Pep Borrell é dentista, mas como ele próprio diz, dedica-se a tratar de bocas de manhã e, de tarde, aos fins de semana e sempre que consegue uns dias livres, a falar sobre o casamento em Espanha e pelo mundo fora, para mudar as estatísticas «porque o casamento é para gozar dele, não para o aguentar», afirma.
É autor de “Bailar en la cocina”, um livro curto e estimulante sobre o casamento, que já ultrapassa os 10 mil exemplares vendidos em todo o mundo. Na sua conta de Instagram reflete a sua paixão pela sua família, por dar palestras sobre o namoro e o casamento e a alegria da fé.
Nesta entrevista conta como a vocação ao Opus Dei o ajuda no seu casamento e dá uma ideia das perguntas que mais lhe fazem quando dá conferências. Apresentamos a transcrição da entrevista.
Quando nos casámos, na nossa paróquia não havia cursos de Preparação para o matrimónio. O sacerdote disse-nos: “Não há problema. Qualquer dia, nós falamos”. Como é típico acontecer com os católicos: “Como já sabes tudo, não é preciso que te preocupes muito”. Mas eu disse: “Não, não. Eu quero fazer um curso de preparação para o matrimónio”.
Naquela época existia a revista Mundo Cristiano, que incluía um destacável para pedir informação. Claro, não havia Internet nem nada parecido, por isso recortei essa ficha e mandei-a pelo correio. Mas não reparei que não era para assistir a um curso, mas para se tornar monitor de cursos pré-matrimoniais. Então, em vez de receber informação para participar, chegou-nos uma caixa com DVDs, livros e folhetos. Basicamente, acabámos por organizar o nosso próprio "auto-curso" – um CPM.
Durante a pandemia, organizámos umas palestras a que chamávamos ConFÉnados. Fazíamo-las por zoom uma vez por semana e enchiam-se de participantes. Uma das palestras mais populares foi “Lançar bem a cana” que teve muitíssimo êxito. Desde então, não parámos. Agora tenho o que chamo "pluriemprego": durante o dia, trabalho a melhorar bocas e, à noite e aos fins de semana, damos conferências por todo o mundo.
Para nós, isto é o que chamamos “unidade de vida”. Não o digo como quem faz um sermão, mas como uma forma de ter Deus presente em tudo o que se faz na vida quotidiana. Tenho-o presente quando realizo uma intervenção cirúrgica, quando dou uma palestra diante de mil pessoas, ou inclusive agora, enquanto falo contigo. É algo impressionante viver a fé desta maneira. E é algo que muita gente desconhece: o espírito do Opus Dei nas coisas de cada dia, inclusive num casamento.
São Josemaria dizia que abençoava uma cama de casal com as mesmas mãos com que abençoava um altar. Falava de casamentos alegres, e o que mais me agrada nos seus ensinamentos é que as suas respostas eram sempre simples. Por exemplo, se alguém lhe perguntava: “O meu marido faz isto ou aquilo, que faço?”, ele respondia: “Olha, mulher, põe-te bonita, leva o teu marido a jantar, vão os dois dançar”. Esse espírito prático de viver a fé é o que tentamos aplicar desde que nos levantamos até que nos deitamos.
5 temas fundamentais de que os namorados devem falar antes de casar
Na minha opinião, há cinco temas fundamentais de que os dois devem falar antes de casar:
1. A fé: É importante entender qual é a fé que tem cada um, como se vive a relação com Deus e como se vai integrá-la no casamento. É fundamental casar com alguém que respeite as tuas crenças e esteja aberto ao diálogo neste âmbito.
2. Os filhos: É essencial falar sobre se querem ter filhos e quantos. Ainda que não se possa planear tudo, é importante ter uma ideia e discutir o que fariam em situações difíceis, tal como ter um filho com deficiência ou enfrentar um diagnóstico complicado. Também devem falar sobre temas éticos, como a adoção ou os métodos de reprodução assistida.
3. A educação dos filhos: Como gostavas de educar os teus filhos? Que valores te inculcaram a ti e quais os que me inculcaram a mim? É importante criar novas tradições familiares, deixando as "mochilas" que cada um traz de sua casa.
4. A família do outro: Este é um tema crucial. Há que aprender a conviver com a família do outro, inclusive quando não seja fácil. É necessário estabelecer limites claros para evitar intromissões e encontrar um equilíbrio.
5.O trabalho e a economia: É vital falar sobre como se repartirão as responsabilidades em casa e fora dela. Também é importante abordar o tema do dinheiro: não deveria haver contas separadas “para o caso de alguma coisa correr mal”. O dinheiro é dos dois e para os dois, e as decisões económicas devem ser tomadas em conjunto.
Estes cinco pontos englobam a maioria dos problemas que os casais enfrentam. Se forem discutidos a fundo durante o namoro, podem evitar-se muitos conflitos futuros.
Atualmente, fala-se muito da teologia do corpo porque dá uma visão positiva do sexo, e isso parece-me fundamental. É necessário falar da sexualidade como algo bom e positivo, porque fomos criados à imagem e semelhança de Deus. Deus ofereceu-nos a sexualidade como um dom e diz-nos: “Como tu és inteligente, dou-te este presente para que desfrutes dele, para que gozes dele em casal, mas dentro de certas condições”. Estas condições incluem que tenhamos filhos quando quisermos e que colaboremos com Deus na criação da vida. É algo incrível.
Os animais reproduzem-se, mas nós, os seres humanos, procriamos, o que significa que colaboramos com Cristo e com Deus na criação. Então, como argumentamos o uso da sexualidade? Porque se deve reservar exclusivamente para o casamento e não o partilhar com uma namorada, mesmo que a amemos? Esta é a grande pergunta.
Mesmo entre crentes e católicos, percebe-se muito bem que andar cada fim de semana com uma pessoa diferente está mal. Isto é evidente para todos. No entanto, quando se trata duma relação de namoro muitos perguntam-se: “Se amo a minha namorada, porque não posso ter relações sexuais com ela?”.
Precisamos do corpo para exprimir que nos queremos. Por exemplo, quando se cumprimentas alguém na rua, olha-se para ele ou estende-se-lhe a mão. A outra pessoa talvez se dê um abraço, um beijo, e a alguém mais especial um beijo mais forte ou um abraço mais íntimo. O nível máximo de intimidade entre duas pessoas é ter relações sexuais. Este ato está previsto para ser realizado somente com uma pessoa, porque implica entrega total, implica dar-se por completo.
3 perguntas sobre a sexualidade no namoro
Há três perguntas frequentes relacionadas com o tema da sexualidade:
1. “Como sei que ele ou ela é a pessoa adequada?”
2. “Até onde posso chegar sexualmente falando?”
3. “Como encaro o passado sexual da outra pessoa ou o meu?”
A última é especialmente comum. O meu conselho é que não se deve perguntar com insistência nem responder com pormenores. Basta dizer: “Tive relações sexuais no passado” e não entrar em pormenores. É importante não insistir nem exigir mais informação. O passado já passou e, por muito que custe, há que assumi-lo e seguir em frente.
Quanto ao compromisso, muitas pessoas têm dificuldades, porque sentem que vão perder comodidade ou liberdade. E sim, é verdade. Escolher uma profissão implica excluir todas as outras, e o mesmo acontece com qualquer decisão importante na vida. Outro obstáculo é o medo do fracasso. Numa sondagem realizada nos Estados Unidos, muitos dos que viviam juntos mas não casavam admitiram que o seu principal motivo era o receio do divórcio. Ouvimos tantas vezes dizer que o casamento corre mal, que isso provoca medo. Finalmente, também influi muito “o que vão dizer”. Atualmente, a muitas pessoas custa-lhes dizer: “Tenho namorada”, “Vou casar” ou “Vou comprometer-me para sempre”.
Nós, os casados, temos a responsabilidade de promover o casamento, dando bom exemplo. Muitas vezes, os jovens não se casam por culpa dos que estamos casados. Se passamos o dia a queixar-nos, a dizer piadas sobre o casamento ou a criticar o marido ou a mulher, como podemos esperar que os outros desejem casar? Pelo contrário, devemos mostrar que o casamento é maravilhoso. É nossa responsabilidade conseguir que os nossos filhos digam: “Quero viver como os meus pais. Quero isso para mim”.
Infelizmente, às vezes damos demasiada importância à nossa formação profissional e não tanta à escolha de quem nos acompanhará na vida, que é a decisão mais importante para alguém com vocação para o casamento. Pensa nisto: É mais importante ser inspetor das Finanças ou formar uma boa família? Isto requer conhecer com quem vais casar, falar em profundidade e não ser excessivamente exigente.
Conheço histórias de pessoas que a princípio não sentiam atração por alguém, mas ao conhecê-lo, descobriram que era muito interessante ou atraente pela sua conversa, estilo ou valores. Somos demasiado exigentes e não dedicamos o tempo nem o esforço necessários para conhecer alguém em profundidade. O meu conselho é que não nos devemos preocupar demasiado, mas sim ocuparmo-nos com seriedade.