitardes as virtudes cristãs.

(Amigos de Deus, n. 124)


2. Um sacramento especial para os enfermos

A Igreja crê e confessa que, entre os sete sacramentos, há um, especialmente destinado a reconfortar os que se encontram sob a provação da doença: a Unção dos enfermos:

«Esta santa unção dos enfermos foi instituída por Cristo nosso Senhor como sacramento do Novo Testamento, verdadeira e propriamente dito, insinuado por S. Marcos, mas recomendado aos fiéis e promulgado por S. Tiago, apóstolo e irmão do Senhor» (Concílio de Trento).

Na tradição litúrgica, tanto no Oriente como no Ocidente, temos, desde os tempos antigos, testemunhos de unções de doentes praticadas com óleo benzido. No decorrer dos séculos, a Unção dos enfermos começou a ser conferida cada vez mais exclusivamente aos que estavam prestes a morrer. Por causa disso, fora-lhe dado o nome de “Extrema-Unção”. Porém, apesar dessa evolução, a liturgia nunca deixou de pedir ao Senhor pelo doente, para que recuperasse a saúde, se tal fosse conveniente para a sua salvação.

(Catecismo da Igreja Católica, n. 1511-1512)

Textos de S. Josemaria para meditar

“Às vezes, dizia aquele doente consumido de zelo pelas almas, o corpo protesta um pouco, queixa-se. Mas procuro transformar também esses "queixumes" em sorrisos, porque são muito eficazes”.

(Sulco, n. 253)

Quando pensares na morte, não tenhas medo, apesar dos teus pecados. Porque Ele já sabe que O amas… e de que massa és feito.

Se tu O procurares, Ele acolher-te-á como o pai ao filho pródigo. Mas tens de O procurar!

(Sulco, n. 880)


3. Como se administra o Sacramento da Unção dos enfermos?

A Unção dos Enfermos não é sacramento só dos que estão prestes a morrer. Por isso, o tempo oportuno para a receber é certamente quando o fiel começa, por doença ou por velhice, a estar em perigo de morte.

Se um doente que recebeu a Unção recupera a saúde, pode, em caso de nova enfermidade grave, receber outra vez este sacramento. No decurso da mesma doença, este sacramento pode ser repetido se o mal se agrava. É conveniente receber a Unção dos Enfermos antes duma operação cirúrgica importante. E o mesmo se diga a respeito das pessoas de idade, cuja fragilidade se acentua.

Só os sacerdotes (bispos e presbíteros) são ministros da Unção dos Enfermos. É dever dos pastores instruir os fiéis acerca dos benefícios deste sacramento. Que os fiéis animem os enfermos chamarem o sacerdote para receberem este sacramento. E que os doentes se preparem para o receber com boas disposições, com a ajuda do seu pastor e de toda a comunidade eclesial, convidada a rodear, de um modo muito especial, os doentes, com as suas orações e atenções fraternas.

Como todos os sacramentos, a Unção dos Enfermos é uma celebração litúrgica e comunitária quer tenha lugar no seio da família, quer no hospital ou na igreja, para um só doente ou para um grupo deles. É muito conveniente que seja celebrada durante a Eucaristia, memorial da Páscoa do Senhor. Se as circunstâncias a tal convidarem, a celebração do sacramento pode ser precedida pelo sacramento da Penitência e seguida pelo da Eucaristia. Enquanto sacramento da Páscoa de Cristo, a Eucaristia deveria ser sempre o último sacramento da peregrinação terrestre, o “viático” da “passagem” para a vida eterna.

Palavra e sacramento formam um todo inseparável. A liturgia da Palavra, precedida dum ato penitenciai, abre a celebração. As palavras de Cristo e o testemunho dos Apóstolos despertam a fé do doente e da comunidade, para pedir ao Senhor a força do seu Espírito.

Àqueles que vão deixar esta vida, a Igreja oferece-lhes, além da Unção dos Enfermos, a Eucaristia como viático. Recebida neste momento de passagem para o Pai, a comunhão do corpo e sangue de Cristo tem um significado e uma importância particulares. É semente de vida eterna e força de ressurreição, segundo as palavras do Senhor: «Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna: e Eu ressuscitá-lo‑ei no último dia» (Jo 6, 54). Sacramento de Cristo morto e ressuscitado, a Eucaristia é aqui sacramento da passagem da morte para a vida, deste mundo para o Pai.

Assim, do mesmo modo que os sacramentos do Batismo, da Confirmação e da Eucaristia constituem uma unidade chamada “os sacramentos da iniciação cristã”, também pode dizer-se que a Penitência, a Santa Unção e a Eucaristia, como viático, constituem, quando a vida do cristão chega ao seu termo, “os sacramentos que preparam a entrada na Pátria” ou os sacramentos com que termina a peregrinação.

O essencial da celebração deste sacramento consiste na unção na fronte e nas mãos do doente (no rito romano) ou sobre outras partes do corpo (no Oriente), unção acompanhada da oração litúrgica do sacerdote celebrante que pede a graça especial deste sacramento.

(Catecismo da Igreja Católica, n. 1514-1518; 1524-1525; 1531)

Textos de S. Josemaria para meditar

Quando estiveres doente, oferece com amor os teus sofrimentos, e converter-se-ão em incenso que se eleva em honra de Deus e que te santifica.

(Forja, n. 791)

Na Unção dos Enfermos, como agora chamam à Extrema Unção, assistimos a uma amorosa preparação da viagem, que terminará na casa do Pai. E com a Sagrada Eucaristia, sacramento – se assim nos podemos exprimir – da loucura do amor divino, concede-nos a sua graça, e entrega-se-nos o próprio Deus, Jesus Cristo, que está realmente sempre presente nas espécies consagradas – e não apenas durante a Santa Missa – com o seu Corpo, com a sua Alma, com o seu Sangue e com a sua Divindade.

Penso repetidas vezes na responsabilidade que incumbe aos sacerdotes, de assegurar a todos os cristãos esse caminho divino dos Sacramentos. A graça de Deus vem em socorro de cada alma; cada criatura requer uma assistência concreta, pessoal. As almas não se podem tratar massivamente! Não é lícito defender a dignidade humana e a dignidade de filho de Deus, não atendendo a cada um pessoalmente com a humildade de quem se sabe instrumento para ser veículo do amor de Cristo; porque cada alma é um tesouro maravilhoso; cada homem é único, insubstituível. Cada um vale todo o sangue de Cristo.

(Cristo que passa, n. 80)

Não tenhas medo da morte. – Aceita-a, desde agora, generosamente…, quando Deus quiser…, como Deus quiser…, onde Deus quiser. – Não duvides; virá no tempo, no lugar e do modo que mais convier…, enviada pelo teu Pai-Deus. – Bem-vinda seja a nossa irmã, a morte!

(Caminho, n. 739)

4. Os efeitos do Sacramento da Unção dos enfermos

A primeira graça deste sacramento é uma graça de reconforto, de paz e de coragem para vencer as dificuldades próprias do estado de doença grave ou da fragilidade da velhice. Esta graça é um dom do Espírito Santo, que renova a confiança e a fé em Deus, e dá força contra as tentações do Maligno, especialmente a tentação do desânimo e da angústia da morte. Esta assistência do Senhor pela força do seu Espírito visa levar o doente à cura da alma, mas também à do corpo, se tal for a vontade de Deus. Além disso, «se ele cometeu pecados, ser-lhe-ão perdoados» (Tg 5, 15).

Pela graça deste sacramento, o enfermo recebe a força e o dom de se unir mais intimamente à paixão de Cristo: ele é, de certo modo, consagrado para produzir frutos pela configuração com a paixão redentora do Salvador. O sofrimento, sequela do pecado original, recebe um sentido novo: transforma-se em participação na obra salvífica de Jesus.

Os doentes que recebem este sacramento, associando-se livremente à paixão e morte de Cristo, concorrem para o bem do povo de Deus. Ao celebrar este sacramento, a Igreja, na comunhão dos santos, intercede pelo bem do doente. E o doente, por seu lado, pela graça deste sacramento, contribui para a santificação da Igreja e para o bem de todos os homens, pelos quais a Igreja sofre e se oferece, por Cristo, a Deus Pai.

A Unção dos Enfermos completa a nossa conformação com a morte e ressurreição de Cristo, tal como o Batismo a tinha começado. Leva à perfeição as unções santas que marcam toda a vida cristã: a do Batismo selara em nós a vida nova: a da Confirmação robustecera-nos para o combate desta vida; esta última unção mune o fim da nossa vida terrena como que de um sólido escudo em vista das últimas batalhas, antes da entrada na Casa do Pai.

Em resumo, a graça especial do sacramento da Unção dos Enfermos tem como efeitos:

– a união do doente à paixão de Cristo, para o seu bem e para o de toda a Igreja;

– o conforto, a paz e a coragem para suportar cristãmente os sofrimentos da doença ou da velhice;

– o perdão dos pecados, se o doente não pôde obtê-lo pelo sacramento da Penitência;

– o restabelecimento da saúde, se tal for conveniente para a salvação espiritual;

– a preparação para a passagem para vida eterna.

(cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 1520-1523; 1532)

Textos de S. Josemaria para meditar

Não esqueças que a Dor é a pedra de toque do Amor.

(Caminho, n. 439)

Doutor em Direito e em Filosofia, preparava um concurso para catedrático na Universidade de Madrid. Duas carreiras brilhantes, realizadas com brilho.

Recebi um aviso seu: estava doente, e desejava que eu fosse visitá-lo. Cheguei à pensão onde estava hospedado. – “Padre, estou a morrer”, foi a sua saudação. Animei-o com carinho. Quis fazer confissão geral. Faleceu naquela mesma noite.

Um arquiteto e um médico ajudaram-me a amortalhá-lo. E, à vista daquele corpo jovem, que rapidamente começou a decompor-se…, concordámos os três que as duas carreiras universitárias não valiam nada, comparadas com a carreira definitiva que, como bom cristão, acabava de coroar.

(Sulco, n. 877)

Aos "outros", a morte paralisa-os e espanta-os. – A nós, a morte – a Vida – dá-nos animo e impulso.

Para eles, é o fim; para nós, o princípio.

(Caminho, n. 738)

Consolaste-te com a ideia de que a vida é gastar-se, é queimá-la no serviço de Deus. Assim, gastando-nos integralmente por Ele, virá a libertação da morte, que nos dará a posse da Vida.

(Sulco, n. 883)

Tu – se és apóstolo – não hás de morrer. – Mudarás de casa, e nada mais.

(Caminho, n. 744)

A Virgem Dolorosa… Quando a contemplares, repara no seu Coração. É uma mãe com dois filhos, frente a frente; Ele… e tu.

(Caminho, n. 506)

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