Áudio de Mons. Ocáriz: “Preparar o Advento, o presente do novo Natal”

Meditação do prelado do Opus Dei sobre o Advento. Neste áudio, considera os efeitos do “Fiat” de Nossa Senhora – “assim seja”– e como Ela se preparou para receber o seu Filho.

«Preparai os caminhos do Senhor, endireitai as suas veredas» (Mc 1, 3). A liturgia do Advento propõe-nos estas palavras de Isaías – proféticas – relativas a João Batista, como também podemos ver no Evangelho. O Advento é uma espera e preparação, não uma espera passiva, mas uma preparação para a vinda do Senhor.

Celebraremos no Natal, precisamente, a Encarnação, o Nascimento do Filho de Deus feito uma criança, para nós. Já nos vamos preparando para contemplar este ministério extraordinário que é uma manifestação, acima de tudo, do amor de Deus por nós, da doação do Senhor por nós. Aquele que é omnipotente, que é o Criador, o Infinito, quer tornar-se uma criança pequena para nós e por nós.

Temos de nos ir preparando para receber este dom de Deus com enorme gratidão, com a novidade que o Natal nos propõe uma vez mais todos os anos. Também sabemos bem que a liturgia do Advento se refere à segunda vinda do Senhor no fim dos tempos, que, de alguma forma, é antecipada para cada pessoa com a sua própria morte, com o fim da passagem pela terra. Algo que não nos deve assustar, mas que também nos deve fazer sentir a nossa própria vida como uma preparação, como um Advento: que o Senhor virá para nos levar. Toda a nossa existência é, de certa forma, um tempo de espera até àquele dia em que Jesus virá para nos levar para junto de si.

Um tempo de espera ativa. A nossa viagem até Belém tem de ser uma procura de Jesus em todas as dimensões da nossa vida quotidiana. Mas para isso devemos «endireitar os seus caminhos». O que significa «endireitar os seus caminhos»? Significa, para nós, remover os obstáculos à vinda do Senhor para nós, para as nossas almas, para a nossa vida.

E que obstáculos encontramos? Muitos. Cada um de nós pode ver: o que há na minha vida que é, de alguma forma, um obstáculo para que o Senhor venha? Por outras palavras, o que me impede de abrir a minha alma, o meu dia, a minha vida normal para que o Senhor possa entrar mais plenamente com a sua força, com a sua graça, com o seu bem, com a sua alegria? Ou seja, tudo pode ser resumido num grande obstáculo, que é o nosso próprio "eu", o orgulho com que teremos sempre de lutar, sem nos desanimarmos, quando o vemos erguer-se.

É, de facto, uma conversão. Uma conversão que é, sim, fruto dos nossos esforços, mas acima de tudo, da graça de Deus. Uma graça de Deus que tem de nos dar luz para vermos onde temos de melhorar, onde temos de abrir mais o caminho para a vinda do Senhor na nossa vida. E, ao mesmo tempo, a força que o Senhor nos concede com a sua graça, para que possamos realizá-la, para que possamos corresponder.

Portanto, ver as nossas limitações, os nossos limites, não deve desanimar-nos. Tem de nos dar, de alguma forma, alegria, não porque sejam limites, mas porque são uma luz que nos permite melhorar, que nos permite estar mais abertos ao dom de Deus. E sobretudo, ver esta graça de Deus, esta luz de Deus como fruto, como consequência, de algo tão grande como o amor omnipotente de Deus por cada um de nós, que agora se manifesta para nós nesta vinda - que esperamos, para a qual nos preparamos ativamente - de Deus feito uma criança para nós e para nós.

Meditar na vinda do Senhor leva-nos logicamente também a pensar na Eucaristia, porque é onde encontramos toda a força – cada dia, se quisermos todos os dias – para abrir a nossa alma àquela vinda que já é uma realidade plena em comunhão, que, como diz um Padre da Igreja, especificamente S. Leão Magno, num texto que a liturgia por vezes também recolhe, «a participação no corpo e no sangue de Cristo não faz mais do que fazer de nós aquilo que recebemos»[1]. Identifica-nos com Jesus Cristo, porque esta “abertura dos caminhos”, esta “retificação dos caminhos”, esta “preparação para a vinda do Senhor”, está a preparar-nos para nos identificarmos com Ele. E nós fazemo-lo fundamentalmente na Eucaristia – Ele fá-lo na Eucaristia! – de modo a que esta identificação seja real, para que o nosso pensamento esteja de acordo com o pensamento do Senhor, para que as nossas reações às pessoas ou às circunstâncias sejam as mesmas que o Senhor tem.

Podemos identificar-nos com Jesus Cristo, também durante o Advento, pensando na simplicidade do Menino, na disponibilidade do Menino, em deixar-se tratado por quem? Por nenhuma outra senão pela Santíssima Virgem.

E assim entramos noutro aspeto que gostaria de fazer objeto da nossa oração, para pedir a Nossa Senhora, pedimos-lhe agora, que nos acompanhe nesta grande solenidade da Imaculada Conceição. Na verdade, acompanhemos a nossa Mãe a caminho de Belém para encontrar Jesus Cristo – novamente considerado, contemplado – como uma expressão do seu amor infinito feito um Menino para nós.

Ela, Maria, concebida sem mancha, cheia de graça. É assim que o Arcanjo a saúda na Anunciação: «Salve, cheia de graça» (Lc 1, 26). Mais tarde, dirá também "Maria" quando disser «não temas, Maria» (Lc 1, 30), mas a saudação é como se fosse o seu próprio nome: “Cheia de graça”. “Cheia de graça”, o que é isso? O seu significado original é: completamente transformada pela graça. É assim que a contemplamos, sabendo também que Ela é nossa Mãe, Mãe de Deus desde o momento da Encarnação e nossa Mãe.

[Esta cena] fez S. Josemaria exclamar – com uma admiração que queremos fazer nossa: «Mais do que Tu, só Deus». Olhando para Nossa Senhora, diremos: “Mais do que Tu, só Deus”. Ela recebe uma vocação surpreendente. Pergunta para saber do que se trata. E quando o Anjo lho explica, dá a resposta de dedicação total: Fiat!, “Faça-se”. «Faça-se em mim segundo a vossa Palavra» (Lc 1, 38).

O primeiro Advento é já a expectativa do nascimento do Senhor, a partir do momento em está no seu ventre virginal. Nesta resposta de Nossa Senhora vemos – como o Papa Francisco disse numa homilia – que a plenitude da graça transforma o coração, e torna-o capaz de realizar aquele grande ato, o Fiat! de Nossa Senhora, que vai mudar a história da humanidade (Francisco, 08/12/2015). Essa palavra: "faça-se".

Também nós devemos responder ao Senhor desta forma: "Faça-se". Porque todos nós temos uma vocação muito precisa. S. Paulo, num texto – que certamente muitos ou todos nós teremos meditado alguma vez – da Epístola aos Efésios, diz que o Senhor Deus «nos escolheu antes da criação do mundo para sermos santos e imaculados na sua presença, no amor» (Ef 1, 4).

Esse texto latino é interessante, porque quando diz "sem mancha", embora signifique a mesma coisa, diz: "imaculados". Nós "imaculados" não somos realmente imaculados, mas chama-nos para que cheguemos a ser imaculados. E como? Por amor, diz ele. Através do amor... Portanto, o chamamento universal à santidade que São Josemaria sempre proclamou, e que o Concílio Vaticano II assumiu solenemente, não é uma santidade de não ter defeitos, de ser super-perfeito, ou de estar num museu... É antes uma santidade que consiste no amor, na plenitude do amor. Porque seremos capazes, com a graça de Deus, de amar cada vez mais a Deus, apesar das nossas limitações, apesar de ainda termos defeitos e limitações: amar a Deus e amar os outros.

Bento XVI, na sua encíclica “Deus Caritas est”, perguntou: é possível amar a Deus a quem não vemos? Certamente, ele poderia ter feito uma apresentação filosófica e teológica para responder a esta pergunta, mas limitou-se à resposta sintética fundamental: é possível amar a Deus a quem não vemos? Na realidade, "Deus tornou-se visível em Jesus Cristo". É para lá que nos devemos dirigir: para contemplar o Senhor, Jesus Cristo, no Evangelho, na nossa própria oração pessoal. Porque desta forma teremos também a força para amar mais os outros, e também para imitar a Santíssima Virgem.

É impressionante como, imediatamente após a Anunciação, imediatamente após ter-se tornado, com essa fé, a Mãe de Deus, a primeira coisa que lhe ocorre é pensar na sua prima. Porque o anjo lhe tinha dito que a sua prima estava à espera de uma criança, mas não lhe tinha dito para ir vê-la. Isso foi um sinal da omnipotência de Deus, porque ela era prima na sua velhice. E Nossa Senhora percebeu imediatamente que a sua prima precisaria de ajuda e põe-se a caminho. E Ela parte, não só para a cumprimentar, para ficar durante algumas horas ou alguns dias. Ela permanece meses, meses...!

Peçamos a Nossa Senhora que nos obtenha do Senhor uma graça que nos leve primeiro a descobrir as necessidades dos outros, e depois a ter a decisão, o desejo e a eficácia de servir, de ajudar, de sentir as necessidades dos outros como as nossas.

E vemos a Virgem Imaculada, fruto desta plenitude de graça, como aquela que sabe descobrir as necessidades em Caná. O Senhor, os seus discípulos e Nossa Senhora são convidados para esse casamento. Nossa Senhora é a única que percebe que falta o vinho. Podemos dizer: é uma coisa tão material.…, mas era importante para os noivos, para que eles não ficassem mal. Nossa Senhora descobre até mesmo essas pequenas coisas e é por amor, pela sua plenitude de graça.

Mãe, não temos uma plenitude de graça, mas com a tua ajuda queremos assemelhar-nos a ti para podermos assemelhar-nos mais a Jesus Cristo. Preparemo-nos para receber neste Advento o presente do novo Natal, fazendo da nossa vida um presente para os outros, e especialmente para aqueles que mais precisam. Há tantas pessoas que vivem sozinhas, tantas pessoas doentes, pessoas isoladas, tantas pessoas que, devido à pandemia, estão a sofrer graves dificuldades económicas, nas suas famílias.

Recorremos à mediação materna de Maria, para que Ela nos guie com José também no nosso caminho para Belém, para aquele constante encontro pessoal com Jesus Cristo.


[1] S. Leão Magno, Sermão 12 sobre a paixão do Senhor, 3, 7: PL 54, 357.