Um padre que sabia falar ao coração

O Pe. José Luis Soria (17/04/1932 – 03/10/2022) foi médico do Fundador do Opus Dei no período em que este viveu em Roma e até ao seu falecimento, em 1975. Viveu posteriormente no Canadá. Faleceu no passado mês de outubro, com 90 anos. Transcrevemos o excerto de um texto publicado na imprensa por Barbara Stuart, que testemunha a influência que teve na sua vida pessoal.

O Pe. José Luis Soria em Glenwood
O Pe. José Luis Soria em Glenwood

Ele falava para o lugar do meu coração que só eu conheço. Ajudou-me a assumir as minhas responsabilidades da forma mais suave, como só um pai que sabe amar pode ousar fazer.

Num momento preciso da minha vida, eu procurava profundamente qualquer coisa, mas não sabia verdadeiramente o quê.

Tinha ouvido falar de uma recoleção mensal em Vancouver, mas estava cética. Um dia, uma boa amiga disse-me: "Barbara, conheço um padre muito santo e penso que vais gostar de o conhecer". A expressão "um padre muito santo" inicialmente chamou a minha atenção.

Assisti à recoleção seguinte e ouvi fascinada este "padre muito santo". Tocou-me no mais profundo de mim mesma. Duas coisas falaram-me ao coração e muito ao meu coração (eu sabia-o!): as nossas circunstâncias particulares são o lugar onde encontramos os meios para a nossa santificação e, em segundo lugar, o restante são apenas intenções piedosas. Pouco depois, pedi ao Pe. José Soria, afetuosamente conhecido por Padre Joe, para ser o meu diretor espiritual. Nunca me arrependi.

As nossas vidas são feitas de pequenos detalhes e de acontecimentos importantes. Penso agora numa mistura dos dois. O Pe. Joe conhecia muito bem cada um de nós. Nunca tive de me explicar; ele sabia aquilo que eu tentava dizer e eu sabia que ele me compreendia.

Ele falava para o lugar do meu coração que só eu conheço. Ajudou-me a assumir as minhas responsabilidades da forma mais suave, como só um pai que sabe amar pode ousar fazer.

Depois das minhas numerosas faltas repetidas, ele dizia: "Barb, penso que já falámos disso". A forma como utilizava o meu nome, como falava, fazia-me sorrir – e eu esforçava-me.

Era tão elegante, tinha uma dignidade tão grande e, no entanto, era tão acessível. Integrava-se perfeitamente na vida de família de cada um. Gostava de jantar com os seus amigos; contava piadas às crianças (e aos adultos); tornou-se num membro estimado de muitas famílias barulhentas e cheias de vida.

Uma noite de inverno, chegou ao Centro Crestwell (o centro do Opus Dei para senhoras em Vancouver), vestido com um casaco de lã preta e um cachecol branco. Todas olhavam para ele: "Pe. Joe, está tão bem, gosto muito do seu casaco e do seu cachecol". Ele respondeu: "Tem 25 anos e comprei-o para os invernos de Montreal".

Finalmente, tirou o casaco e desceu para pregar uma meditação. Nunca mais o vi com esse casaco! Cada vez que lhe fazíamos um elogio ou lhe agradecíamos em excesso, dizia-nos com firmeza: "Se não param, vou-me já embora", e nós sabíamos que ele estava a falar a sério.

Uma outra noite, em Crestwell, estávamos reunidos no primeiro andar para cantar canções de Natal. À saída, ele parou para cumprimentar um casal que fazia uma pequena dança. O padre juntou-se a eles e dançou com eles. Era tão invulgar e, no entanto, tão autêntico!

Um ano, a minha filha veio a um retiro com o seu filho pequeno, um rapaz. Este estava à frente de uma porta espelhada e falava para si próprio. O Pe. Joe aproximou-se por detrás e falou-lhe ao espelho. Alguns anos mais tarde, quando o padre estava doente, o meu neto, então adolescente, teve o privilégio de lhe levar refeições ao seu quarto.
Durante a última doença do meu marido, recebi um telefonema do Pe. Joe a perguntar-me se eu queria que ele nos fosse visitar. Fiquei muito surpreendida! Eu sabia que ele era extremamente ocupado e que atendia muitas pessoas, mas claro que aceitei e ele veio imediatamente.

Depois desta primeira visita, veio com frequência, preocupando-se connosco, dando-me sempre conselhos úteis sobre os tratamentos a fazer ao meu marido e em particular sobre a toma dos seus medicamentos.
Uma noite, quando o fim parecia próximo, telefonei ao Pe. Joe para lhe pedir para vir. Ao entrar no quarto, ajoelhou-se e disse "absolvo", fazendo o sinal da cruz sobre o John. Velou comigo e com a família até à 1h30m da manhã. Graças à sua amizade gentil e amável nestes momentos difíceis, uma pessoa da minha família que me ajudava a cuidar do John, voltou a encontrar a fé e está agradecida até hoje.

Recentemente, a minha filha e eu tivemos a sorte de visitá-lo. Apesar de não poder falar, presenteou-nos com o seu mais belo sorriso. Para todas as pessoas que ele tocou de maneira especial e particular, existem milhares de histórias que esperam para ser contadas. A minha é pequena, mas sinto-me honrada por poder oferecer aos outros uma representação da vida de um "padre muito santo".

Padre Joe: muito obrigada e que possa descansar em paz.

Barbara Stuart, North Vancouver

Excerto traduzido do artigo publicado pelo BC Catholic. Pode aceder-se à versão completa original aqui.