Meditações: sábado da III semana do Tempo Comum

Reflexão para meditar no sábado da III semana do Tempo Comum. Os temas propostos são: o cansaço de Jesus, homem perfeito; abandonar-se em Cristo para chegar a porto seguro; ver Jesus também nas dificuldades.


O LAGO DE GENESARÉ, com os seus 165 quilómetros quadrados de superfície e 43 metros de profundidade, é um lago bastante modesto. No entanto, apesar do seu pequeno tamanho, era rico em peixes e desencadeavam-se tempestades violentas nas suas águas, como ainda hoje acontece. Está localizado numa cavidade de terra, cercada por montanhas, entre as quais passa o vale do Jordão e se encontra a planície de Esdrelão. Por esses corredores naturais chegam fortes rajadas de vento que convergem para o lago, causando ondas furiosas, suficientes até para virar um pequeno barco.

Uma dessas tempestades atingiu o lago enquanto Jesus e os Seus discípulos o atravessavam. Era ao entardecer. Tinha terminado um dia intenso de pregação para uma grande multidão de pessoas. Havia tanta gente, que o Senhor teve que entrar num barco e afastar-Se um pouco da praia para que pudessem vê-l'O e ouvi-l'O. Naquele mesmo barco ia Jesus, mais tarde, cansado: «à popa dormia sobre uma almofada» (Mc 4, 38). É a única vez que os evangelhos O apresentam adormecido. «Cada um destes gestos humanos é gesto de Deus. Em Cristo habita toda a plenitude da divindade corporalmente. Cristo é Deus feito homem; homem perfeito; homem cabal. E, na sua humanidade, dá-nos a conhecer a divindade»[1]. É comovente contemplá-l’O assim: exausto, depois de um dia de trabalho em que Se entregou por completo, até ficar sem energia e precisar de um sono profundo para recuperá-la.

«A fadiga de Jesus, sinal da Sua verdadeira humanidade, pode ser vista como um prelúdio da paixão, com a qual Ele completou a obra da nossa redenção»[2]. Mostra-se-nos como um homem perfeito, igual a nós em tudo, exceto no pecado. E compreendemos mais facilmente que, com a Sua graça, também nós podemos encarnar a Sua vida, mesmo que às vezes nos seja difícil, mesmo que nos cansemos, ainda que se sinta o peso do trabalho diário feito por amor.


DESENCADEIA-SE A TEMPESTADE. As ondas encrespam-se. Ouve-se claramente o ranger da madeira do barco. Os discípulos, pescadores experientes, estão tensos. A sua experiência diz-lhes que a tempestade é perigosa. Espantam-se que, nesta situação crítica, Jesus ainda esteja a dormir. Acordam-n'O com uma frase em que, sob a aparência de reprovação, há muita confiança: «Mestre, não Te importas que pereçamos?» (Mc 4, 38). Ele, despertando, falou imperiosamente ao vento e disse ao mar: «Cala-te, acalma-te!». O vento serenou e fez-se grande calma. Depois disse-lhes: «Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?» (Mc 4, 39-40).

Espantados, os discípulos voltam a ter medo, embora agora seja um medo diferente: a grandeza do mar dá lugar à grandeza do mistério de Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem. «O gesto solene de acalmar o mar tempestuoso é claramente um sinal do senhorio de Cristo sobre os poderes negativos e leva a pensar na sua divindade: “Quem é Este – interrogaram-se admirados e cheios de terror os discípulos – a Quem até o vento e o mar obedecem?” (Mc 4, 41). A sua fé ainda não é sólida, mas está a formar-se; é um misto de medo e de confiança; o abandono confiante de Jesus ao Pai é, pelo contrário, total e puro. Por isso, por este poder do amor, Ele pode adormecer durante a tempestade, completamente seguro nos braços de Deus»[3].

A nossa fé também se está a formar, está sempre a crescer. Muitas vezes nos assustamos, temos medo, ficamos inseguros diante de pequenas ou grandes tempestades: tentações, contratempos, deceções connosco mesmos, fracassos... É a hora de invocar Jesus para nos ajudar a enfrentar essas situações com paz e abandono. Como aconselhou Santo Agostinho: «Não deixes que as ondas te arrastem para baixo perante as confusões do teu coração. Em todo o caso, ainda que sejamos homens, não desesperemos se o vento soprar os afetos da nossa alma. Despertemos para Cristo: a nossa viagem será tranquila e chegaremos a bom porto»[4].


NA PRAÇA DE S. PEDRO completamente vazia, à chuva, diante de um crucifixo e uma imagem da Virgem, em março de 2020, o Papa Francisco presidiu a uma vigília de oração durante um momento difícil para toda a humanidade, em plena pandemia. Escolheu comentar precisamente a passagem evangélica sobre a qual estamos a meditar. As suas palavras também podem ajudar-nos a enfrentar outros momentos de dificuldade que podem aparecer nas nossas vidas.

«Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?». Senhor, lanças-nos um apelo, um apelo à fé. Esta não é tanto acreditar que Tu existes, como sobretudo vir a Ti e fiar-se em Ti (…) Chamas-nos a aproveitar este tempo de prova como um tempo de decisão. Não é o tempo do teu juízo, mas do nosso juízo: o tempo de decidir o que conta e o que passa, de separar o que é necessário daquilo que não o é. É o tempo de reajustar a rota da vida rumo a Ti, Senhor, e aos outros. (…) «Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?». O início da fé é reconhecer-se necessitado de salvação. Não somos autossuficientes, sozinhos afundamos: precisamos do Senhor como os antigos navegadores, das estrelas. Convidemos Jesus a subir para o barco da nossa vida. Confiemos-Lhe os nossos medos, para que Ele os vença. Com Ele a bordo, experimentaremos – como os discípulos – que não há naufrágio. Porque esta é a força de Deus: fazer resultar em bem tudo o que nos acontece, mesmo as coisas ruins. Ele serena as nossas tempestades, porque, com Deus, a vida não morre jamais»[5].

«Quando chega o padecimento em forma tão humana, tão normal (dificuldades e problemas familiares... ou essas mil e uma miudezas da vida corrente), custa-te ver Cristo por trás disso. - Abre com docilidade as mãos a esses cravos... e a tua dor converter-se-á em alegria»[6].

Por intercessão de Maria Santíssima, Estrela do mar, peçamos ao Senhor que aumente a nossa fé, que nos liberte dos nossos medos e nos encha de esperança.


[1] S. Josemaria, Cristo que passa, n. 109.

[2] Bento XVI, Angelus, 27/03/2011.

[3] Bento XVI, Homilia, 21/06/2009.

[4] Sto. Agostinho, Sermão 63, 3.

[5] Francisco, Momento extraordinário de oração em tempo de epidemia, 27/03/2020.

[6] S. Josemaria, Sulco, n. 234.