Lisboa: confinamento com "porta aberta"

São 7 voluntárias que “acompanham à distância” 75 pessoas. Aconselham filmes, livros, médicos, trocam receitas, falam de viagens. Uma iniciativa que nasceu do apelo do Papa Francisco na Fratelli tutti de “acompanhar, acolher e cuidar dos outros" no 75.º aniversário do Opus Dei em Portugal.

“O serviço é, em grande parte, cuidar da fragilidade. Servir significa cuidar dos frágeis das nossas famílias, da nossa sociedade, do nosso povo".

Foi a Fratelli tutti, as restrições de contactos provocadas pelo confinamento e a celebração dos 75 anos do Opus Dei em Portugal que estiveram na origem da iniciativa Porta Aberta.

Uma grande amiga minha ficou maravilhada com a Fratelli Tutti do Papa Francisco que leu muito antes de mim. Quando nos encontrávamos e, mais recentemente, quando conversávamos ao telefone (devido ao confinamento), ela mencionava sempre o documento do Santo Padre cujas ideias resumia em"acompanhar, acolher e cuidar dos outros".

Contagiou-me com o seu entusiasmo e no final de janeiro li a Fratelli Tutti num ápice. As ideias expressas e a forma como o Santo Padre as transmitia fizeram com que a lesse de uma vez só. Não consegui parar.

Contagiou-me com o seu entusiasmo e no final de janeiro li a Fratelli Tutti num ápice.

Nos primeiros dias de fevereiro quando pensávamos numa iniciativa com a qual pudéssemos celebrar os 75 anos do Opus Dei em Portugal (5 de fevereiro) e também o ano de S. José - eu em Lisboa, ela nos Açores, - surgiu, muito espontaneamente a Porta Aberta. Ambas estávamos a percecionar, quando telefonávamos a amigas e familiares, que o confinamento agravava situações de fragilidade como a solidão, a doença, o isolamento, o luto, a ansiedade, a necessidade de aconselhamento e acompanhamento. O objetivo da Porta Aberta seria continuarmos a acolher com amizade e a dar apoio, apesar do confinamento, às pessoas mais vulneráveis.

Os critérios de seleção foram a proximidade - familiares, amigos, vizinhos e conhecidos - as periferias existenciais da nossa sociedade, como as classifica o Papa Francisco: "Existem periferias que estão próximas de nós, no centro duma cidade ou na própria família".

O objetivo da Porta Aberta seria continuarmos a acolher com amizade e a dar apoio, apesar do confinamento, às pessoas mais vulneráveis.

Definimos os meios compatíveis com as restrições do confinamento: o telefone, WhatsApp, Zoom. A seguir convidámos as amigas do nosso grupo de formação semanal a aderir à iniciativa. A Graça ofereceu-se para encontrar um logótipo que identificasse a iniciativa e a Lurdes disponibilizou imediatamente os seus conhecimentos de médica para lidar com situações de maior ansiedade e fazer o encaminhamento para outros médicos, quando fosse necessário. As adesões ao projeto estão a ser feitas gradualmente de acordo com as respetivas disponibilidades e circunstâncias de vida. Cada uma elabora a sua lista e desenvolve os contactos, sentindo-se apoiadas umas nas outras.

Temos consciência de que não fazemos nada de extraordinário e nos nossos ouvidos ecoam as palavras de S. Josemaria: "A santidade não consiste em realizar coisas extraordinárias, mas em cumprir, com amor os pequenos deveres de cada dia. É fazeres o que deves e estares no que fazes."

"Cada uma elabora a sua lista e desenvolve os contactos, sentindo-se apoiadas umas nas outras"

Nalgumas situações, quando é possível, fazemos deslocações a casa das pessoas para, à porta e com as devidas proteções, emprestar livros e revistas; organizar listas e mandar entregar compras a quem não lida com as novas tecnologias; e até ajudar a atenuar situações de stress pós-traumático que são detetadas.

Uma amiga minha, por exemplo, perdeu o marido há 2 anos, e começou a conviver mais com a vizinha do lado. Ambas viúvas passavam muito tempo juntas até que, recentemente, essa vizinha morreu vítima de Covid- 19.

Lara ficou num estado de ansiedade muito grande e não queria sair à rua nem que a filha fosse lá para casa fazer-lhe companhia. Foi com muito carinho e persistência que se conseguiu que ela começasse a sair gradualmente para apanhar ar e sol e dar um passeio na área circundante da habitação que tem muitas zonas verdes pouco frequentadas.

Lara ficou num estado de ansiedade e não queria sair à rua. Com muito carinho e persistência começou a sair.

Fazemos tudo o que está ao nosso alcance para ir ao encontro das necessidades de cada pessoa. Aconselhamos filmes, livros, médicos, trocamos receitas, falamos de viagens... outras vezes, ouvimos apenas. Nesses momentos recordamos as palavras do Santo Padre: "Às vezes a velocidade do mundo moderno, o frenesim impede-nos de escutar bem o que outro diz. Quando está a meio do seu diálogo, já o interrompemos e queremos replicar quando ele ainda não acabou de falar. Não devemos perder a capacidade de escuta".

Tentamos fazer funcionar a imaginação da caridade como costumava dizer João Paulo II. A Lurdes partilhou connosco um pequeno livro digital para aprendermos atividades engraçadas que despertem a atenção de crianças mais pequenas para podermos entretê-las via Zoom e WhatsApp e ajudar assim alguns pais que estão em teletrabalho.

"Apercebi-me que havia familiares, amigos, vizinhos e conhecidos que estavam esquecidos na espuma dos dias"

Apercebi-me, através do simples facto de ter que fazer um levantamento sistematizado de pessoas com quem comunicar que havia familiares, amigos, vizinhos e conhecidos que estavam esquecidos na espuma dos dias.

E quando acabar o confinamento?

Queremos continuar a desenvolver esta iniciativa e a contaminar mais pessoas com este sonho do Papa Francisco: "Sonhemos com uma única humanidade, como caminhantes da mesma carne humana, como filhos desta mesma terra que nos alberga a todos, cada qual com a riqueza da sua fé ou das suas convicções, cada qual com a própria voz, mas todos irmãos".

Neste momento, ou seja, um mês depois de a iniciativa ter nascido, já somos 7 a acompanhar 75 pessoas. Este projeto está aberto a quem nele queira participar. Deixamos os nossos contactos!


Coordenadoras:

Marília Lima: +351 917 542 984; mae1941@gmail.com

Manuela Martins: + 351 961 447 056; manuelafigmartins@gmail.com

Voluntárias: Graça Lufinha, Luísa Francisco, Lurdes Monsanto, Margarida Freire, Mila Salgueiro