Carta pastoral de 2-X-2011

Na data em que se comemora a Fundação do Opus Dei, D. Javier Echevarría dirige aos fiéis da Prelatura uma extensa carta, na que trata sobre alguns aspetos da formação para a vida espiritual e a nova evangelização.

ÍNDICE

FORMAÇÃO PARA A NOVA EVANGELIZAÇÃO

Como os primeiros cristãos

Necessidade e importância da formação

Liberdade, docilidade, sentido de responsabilidade

FORMAÇÃO HUMANA

Temperança

Fortaleza

Tom humano

O tom humano dos ministros sagrados

FORMAÇÃO ESPIRITUAL

Identificar-se com Jesus Cristo

Os meios

O Sacramento da Reconciliação

Espírito de iniciativa e docilidade

Humildade e prudência ao dar a direção espiritual

A formação litúrgica

A liturgia da Palavra

A liturgia eucarística

FORMAÇÃO NA DOUTRINA CATÓLICA

Fidelidade ao Magistério e liberdade no que é opinável

FORMAÇÃO PARA O APOSTOLADO

Apostolado pessoal de amizade e confidência

Apostolado da família e com a juventude

Apostolado e cultura

FORMAÇÃO PROFISSIONAL

Trabalho e unidade de vida

Retidão de intenção

Espontaneidade apostólica

***

Queridíssimos: que Jesus me guarde as minhas filhas e os meus filhos!

1. Desde o mandato apostólico recebido do Senhor (cfr. Mt 28, 19-20), a Igreja não cessou de evangelizar. Muitos frutos vieram no decurso dos séculos: pela graça de Deus, também a Obra e cada um dos seus fiéis. Como noutras épocas, também agora se está a desenvolver em muitos ambientes um forte processo de descristianização que acarreta consigo perdas muito graves para a humanidade. Deus enviou sempre santos à Igreja que, com a sua palavra e com o seu exemplo, souberam reconduzir as almas a Cristo. Como escreveu o Papa Bento XVI na sua encíclica sobre a esperança, o cristianismo não é apenas uma “boa notícia”, uma comunicação de realidades que se podem saber, mas uma comunicação que gera factos e muda a vida [1].

Detenho-me agora em alguns aspetos dessa formação para a nossa vida espiritual e para tomar parte na “nova evangelização”, como a definiu o beato João Paulo II.

Em 1985, o primeiro sucessor do nosso Padre dirigiu-nos uma carta pasto­ral, incitando-nos a participar muito ativamente neste apostolado, insistindo na necessidade de nos esmerarmos na formação pessoal e em estender esse trabalho às almas.

Também Bento XVI guia agora os cristãos pelas mesmas vias. A recente criação do Pontifício Conselho para a promoção da nova evangelização [2] é uma demonstração desse interesse. Todos nos sentimos interpelados pelas suas palavras na recente Jornada Mundial da Juventude, quando animava os jovens a dar testemunho da fé nos mais diversos ambientes, incluindo os lugares onde prevalece a rejeição ou a indiferença. É impossível encontrar Cristo, e não O dar a conhecer aos outros. Por isso, não guardeis Cristo para vós mesmos. Comunicai aos outros a alegria da vossa fé. O mundo necessita do testemunho da vossa fé; necessita, sem dúvida, de Deus [3].

FORMAÇÃO PARA A NOVA EVANGELIZAÇÃO

Como os primeiros cristãos

2. Como a Obra veio ao mundo precisamente para recordar o chamamento universal à santidade, S. Josemaria afirmava que a maneira mais fácil de entender o Opus Dei é pensar na vida dos primeiros cristãos. Eles viviam profundamente a sua vocação cristã; procuravam muito a sério a perfeição a que eram chamados, pelo facto, ao mesmo tempo simples e sublime, do Batismo. Não se distinguem exteriormente dos outros cidadãos [4].

No Pentecostes, o Paráclito estimulou os apóstolos e os outros discípulos a evangelizar, reavivando nas suas mentes os ensinamentos de Jesus Cristo. Basta ler os escritos do Novo Testamento, para comprovar que uma das primeiras ocupações dos Doze era cultivar a semente da fé e alimentá-la com os seus ensinamentos, de palavra e por carta. O paciente labor de formação que o Senhor realizou com os Apóstolos durante três anos, continuado sem pausas por eles e pelos seus colaboradores, com a assistência do Espírito Santo, transformou o mundo antigo até fazê-lo cristão.

Necessidade e importância da formação

3. S. Josemaria estimulou todos a adquirirem e melhorarem constante­mente a própria formação cristã, pressuposto indispensável para crescer em intimidade com Jesus Cristo e dá-lo a conhecer a outras almas. Discite benefacere ( Is 1, 17), aprendei a fazer o bem, repetia com palavras do profeta Isaías; porque é inútil que uma doutrina seja maravilhosa e salvadora, se não há homens formados que a levem à prática [5] . Desde os seus primeiros passos como sacerdote, dedicou muitas energias a formar doutrinalmente as pessoas que se aproximavam do seu trabalho pastoral; depois, com o desenvolvimento do Opus Dei, intensificou essa dedicação e estabeleceu os meios necessários para dar continuidade à tarefa formativa: em primeiro lugar dos seus filhos, mas também das inumeráveis pessoas – homens e mulheres, novos e gente madura, sãos e doentes – que se mostravam dispostos a acolher essa mensagem nas suas almas.

O nosso Padre considerava cinco aspetos da formação: humano, espiritual, doutrinal-religioso, apostólico e profissional. Afirmava que um homem, uma mulher, vai-se fazendo pouco a pouco, e nunca chega a fazer-se bastante, a realizar em si mesmo toda a perfeição humana de que a natureza é capaz. Num aspeto determinado, pode inclusive chegar a ser o melhor, em relação a todos os outros, e talvez a ser insuperável nessa atividade concreta natural. Não obstante, como cristão o seu crescimento não tem limites [6] .

Humanamente, se nos examinamos com sinceridade, descobrimos logo que precisamos de aperfeiçoar o nosso caráter, o nosso modo de ser, adquirindo e melhorando as virtudes humanas que constituem a base das sobrenaturais. O mesmo sucede na formação espiritual, pois sempre existe a possibilidade de progredir nas virtudes cristãs, especialmente na caridade, que é a essência da perfeição.

No aspeto doutrinal-religioso, também o nosso conhecimento de Deus e da doutrina revelada pode e deve crescer: para melhor conformar com os mistérios da fé a nossa inteligência, a nossa vontade e o nosso coração, e assimilá-los mais profundamente.

O apostolado, por sua vez, é um mar sem limites , e requer-se preparação para anunciar o amor de Cristo em novos ambientes e em mais países. Este era o panorama de S. Josemaria desde os começos, como aparece, nos primeiros anos da Obra, num autógrafo seu: conhecer Jesus Cristo. Fazê-l´O conhecer. Levá-l´O a todos os sítios . O prestígio profissional torna-se o anzol de pescador de homens [7] , para estender o reinado de Cristo – presente já na sua Igreja – na sociedade.

O panorama é tão vasto que nunca poderemos dizer: já estou formado! Nós nunca dizemos basta. A nossa formação nunca acaba: tudo o que recebestes até agora – explicava o nosso Padre – é fundamento do que virá depois [8] . Liberdade, docilidade, sentido de responsabilidade

4. A identificação com Jesus Cristo requer a livre cooperação humana: «o que te fez sem ti, não te justifica sem ti» [9]. Esta correspondência pessoal desempenha um papel imprescindível, mas onde a criatura não chega, chega a graça de Deus. O Senhor deixou-nos com liberdade, que é um bem muito grande e a origem de muitos males, mas que é também a origem da santidade e do amor [10] . Origem do amor: só os seres livres estão em condições de amar e ser felizes. Dificilmente cresce o amor onde prevalece a coação. E não há fidelidade sem a decisão livre e firme de identificar-se com a Vontade de Deus.

A Igreja possui o remédio para curar a debilidade humana, consequência do pecado, que se manifesta – entre outras coisas – na diminuição da liberdade interior. Esse remédio, a graça divina, não só sara a liberdade natural, mas a eleva a uma liberdade nova e mais alta. Jesus Cristo, com efeito, arrancou-nos da escravidão da corrupção para participar da liberdade gloriosa dos filhos de Deus (Rm 8, 21). Por isso – exorta o Apóstolo– mantende-vos firmes e não vos deixeis sujeitar de novo ao jugo da servidão (Gl 5, 1).

Queres pensar – convida S. Josemaria – (…) se manténs imutável e firme a tua escolha da Vida? Se, ao ouvires essa voz de Deus, amabilíssima, que te estimula à santidade, respondes livremente que sim? [11] . A decisão pessoal da nossa resposta ao chamamento de Deus, na Igreja e na Obra, é precisamente a razão da nossa perseverança. Mais ainda, essa liberdade é completamente realizada, alcança todo o seu sentido, apenas pela entrega amorosa à Vontade de Deus, como fez Jesus.

A liberdade pessoal – que defendo e defenderei sempre com todas as minhas forças – leva-me a perguntar com uma segurança convicta e também consciente da minha própria fraqueza: que esperas de mim, Senhor, para fazê-lo voluntariamente? [12] .

E o nosso Padre acrescenta: o próprio Cristo nos responde : Veritas liberabit vos ( Jo 8, 32); a verdade far-vos-á livres. Que verdade é esta, que inicia e consuma o caminho da liberdade em toda a nossa vida? Resumi-la-ei com a alegria e com a certeza que provêm da relação de Deus com as suas criaturas: saber que saímos das mãos de Deus, que somos objeto da predileção da Santíssima Trindade, que somos filhos de um Pai tão grande [13] .

5. Ao incorporar-se ao Opus Dei, cada um aceita livremente o compromis­so de se formar para dar cumprimento à missão da Obra no seio da Igreja, e recorre, com agradecimento aos meios de formação específicos estabelecidos por S. Josemaria, fiel ao amor divino.

Consideremos seriamente e com frequência a obrigação de nos formar­mos bem doutrinalmente, obrigação de nos prepararmos para que entendam; para que, além do mais, saibam expressar-se os que nos escutam [14] . Daí a necessidade de recorrer aos meios de formação que estão determinados e aproveitá-los ao máximo.

Como indicava João Paulo II «certas convicções tornam-se particularmen­te necessárias e fecundas. Antes do mais, a convicção de que não se dará formação verdadeira e eficaz se cada qual não assumir e não desenvolver por si mesmo a responsabilidade da formação, pois, esta configura-se essencialmente como “autoformação”. A convicção, além disso, de que cada um de nós é o termo e, simultaneamente, o princípio da formação: quanto mais somos formados, mais sentimos a exigência de continuar a melhorar a formação; assim como, quanto mais somos formados, mais nos tornamos capazes de formar os outros» [15].

FORMAÇÃO HUMANA

6. No aspeto humano, a formação tende a fortalecer as virtudes e contribui para a configuração do caráter: o Senhor quer-nos muito humanos e muito divinos, com os olhos postos n’Ele, que é perfeito Deus e perfeito homem [16] .

O edifício da santidade assenta sobre bases humanas: a graça pressupõe a natureza. Por isso o Concílio Vaticano II recomenda aos fiéis leigos que tenham em sumo apreço aquelas virtudes «que se referem às relações sociais, isto é, a honradez, o espírito de justiça, a sinceridade, os bons sentimentos, a fortaleza de alma, sem as quais não pode dar-se uma autêntica vida cristã» [17].

Uma sólida personalidade constrói-se na família, na escola, no lugar de trabalho, nas relações de amizade, nas variadas situações da existência. É necessário, igualmente, aprender a comportar-se com nobreza e retidão. Deste modo, melhora-se o caráter que é a base do fortalecimento da fé ante as dificul­dades internas ou externas. Não faltam homens ou mulheres que talvez não tenham tido ocasião de ouvir a palavra divina ou que a esqueceram. Mas as suas disposições são humanamente sinceras, leais, compassivas, honradas. Atrevo-me a afirmar que quem reúne essas condições está a ponto de ser generoso com Deus, porque as virtudes humanas constituem o fundamento das sobrenaturais [18].

Atualmente torna-se mais necessário redescobrir o valor e a necessidade das virtudes humanas, pois alguns consideram-nas em oposição à liberdade, à espontaneidade, ao que pensam, erradamente, que é “autêntico” no homem. Esquecem, talvez, que essas perfeições habituais do entendimento e da vontade facilitam agir bem, com retidão, e fazem que a convivência social seja justa, pacífica, amável.

Ainda que o ambiente que se respira nalguns lugares dificulte captar estes valores, não é por isso que as virtudes humanas deixam de ser atrativas. Ante as múltiplas solicitações que não enchem o coração, a pessoa humana acaba por buscar algo que realmente valha a pena. Por isso, aos cristãos apresenta-se-nos o grande labor de mostrar, primeiro com o próprio exemplo, a beleza de uma vida virtuosa, ou seja, plenamente humana, uma vida feliz.

Na atualidade, mostram-se-nos especialmente importantes a temperança e a fortaleza.

Temperança

7. Temperança é domínio . Domínio que se consegue quando se adverte que nem tudo o que experimentamos no corpo e na alma deve deixar-se à rédea solta. Nem tudo o que se pode fazer se deve fazer. É mais cómodo deixar-se arrastar pelos impulsos a que chamam naturais; mas no fim desse caminho cada um encontra a tristeza, o isolamento na sua própria miséria [19] .

Esta virtude introduz ordem e medida no desejo, domínio firme e moderado da razão sobre as paixões. O seu exercício não se reduz a uma pura negação, que seria uma caricatura desta virtude. Tende a que o bem deleitável e a atração que suscita se integrem harmonicamente na maturidade global da pessoa, na saúde da alma. A temperança não supõe limitação, mas grandeza. Há muito maior privação na intemperança, porque o coração abdica de si próprio para servir o primeiro que lhe fizer soar aos ouvidos o ruído de uns chocalhos de lata [20] .

A experiência revela que a intemperança dificulta o julgamento para determinar o verdadeiro bem. Causam pena aqueles em que o prazer se converte no critério das suas decisões! A pessoa destemperada deixa-se guiar pelas múltiplas sensações que o ambiente lhe desperta. E, deixando de lado a verdade das coisas e buscando a felicidade em experiências fugazes – que, por serem sensíveis e passageiras, nunca satisfazem totalmente, mas que inquietam e destabilizam – fazem entrar a criatura numa espiral autodestrutiva. Pelo contrário, a temperança dá serenidade e repouso; não sufoca nem recusa os bons desejos e nobres paixões, mas faz o homem senhor de si.

Neste campo, têm uma especial responsabilidade os Supranumerários, com o seu empenho em criar lares cristãos. S. Josemaria comentava que os pais devem ensinar os filhos a viver com sobriedade (…). É difícil, mas há que ser valente: tende coragem para educar na austeridade [21] . O modo mais eficaz de transmitir esta abordagem, sobretudo às crianças, é o exemplo, pois só entenderão a beleza da virtude quando observem como renunciais a um capricho por amor deles, ou sacrificais o vosso próprio descanso para atendê-los, para acompanhá-los, para cumprir a vossa missão de pais. Ajudai-os a administrar o que usam: far-lhes-eis um grande bem. Insisto: se cuidais a temperança nos vossos lares, o Senhor recompensará a vossa abnegação e sacrifício de mães e de pais; e surgirão vocações de dedicação a Deus no seio da vossa própria casa.

Fortaleza

8. Às vezes, experimentamos dentro de nós uma certa resistência ao esforço, ao que implica trabalho, sacrifício, abnegação. A fortaleza «assegura a firmeza e a constância na prossecução do bem. Torna firme a decisão de resistir às tentações e de superar os obstáculos na vida moral. A virtude da fortaleza dá capacidade para vencer o medo, mesmo da morte, e enfrentar a provação e as perseguições» [22].

Lutemos por adquirir o hábito de vencer em pequenos pormenores: cumprir um horário, cuidar a ordem material, não ceder a caprichos, dominar enfados, acabar tarefas, etc. Assim, poderemos responder com mais prontidão às exigências da nossa vocação cristã. Além disso, a fortaleza conduzir-nos-á à boa paciência, a sofrer sem dar trabalho aos outros, a superar as contrariedades que derivam das nossas próprias limitações e defeitos, do cansaço, do caráter alheio, das injustiças, da falta de meios. É forte quem persevera no cumprimento do que entende dever fazer, segundo a sua consciência; quem não mede o valor de uma tarefa exclusivamente pelos benefícios que recebe, mas pelo serviço que presta aos outros. O homem forte às vezes sofre, mas resiste; talvez chore, mas traga as lágrimas. Quando a contradição aumenta, não se curva [23] .

É certo que se requer firmeza para empreender diariamente a tarefa da própria santificação e do apostolado no meio do mundo. Surgirão talvez obstáculos, mas a pessoa movida pela força de Deus – quoniam tu es fortitudo mea ( Sl 30 [31] 5), porque Tu és, Senhor, a minha fortaleza – não teme atuar, proclamar e defender a sua fé, também quando isto suponha ir contra a corrente. Voltemos de novo o olhar para os primeiros cristãos: eles encontraram numerosas dificuldades, pois a doutrina de Cristo aparecia – então como agora – um sinal de contradição ( Lc 2, 34). O mundo de hoje necessita de mulheres e homens que ofereçam na sua conduta quotidiana o testemunho silencioso e heroico de muitos cristãos que vivem o Evangelho sem excepções, cumprindo o seu dever [24].

Tom humano

9. O afã por cultivar as virtudes humanas colaborará para que se respire o bonus odor Christi (cfr. 2 Cor 2, 15), o bom aroma de Cristo. Neste contexto, revela-se especialmente importante o “tom humano”, o comportamento cordial e respeitoso nas relações com os outros. Fomentemo-lo no seio da família, no lugar de trabalho, nos momentos dedicados ao divertimento, ao desporto, ao descanso, ainda que não poucas vezes se precise, também nisso, de ir contra a corrente. Não tenhamos medo se, nalguma ocasião, a nossa simples naturalidade cristã choca com o ambiente porque – assim nos ensinou S. Josemaria – essa é então a naturalidade que o Senhor nos pede [25].

Há hoje uma necessidade urgente de cuidar o tom humano e de difundi-lo à nossa volta. Com frequência na família e na sociedade descuidam-se essas manifestações de delicadeza na conduta, em nome de uma falsa naturalidade. Existem bastantes maneiras de contribuir para a formação neste terreno. Primeiro, como sempre, é o exemplo, ainda que será também conveniente insistir através de conversas pessoais e palestras a grupos de pessoas. O respeito no trato mútuo manifesta-se no modo de vestir digno e honesto, nos temas das conversas e tertúlias, promovendo um espírito de serviço alegre em casa, na escola e nos lugares de diversão ou descanso; na atenção material dos lares e no cuidado das coisas pequenas.

De particular importância é o interesse em adquirir e fomentar um nível cultural sério, adequado às circunstâncias de cada um, em função dos estudos realizados, do ambiente social, dos gostos e interesses pessoais. Limitar-me-ei a recordar-vos que aqui desempenham um papel importante as leituras e o bom aproveitamento do tempo dedicado ao conveniente descanso.

10. Nos centros do Opus Dei e nos trabalhos apostólicos promovidos por fiéis da Prelatura, procura-se que os jovens se acostumem a pensar nos outros, com generosidade, com afã de serviço. Animemos positivamente a criar um ideal de vida que não os encerre em limites raquíticos, cómodos ou egoístas. Recor­demos como S. Josemaria insistia em que, elas e eles, promovessem e sobrenatu­ralizassem todas as suas ambições nobres.

Se cultivam essas ambições nobres, com espírito de superação e sacrifício, será mais possível e simples o apreço pela transcendência e importância sobrena­tural desses esforços; e mais facilmente se ajudará a que progridam na sua vida interior e cheguem a ser instrumentos idóneos nas mãos de Cristo, ao serviço da Igreja e da sociedade.

Muitas raparigas e muitos rapazes jovens – dizia João Paulo II numa ocasião – «são exigentes no que respeita ao sentido e ao modelo da sua vida e desejam libertar-se da confusão moral e religiosa. Ajudai-os nesta empresa. Com efeito, as novas gerações estão abertas e são sensíveis aos valores religiosos, ainda que às vezes seja de modo inconsciente. Intuem que o relativismo religioso e moral não dá a felicidade e que a liberdade sem a verdade é vã e ilusória» [26]. A criatura que se conforma com horizontes reduzidos, muito dificilmente chegará a adquirir uma verdadeira formação humana e cristã. Não deixemos de encorajar os jovens para que saibam enfrentar-se com os problemas deste mundo.

O tom humano dos ministros sagrados

11. Para os sacerdotes também se revela imprescindível o exercício das virtudes humanas, pela própria natureza do seu ministério pastoral. Os presbí­teros desenvolvem o seu trabalho no meio do mundo, em contacto imediato com toda a classe de pessoas, que – como sublinhou D. Álvaro – «costumam ser juízes implacáveis do sacerdote, e fixam-se em todo o seu modo de proceder como homem» [27].

Um sacerdote afável, educado, disponível para dedicar o seu tempo aos outros, sabe apresentar-se bem e fazer agradável a luta do cristão.

Nenhuma circunstância afastou S. Josemaria da elevada ideia que tinha do sacerdote. Se, por um lado, deve fazer-se tudo para chegar a todos (cfr. 1 Cor 9, 19), por outro, não há-de esquecer que é representante de Jesus Cristo entre os homens. Portanto, é lógico que deva esforçar-se − dentro das suas próprias limitações – para que os outros fiéis descubram, através do seu comportamento pessoal, o rosto do Senhor. Mantêm toda a atualidade as recomendações que o nosso Fundador dirigia aos clérigos, instando-os a cuidar a correção no modo de vestir, para que a gente estivesse em condições de reconhecê-los como ministros de Cristo, como dispensadores dos mistérios de Deus (cfr. 1 Cor 4, 1) .

O sacerdócio abarca toda a existência do presbítero. Precisamente por isso, porque há-de aparecer real e constantemente disponível, deve ser reconhe­cido facilmente e o traje sacerdotal – a batina ou o clergyman – distingue-o de modo claro. Na sociedade atual – muito ligada à cultura da imagem e ao mesmo tempo, talvez afastada de Deus – a veste sacerdotal não passa despercebida. Por isso, os sacerdotes da Prelatura que exercem o seu ministério pastoral numa igreja, levam habitualmente a veste talar no templo, e também nos nossos centros. Dos países onde há outros costumes – comentava o nosso Padre – não digo nada. Faremos sempre o que dispuser a Igreja. Não obstante, dentro de casa levaremos a batina; os que falam de liberdade devem, ao menos, respeitar a nossa liberdade de a vestir em casa [28] . FORMAÇÃO ESPIRITUAL

12. Esta faceta há-de ocupar «um posto privilegiado na vida de cada um, chamado como está a crescer continuamente na intimidade com Jesus, na conformidade com a Vontade do Pai, na entrega aos irmãos na caridade e na justiça» [29].

O Papa Bento XVI recordou que o itinerário formativo do cristão na tradição mais antiga da Igreja, mesmo sem descuidar a compreensão sistemática dos conteúdos da fé, teve sempre um caráter de experiência, no qual era determinante o encontro vivo e persuasivo com Cristo, anunciado por testemunhas autênticas [30]. A vida de união com Cristo, a busca da santidade, nutre-se de auxílios espirituais: conhecimento da doutrina católica, vida litúrgica e sacramental, acompanhamento espiritual.

Identificar-se com Jesus Cristo

13. Com a ação do Espírito Santo, os modos de seguir Jesus Cristo dentro da Igreja são inumeráveis. Assim o anotava o nosso Padre, quando escrevia: haveis de ser tão diferentes, como diferentes são os Santos do Céu, que têm cada um as suas notas pessoais e especialíssimas. – E também tão parecidos uns com os outros como os Santos, que não seriam santos se cada um deles se não tivesse identificado com Cristo [31].

O Opus Dei, além das práticas de piedade – todas tradicionais na Igreja – que recomenda aos seus fiéis ou a quem se aproxima dos trabalhos apostólicos, transmite um espírito, para enfrentar e dar sentido à própria vida, fundamen­tando-a na filiação divina em Cristo. O eixo – o gonzo – sobre o qual gira todo o trabalho de santificação, própria e alheia, é o trabalho profissional realizado do melhor modo possível, em união com Jesus Cristo e com o desejo de servir os outros.

Esta ajuda espiritual facilita a unidade de vida, porque os fiéis da Prelatura e os sócios da Sociedade Sacerdotal da Santa Cruz, aprendem a aproveitar as situações concretas em que se encontram, para convertê-las em ocasião e meio de santidade e de apostolado, atuando sempre com a mais plena liberdade pessoal nas questões profissionais, familiares, sociais, políticas, etc., que a Igreja deixa à decisão pessoal dos católicos.

Neste sentido, S. Josemaria explicava que é impossível estabelecer uma diferença entre trabalho e contemplação: não se pode dizer até aqui reza-se, e até aqui trabalha-se. Continua-se sempre a rezar, contemplando na presença de Deus. Sendo, em aparência, homens de ação, vamos parar onde foram parar os místicos mais altos : volé tan alto, tan alto, / que le di a la caza alcance, até ao coração de Deus [32] . Como não descobrir um eco destes ensinamentos nas palavras do papa João Paulo II, dirigidas em Castelgandolfo a fiéis do Opus Dei? «Viver unidos a Deus no mundo, em qualquer situação, tratando de melhorar-se a si mesmos com a ajuda da graça e dando a conhecer Jesus Cristo com o testemunho da vida. E que há de mais belo e mais entusiasmante que este ideal? Vós, inseridos e misturados nesta humanidade alegre e dolorosa, quereis amá-la, iluminá-la, salvá-la» [33].

Os meios

14. A união do trabalho com a luta ascética, a contemplação e o exercício da missão apostólica, requer uma profunda preparação: por isso o Opus Dei oferece-nos um amplo leque de recursos de formação pessoais e coletivos. Entre os pessoais, um tem especial importância: é a conversa fraterna, a que chamamos também confidência, precisamente pelo seu caráter interpessoal cheio de confiança.

É uma conversa de direção espiritual, que se situa no contexto do serviço fraterno, para viver a fundo, com liberdade e responsabilidade, o encontro quotidiano com Cristo no meio do mundo. Descobrimos nas páginas do Novo Testamento que o Senhor quis servir-se da mediação de homens e mulheres para encaminhar as almas para a meta da santidade. Quando chama S. Paulo no caminho de Damasco, pede-lhe que se dirija a outro homem, Ananias, que lhe comunicará o que há-de saber acerca do novo caminho que está a ponto de empreender (cfr. Act 9, 6-18; 22, 10-15). Em seguida irá a Jerusalém videre Petrum, para ver a Pedro e aprender dele muitos aspetos da doutrina e da vida cristãs (cfr. Gl 1, 18) . De facto, a direção espiritual é uma tradição cujo espírito remonta aos primeiros passos da Igreja.

No Opus Dei, essa ajuda espiritual tende a facilitar que as pessoas assimilem com fidelidade o espírito que o nosso Fundador recebeu de Deus e nos transmitiu, e que foi proposto pela Igreja como um caminho de santidade [34].

15. S. Josemaria explicava que, na Obra, a direção espiritual pessoal se realiza in actu, isto é , no momento em que se tem essa conversa. Essa atenção situa-se no âmbito do conselho para ajudar a progredir na vida cristã. O nosso Padre comparava alguma vez a direção espiritual à tarefa de um irmão, que se preocupa com o andar dos irmãos mais novos; de um amigo ou uma amiga leais, movidos pelo desejo de ajudar os outros a serem melhores cristãos [35]. Resumindo, a confidência é uma conversa entre irmãos e não a de um súbdito com o seu superior. Os que atendem essas conversas fraternas atuam com uma delicadeza extraordinária, fruto da preocupação exclusiva pela vida interior e as tarefas apostólicas dos seus irmãos, sem jamais pretender influir nos assuntos temporais – de caráter profissional, social, cultural, político, etc. – de cada um.

Na Obra, a separação entre o exercício da jurisdição e a direção espiritual assegura-se na prática, entre outras coisas, pelo facto de que precisamente os que recebem conversas de direção espiritual – os diretores locais e alguns outros fiéis especialmente preparados, e os sacerdotes ao celebrar o Sacramento da Penitência – não têm nenhum poder de governo sobre as pessoas que atendem. A competência do governo local, não se refere às pessoas, mas somente à organização dos centros e das atividades apostólicas; a função dos diretores locais, no que se refere aos seus irmãos, é de conselho fraterno. Não coincidem, portanto, numa mesma pessoa as funções de jurisdição e de ajuda espiritual. Na Prelatura, a única base da autoridade de governo sobre as pessoas é a jurisdição, que reside somente no Prelado e nos seus Vigários. Que oferece, pois, o Opus Dei? Fundamentalmente, uma direção espiritual aos seus fiéis e às pessoas que a solicitem. Os fiéis da Prelatura, porque aspiramos à nossa santificação pessoal e a realizar a missão do Opus Dei na Igreja, não temos inconveniente, normalmente, em falar com quem nos indicam os diretores – ainda que seja alguém mais novo –, sempre com plena liberdade e com fé na graça divina, que se serve de instrumentos humanos. A conversa fraterna não é uma conta de consciência. Se nessa direção espiritual se nos pergunta algo – e, em ocasiões pode ser bom e até necessário que nos perguntem – procederão com muita delicadeza, porque ninguém está obrigado, concretamente, a dizer na confidência, o que é matéria de confissão.

Tudo o que vos menciono, minhas filhas e meus filhos, parecer-vos-á evidente, mas desejei expô-lo no contexto atual da sociedade, que manifesta uma particular sensibilidade pelo respeito à intimidade das pessoas, ainda que também abundem, em certos ambientes, falta de pudor e de respeito pela vida privada dos outros. A todos nos explicaram, mal conhecemos a Obra, que não nos ocorria, nem se nos ocorre, chamar “ o meu diretor espiritual ” a quem nos escuta, simplesmente porque, repito, não se dá, nem nunca se deu, esse personalismo na Obra. O que recebe uma confidência transmite o espírito do Opus Dei sem acrescentamentos: quem tem o encargo de oferecer essa ajuda desaparece para pôr as almas frente ao Senhor, dentro das características do nosso caminho. Um caminho, o da Obra, dizia o nosso Padre que é muito amplo. Pode ir-se pela direita ou pela esquerda; a cavalo, em bicicleta; de joelhos, de gatas como quando éreis meninos; e também pela valeta, sempre que não se saia do caminho [36] . O Sacramento da Reconciliação

16. Além da conversa fraterna, recorremos – em geral, semanalmente – a um sacerdote para receber a ajuda espiritual que está unida à Confissão sacramental. Como é bem compreensível, ajudam-nos os confessores que se designam para os diferentes centros, que se ordenaram para servir em primeiro lugar as suas irmãs e irmãos, com total disponibilidade, e – porque conhecem e vivem o mesmo espírito − têm uma preparação específica para nos orientar, nunca para mandar. De modo análogo se comporta quem costuma recorrer ao médico de família, quando existe, em vez de ir a um desconhecido.

Ao mesmo tempo, como sempre deixou muito claro S. Josemaria, os fiéis da Prelatura, tal como todos os católicos, gozam de plena liberdade para se confessar ou falar com qualquer sacerdote que tenha as faculdades ministeriais: surpreender-vos-á que vos recorde esta verdade tão clara, mas interessa-me mencioná-la porque talvez pudesse ser menos conhecida por aqueles que nada sabem do Opus Dei ou do espírito de liberdade próprio dos que seguem Jesus Cristo. Além disso, o nosso Padre estabeleceu que habitualmente sejam pessoas diferentes as que nos atendem na conversa fraterna e na Confissão.

Espírito de iniciativa e docilidade

17. A direção espiritual requer, nas pessoas que a recebem, o desejo de progredir no seguimento de Cristo. São elas as primeiras interessadas em buscar o impulso com a frequência oportuna, abrindo o coração com sinceridade, de modo que nos possam sugerir metas, indicar possíveis desvios, alentar em momentos de dificuldade, consolar e compreender. Por isso, movem-se com espírito de iniciativa e de responsabilidade. O conselho de outro cristão, e especialmente − em questões morais ou de fé − o conselho do sacerdote, é uma ajuda poderosa para reconhecer o que Deus nos pede numa circunstância determinada; mas o conselho não elimina a responsabilidade pessoal. É cada um de nós que tem de decidir em última análise, e é pessoalmente que havemos de dar contas a Deus das nossas decisões [37] .

Ao recorrer à direção espiritual, para secundar a ação do Espírito Santo e crescer espiritualmente e identificarmo-nos com Cristo, devemos cultivar as virtudes da sinceridade e da docilidade, que resumem a atitude da alma crente ante o Paráclito. Assim descrevia esta recomendação S. Josemaria. Dirigindo-se a todos os fiéis, da Obra ou não. Conhecem muito bem as obrigações do vosso caminho de cristãos, que os hão-de levar sem parar e com calma à santidade; também estão precavidos contra as dificuldades, praticamente contra todas, porque já se vislumbram desde o princípio do caminho. Agora insisto em que se deixem ajudar e guiar por um diretor de almas, a quem confiem todos os entusiasmos santos, os problemas diários que afetarem a vida interior, as derrotas que sofrerem e as vitórias. Nessa direção espiritual mostrem-se sempre muito sinceros: não deixem nada por dizer, abram completamente a alma, sem medo e sem vergonha. Olhem que, se não, esse caminho tão plano e tão fácil de andar complica-se e o que ao princípio não era nada acaba por se converter num nó que sufoca . [38].

E, fazendo eco dos ensinamentos dos Padres da Igreja e dos autores espirituais, apoiado na experiência de muitos anos de prática pastoral, insistia : se a tentação de esconder alguma coisa se infiltra na alma, deita tudo a perder; se, pelo contrário, é vencida imediatamente, tudo corre bem, somos felizes e a vida caminha retamente. Sejamos sempre selvaticamente sinceros, embora com modos prudentemente educados [39].

O Senhor derrama a sua graça abundantemente sobre a humildade dos que recebem com visão sobrenatural os conselhos da direção espiritual, vendo nessa ajuda a voz do Espírito Santo. Só uma efetiva docilidade de coração e de mente torna possível o progresso no caminho da santidade, já que o Paráclito, com as suas inspirações e os conselhos de quem nos atende, vai dando tom sobrenatural aos nossos pensamentos, desejos e obras. É Ele que nos impele a aderir à doutrina de Cristo e a assimilá-la em profundidade; que nos dá luz para tomar consciência da nossa vocação pessoal e força para realizar tudo o que Deus espera de nós. Se formos dóceis ao Espírito Santo, a imagem de Cristo ir-se-á formando, cada vez mais nítida, em nós e assim nos iremos aproximando cada vez mais de Deus Pai . Os que são conduzidos pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus ( Rm 8, 14) [40].

Humildade e prudência ao dar a direção espiritual

18. Detenho-me agora nas disposições de quem ajuda outros na direção espiritual. Salienta-se, em primeiro lugar, a de querer os outros como são, procurando exclusivamente o seu bem. Assim, a sua atitude será sempre positiva, otimista e alentadora. Além disso, deverá também fomentar em si mesmo a virtude da humildade, para não perder de vista que apenas é um instrumento (cfr. Act 9, 15) de que o Senhor deseja servir-se para a santificação das almas.

Por outro lado, esmerar-se-á em alcançar a melhor preparação possível para exercer a sua actividade, conhecer os princípios fundamentais da vida espiritual que ordinariamente fortalecem as almas, e duvidar prudentemente – isto é, não se fiar exclusivamente do seu critério – se se apresentam situações especiais. Nestes casos, além de rezar mais, pedirá mais luzes ao Espírito Santo, para estudar e enquadrar o assunto. Se é necessário, de acordo com os ensina­mentos da Moral, pode fazer-se uma consulta a pessoas mais doutas, apresentan­do-a como um caso hipotético e modificando as circunstâncias, de maneira que – para guardar rigorosamente o silêncio de ofício – fique completamente a salvo a identidade de quem se trate, e sempre com a devida prudência.

Na Obra, desde sempre, conhecíamos e aceitávamos claramente que a pessoa com quem se fala fraternalmente possa consultar o Diretor respetivo, quando o considere oportuno para ajudar melhor o interessado. Com o fim de que fique ainda mais em evidência o espírito de liberdade e de confiança nessas situações – que não serão nem habituais nem frequentes – a pessoa que recebe a conversa fraterna propõe ao interessado se deseja, ele mesmo, pedir conselho a um diretor ou se prefere que o faça o que atende a sua confidência. É uma maneira de proceder que reforça as medidas de delicadeza e de prudência vividas desde o princípio.

Do mesmo modo, todos têm liberdade de se dirigir diretamente ao Padre ou a um diretor regional ou da delegação, para falar da própria vida interior. Isto dá-nos a garantia, aos que recorremos à direção espiritual no Opus Dei, de que vamos receber o que necessitamos e desejamos: o espírito que nos transmitiu S. Josemaria, sem acrescentos nem modificações. Simultaneamente, nem de longe se lesa o dever de manter o segredo natural, que se guarda com o máximo cuidado e rigor: uma pessoa que não fosse exemplar neste ponto, careceria de uma disposição fundamental para dar direção espiritual.

Os que atendem outros, procuram fomentar em todo o momento a liber­dade interior dessas almas, para que respondam voluntariamente aos requisitos do amor de Deus. A direção espiritual oferece-se, portanto, sem uniformizar os fiéis do Opus Dei; isso seria ilógico e uma falta de naturalidade. A Obra quer-nos libérrimos e diversos. Mas quer-nos cidadãos católicos responsáveis e coerentes, de forma que o cérebro e o coração de cada um de nós não vão díspares, cada um por seu lado, mas concordes e firmes, para fazer em cada momento o que se vê com clareza que há que fazer, sem se deixar arrastar – por falta de personalidade e de lealdade à consciência – por tendências ou modas passageiras [41] . Logicamente, hão-de falar com a fortaleza necessária para estimulá-los a caminhar pela senda que Deus lhes marca; mas também com extrema suavidade, porque não são nem se sentem donos, mas servidores das almas: fortiter in re, suaviter in modo. Com efeito, sempre que a situação o requeira, a prudência exige que se aplique o remédio totalmente e sem paliativos, depois de pôr a chaga a descoberto (…).Em primeiro lugar, temos que proceder assim connosco mesmos e com quem, por motivos de justiça ou caridade, temos obrigação de ajudar[42] .

Não há-de ser impedimento neste encargo o pensamento de que também o próprio deve melhorar nesse ponto concreto. Porventura um médico que está doente, mesmo que a sua doença seja crónica, não cura os outros? A sua doença impede-o de prescrever a outros doentes o tratamento adequado? É claro que não: para curar basta-lhe ter a ciência necessária e aplicá-la com o mesmo interesse com que combate a sua própria doença [43] .

A formação litúrgica

19. Dentro da formação espiritual , muito unida à formação doutrinal­‑religiosa, situa-se o amor pela sagrada liturgia da Igreja, em que – de modo eminente na Santa Missa – se realiza a obra da nossa Redenção [44]. A Santa Missa situa-nos (…) perante os mistérios primordiais da fé, porque se trata da própria doação da Trindade à Igreja. Compreende-se assim que a Missa seja o centro e a raiz da vida espiritual do cristão [45].

A mensagem cristã é performativa. Isto é, o Evangelho e a liturgia que a traz à nossa existência, não é apenas uma comunicação de realidades que se podem saber, mas uma comunicação que gera factos e muda a vida [46].

Ninguém com sentido comum e sentido sobrenatural pode pensar que a liturgia é “coisa de clérigos”; ou que os clérigos “celebram” e o povo simples­mente “assiste”. Bem longe de semelhante concepção, S. Josemaria impulsionava a participação de todos: desde a compreensão da conexão íntima entre liturgia da Palavra e liturgia eucarística, ou da dimensão essencial da adoração na celebração, até detalhes concretos como o uso do missal de fiéis, para facilitar a sua participação: primeiro a partir do coração e depois com as palavras e os gestos previstos. Recordo ter ouvido que, já nos anos trinta do século passado, para dar mais vigor a esse ensino, quis que se dialogasse a Missa, com uma resposta em voz alta, às orações que pronunciava o sacerdote. Então não era habitual: faltavam trinta anos para o Concílio Vaticano II.

A liturgia da Palavra

20. Toda a história da salvação, e a liturgia que a celebra e faz presente, está caracterizada pela iniciativa de Deus que nos convoca e espera de cada um de nós uma resposta atual, com um amor que depois informe toda a jornada, com desejo de que o Sacrifício do altar se prolongue durante as vinte e quatro horas.

A celebração da Palavra na Santa Missa é um verdadeiro diálogo que exige uma resposta delicada: é Deus que fala ao seu povo e este faz sua esta palavra divina por meio do silêncio, do canto, etc.; unir-se a esse anúncio professando a sua fé no Credo, e cheio de confiança recorre com as suas petições ao Senhor [47]. Nas leituras, o Paráclito fala com voz humana para que a nossa inteligência saiba e contemple, para que a vontade se robusteça e a ação se cumpra [48] . A possibilidade de que eles se tornem realidade na nossa vida depende da graça divina, mas também da preparação e fervor de quem as lê e medita, de quem as escuta. «Pelas santas Escrituras, com efeito, somos conduzidos a executar ações virtuosas e à pura contemplação» [49].

Aqui apresenta-se-nos um ponto bem concreto de exame e de melhoria. Dessas leituras que consequências tiramos, em cada dia, na Santa Missa? Saboreamos os instantes de silêncio previstos depois do Evangelho, para aplicarmos a pregação do Senhor? Recordei que «muitos fomos testemunhas de como S. Josemaria se metia a fundo nas leituras da Missa; notava-se-lhe até no tom da voz. Havia algo que ele repetia com bastante frequência: depois do Santo Sacrifício, tomava notas das frases que o haviam ferido mais profundamente, para meditá-las na oração pessoal. Assim foi enriquecendo constantemente a sua alma e a sua pregação. Tratemos nós de imitar tão bom mestre. Deus revelou-Se­‑nos para que O conheçamos mais e melhor, e para que O demos a conhecer, com naturalidade, sem respeitos humanos» [50].

A liturgia eucarística

21. Nesta parte da Santa Missa, o sacerdote não se dirige principalmente aos fiéis reunidos. De facto, a orientação espiritual e interior de todos, do sacerdote e dos fiéis, é versus Deum per Jesum Christum, para Deus por meio de Jesus Cristo. Na liturgia eucarística, sacerdote e povo naturalmente não rezam um para o outro, mas para o único Senhor. Portanto, durante a oração olham na mesma direção, para uma imagem de Cristo na abside, ou para uma cruz ou simplesmente para o céu, como fez o Senhor na oração sacerdotal na noite antes da sua Paixão [51]. Como nos ajuda a viver esta adoração comum, este sair ao encontro do Senhor que chega, e pôr os nossos olhos na cruz do altar!

22. No Sacrifício do altar são necessárias a obediência e a piedade, intimamente unidas: são também requisitos fundamentais para que a liturgia seja fonte e cume da vida da Igreja e de cada cristão. Obediência, em primeiro lugar, porque «as palavras e os ritos litúrgicos são expressão fiel, amadurecida ao longo dos anos, dos sentimentos de Cristo e ensinam-nos a ter os mesmos sentimentos que Ele (cfr. Fl 2, 5); conformando a nossa mente com as suas palavras, eleva­mos ao Senhor o nosso coração» [52]. Eis aqui um fundamento profundo do porquê havemos de obedecer, de amar, cada palavra, cada gesto, cada rubrica, pois fazem chegar o dom de Deus, ajudam-nos a ser alter Christus, ipse Christus.

O Concílio Vaticano II recordou que a plena eficácia da liturgia depende também de que cada um, sacerdote ou fiel, ponha a alma em concordância com a voz [53]. E Bento XVI explicava que nas cerimónias, a vox, as palavras precedem a nossa mente. Normalmente não é assim: primeiro temos que pensar e depois o pensamento torna-se palavra. A Sagrada Liturgia dá-nos as palavras; nós devemos entrar nestas palavras, encontrar a concórdia com esta realidade que nos precede (…). Esta é a primeira condição: nós próprios devemos interiorizar a estrutura, as palavras da Liturgia, a Palavra de Deus. Assim o nosso celebrar torna-se realmente um celebrar “com” a Igreja: o nosso coração alarga-se e nós não fazemos algo, mas estamos “com” a Igreja em diálogo com Deus [54].

Na vida de S. Josemaria fundem-se de modo admirável piedade e obediência. e constituem um exemplo de algo muito real: De nenhuma forma poderemos manifestar melhor o nosso máximo interesse e amor pelo Santo Sacrifício, que observando esmeradamente até a mais pequena das cerimónias prescritas pela sabedoria da Igreja. E, além do Amor, deve urgir-nos a “necessidade” de nos parecermos com Jesus Cristo, não só interiormente, mas também externamente, movendo-nos – nos amplos espaços do altar cristão – com aquele ritmo e harmonia da santidade obediente, que se identifica com a vontade da Esposa de Cristo, quer dizer, com a Vontade do próprio Cristo [55] .

Gostaria que estas brevíssimas considerações acerca da estrutura da Santa Missa nos ajudassem a todos a fomentar o interesse pela liturgia, alimento e parte necessária da vida espiritual. Como não recordar que o nosso Fundador, já no longínquo ano de 1930, escreveu que todos na Obra hão-de ter especial empenho em seguir, com todo o interesse, todas e cada uma das disposições litúrgicas, ainda que pareçam pouco ou nada importantes. O que ama não perde um pormenor. Eu já vi: essas ninharias são uma coisa muito grande: amor. E obedecer ao Papa, até no mínimo, é amá-lo. E amar o Santo Padre é amar Cristo e a sua Mãe, a nossa Mãe Santíssima, Maria. E nós só aspiramos a isso: porque os amamos, queremos que omnes, cum Petro, ad Jesum per Mariam [56].

FORMAÇÃO NA DOUTRINA CATÓLICA

23. Quem ama sinceramente a Deus, sente-se levado a conhecê-lo cada vez mais e melhor; não se conforma com um trato superficial; procura compre­ender com maior profundidade tudo o que a Ele se refere. O afã por adquirir esta ciência teológica - a boa e firme doutrina cristã - deve-se, em primeiro lugar, ao desejo de conhecer e amar a Deus. Simultaneamente é consequência da preocupação geral da alma fiel por alcançar a mais profunda compreensão deste mundo, que é uma realização do Criador [57] . Por isso a formação que o Opus Dei proporciona aos seus fiéis – considerada a partir da perspetiva doutrinal-religiosa – dirige-se a que adquiramos a doutrina da Igreja e aprofunde­mos no seu conhecimento.

Com o mesmo horizonte – olhando Deus e o mundo – o Beato João Paulo II assinalou a necessidade atual da formação na doutrina católica. «A formação doutrinal dos fiéis leigos mostra-se hoje cada vez mais urgente, não só pelo natural dinamismo de aprofundar a sua fé, mas também pela exigência de “racionalizar a esperança” que está dentro deles, perante o mundo e os seus problemas graves e complexos. Tornam-se, desse modo, absolutamente necessá­rias uma sistemática ação de catequese , a dar-se gradualmente, conforme a idade e as várias situações de vida, e uma mais decidida promoção cristã da cultura , como resposta às eternas interrogações que atormentam o homem e a sociedade de hoje» [58].

Desde os começos do Opus Dei e ainda antes, S. Josemaria mostrou um especial interesse para que as pessoas, a quem atendia espiritualmente, aprofun­dassem na sua formação doutrinal-religiosa, porque cada um há-de esforçar-se, na medida das suas possibilidades, pelo estudo sério e científico da fé [59] .

24. Como escrevia S. Gregório Magno, «muito inútil é a piedade se falta a reflexão da ciência» [60]. E «nada é a ciência se não tem a utilidade da piedade» [61]. O nosso Fundador insistiu em que o estudo da doutrina estivesse acompanhado por uma sincera vida espiritual, pelo trato íntimo com Jesus Cristo na oração e nos sacramentos, por uma devoção filial à Virgem Santíssima. Ensinava que a verdade é sempre, em certo modo, algo sagrado: dom de Deus, luz divina que nos encaminha para Aquele que é a Luz por essência. E isto sucede especialmente quando a verdade se considera na ordem sobrenatural: há pois que tratá-la com respeito, com amor (…). Mais ainda: estamos persuadidos de que essa verdade divina, que levamos, nos transcende: que as nossas palavras são insuficientes para expressar toda a sua riqueza, que é inclusive possível que não a entendamos com plenitude e que façamos o papel de quem transmite uma mensagem que o próprio não compreende totalmente [62] .

Vale a pena o esforço da Prelatura para garantir a todos os seus fiéis e a muitas outras pessoas uma séria preparação doutrinal; mais ainda em momentos, como os atuais, em que essa necessidade se nota de modo mais perentório. É de realçar, como gozosa realidade, a afirmação do nosso Fundador há muitos anos atrás: a Obra inteira equivale a uma grande catequese, feita de forma viva, simples e direta nas entranhas da sociedade civil [63] .

Fidelidade ao Magistério e liberdade no que é opinável

25. A formação doutrinal abarca todos os campos, desde a filosofia à teologia e ao direito canónico, etc. Mediante essa preparação – que no caso dos Numerários e das Numerárias, e de muitos Agregados e Agregadas, abrange os programas que se estudam nas universidades pontifícias – contribui-se para que em todos os estratos da sociedade haja pessoas decididas a dar um testemunho vivo do Evangelho, com a palavra e com as obras : sempre dispostos − como escreve S. Pedro − a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que vo-la peça (1 Pd 3, 15) .

De acordo com as repetidas diretrizes do Magistério, na explicação das diferentes matérias filosóficas, tem uma especial relevância a doutrina do Doutor comum da Igreja. Cumpre-se assim a recomendação do Concílio Vaticano II e de vários Romanos Pontífices: «Aprofundar nos mistérios da fé e descobrir a sua mútua conexão (…) sob o magistério de S. Tomás» [64].

S. Josemaria ateve-se a esta linha e assim o recordou aos professores e professoras encarregados dos Estudos gerais da Prelatura. Ao mesmo tempo, com uma mentalidade aberta ao progresso da ciência teológica, explicava que dessa recomendação não se pode concluir que devamos limitar-nos a assimilar e a repetir todos e somente os ensinamentos de S. Tomás . Trata-se de algo muito diferente: devemos certamente cultivar a dou­trina do Doutor Angélico, mas do mesmo modo que ele a cultivaria hoje se vivesse. Por isso, algumas vezes haverá que levar a cabo o que ele mesmo só pôde começar; e por isso também, fazemos nossos todos os achados de outros autores, que respondam á verdade [65] .

Acabo de recordar-vos, com palavras do nosso Padre, uma característica essencial do espírito do Opus Dei: que corporativamente não temos outra doutrina que a que ensina o Magistério da Santa Sé. Aceitamos tudo o que este Magistério aceita e rejeitamos tudo o que rejeita. Cremos firmemente em tudo quanto propõe como verdade de fé e fazemos também nosso tudo o que é de doutrina católica [66] . E dentro desta doutrina ampla, cada um de nós forma o seu critério pessoal [67] . Os Estatutos da Prelatura estabelecem a proibição de que o Opus Dei – como disse o nosso Fundador – crie ou adote uma escola filosófica ou teológica particular [68]. Isto, além do amor à liberdade, expressa um facto eclesiológico fundamental: que os membros da Prelatura são fieis cristãos comuns ou, no seu caso, sacerdotes seculares com idênticos âmbitos de liberdade de opinião que os restantes católicos.

FORMAÇÃO PARA O APOSTOLADO

26. O conhecimento profundo das verdades religiosas fundamentais, assim como dos aspetos morais e éticos que se relacionam mais de perto com o exercício do próprio trabalho, é importante, também, para fazer um amplo trabalho apostólico no ambiente profissional em que cada um se desenvolve. A luz dos seguidores de Jesus Cristo não deve estar no fundo do vale, mas no cume da montanha para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai que está nos céus ( Mt 5, 16) [69].

Certamente são muitas as pessoas de grande coração, capazes de enamorar-se de Deus, mas a quem falta a luz da doutrina que oriente e dê sentido às suas vidas. E aos cristãos incumbe o dever e o prazer de lha proporcionar. Uma passagem do Novo Testamento ilustra-o claramente. Cumprindo um mandato do Espírito Santo, o diácono Filipe dirigiu-se ao caminho que conduzia a Gaza. Por ali transitava uma carruagem em que um alto personagem, ministro da rainha da Etiópia, regressava ao seu país depois de ter adorado a Deus em Jerusalém . Filipe, acorrendo, ouviu o etíope a ler o profeta Isaías e perguntou­‑lhe: Compreendes, verdadeiramente, o que estás a ler? Respondeu ele: E como poderei compreender, sem alguém que me oriente? E convidou Filipe a subir e a sentar-se junto dele ( Act 8, 30-31) .

É missão dos católicos anunciar, com paz e perseverança, a boa nova de Jesus, evitar a ignorância religiosa por meio da difusão da doutrina revelada. O apostolado cristão − e refiro-me agora em concreto ao de um cristão corrente, ao do homem ou da mulher que vive realmente como outro qualquer entre os seus iguais − é uma grande catequese, em que, através de uma amizade leal e autêntica, se desperta nos outros a fome de Deus, ajudando-os a descobrir novos horizontes: com naturalidade, com simplicidade como já disse, com o exemplo de uma fé bem vivida, com a palavra amável, mas cheia da força da verdade divina [70] .

Devemos propagar ardentemente a Verdade de Cristo, fazer com que outros participem do tesouro que recebemos, de modo que experimentem que não há nada de mais belo do que conhecê-l´O e comunicar aos outros a Sua amizade [71].

27. No Decreto sobre o apostolado dos leigos, o Concílio Vaticano II ensina que «o apostolado só se pode alcançar com uma formação multiforme e integral. Exigem-na tanto o contínuo progresso espiritual e doutrinal do próprio leigo, como as diversas circunstâncias de coisas, pessoas e encargos a que a sua atividade se deve acomodar. Esta formação deve-se apoiar sobre os fundamentos afirmados e expostos por este sagrado Concílio noutros lugares (…). Além da formação comum a todos os cristãos, não poucas formas de apostolado requerem uma formação peculiar e específica, por causa da diversidade de pessoas e circunstâncias» [72].

Nos últimos anos, este afã de almas tem exigido mais vigor, para contra­riar o secularismo, que avançou a passos largos, até adquirir carta de cidadania em países tradicionalmente cristãos. Voltar a impregnar com o espírito de Cristo as raízes dessas nações é precisamente o objetivo da nova evangelização [73]. Na Prelatura, esse trabalho resume-se a orientar e estimular cada pessoa, para que realize a missão evangelizadora recebida no Batismo, com o espírito e os meios específicos do Opus Dei, através do apostolado de amizade e confidência .

João Paulo II insistia em que o mundo «exige evangelizadores credíveis, cuja vida , em sintonia com a cruz e a ressurreição de Cristo, irradie a beleza do Evangelho (...). Cada batizado, enquanto testemunha de Cristo, deve obter a formação adequada à sua condição, não só para evitar que a fé definhe por falta de cuidado num ambiente hostil como é o do mundo, mas também para dar apoio e impulso ao testemunho evangelizador» [74].

Apostolado pessoal de amizade e confidência

28. Nosso Senhor veio a esta terra para que todas as almas alcancem a vida eterna e quer contar também com os seus discípulos: ut eatis, que vades – repete-nos aos cristãos, como aos Apóstolos – e deis fruto, e o vosso fruto permaneça (cfr. Jo 15, 16). Portanto, minhas filhas e filhos, havemos de levar a sua doutrina pelos mais diversos ambientes, já que nos interessam todas as almas para o Senhor. Mas torna-se lógico começar por quem Deus colocou mais próximo de nós.

Na Prelatura do Opus Dei, como vos dizia, damos prioridade ao que S. Josemaria chamava apostolado de amizade e confidência : um trato pessoal em que cada coração verte no outro o seu conhecimento e o seu amor a Cristo, facilitando que se abra aos suaves impulsos da graça.

A amizade presume – e ao mesmo tempo cria – comunhão de sentimentos e de afãs. Mas «onde principalmente se realiza essa comunhão é na convivência (…); daqui que o conviver seja próprio da amizade» [75]. Com esse trato, empreende-se o primeiro passo no caminho da amizade. Portanto, dá-nos alegria aproveitar as ocasiões que o trabalho profissional e social nos oferece de conhecer novos amigos, com o desejo de ajudá-los e, também, de aprender deles: a amizade é essencialmente mútua. O nosso Padre animava-nos a nos conduzirmos como Cristo que passa ao lado da gente, pelo caminho da vida quotidiana. O Senhor quer servir-se de nós – do nosso trato com os homens, desta nossa capacidade, que Ele nos deu, de querer e fazer-nos querer –, para Ele continuar a ter amigos na terra [76].

Entre as características deste modo de servir, destaca-se a necessidade de saber adaptar-se à capacidade e à mentalidade de cada um, de modo que entendam o que escutam. S. Josemaria chamava dom de línguas a este esforço por fazer-se entender, que brota como fruto da graça, da oração e da preparação pessoal, para que a doutrina da Igreja ressoe com novas tonalidades aos ouvidos das pessoas. Há que repetir o mesmo, mas de modos diversos. É a forma o que deve ser sempre novo, diferente; não a doutrina [77] .

Trata-se de imitar Jesus, que expunha os mais elevados ensinamentos por meio de parábolas, de comparações, que todos – cada um ao seu nível – estavam em condições de entender. Fomentemos o desejo de expor as verdades cristãs de forma atrativa: Que a vossa palavra seja sempre amável, temperada de sal, para que saibais responder a cada um como deveis ( Cl 4, 6) . Não se trata de uma formalidade, ou de nos mostrarmos eruditos, mas de falar com conteúdo, buscando a glória de Deus e o bem das almas.

29. Neste contexto, o conhecimento profundo da Sagrada Escritura – do Antigo e do Novo Testamento – fruto de uma leitura assídua e de uma meditação atenta, é de importância fundamental. Recordou-o recentemente o Papa Bento XVI, na Exortação apostólica Verbum Domini sobre a palavra de Deus na missão da Igreja. Ali, entre outros grandes santos a quem o Senhor concedeu luzes especiais para aprofundar no sentido espiritual da Bíblia, o Papa afirma que um desses raios de luz se manifesta em S. Josemaria Escrivá e na sua pregação sobre a chamada universal à santidade [78] .

O Romano Pontífice escreve que um momento importante da animação pastoral da Igreja, onde se pode sapientemente descobrir a centralidade da Palavra de Deus, é a catequese, que, nas suas diversas formas e fases, sempre deve acompanhar o Povo de Deus [79]. E mostra como o encontro dos discípulos de Emaús com Jesus, descrito pelo evangelista Lucas (cfr. Lc 24, 13-35), representa em certo sentido o modelo de uma catequese em cujo centro está a “explicação das Escrituras”, que somente Cristo é capaz de dar (cfr. Lc 24, 27‑28), mostrando o seu cumprimento em Si mesmo. Assim, renasce a esperança, mais forte do que qualquer revés, que faz daqueles discípulos testemunhas convictas e credíveis do Ressuscitado [80]. Estas palavras não vos trazem à memória a afirmação gozosa do nosso Padre quando pregava que agora, Emaús é o mundo inteiro, porque o Senhor abriu os caminhos divinos da terra? [81] .

Recordai como nos transmitiu os ensinamentos desta passagem de S. Lucas. Comentava que toda a vida de Cristo é um modelo divino que devemos imitar, mas o que nos conta o evangelista da cena de Emaús pertence­‑nos muito especialmente [82] . Dessa cena evangélica serviu-se também para nos falar do apostolado pessoal de amizade e confidência. Dava ênfase a uma característica importante: é preciso ter iniciativa, sair ao encontro das pessoas para lhes oferecer a nossa amizade e ajudá-las na sua procura de Deus, respeitando e defendendo a intimidade e a liberdade de todos.

No caminho de Emaús, o Ressuscitado vai em busca dos discípulos que regressavam a suas casas, desanimados pelos acontecimentos dolorosos que tinham presenciado: a Paixão e Morte do seu Senhor. Esse gesto de Jesus ensina­‑nos que a amizade leva a participar nas alegrias e nas penas dos nossos amigos, a sermos solidários e dedicar-lhes tempo. Jesus caminha junto daqueles dois homens que perderam quase toda a esperança, de modo que a vida começa a parecer-lhes sem sentido. Compreende a sua dor, penetra nos seus corações, comunica-lhes algo da vida que n’Ele habita [83] . De igual modo havemos de compartilhar as preocupações, os interesses e as dificuldades das pessoas que acompanhamos, sendo um mais entre os nossos companheiros de emprego ou profissão, sem que nos separe deles nenhuma barreira: uma característica estu­penda do espírito da Obra, que não tira ninguém do seu sítio e que nos convida a estar no mundo sem ser mundanos.

Assim havemos de conduzir-nos no ambiente em que nos movemos, sem perder de vista que – se formos fiéis – Jesus Cristo atua em nós, e deseja servir-se do nosso exemplo e da nossa palavra para chegar a outras pessoas, ao mesmo tempo que elas nos enriquecem com a sua amizade. Nada mais lógico que os verdadeiros amigos comuniquem entre si as suas alegrias e as suas penas, as suas tarefas e, supostamente, o tesouro maior que possui um cristão: a vida de Cristo. Falar-lhes-emos de Deus, da alegria de tê-l’O na nossa alma em graça, do valor imenso que só Ele pode conferir a uma existência humana.

Atuando assim, os cristãos cooperam eficazmente na missão evangeliza­dora da Igreja, metendo Cristo no coração e na alma dos seus conhecidos, para ajudar a levantar a Cruz no cume de todas as atividades humanas.

Apostolado da família e com a juventude

30. São muitas as atividades que contribuem para fortalecer a extensão do reino de Deus. Não obstante, algumas têm objetivamente uma transcendência maior, conforme as necessidades de cada época e de cada lugar. A família, a formação da juventude, o mundo da cultura, situam, em grande parte, o desafio da nova evangelização que lança o Santo Padre.

A família necessita urgentemente que se reafirme o seu húmus originário, querido por Deus na criação, que desgraçadamente os costumes e as leis civis de muitos países se empenham em perverter. É uma tarefa de importância capital, em que os católicos coincidimos com pessoas de outras crenças, ou sem qualquer religião, conscientes de que a promoção da família – comunhão de amor entre um homem e uma mulher, indissolúvel e aberta à vida – constrói uma coluna insubstituível para a reta ordenação da sociedade e um fundamento importante para que os homens alcancem a maturidade e a felicidade. Além do que possamos contribuir em colaboração com outras gentes, pessoalmente pode-se ajudar, por exemplo, a que os cônjuges mutuamente se perdoem, e melhor compreendam que a sua vida é entrega ao outro; e, se se trata de um casal cristão, que compreendam que participam num mistério: na união de Cristo com a sua Igreja. Essa fidelidade de ambos, manifestação do verdadeiro amor com o passar do tempo, traça também o caminho para chegar ao Céu.

O trabalho apostólico com a juventude constituirá sempre um desafio vital para o mundo e para a Igreja, porque nesses anos forjam-se os que endireitarão o rumo da sociedade e a farão avançar nos caminhos traçados pelo Criador e Redentor.

Neste âmbito, adquire especial importância o apostolado da diversão e o bom uso do tempo livre. Limito-me a recordar-vos o que vos escrevi em 2002, que é preciso preencher de conteúdo cristão «os costumes, as leis, a moda, os meios de comunicação, as expressões artísticas. Todos os aspetos que palpitam no coração da batalha para a nova evangelização da sociedade e para a qual o Santo Padre convida incansavelmente os cristãos» [84].

Apostolado e cultura

31. O amplo mundo do pensamento e da cultura, das ciências, das letras e da técnica, continua sendo uma área privilegiada que é preciso iluminar com as luzes do Evangelho. «Por isso, os cristãos são chamados a possuir uma fé que lhes permita confrontar-se criticamente com a cultura atual resistindo às suas seduções; influir eficazmente nos setores culturais, económicos, sociais e políticos; mostrar que a comunhão entre os membros da Igreja Católica e com os outros cristãos é mais forte do que qualquer vínculo étnico; transmitir com alegria a fé às novas gerações; construir uma cultura cristã que possa evangelizar a cultura mais ampla em que vivemos» [85].

Os apostolados da Obra são um mar sem limites . Queremos abrir os braços de par em par a cada pessoa, como Cristo na Cruz. Daí o nosso empenho por chegar aos que estão mais longe de Deus, como nos ensinou S. Josemaria, que amava – sempre o repetiu – o apostolado ad fidem. O nosso Padre estimulava-nos a ter especial empenho no apostolado ad gentes, com os gentios (…). Primeiro – repetirei o de sempre – com uma amizade sincera, leal, humanamente boa [86] . Aproveitando as múltiplas relações que se originam no exercício do trabalho profissional, num mundo caracterizado pela globalidade, tornar-se-á fácil dialogar com pessoas de outras confissões e crenças, ou com pessoas sem qualquer religião, com o desejo de lhes fazer nascer a vontade de conhecer melhor Deus. Ajudaremos, inclusive, a quem tenha uma atitude negativa face à Igreja católica, se procuramos tratá-los com mansidão, paciência, compreensão e afeto.

Mas considero importante sobretudo o facto de as pessoas que se consideram agnósticas ou ateias deverem também interessar-nos a nós como crentes. Quando falamos de uma nova evangelização, talvez estas pessoas se assustem. Não se querem ver objeto de missão, nem renunciar à sua liberdade de pensamento e de vontade. E todavia a questão acerca de Deus permanece em aberto também para elas, mesmo se não conseguem acreditar no caráter concreto da Sua solicitude por nós [87] .

Ainda que em iniciativas deste tipo participem especialmente só alguns, sentimos o dever de apoiá-las com a nossa oração. Porque cada um de nós, filhos de Deus na Igreja santa, só quer viver para levar o nome do Senhor a todos os povos e a todas as culturas, até aos últimos recantos da terra (cfr. Act 9, 15).

FORMAÇÃO PROFISSIONAL

32. Ao constituir o trabalho ordinário, segundo o espírito do Opus Dei, o eixo da santificação pessoal e o âmbito habitual do trabalho apostólico dos seus fiéis, compreende-se que na Prelatura se fomente a boa preparação profissional. O estudo, a formação profissional, seja qual for, entre nós é obrigação grave [88] .

Recentemente, o Magistério da Igreja abordou o tema do trabalho – e todos lemos esse ensinamento pensando na pregação de S. Josemaria, desde 1928 – como o âmbito para a procura da santidade por parte dos fiéis leigos. Insistiu «na promoção de uma espiritualidade do trabalho, suscetível de ajudar todos os homens a aproximarem-se através dele de Deus, Criador e Redentor, e a participarem nos seus desígnios salvíficos quanto ao homem e ao mundo, e a aprofundarem na sua vida a amizade com Cristo» [89] . Trabalho e unidade de vida

33. Na homilia Amar o mundo apaixonadamente, S. Josemaria insistiu na importância da unidade de vida, que harmoniza a piedade, o trabalho e o apostolado. Tenho ensinado constantemente com palavras da Sagrada Escri­tura: o mundo não é mau porque saiu das mãos de Deus, porque é uma criatura Sua, porque Iavé olhou para ele e viu que era bom (cfr. Gn 1, 7ss). Nós, os homens, é que o tornamos mau e feio, com os nossos pecados e as nossas infidelidades. Não duvideis, meus filhos: qualquer forma de evasão das honestas realidades diárias é, para vós, homens e mulheres do mundo, coisa oposta à vontade de Deus. Pelo contrário, deveis compreender agora – com uma nova clareza – que Deus vos chama a servi-l’O em e a partir das ocupações civis, materiais, seculares da vida humana: Deus espera-nos todos os dias no laboratório, no bloco operatório, no quartel, na cátedra universitária, na fábrica, na oficina, no campo, no lar e em todo o imenso panorama do trabalho. Ficai a saber: escondido nas situações mais comuns há um quê de santo, de divino, que toca a cada um de vós descobrir (…). Não há outro caminho, meus filhos: ou sabemos encontrar nosso Senhor na nossa vida corrente ou nunca O encontraremos. Por isso posso dizer-vos que a nossa época precisa de restituir à matéria e às situações que parecem mais vulgares o seu sentido nobre e original, colocá-las ao serviço do Reino de Deus, espiritualizá-las, fazendo delas o meio e a ocasião do nosso encontro permanente com Jesus Cristo [90] .

A formação que proporciona a Prelatura tende a fomentar o necessário espírito sobrenatural, para que cada um se empenhe em realizar o trabalho com a maior perfeição humana possível e com afã de serviço, convertendo-o em instrumento de santidade e de apostolado. Para isso, havemos de esforçar-nos por alcançar o necessário prestígio profissional entre os nossos companheiros, que se adquire com o empenho e a dedicação ao longo dos anos. Cada um recebe esta formação específica como os outros cidadãos: nas universidades, nas escolas técnicas, nas oficinas, etc., onde realiza os seus estudos ou aprende um ofício. O espírito da Obra impele-nos a conservar e a melhorar com constância essa preparação. Todos nos sabemos libérrimos, tanto no momento de escolher uma profissão como ao exercê-la. A Obra só ensina o modo de se santificar nessas tarefas, sem se imiscuir nas opções laborais de cada um.

Não importa o tipo de tarefa que se leve a cabo, desde que seja honrada. O que é mais importante: ser catedrático na Sorbonne ou fazer os trabalhos domésticos? Dir-te-ei que se tu és santa, porque te estás a santificar no trabalho, isso é o mais importante [91] . E acrescentava noutro momento: quando, referindo-me às mulheres da limpeza que trabalham na Universidade de Navarra, afirmo que não sei se o seu trabalho é tão importante ou mais que o do Conselho de Administração, não estou a brincar: repito simplesmente o que sempre tenho pensado. A tarefa de uma dessas mulheres que vai com alegria e faz tudo por amor, pode ser heroico, nada vulgar, e naturalmente mais eficaz que o de um grande investigador que só pense em publicar os seus estudos. Insisto: que vale mais? Depende do amor e do sacrifício com que se realiza o próprio trabalho, mas com um sacrifício gozoso, alegre, voluntário; caso contrário, é melhor que não se faça [92] .

A todos os católicos compete o dever de fazer quanto estiver nas suas mãos para que Cristo reine efetivamente na sociedade, e estas ânsias santas manifestam-se também procurando adquirir o necessário prestígio profissional, candeeiro para que brilhe a luz de Cristo (cfr. Mc 4, 21).

Os estudantes, por seu lado, hão-de sentir o dever de conseguir boas notas. Não me esqueçais aquela consideração que S. Josemaria escreveu em Caminho , que tem servido de guia a tantas gerações de jovens no mundo inteiro : para um apóstolo moderno, uma hora de estudo é uma hora de oração [93] . Retidão de intenção

34. Ao mesmo tempo que cuidamos a preparação profissional, recordemos com responsabilidade que a ocupação laboral – seja qual for – mostra-nos sempre um meio para alcançar a santidade e estar atento ao apostolado. É muito neces­sário não perder este ponto de vista nos momentos atuais, porque na sociedade de hoje, altamente competitiva, é fácil colocar a profissão na primeira linha das obrigações, por cima dos outros deveres com Deus, com a própria família e com as outras pessoas. Insisto-vos, com o nosso Padre: trabalhai cara a Deus, sem ambicionar glória humana. Alguns vêem no trabalho um meio para conquistar honras, ou para adquirir poder ou riqueza que satisfaça a sua ambição pessoal, ou para sentir o orgulho da própria capacidade de atuar. Os filhos de Deus no seu Opus Dei não vemos jamais no nosso trabalho profissional algo relacionado com o egoísmo, a vaidade ou a soberba: vemos somente uma possibilidade de servir todos os homens por amor de Deus [94]. Por isso, acrescentava : um bom índice da retidão de intenção, com que deveis realizar o vosso trabalho profissional, é precisamente o modo como aproveitais as relações sociais ou de amizade, que nascem ao desempenhar a profissão, para aproximar a Deus essas almas: chegando, se for o caso, se se vêem as circunstâncias apropriadas, a colocar-lhes o problema da sua vocação [95] .

No campo da preparação profissional, tendemos necessariamente a conhe­cer bem aqueles temas da doutrina católica mais relacionados com o âmbito da própria profissão, ou que gozam de especial atualidade no país; talvez diferentes de um lugar para outro, mas alguns vigentes em todas as partes; por exemplo, os relacionados com o matrimónio e a família, a educação, o “ evangelho da vida ”, a bioética, a justiça e a caridade nas relações laborais… Por isso, o exemplo de retidão no cumprimento dos deveres profissionais, familiares e sociais constitui um testemunho de confiança que todos havemos de dar, «Como consequência da vossa retidão humana e cristã escrevi-vos , nascerão igualmente – nos ambientes em que vos moveis – muitas iniciativas diretamente encaminhadas a resolver problemas sociais concretos, em nobre e fraterna colaboração com outros homens e mulheres de boa vontade. Elevo nestes momentos o meu coração em ação de graças a nosso Senhor, porque à volta da Prelatura, com a ajuda de tantos cooperadores, católicos e não católicos, florescem abundantes realidades de solidariedade que contribuem para implantar a justiça e a paz sobre a terra, levando a dezenas de milhares de pessoas – como dizia o nosso Padre – o bálsamo forte e pacífico do amor ( Cristo que passa , n. 183)» [96] . Espontaneidade apostólica

35. Minhas filhas e meus filhos, quis pôr de novo perante os vossos olhos que a única ambição, o único desejo do Opus Dei e de cada um dos seus filhos é servir a Igreja, como Ela quer ser servida, dentro da específica vocação que o Senhor nos deu [97] . E com alguma frequência, S. Josemaria se referiu ao Opus Dei dizendo que é uma desorganização organizada , porque o modo próprio de colaborar na missão da Igreja, querido por Deus, consiste em proporcionar formação às pessoas, nos diversos aspetos. Pode-se afirmar que a Prelatura do Opus Dei gasta todas as suas energias nesta tarefa, nesta catequese. Logo, vós, individualmente, com a bagagem da preparação recebida e assimilada, com liberdade e responsabilidade pessoais, procurais infundir a seiva do espírito cristão na torrente circulatória da sociedade.

Respondendo à pergunta de um jornalista sobre este aspeto tão caracterís­tico da Obra, o nosso Padre explicava que concedemos uma importância primá­ria e fundamental à espontaneidade apostólica da pessoa, à sua iniciativa livre e responsável guiada pela ação do Espírito; e não a estruturas orgânicas, mandatos, táticas e planos impostos de cima, como atos de governo [98] .

Antes de concluir, volto ao fundamental: esforcemo-nos dia após dia na nossa dedicação cristã a Deus e aos outros. Esmeremo-nos em ser mulheres e homens fidelíssimos ao Romano Pontífice, rezando continuamente pela sua pessoa e intenções; vivamos uma afetiva e efetiva união com os Bispos e todos os fiéis católicos. Enchamo-nos de otimismo e de gratidão ao Senhor, ao participar na nova evangelização. Recorramos à intercessão da Santíssima Virgem, Rainha do mundo e Mãe da Igreja, para que nos obtenha do Céu as graças necessárias.

Como é natural, pomos como especial intercessor de todo este trabalho formativo S. Josemaria, que, com a sua vida e ensinamentos, deixou bem esculpido o espírito do Opus Dei recebido de Deus em 2 de Outubro de 1928, para que as suas filhas e filhos, e muitas outras pessoas, possamos percorrer todos os caminhos da terra, fazendo-os divinos com a graça do Espírito Santo.

Com todo o afeto, abençoa-vos

o vosso Padre

+ Javier

Roma, 2 de Outubro de 2011

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[1] Bento XVI, Encíclica Spe salvi, 30-IX-2007, n. 2.

[2] Cfr. Bento XVI, Carta Apost. Ubicumque et semper , 21-IX-2010.

[3] Bento XVI, Homilia na Missa de encerramento da Jornada Mundial da Juventude, 21-VIII-2011.

[4] S. Josemaria, Temas Actuais do Cristianismo , n. 24.

[5] S. Josemaria, Carta 6-V-1945, n. 19.

[6] S. Josemaria, Carta 24-III-1931, n. 9.

[7] S. Josemaria, Caminho , n. 372.

[8] S. Josemaria, Notas de uma reunião familiar, 18-VI-1972.

[9] Santo Agostinho , Sermão, 169, 13 (PL, 38, 923).

[10] S. Josemaria . Notas de uma reunião familiar, 1963.

[11] S. Josemaria, Amigos de Deus , n. 24.

[12] S. Josemaria, Amigos de Deus , n. 26.

[13] S. Josemaria, Amigos de Deus , n. 26.

[14] S.Josemaria, Carta 9-I-1932, n. 28.

[15] João Paulo II, Ex. ap. Christifideles laici , 30-XII-1988, n. 63.

[16] Símbolo Atanasiano.

[17] Concílio Vaticano II, Decr. Apostolicam actuositatem , n. 4.

[18] S. Josemaria,Amigos de Deus, n. 74.

[19] S. Josemaria,Amigos de Deus, n. 84.

[20] S. Josemaria,Amigos de Deus, n. 84 .

[21] S. Josemaria, Notas de uma reunião familiar, 28-XI-1972.

[22] Catecismo da Igreja Católica , n. 1808.

[23] S. Josemaria, Amigos de Deus , n. 77.

[24] Bento XVI, Alocução no Angelus , 28-X-2007.

[25] Cfr. S. Josemaria, Caminho , n. 380.

[26] João Paulo II, Discurso a um grupo de bispos em visita ad limina, 18-XI-1999.

[27] D. Álvaro del Portillo, Escritos sobre o sacerdócio , Rialp, Madrid, 6ª. ed. 1990, p. 24.

[28] S. Josemaria, Carta 8-VIII-1956, n. 47.

[29] João Paulo II, Ex. ap. Christifideles laici , 30-XII-1988, n. 60.

[30] Bento XVI, Ex. ap. Sacramentum caritatis , 22-II-2007, n. 64.

[31] S. Josemaria, Caminho , n. 947.

[32] S. Josemaria, Notas de uma reunião familiar, 30-X-1964.

[33] João Paulo II, Homilia, 19-VIII-1979.

[34] Cfr. João Paulo II, Const. Ap . Ut sit , 28-XI-1982.

[35] Cfr. S. Josemaria, La Abadesa de las Huelgas, Estudio teológico jurídico , Rialp, Madrid 1974, 3ª. ed., p. 153. Recentemente, a Congregação para o Clero publicou o documento O sacerdote, ministro da misericórdia divina , 9-III-2011, onde se fala explicitamente de que também « fiéis leigos bem formados (…) realizam este serviço de conselho no caminho da santidade » (n. 65).

[36] S. Josemaria. Notas de uma meditação, 31-XII-1970.

[37] S. Josemaria. T emas Actuais do Cristianismo , n. 93.

[38] S. Josemaria, Amigos de Deus , n. 15.

[39] S. Josemaria, Amigos de Deus , n. 88.

[40] S. Josemaria, Cristo que passa , n. 135.

[41] S. Josemaria, Carta 6-V-1945 , n. 35.

[42] S. Josemaria, Amigos de Deus , n. 157.

[43] S. Josemaria, Amigos de Deus , n. 161.

[44] Cfr. Concílio Vaticano II, Const. Sacrosanctum Concilium, n. 2.

[45] S. Josemaria, Cristo que passa , n. 87.

[46] Cfr. Bento XVI, Encíclica Spe salvi , 30-XI-2007, n. 2.

[47] Cfr . Instrução Geral do Missal Romano , n. 55.

[48] S. Josemaria, Cristo que passa , n. 89.

[49] S. João Damasceno, Exposição sobre a fé ortodoxa , IV, 17 (PG 94, 1175).

[50] Vivir la Santa Misa , Rialp, Madrid, 2010, pp. 65-66.

[51] Joseph Ratzinger-Bento XVI , Opera omnia , vol. XI, Prefácio.

[52] Congregação para o Culto divino e a Disciplina dos sacramentos, Instr. Redemptionis sacramentum , 25-III-2004, n. 5.

[53] Cfr. Concílio Vaticano II, Const. Sacrosanctum Concilium , n. 11.

[54] Bento XVI, Encontro com sacerdotes da diocese de Albano, 31-VIII-2006.

[55] S. Josemaria, Forja, n. 833.

[56] S. Josemaria, Apontamentos íntimos , n. 110 (17-XI-1930) Cit. por D. Álvaro del Portillo, Carta, 15‑X‑1991.

[57] S. Josemaria, Cristo que passa, n. 10.

[58] João Paulo II, Ex. ap. Christifideles laici , 30-XII-1988, n. 60.

[59] S. Josemaria, Cristo que passa, n. 10.

[60] S. Gregório Magno, Moralia, I, 32, 45 (PL 75, 517).

[61] S. Gregório Magno, Moralia, I, 32, 45 (PL 75, 517).

[62] S. Josemaria, Carta 24-X-1965 , nn. 24-25.

[63] S. Josemaria, Carta 11-III-1940 , n. 47.

[64] Concílio Vaticano II, Decr. Optatam totius , n. 16; cfr. Pio XII, Discurso, 24-VI-1939: Paulo VI, Discurso, 12-III-1964; João Paulo II, Encíclica Fides et Ratio , 14-IX-1998, nn. 43ss.

[65] S. Josemaria, Carta 9-I-1951 , n. 22.

[66] S. Josemaria, Carta 14-II-1964 , n. 1.

[67] S. Josemaria, Notas de uma reunião familiar, 30-IV-1961.

[68] Cfr. Codex Iuris particularis seu Statuta Praelaturae Sanctae Crucis et Operis Dei , n. 109.

[69] S. Josemaria, Cristo que passa, n. 10.

[70] S. Josemaria, Cristo que passa, n. 149.

[71] Bento XVI, Homilia na Missa de início do ministério petrino, 24-IV-2005.

[72] Concílio Vaticano II, Decr. Apostolicam actuositatem, n. 28.

[73] Cfr. Bento XVI, Encíclica Caritas in veritate, 29-VI-2009, n. 29; Discursos de 19-X-2006, 11‑VI‑2007, 12-III-2010, 24-IX-2011, entre outros.

[74] João Paulo II, Ex. ap. Ecclesia in Europa , 28-VI-2003, n. 49.

[75] S. Tomás de Aquino, Exposição sobre a Ética a Nicómaco , IX, 14.

[76] S. Josemaria, Carta 9-I-1932 , n. 75.

[77] S. Josemaria, Carta 30-IV-1946 , n. 71.

[78] Bento XVI, Ex. ap. Verbum Domini, 30-IX-2010, n. 48.

[79] Bento XVI, Ex. ap. Verbum Domini, 30-IX-2010, n. 74.

[80] Bento XVI, Ex. ap. Verbum Domini, 30-IX-2010, n. 74.

[81] S. Josemaria, Amigos de Deus, n. 314.

[82] S. Josemaria, Notas de uma reunião familiar, abril de 1951.

[83] S. Josemaria, Cristo que passa, n. 105.

[84] Carta , 28-XI-2002, n. 11.

[85] João Paulo II, Ex. ap. Ecclesia in Europa , 28-VI-2003, n. 50.

[86] S. Josemaria, Notas de uma reunião familiar, 15-IV-1973.

[87] Bento XVI, Discurso à Cúria Romana, 21-XII-2009.

[88] S. Josemaria, Caminho , n. 334.

[89] João Paulo II, Encíclica Laborem exercens , 14-IX-1981, n. 24.

[90] S. Josemaria, Homilia Amar o mundo apaixonadamente, 8-X-1967 (em Temas Actuais do Cristianismo , n. 114).

[91] S. Josemaria, Notas de uma reunião familiar, 30-VIII-1961.

[92] S. Josemaria, Notas de uma reunião familiar, 10-IV-1969.

[93] S. Josemaria, Caminho, n. 335.

[94] S. Josemaria, Carta 15-X-1948 , n. 18.

[95] S. Josemaria, Carta 15-X- 1948, n. 31.

[96] Carta, 1-VI-1999.

[97] S. Josemaria, Carta 31-V-1943 , n. 1.

[98] S. Josemaria, Temas Actuais do Cristianismo , n. 19.