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Desde pequena, esta escultora, natural de Barcelona, foi cativada pela arte. Os seus pais levavam-na a uma atividade extraescolar de desenho e pintura.
Para ela, o desenho é “o essencial, em todas as artes plásticas”. Define-se como uma artista plástica multidisciplinar em constante formação. Ultimamente interessou-se pelo mundo do ferro e “desde há algum tempo – explica – vou à ferraria de Espluga de Francolí, onde se encontra um dos poucos ferreiros artísticos que nos restam”.
Rebeca Muñoz tem um percurso bastante eclético porque está sempre à procura de “novos desafios, explorando novas formas de me expressar. Fui expressionista, agora sou realista, sempre em busca de coisas novas. A viagem é, por si mesma, interessante. A escultura leva-nos a ver tudo sob muitos pontos de vista – é uma visão poliédrica – e a trabalhar as três dimensões e os materiais”.
Arte e fé de mãos dadas
Quando lhe perguntamos como chegou à arte religiosa, responde-nos evocando laços familiares. “Tinha uma tia que conheceu o Beato Pere Tarrés e um dia, em 2005, falou-me de um concurso organizado pela Ordem dos Médicos, no âmbito do ano Tarrés, que dava a possibilidade de fazer uma escultura daquele Beato”. Ganhou o primeiro prémio. Atualmente, esta escultura do Beato Tarrés pode ser vista nos jardins do seminário de Barcelona.
E como é que chegou a São Josemaria? “Conheci-o pela primeira vez quando me encomendaram uma escultura dele para a igreja de São Julià de Lòria”. O arquiteto, Joan Coma, que conheceu pessoalmente São Josemaria, e Jordi Piferrer, da Associação de Amigos do Caminho de Pallerols a Andorra, um dia visitaram Rebeca no seu atelier. Chegaram com uma fotografia de São Josemaria, de Català Roca, e um livro sobre a passagem dos Pirenéus. Fruto da visita, veio à luz uma escultura de São Josemaria em oração, com os olhos fixos no Santíssimo Sacramento, que se encontra no antigo retábulo da igreja paroquial de São Julià, onde se encontra o primeiro sacrário diante do qual São Josemaria pôde rezar quando chegou a Andorra em 1937.
A característica do fundador do Opus Dei que Rebeca Muñoz destaca em primeiro lugar é a simpatia que transmite. Recorda especialmente algumas episódios extraídos do livro sobre a Passagem dos Pirenéus. Concretamente, comenta que “quando um dos expedicionários estava doente e não se sentia com forças para continuar a viagem – refere-se a Tomás Alvira, o primeiro Supranumerário do Opus Dei – e o chefe da expedição dá ordem para o abandonarem, São Josemaria convence o guia a não o fazer e dá a sua palavra de que todos os membros do grupo o ajudarão a continuar”. E assim foi. Conta outros episódios divertidos “como o que ocorreu da primeira vez que São Josemaria se confessou e lhe deram como penitência comer um ovo estrelado. Temos uma ideia de como é a pessoa, mas os pequenos episódios refletem-na melhor porque surgem da espontaneidade”.
Pesquisa e diálogo para uma escultura que comunique
Em palavras de Bento XVI dirigidas aos artistas, «uma função essencial da verdadeira beleza, já sublinhada por Platão, consiste em dar ao homem um saudável “abanão”, que o faz sair de si mesmo, o arranca da resignação, da comodidade do dia a dia e inclusive o faz sofrer, como um dardo que o fere, mas, precisamente assim, o “desperta” e lhe reabre os olhos do coração e da mente, dando-lhe asas e impulsionando-o para o alto».
Rebeca Muñoz ratifica-as porque, segundo ela, a beleza da obra artística de carácter religioso deve convidar à transcendência. “Na escultura em geral procura-se a beleza com maiúscula, mas na escultura religiosa esta deve comunicar e, ao mesmo tempo, ajudar a transcender. Uma vez terminada a escultura, o artista desaparece e abre-se um canal de comunicação entre o crente e o que transcende, o que, por outro lado, complica bastante o trabalho do artista”.
Para dar vida a uma escultura como o alto-relevo de São Josemaria e do Beato Álvaro em Montserrat, foi necessário muito trabalho prévio. Tem de se “investigar sobre a pessoa de quem se vai fazer a escultura e representar um pouco quem era. Pessoalmente, trabalho muito a personagem. São necessárias muitas fotografias, devido ao volume, e também o que nos contam e os escritos pessoais ou os testemunhos vivos que nos transmitam visões da personagem... Procuro escolher uma característica e centrar-me nela. São Josemaria era uma pessoa muito simpática, com dom de gentes; o Beato Álvaro, mais tímido, uma pessoa mais recolhida, com um sorriso muito doce, sempre em segundo plano, mas ambos se compensavam mutuamente. Isto deve plasmar-se na escultura”.
A cada um comunicará algo diferente, porque a relação que se estabelece entre a obra e o observador é pessoal. “A quem a olhar, deve comunicar algo; entre o crente e a figura há algo que transcende. Não deve ser apenas uma imagem estética exteriormente; deve estar viva por dentro; há esculturas que nascem mortas. Não têm de ser hiper-realistas, mas precisam de ter uma força de dentro para fora”.
Rebeca fez várias imagens de São Josemaria e comenta que “cada imagem que fiz dele é diferente, mas a pessoa é a mesma. As de Sonsoles, em Las Rozas e de Sant Julià de Lòria convidam ao recolhimento; poderíamos dizer que são mais místicas. A de Montserrat interpela mais, transmite os momentos em que ele se dirigia aos crentes. Também a imagem que fiz para a igreja de Santa Maria da Graça em Cartagena é dirigida ao crente. Gostaria que despertassem uma certa curiosidade; seria um fracasso se nos deixassem indiferentes”.
Cada escultura requer muitas horas de trabalho. Segundo Rebeca, “estabeleço uma relação muito intensa com a escultura e ao terminar, não estou satisfeita. Nunca acabaria. Sou perfecionista; por mim continuaria a fazer mudanças; às vezes, se eu vejo que não funciona, elimino o que fiz e começo do zero. É assim: estudo, visualizo a peça, crio-a e dou-a por terminada quando acho que cumpre os requisitos para não me sentir envergonhada”. E todo este processo, vivido com muita intensidade, faz com que a escultora muitas vezes se sinta ausente e às vezes perdida, mas depois, confessa, a música ajuda-a a reencontrar-se, especialmente Bach.
São Josemaria, o Beato Álvaro e Montserrat
O fundador do Opus Dei, São Josemaria, manteve ao longo da sua vida uma ligação estreita com Montserrat. A sua relação de amizade com a comunidade beneditina do mosteiro começou em dezembro de 1937, depois de ter atravessado a pé os Pirenéus até Escaldes-Engordany (Andorra), onde os monges de Montserrat se tinham estabelecido. Por outro lado, desde 1941, o Beato Álvaro, que foi o mais estreito colaborador de São Josemaria e seu primeiro sucessor, gozava também, como ele, de uma sincera amizade com o Abade Escarré e a comunidade de Montserrat. São, pois, numerosas as manifestações de amizade e afeto com a comunidade de monges de Montserrat.
Por esse motivo, a Associação de Cooperadores do Opus Dei na Catalunha propôs-se encomendar um alto-relevo que lembrasse as visitas que, tanto São Josemaria como o Beato Álvaro, fizeram em várias ocasiões a Nossa Senhora de Montserrat e também a devoção que lhe manifestavam.
O Abade de Montserrat, Padre Manel Gasch, na homilia da Missa conventual celebrada na basílica no sábado, 24 de fevereiro, pouco antes da inauguração do alto-relevo, recordou que “muitos santos passaram por Montserrat, desde Santo Inácio a São João Paulo II. E assim como há uma memória de tantos destes filhos e filhas de Deus no caminho de Sant Miquel, era importante poder acolher um relevo para testemunhar a passagem de São Josemaria e do Beato Álvaro, como peregrinos da Moreneta, servindo assim de exemplo a tantos dos seus seguidores que, a partir de hoje, o verão e o visitarão, para os apresentar também de outra maneira: como discípulos de Jesus Cristo que criaram um carisma válido para o crescimento espiritual do Povo de Deus”.
Despedimo-nos de Rebeca no seu estúdio de Belltall (Tarragona), para onde se mudou no ano 2000 com a família, que a acompanhou nesta viagem artística, para estar mais perto da natureza. Ali desfruta do ambiente, dos céus. Cada dia, um céu diferente. Vistas para leste. A luz que entra pela janela e a paisagem que lhe oferece alimentam-lhe a alma. Vê passar as estações, é um outro ritmo de vida. E está a trabalhar em novos projetos, entre eles uma escultura de outro santo que elogiava o trabalho criativo dos artistas, São João Paulo II; e outros que ainda não pode revelar.