Que é isso de “santificar o estudo”?

A santificação do trabalho, do estudo é central no ensinamento de São Josemaria. Mas em que consiste concretamente? Como se faz e que é que se consegue?

Dois rapazes a estudar. Capa do artigo sobre a santificação do estudo

O começo duma história muitas vezes repetida

Através dalgum mecanismo que talvez não cheguemos a compreender bem, costuma acontecer que os primeiros momentos das histórias que formam a nossa vida ficam guardados na nossa memória com uma força especial, que faz com que os possamos reviver com facilidade.

A primeira vez que fomos a um Centro do Opus Dei pode muito bem ser uma dessas histórias. Cada um, cada uma guarda com certeza as suas próprias recordações. Mas, apesar dessa quase interminável variedade de experiências, quando alguém partilha connosco aquelas primeiras impressões, não é raro reagirmos com uma certa admiração: como eu!


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Sim; como eu. A todos talvez nos surpreendesse esse modo de tratar o Senhor no Sacrário, mistura de reverência sobrenatural, carinho e proximidade humana que nos cativou: “este é o lugar mais importante: o Oratório; por isso cumprimentamos o Senhor ao chegar e despedimo-nos d’Ele quando saímos”.

Da mesma maneira, não deixaria de nos surpreender, enquanto nos mostravam a casa, o irmo-nos encontrando com os rostos sorridentes das pessoas que lá havia; talvez pensássemos: Que se passa aqui? Há qualquer coisa diferente. Qualquer coisa que nos era difícil definir, mas que fazia com que nos sentíssemos bem. Certamente não demorávamos muito a descobrir que aquilo era mais do que um Centro, que tudo o que ali se notava se enquadrava melhor com a palavra família do que com qualquer outra; nisso consistia a tal qualquer coisa: uma família da qual todos fazemos parte. Por isso, se estava tão bem.

Chegámos à sala de estudo. Sentámo-nos, talvez com um pouco de timidez: não queríamos distrair, perturbar o silêncio e o ambiente de trabalho que se respirava ali. E então... outra surpresa! Encontrámo-nos, como é normal num lugar destinado ao estudo, com livros, computadores, apontamentos, esquemas... Vimos também os que tinham à vista, na mesa junto dos livros, um crucifixo, uma imagem de Nossa Senhora... Aquilo deixou-nos um pouco desconcertados. Talvez nunca tivéssemos visto uma imagem da Virgem ao lado duns apontamentos ou de qualquer outro material de estudo. Quando pudemos, duma maneira discreta, tentámos sair da dúvida perguntando a algum mais antigo na casa que pudesse satisfazer a nossa curiosidade: ouve lá... que é isto...?

A novidade de que o estudo é mais alguma coisa do que estudar

E então ouvimos, talvez pela primeira vez, essa expressão: isto é para nos lembrar que temos que santificar o trabalho, que agora é o estudo. Isso sim, era uma novidade. Talvez entendêssemos que o estudo era algo necessário, às vezes custoso, mas necessário, mas daí a santificá-lo... vai um grande salto.

Santificar – continuámos a pensar – tem que significar que há alguma coisa que se põe perto do Senhor... Mas na realidade isso afinal é pouco. Isso seria só uma proximidade superficial. Tem que se parecer mais... a que essa alguma coisa, o meu estudo, é para o Senhor, é do Senhor!

Era verdadeiramente uma descoberta que estávamos a fazer, algo bastante mais além do que nunca teríamos imaginado que se podia esconder no trabalho, no meu estudo.

Quatro reflexões sobre a santificação do estudo

Com o tempo, continuaríamos a avançar nessa novidade, assimilando-a, descobrindo novos aspetos do que significava incorporá-la na nossa vida.

1. Se o meu estudo é para Ele, então não me posso conformar com estudar para despachar, nem sequer para me exibir, isso seria muito parecido com enganar... o meu estudo tem que ser bem feito... o melhor que eu puder; desse modo, sim, posso dizer: Senhor, para ti.

Essa descoberta pessoal talvez a tenhamos visto confirmada quando lemos, num momento de oração, com palavras de São Josemaria, o que tínhamos intuído: «Não se pode esquecer que o trabalho humanamente digno, nobre e honesto, pode – e deve! – elevar-se à ordem sobrenatural, passando a ser uma tarefa divina»[1].

2. Uma tarefa divina... exatamente! O meu estudo já não é só algo para o Senhor, mas é divino, d’Ele, e isso só se pode alcançar se Ele me ajudar... e eu me empenhar em estudar, em trabalhar, como Ele mesmo faria. Tenho caminho pela frente... mas não desanimo, na realidade isto é... extraordinário! Não há um momento em que não possa estar com Jesus; nunca me teria passado pela cabeça. Pensava que isso só acontecia quando rezo, assisto à Santa Missa... quanto há aqui escondido, oculto, que antes não tinha sabido ver...

3. Além disso, repara: se enquanto estudas podes estar com o Senhor, isso significa que podes converter o teu estudo em algo muito parecido com uma conversa com Ele: «uma hora de estudo, para um apóstolo moderno, é uma hora de oração»[2]. Mas não te preocupes, tudo isto é parte desse algo divino que temos que ir descobrindo pouco a pouco...[3].

4. Talvez um dia, depois de muitos tempos de estudo naquele mesmo lugar, reparaste em algo que fazia parte da decoração e que já tinhas visto, mas que agora te dizia algo mais: um Crucifixo, uma imagem da Virgem e o MANDATUM NOVUM (Dou-vos um mandamento novo...)[4]. E tudo encaixou, já estavam todas as peças do puzzle: esforço, caridade, Cristo e, sempre, a companhia da nossa Mãe.

Santificar o trabalho, santificar o estudo: todo um desafio...


[1] São Josemaria, Forja, n. 687

[2] São Josemaria, Caminho, n. 335

[3] cf. São Josemaria, Entrevistas a São Josemaria, “Amar o mundo apaixonadamente”, n. 114

[4] Palavras do Senhor no Evangelho de São João que costumam presidir às salas de estudo dos Centros do Opus Dei