Áudio do Prelado: “Perdoar ao que nos ofende”

D. Javier Echevarría revê a parábola do filho pródigo para refletir sobre o perdão de Deus, de quem devemos aprender a viver esta obra de misericórdia: «Desejemos vivamente que a decisão de perdoar e de pedir perdão se converta numa atitude habitual em nós, em cada família, entre os amigos».

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1. Introdução: As Obras de Misericórdia ( Dez 2015)

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3. Dar de comer a quem tem fome e dar de beber a quem tem sede (Fev 2016)

4. Vestir os nus e visitar os presos (Mar 2016)

5. Dar pousada ao peregrino (Abril 2016)

6. Dar sepultura aos defuntos (Maio 2016)

7. Ensinar os ignorantes” e “dar bom conselho (Junho 2016)

8. Corrigir os que erram (Julho 2016)

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Uma das obras de misericórdia de que o mundo mais necessita – agora e sempre – consiste em perdoar ao que nos ofende. “Que difícil nos pode parecer muitas vezes perdoar! – salientou o Santo Padre. E, no entanto, o perdão é o instrumento posto nas nossas frágeis mãos para alcançar a serenidade do coração. Deixar cair o rancor, a raiva, a violência e a vingança são condições necessárias para viver felizes”.

Este viver felizes surge diante de nós como um desejo de todos os seres humanos. Mas ninguém pode alcançar a felicidade por conta própria, de costas para Deus e para os outros. Com alguma frequência, talvez cresça a sensação de que aqueles que nos rodeiam são um obstáculo: porque nos ofendem; porque nos maltratam; porque nos causam dor física ou moral... males que o próprio Jesus Cristo experimentou, crucificado por aqueles a quem veio trazer a salvação.

O Senhor, rosto visível da misericórdia do Pai, perdoou sem dar lugar ao ressentimento: “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem”, rezou enquanto pendia do lenho da Cruz. Desse modo, quebrou decididamente o círculo vicioso do ódio que apenas gera mais ódio, do círculo da vingança, do rancor; e fez com que dessa cruz emanasse uma fonte de misericórdia, capaz de mudar a história de cada mulher e de cada homem.

A Cruz do Senhor ajuda-nos a compreender que todos necessitamos de perdão: de perdoar e de ser perdoados. Quem não assimila esta realidade, torna-se incapaz de sondar a boa profundidade do amor que o une a outra pessoa ou a Deus.

Revejamos a parábola do filho pródigo. O jovem, cego pela inexperiência e orgulho, afastou-se da casa paterna e delapidou tudo o que tinha recebido. Se regressou a casa, foi porque teria sentido muito de perto, noutros momentos, a misericórdia paterna, a sua compreensão, e sabia de sobra que não seria rejeitado. Ao reencontrar o pai, este entregou-lhe, com um abraço, o seu maior dom: o perdão. E procedeu assim sem o humilhar, sem lhe recordar, nem por um instante, as suas anteriores advertências e conselhos. Só então o jovem chegou a compreender o verdadeiro tesouro do amor paterno que tinha ignorado e deixado para trás, e que, felizmente, ao regressar contrito, tinha recuperado.

Também cada um de nós necessita de recorrer com frequência ao sacramento do perdão, para entender de alguma maneira a profundidade do amor divino. “Deus não se cansa de perdoar – recorda o Papa – somos nós que nos cansamos de pedir perdão”. Com efeito, infelizmente, alimentamos mesmo a determinação de nos acostumarmos à frieza do pecado. Por isso, se já beneficiamos deste sacramento, façamo-lo com as melhores disposições ao nosso alcance, recorrendo a ele com maior frequência ou preparando-nos melhor. Para o conseguir, lancemo-nos nos braços misericordiosos de Deus, eliminemos radicalmente os preconceitos e as desculpas que nos impedem de perceber na alma essa carícia da compreensão do Senhor. Por acaso não recordamos a felicidade experimentada na última vez que nos reconciliámos com uma pessoa? O pedido de perdão não é um gesto humano capaz de “pôr rosto” a esse Deus, que tantas vezes afastámos da nossa vida e cuja bondade esquecemos?

Muitos cristãos desconhecem a beleza da Confissão. Convençamo-nos, este sacramento não passou nem nunca passará de moda. Possui e possuirá um poder sempre atual. Mais ainda, é um sacramento que abre a nossa vida ao futuro, porque nos devolve a esperança. Rezemos portanto para que o Ano Jubilar da Misericórdia permita a tantos cristãos recuperar o caminho de regresso à casa paterna.

Talvez algum possa pensar que, para se confessar, se requer uma preparação prévia muito complexa, e não é assim; basta desejar a graça, fazer um bom exame de consciência – talvez com a ajuda de um guião ou com a colaboração de uma pessoa competente – e a seguir, confiadamente, ir ao sacerdote. Não passemos por alto que foram os sofrimentos interiores e exteriores, o conhecimento da própria miséria e a recordação do amor paterno, o que moveu interiormente o filho pródigo a pôr-se a caminho. Numa situação semelhante se encontram muitas pessoas à nossa volta: só necessitam de alguém que os acompanhe nessa viagem de regresso à casa do Pai.

Por outro lado, assim como Deus absolve, também nós devemos saber perdoar quantas vezes for necessário na vida quotidiana. Pode suceder que talvez por causa de mal entendidos, diferenças de caráter, divergências políticas ou culturais, ou questões de outro tipo, alguns homens e mulheres arrastem durante anos a recordação de ofensas causadas por amigos ou por terceiros. Infelizmente, com uma disposição desse género na alma, os conflitos podem prolongar-se no tempo, sem que nenhum dê o braço a torcer.

Imersos em pleno, como estamos, no Ano da misericórdia, não descobrimos este tempo como ocasião magnífica para oferecer a nossa reconciliação, ainda que tenhamos sido nós os ofendidos? O Senhor dá sempre o primeiro passo para nos perdoar, embora não mereçamos a sua graça; não nos decidimos a seguir o exemplo do Mestre? “Esforça-te, se for preciso – escreveu São Josemaría – por perdoar sempre aos que te ofendam, desde o primeiro instante, já que, por grande que seja o prejuízo ou a ofensa que te façam, mais te perdoou Deus a ti”.

Desejemos vivamente que a decisão de perdoar e de pedir perdão se converta numa atitude habitual em nós, em cada família, entre os amigos. Pensemos que, sem a disposição de perdoar, todos os cenários em que nos movemos – também a própria família – se convertem em ambientes desoladores, egoístas, tristes, que envenenam as almas ou as entristecem. A lição de Jesus Cristo é bem precisa: amar sem descanso, também aquele que nos fere.

Portanto, se os outros correspondem ao nosso perdão, demos graças a Deus; mas se não obtemos essa resposta que desejaríamos, não desanimemos, porque a misericórdia é gratuita, nada espera em troca. Jesus Cristo morreu a rezar pelos que O crucificavam e O ofendiam. A sua morte redentora foi a causa do véu do ódio cair dos olhos das almas. E só então, ao contemplar como Jesus Cristo expirou, o centurião que estava junto à Cruz pronunciou este formoso ato de fé: “Verdadeiramente este homem era Filho de Deus”.

Se os cristãos perdoarem prontamente as ofensas recebidas, com alegria e simplicidade de coração, muitos se sentirão atraídos pelo amor dos filhos de Deus e chegarão a encontrar o Pai bom que deseja abraçar a todos com a sua misericórdia.