São Josemaria e a reforma litúrgica do Concílio Vaticano II (I) - o testemunho do Beato Álvaro del Portillo

No livro “Entrevista sobre o Fundador do Opus Dei”, Quadrante, 1994, o primeiro sucessor de São Josemaria e que viveu perto do fundador desde 1935 a 1975, responde à pergunta: “como é que o Padre acolheu a reforma litúrgica determinada pelo Concílio?”

Como sempre, aplicou com obediência e fortaleza todas as disposições sobre essa matéria. Graças à solicitude do seu Fundador, o Opus Dei foi exemplo de fidelidade também no que se refere à práxis litúrgica.

Encarregou alguns sacerdotes da Obra de examinar as diversas possibilidades previstas pela reforma e de determinar e explicar como se aplicavam. Orientou pessoalmente este trabalho e aprovou os resultados. Desta forma, todos os sacerdotes da Obra começaram a aprender as novas rubricas, seguindo o desejo do Santo Padre de que "a Constituição conciliar sobre a Sagrada Liturgia seja posta em prática na sua plenitude e com todo o cuidado" (Carta enviada em nome do Papa a todos os bispos e outros superiores eclesiásticos, junto com o livro Jubilate Deo, 14 de Abril de 1974).

Foi o primeiro a obedecer às novas disposições litúrgicas e esforçou-se por aprender o novo rito da Missa

Foi o primeiro a obedecer às novas disposições litúrgicas e esforçou-se por aprender o novo rito da Missa. Havia muitos anos que outro sacerdote o ajudava habitualmente a Missa: a partir dos anos cinquenta, era o Pe. Javier Echevarría ou eu. Quando se introduziram as mudanças litúrgicas, pediu-nos que não deixássemos de lhe fazer todas as observações que nos parecessem oportunas para o ajudar a aprender bem o novo rito. Mas, apesar da sua boa vontade, notávamos que isso lhe exigia um considerável esforço, porque tinha de mudar hábitos de devoção litúrgica adquiridos durante muitos anos de luta perseverante cheia de amor de Deus.

Eu perguntava-me como poupar ao Padre estas dificuldades, e, na sua presença, mencionei de passagem que outros sacerdotes mais jovens tinham sido autorizados a seguir o rito de S. Pio V e a celebrar a Missa como haviam feito até então. O Padre interrompeu-me imediatamente: afirmou que não queria nenhum privilégio, e proibiu-me de fazer esse pedido. Sabia que eu me dava com as pessoas que estavam a elaborar as novas disposições litúrgicas.

Algum tempo depois, encontrei-me com Mons. Annibale Bugnini, que era o máximo responsável nesse campo e meu bom amigo, tanto que nos tratávamos por tu. Falámos da dificuldade que experimentavam alguns sacerdotes anciãos em adaptar-se ao novo rito, depois de haverem celebrado a Santa Missa pelo rito antigo durante muitos anos; era uma situação conhecida. De passagem, aludi ao caso do nosso Padre, que obedecia de modo exemplar e com profunda alegria. Bugnini disse-me que o Fundador do Opus Dei não tinha por que fazer um esforço desse género, já que muitos outros sacerdotes tinham licença para celebrar pelo rito anterior e ele próprio havia acedido a pedidos similares de pessoas que estavam nessas circunstâncias. Embora eu já lhe tivesse dito que o nosso Fundador não queria outro privilégio senão o de obedecer sempre à Santa Sé, e que até me proibira de pedir qualquer coisa, ele empenhou-se em conceder-me a licença para o nosso Fundador e insistiu-me em que lhe referisse como se dera a nossa conversa.


Beato Álvaro del Portillo (1975-1994)

Álvaro del Portillo nasceu em Madrid no dia 11 de março de 1914. Pertenceu ao Opus Dei desde 1935. Fez parte do conselho geral do Opus Dei de 1940 a 1975; de 1940 a 1947 e de 1956 a 1975 foi secretário geral. Foi ordenado sacerdote em 25 de junho de 1944. Doutorou-se em Engenharia Civil, em História (na Faculdade de Filosofia e Letras) e em Direito Canónico.

Tornou-se muito cedo um dos principais apoios do fundador e foi o seu colaborador mais próximo até ao fim da sua vida. Nomeado consultor de diversos organismos da Santa Sé, trabalhou no Concílio Vaticano II, primeiro como presidente da Comissão ante preparatória para o laicado e depois como secretário da Comissão para a disciplina do clero e como consultor de outras comissões. Os seus livros Fiéis e leigos na Igreja (1969) e Escritos sobre o sacerdócio (1970) são, em boa parte, fruto dessa experiência. Colaborou também na elaboração do novo Código de Direito Canónico, promulgado por S. João Paulo II em 1983.

Em 1975, foi eleito para suceder a Josemaria Escrivá. Quando o Opus Dei foi erigido em prelatura pessoal, o Santo Padre nomeou-o prelado. No dia 6 de janeiro de 1991, foi ordenado bispo por João Paulo II.

Durante os seus dezanove anos à frente do Opus Dei, o trabalho da prelatura ampliou-se a vinte novos países. Em 1985, fundou em Roma o Centro Académico Romano da Santa Cruz, embrião da atual Universidade Pontifícia da Santa Cruz.

Morreu em Roma no dia 23 de março de 1994. O Papa João Paulo II deslocou-se para rezar junto dos seus restos mortais. Foi beatificado no dia 27 de setembro de 2014 em Madrid, a sua cidade natal. «Destacava-se especialmente o seu amor à Igreja», escreveu o Papa Francisco na mensagem que preparou para a ocasião.