14. Como foram escritos os evangelhos?

A Igreja afirma sem vacilar que os quatro evangelhos canónicos “transmitem fielmente as coisas que Jesus, Filho de Deus, realmente operou e ensinou (...), durante a sua vida entre os homens” (Concilio Vaticano II, Constituição Dogmática Dei Verbum, n. 19). Estes quatro evangelhos “têm origem apostólica. Pois aquelas coisas que os Apóstolos por mandato de Cristo pregaram, foram depois, sob inspiração do Espírito Santo, transmitidas por escrito por eles mesmos e por homens do seu grupo, como fundamento da fé” (ibidem, n. 18). Os escritores cristãos antigos interessaram-se em explicar como é que os evangelistas realizaram este trabalho. Santo Ireneu, por exemplo, diz que «Mateus publicou entre os hebreus, na sua própria língua, uma forma escrita do evangelho, enquanto Pedro e Paulo, em Roma, anunciavam o evangelho e fundavam a Igreja. Foi depois da sua partida que Marcos, o discípulo e intérprete de Pedro, nos transmitiu também por escrito o que tinha sido pregado por Pedro. Lucas, companheiro de Paulo, consignou também num livro o que tinha sido pregado por este. Depois João, o discípulo do Senhor, o que se tinha reclinado sobre o seu peito (Jo 13, 23), publicou também o evangelho enquanto residia em Éfeso» (Contra as heresias, III, 1, 1). Comentários muito semelhantes encontram-se em Papias de Hierápole ou Clemente de Alexandria (cf. Eusébio de Cesareia, Hist. Eccl., 3, 39, 15; 6, 14, 5-7): os evangelhos foram escritos pelos Apóstolos (Mateus e João) ou por discípulos dos Apóstolos (Marcos e Lucas), mas sempre recolhendo a pregação do evangelho por parte dos Apóstolos.

A exegese moderna, com um estudo muito minucioso dos textos evangélicos, explicou de maneira mais pormenorizada este processo de composição. O Senhor Jesus não enviou os seus discípulos a escrever, mas a pregar o evangelho. Os Apóstolos e a comunidade apostólica procederam desse modo, e, para facilitar a actividade evangelizadora, puseram parte desses ensinamentos por escrito. Finalmente, no momento em que os apóstolos e os da sua geração começaram a desaparecer, “os autores sagrados escreveram os quatro evangelhos, escolhendo algumas coisas dentre as muitas transmitidas por palavra ou por escrito, sintetizando algumas, ou explicando outras segundo o estado das Igrejas” (Dei Verbum, n. 19).

Portanto, pode concluir-se que os quatro evangelhos são fiéis à pregação dos Apóstolos sobre Jesus e que a pregação dos Apóstolos sobre Jesus é fiel ao que Jesus fez e disse. Este é o caminho pelo qual podemos dizer que os evangelhos são fiéis a Jesus. De facto, os nomes que os antigos escritos cristãos dão a estes textos, “Recordações dos Apóstolos”, “Comentários, Palavras sobre (de) o Senhor” (cf. São Justino, Apologia, 1, 66; Diálogo com Trifão, 100), apontam para este significado. Com os escritos evangélicos temos acesso ao que os Apóstolos pregavam sobre Jesus Cristo.

 

Bibliografia: G. Segalla, Panoramas del Nuevo Testamento, Verbo Divino, Estella 2004; P. Grelot, Los evangelios, Verbo Divino, Estella 1984; R. Brown, Introducción al Nuevo Testamento, Trotta, Madrid 2002; V. Balaguer (ed.), Comprender los evangelios, Eunsa, Pamplona 2005; M. Hengel, The four Gospels and the one Gospel of Jesus Christ : an investigation of the collection and origin of the Canonical Gospels, Trinity Press International, Harrisburg 2000.

Vicente Balaguer