São Josemaria e a reforma litúrgica do Concílio Vaticano II (II) - o testemunho de D. Javier Echevarría

No livro “Lembrando o Beato Josemaria”, DIEL, 2000, o anterior prelado do Opus Dei (1994-2016), que esteve ao lado do fundador de 1954 a 1975, responde à pergunta: “que sucede quando entraram em vigor estas mudanças [resultantes da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II]?”

Mons. Escrivá aceitou a reforma com serenidade e obediência, ainda que as mudanças lhe exigissem muito trabalho: não por oposição ou crítica às inovações, mas porque a liturgia estava muito integrada na sua piedade, e tinha conseguido luzes para a sua vida espiritual e o seu ministério sacerdotal até de gestos que podem parecer insignificantes nas rubricas.

Eu notava o esforço que para ele representava a mudança, tendo em conta que ele levava quarenta anos a seguir o rito anterior. Mas não aceitou excepção alguma, e pedia-me diariamente que não deixasse de o advertir no que fizesse menos bem nas novas rubricas, disposto a mostrar o seu amor à liturgia, com o rito renovado.

Sem que houvesse da sua parte o menor sintoma de rebeldia da sua parte, comentava a um grupo de sacerdotes em 1968: "obedeço com submissão em tudo o que determinaram para a celebração da Santa Missa, mas sinto a falta de tantas rubricas de piedade e de amor que tiraram: por exemplo, não dou o beijo à patena, onde punha tanto amor - toda a minha alma - para que Ele o encontrasse. Mas temos de saber obedecer, vendo a mão de Deus, e tratando o Senhor com delicadeza, sem Lhe roubar nada no tempo”.

"obedeço com submissão em tudo o que determinaram para a celebração da Santa Missa, mas sinto a falta de tantas rubricas de piedade e de amor que tiraram"

Foi uma longa temporada de esforço. Se teimávamos em apresentar-lhe a possibilidade de pedir o privilégio, previsto para sacerdotes de certa idade, opunha-se: por espírito de obediência às normas eclesiásticas, proibiu que se desse um só passo nesse sentido.

Sucedeu uma vez que, estando o Pe. Álvaro del Portillo com Mons. Bugnini, falaram da nova liturgia. Comentou o Pe. Álvaro o trabalho que significava a mudança para o Fundador do Opus Dei. Mons. Bugnini perguntou: "porque não usa o privilégio?" O Pe. Álvaro esclareceu-o de que o Fundador da Obra sempre nos tinha ensinado sempre com a sua própria vida, também agora, a obedecer com submissão; "além disso – acrescentou - "proibiu-me expressamente de te pedir o que for". Mons. Bugnini pediu que lhe dissesse que tinha concedido o privilégio de celebrar a Santa Missa com o rito anterior. Insistiu o Pe. Álvaro em que não lhe pedia nada, e Mons. Bugnini reiterou: "diz a Mons. Escrivá que tu não me pediste nada, porque essa é a verdade; e acrescenta que te comuniquei que celebre como antes, porque tem essa faculdade”.

O Pe. Álvaro transmitiu-lhe este diálogo, e Mons. Escrivá de Balaguer agradeceu a possibilidade que se lhe concedia. Mas, desde então, quando a utilizava, não quis que assistisse à Missa mais que a pessoa que o ajudava.


D. Javier Echevarría (1995-2016)

Javier Echevarría nasceu em Madrid no dia 14 de junho de 1932. Era o mais novo de oito irmãos. Fez os primeiros estudos em San Sebastián, no colégio dos padres marianistas, e continuou a sua formação na capital de Espanha, no colégio dos irmãos maristas.

Em 1948, conheceu alguns jovens do Opus Dei numa residência de estudantes. No dia 8 de setembro desse ano, sentindo-se chamado por Deus a procurar a santidade na vida quotidiana, pediu a admissão no Opus Dei. Começou os estudos de Direito na Universidade de Madrid e continuou-os em Roma. Doutorou-se em Direito Canónico na Pontifícia Universidade de S. Tomás, em 1953, e em Direito Civil na Pontifícia Universidade Lateranense, em 1955. No dia 7 de agosto desse ano recebeu a ordenação sacerdotal.

Colaborou estreitamente com S. Josemaria Escrivá de Balaguer, de quem foi secretário desde 1953 até à sua morte, em 1975. Quando em setembro desse ano Álvaro del Portillo sucedeu a S. Josemaria, Mons. Javier Echevarría foi nomeado secretário-geral do Opus Dei e, em 1982, vigário geral. Em 1994, após o falecimento do beato Álvaro, foi eleito prelado do Opus Dei e, no dia 6 de janeiro de 1995, na basílica de S. Pedro, foi ordenado bispo por S. João Paulo II.

Desde o princípio do seu ministério como prelado, teve como prioridades a evangelização nos campos da família, da juventude e da cultura. Promoveu o início estável das atividades formativas da prelatura em 16 países, entre outros, Rússia, Cazaquistão, África do Sul, Indonésia e Sri Lanka, e viajou aos cinco continentes para impulsionar a tarefa evangelizadora dos fiéis do Opus Dei e das pessoas que participam nos seus apostolados. Encorajou o início de numerosas iniciativas de promoção social e de cuidados de saúde, especialmente entre pessoas desfavorecidas. Acompanhava com especial interesse algumas iniciativas relacionadas com o atendimento a doentes e imigrantes.

Nas suas viagens de catequese e no seu ministério pastoral, foram temas recorrentes o amor a Cristo na cruz, a caridade fraterna, a importância da graça e da palavra de Deus, a união ao Papa, a vida familiar e o serviço aos outros. Escreveu numerosas cartas pastorais e vários livros de espiritualidade, como Itinerários de vida cristã (2001), Para servir a la Iglesia (2001), Getsemaní (2005), Eucaristia e vida cristã (2005), Viver a Missa (2010) y Creo, creemos (2014). A sua última publicação é uma recompilação de meditações sobre as obras de misericórdia com o título de Misericordia y vida cotidiana (2016).

Foi membro da Congregação para as Causas dos Santos e do Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica. Participou nos sínodos de bispos de 2001, 2005 e 2012 e nos dedicados à América (1997) e à Europa (1999).

Faleceu em Roma no dia 12 de dezembro de 2016, devido a uma insuficiência respiratória.