As Filipinas têm sido recentemente anunciadas como uma das economias de crescimento mais rápido não só na Ásia mas também no mundo. Ao mesmo tempo, sofre de uma pobreza generalizada e persistente e de uma grande desigualdade de rendimentos, que fazem o país destacar-se entre os seus pares, pois isso mostra que muitos não beneficiaram da expansão das atividades económicas.
Esta realidade torna-se mais acentuada quanto mais nos afastamos dos principais centros urbanos, como Metro Manila, que fica quase 700 quilómetros a norte de Antique, uma província, no centro das Filipinas, onde vivo desde que nasci.
Sou filha de pais socialmente conscientes, que, nos anos em que éramos mais jovens, me levavam a mim e ao meu irmão a atividades simples de apoio a famílias menos favorecidas no nosso município de Hamtic e arredores.
Esta consciência social tornou-se mais profunda quando entrei em contacto com o Opus Dei em Manila, enquanto estava no segundo ano da faculdade, há mais de uma década. Impelida pelo desejo de ajudar as vítimas do supertufão Haiyan, participei, em 2013, num programa de apoio à província de Samar – que foi inesquecível e uma lição de humildade –, organizado pelo Centro de Estudos Iraya.
Apesar da destruição generalizada e da perda de vidas, os habitantes receberam-nos com sorrisos calorosos. Testemunhar a sua resiliência foi verdadeiramente inspirador. Distribuímos material escolar e alimentos. Lembro-me vivamente dos encantadores gémeos que seguravam o material escolar junto ao peito, dizendo alegremente: “Salamat po!” (Obrigado!). Cativámos as crianças com jogos e atividades artísticas. Ajudámos a pintar os telhados das casas construídas pela Fundação Gawad Kalinga.
Este desejo de servir passou para a minha vida de jovem profissional. E a minha carreira de professora pôs-me em contacto direto com crianças de famílias menos afortunadas do que a minha.

Através dos meus pais e, mais tarde, da Obra, acabei por compreender o significado daquela carta do apóstolo Tiago, que escreveu (2, 15-17): «Se um irmão ou uma irmã estiverem nus e precisarem de alimento quotidiano, e um de vós lhes disser: “Ide em paz, tratai de vos aquecer e de matar a fome”, mas não lhes dais o que é necessário ao corpo, de que lhes aproveitará? Assim também a fé: se ela não tiver obras, está completamente morta».
E São Josemaria Escrivá parecia falar deste tema quando escreveu em Forja: «Quando calcares de verdade o teu próprio eu e viveres para os outros, só então serás instrumento apto nas mãos de Deus. Ele chamou – chama – os seus discípulos, e manda-lhes: “Ut eatis!” – Ide buscar a todos» (Forja, n. 915), e «Oxalá saibas, diariamente e com generosidade, contrariar-te, alegre e discretamente, para servir e para tornar agradável a vida aos outros. Este modo de proceder é verdadeira caridade de Jesus Cristo» (Forja, n. 150).
As palestras de formação e a oração tornaram cada vez mais claro para mim que não é preciso aventurarmo-nos para longe de modo a viver plenamente de acordo com o cristianismo. Servir os outros requer, em primeiro lugar, que nos concentremos naqueles que estão imediatamente à nossa volta: a nossa família, os nossos amigos, os nossos colegas de trabalho; e estende-se aos menos afortunados que o Senhor coloca no nosso caminho.
Ut eatis
No dia 3 de janeiro de 2020, eu e cinco das minhas antigas alunas do Liceu Católico de Dao, na vila de Tobias Fornier, no sul de Antique, decidimos ir a Lawigan, uma comunidade das terras altas, em depressão económica, a cerca de 30 minutos de distância, à pendura em motocicletas, passando por uma estrada sinuosa e estreita, com declives repentinos.

É uma das muitas aldeias do país que não beneficia de infraestruturas básicas de comunicação, como antenas de telemóvel ou linhas de telefone fixo. Algumas casas não têm sequer instalações sanitárias básicas, como sanitas e água canalizada.
Nessa altura, as minhas antigas alunas já estavam na faculdade e tínhamos ficado boas amigas. Fiquei animada com o facto de terem sido elas a falar da ideia de fazer uma atividade de apoio social. Não estávamos a tentar mudar o mundo, mas a tentar fazer alguma diferença naquele pequeno canto da província onde estudámos, trabalhámos e desfrutámos da vida.
Passámos meio dia na Escola Básica de Lawigan. Aí, distribuímos cadernos, afia-lápis, lápis de cor e pastas a 30 alunos. Oferecemos-lhes lanches pagos do nosso próprio bolso. Também passámos algum tempo a brincar em jogos com as crianças.
Rosalina Serguino, a professora responsável na altura, disse-nos, encantada, que éramos o primeiro grupo de pessoas forasteiras a realizar uma atividade de apoio na escola. A gratidão e alegria nos rostos das crianças e dos habitantes mostraram-nos como até os mais pequenos gestos e presentes podem fazer uma grande diferença para estes aldeões.

O nosso impacto era visível mesmo um ano mais tarde, quando um vendedor de legumes abordou a minha mãe num mercado e perguntou no dialeto Hiligaynon: “Re, bata mo to si Ma’am Mae? Ang nagtukad bala haw sa Lawigan Elementary School imaw ka mga estudyante na? Galiwan-liwan gid pamangkot ang apo ko kun san-o pagid sanda makabalik kay nasadyahan gid tana sa andang pag-agto. Duro gid ang anang istorya kanamon pag-uli na” (Tradução: Re, a senhora Mae é sua filha? Aquela que foi à Escola Básica de Lawigan com as suas alunas? O meu neto esteve sempre a perguntar-me quando voltariam, porque ficou muito contente com a sua visita. Contou-nos muitas histórias no caminho para casa).
A vida (e o apoio) continua
Os confinamentos da comunidade durante a Covid, em 2021-2022, adiaram temporariamente os nossos planos de continuação do apoio na escola. Isso não significou que a vida tivesse parado em Lawigan. Um programa de televisão apresentou a iniciativa dos professores de proporcionar lá um "palco" de conclusão de curso, móvel, puxado por carabaos, que passou pela casa de cada aluno finalista para que tivessem as suas fotografias oficiais, mesmo quando todo o país estava nas restrições do confinamento.
Ao sair da pandemia, em dezembro de 2022, as minhas amigas e eu regressámos para uma estada noturna em Lawigan. Fomos com material escolar e com a missão de plantar 15 mudas de árvores nativas, como árvore narra, abacateiro, dao, assim como abacá. Os habitantes têm estado a cortar árvores para transformá-las em carvão ou para fazer móveis – uma fonte de subsistência muito importante para a comunidade.
As minhas amigas e eu inspirámo-nos na encíclica do Papa Francisco, de maio de 2015, Laudato Si (“Louvado Sejas”), que chamava a nossa atenção para a “indiferença” para com a natureza, que “clama contra o mal que lhe provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nela colocou”.
Lembrei-me também do que São Josemaria Escrivá redigiu sobre a criação, em Amigos de Deus: «Deus formou Adão com o barro da terra e criou para ele e para a sua descendência este mundo tão formoso, ut operaretur et custodiret illum, com o fim de o trabalhar e de o conservar».

Percebemos que, se não fizéssemos a nossa pequena parte para proteger o ambiente, não estaríamos a amar verdadeiramente as crianças, porque não estaríamos a cuidar do mundo que elas herdarão de nós. Temos a esperança de que o exemplo que deixámos na memória dos habitantes da localidade os ajude a perceber a sua ligação inerente à criação divina que os rodeia. Isto é algo que todos nós talvez tenhamos tomado por garantido durante demasiado tempo.
Apenas o início
Em janeiro de 2024, voltei a Lawigan por três dias. Entre outras coisas, queria aplicar o que tinha aprendido, na pós-graduação, sobre as diferentes formas em que os alunos aprendem e adquirem informação.
Conjugando o desejo de partilhar a minha preocupação relativa ao ambiente com as formas de aprendizagem da “inteligência múltipla”, elaborei um plano de aula que permitiu aos alunos explorar os seus pontos fortes, únicos, e apreciar melhor os recursos naturais ao seu alcance. Exploraram vários meios para criar obras de arte e artesanato, por exemplo, barro ou mesmo lama para dar forma a vasos, imagens de pedras preciosas para fazer joias, um tecido de algodão da vila vizinha de Bugasong para criar diferentes estilos de patadyong (vestidos-envelope), etc.

A eficácia deste método de ensino tornou-se evidente pelo burburinho de excitação na sala de aula enquanto os alunos trabalhavam nas suas criações e pelo orgulho com que apresentavam as suas obras perante a turma. Os alunos falaram sobre como compreenderam melhor a ligação entre os recursos naturais e o meio de subsistência das suas comunidades.
A experiência fez-me perceber que as possibilidades de responder às necessidades não satisfeitas das pessoas e do ambiente são infinitas. Apresentei o resultado da minha “experimentação” aos professores da escola como forma de partilhar os meus novos conhecimentos sobre os méritos de se ser criativo na transmissão de conhecimentos às mentes dos jovens.
Que é que se segue? Bem, os nossos esforços e a reportagem televisiva sobre a escola atraíram a atenção de doadores para Lawigan. É altura de procurar outras escolas mais necessitadas em mais zonas remotas. E essa perspetiva entusiasma-me a mim e às minhas amigas.
Se há alguma coisa a aprender com esta experiência, é que cada cristão – sendo um cidadão consciencioso – deve fazer o que pode, dados os recursos limitados, para ajudar os menos afortunados que Deus colocou ao nosso alcance. A minha fé sempre me guiou para servir os outros, mas foi nos sorrisos e nos olhos brilhantes daquelas crianças que compreendi verdadeiramente o poder transformador do apoio e serviço comunitário.
Não se tratava apenas de dar materiais ou de plantar árvores; tratava-se de cultivar corações e mentes, de nutrir uma comunidade, de inspirar outros e, em última análise, de glorificar Deus por meio da ação.