“Aprendo muito com os meus doentes”

A Doutora Purificação de Castro trabalha no departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Clínica Universitária de Navarra

Quando era estudante, um belo dia foi a um Centro da Obra para conhecer o Opus Dei. É com essa mesma atitude de abertura que todos os dias se aproxima dos seus doentes, de quem aprende a olhar para a vida e para a morte com serenidade.

Conheci o Opus Dei, era ainda miúda. Conhecia-o mal, ou pelo menos, com uma certa controvérsia, porque juntamente com o convencimento de que tinha que ser algo bom, por ser uma instituição da Igreja, ouvia também comentários negativos: “só interessam os espertos…”,são misteriosos...” e sobretudo um aviso:“Cuidado... que têm muito gancho!”

Quando estudava Medicina em Santiago, convidaram uma amiga minha para uma meditação. Ela não queria ir, mas eu animei-a: “Vou contigo e vamos verificar como é a Obra”. Fiquei impressionada porque o sacerdote que dirigia a meditação, ao mencionar Deus, fazia um gesto com a mão para o Sacrário. Pensei: “este sacerdote acredita realmente que Jesus Cristo está no Sacrário... é um bom sítio para me formar e procurar ajuda espiritual”.

Ninguém me convidou, fui por minha conta e depois continuei a ir. Ia conhecendo aspectos do espírito e das actividades da Obra em Espanha e noutros países.

"Em muitas ocasiões, são os próprios doentes que me consolam a mim, vejo-os tão serenos e tão fortes, que penso que é impossível que eles sozinhos tenham tanta fortaleza, têm que ter Deus muito perto"

Pedi a admissão. Ser do Opus Dei implica que há que esforçar-se por trabalhar muito bem. Na minha profissão, por vezes, não é fácil fazer as coisas bem. Trata-se de atender pessoas que estão a passar um mau bocado, e embora se queira fazê-lo bem, às vezes não se é oportuno e não se sentem compreendidos. Costumo dizer aos jovens médicos que trabalham comigo: “temos que querer fazer as coisas muito bem para que saiam razoavelmente, porque se não nos esmeramos, saem seguramente mal”. Além disso, a delicadeza no convívio – que deriva da caridade – é um dos ensinamentos mais genuínos de São Josemaria que, no caso dos doentes, dizia: “são Cristo, na cruz!”

Estar doente não é apenas padecer os sintomas e limitações físicas ou psíquicas de uma doença. Pode implicar não poder trabalhar, não poder ter a mesma vida social, haver perdas económicas, dificuldades familiares, incompreensões. Se surge uma oportunidade, aos doentes que têm fé, ainda que muito débil, digo-lhes o que digo a mim própria: “O Senhor sabe o que te está a acontecer; Ele é a única pessoa que te pode compreender e consolar verdadeiramente e não deixes que se perca nada do teu sofrimento, aceita-o e oferece-o pelo que aches mais necessário”. Se não têm fé e se vier a jeito, digo-lhes que vou rezar por eles e peço-lhes que digam a Jesus que receba as suas dores. Muitas vezes são os próprios doentes que me consolam a mim, vejo-os tão serenos e tão fortes, que penso que é impossível que eles sozinhos tenham tanta fortaleza, têm que ter Deus muito perto.

Actualmente existe uma grande pressão sobre a eutanásia que tem origem em raízes ideológicas e económicas claras e é promovida por pessoas sãs. Os doentes, o que querem é curar-se – ou pelo menos melhorar – e viver. Outra coisa muito diferente é que a morte é inevitável. Então o que há a fazer é ajudar a que esse duro momento pessoal e familiar tenha lugar no ambiente mais sereno possível.  

Clínica Universitaria de Navarra

A morte das pessoas verifica-se em circunstâncias muito variadas. Se estão conscientes até aos últimos momentos, a Medicina pode conseguir que não tenham dor nem sintam dificuldades respiratórias (isto é ajudar a morrer). Se os danos causados por uma doença são lentos, a Medicina paliativa tem recursos para aliviar os sintomas, de modo que a situação se torne tolerável. A morte é um transe duro para o doente e a família.

Costumo dizer aos alunos que a Medicina o mais que pode conseguir é uma morte serena. A alternativa real à eutanásia é aprender a viver contando com a própria morte e a das pessoas a quem mais queremos. A eutanásia pretende solucionar o modo de morrer, mas o problema não é esse, isso soluciona-o a medicina. Penso honradamente que a esperança cristã na outra vida é a única resposta válida para o sem sentido que suporia nascer para desaparecer.