Carta do Prelado (Maio 2008)

Em Maio, D. Javier Echevarría convida a falar com a Mãe de Deus na oração, e a aprender com ela a falar com Cristo. Publicamos a sua carta mensal.

Queridíssimos: que Jesus me guarde as minhas filhas e os meus filhos!

Celebra-se hoje na Igreja universal a solenidade da Ascensão do Senhor; nalguns locais, por motivos pastorais, é transferida para o próximo Domingo. Como nos aconselhava o nosso Padre, coloquemo-nos no meio dos Apóstolos e das santas mulheres, que são testemunhas deste último mistério da vida de Jesus na terra.

É justo que a Santa Humanidade de Cristo receba a homenagem, a aclamação e a adoração de todas as hierarquias dos Anjos e de todas as legiões dos bem-aventurados da Glória [1]. Queremos unir-nos com todo o coração a essa glorificação do nosso Jesus. Sentimos a urgência de nos agarrarmos com força à graça da salvação que alcançou para nós e, conscientes de que – tal como aos Onze – também a nós nos pode censurar a nossa pouca fé [2], suplicamos-Lhe que imprima no nosso ser a grandeza de uma vida nova, a vida sobrenatural.

O Senhor deixou-nos. Foi para o Céu para nos preparar a mansão definitiva; de lá, da direita do Pai, como repete a Liturgia, a gratia Capitis, a graça da Cabeça chega a todos os membros do Corpo Místico. Antes de partir, encarregou-nos de ir por toda a parte, sem medo, sem respeitos humanos, com fé e optimismo, para difundir os seus ensina­mentos [3].

É evidente a desproporção entre o encargo recebido e as nossas forças: somos tão pouca coisa para tal empreendimento! Mas que segurança nos infunde a sua promessa de que não nos deixará sós, de que nos enviará o Espírito Santo para sermos suas testemunhas até ao último confim da terra! [4] A Ascensão do Senhor é, para cada uma e para cada um, um desafio extraordinário e uma confiança total do Céu.

Mas tu e eu sentimo-nos órfãos; estamos tristes e vamos consolar-nos com Maria [5]. Com estas palavra termina S. Josemaria o seu comentário ao segundo mistério glorioso. Vamos, pois, consolar-nos com a nossa Mãe, para que Ela nos mantenha fiéis, firmemente fiéis, neste compromisso de dar testemunho de Cristo e dos seus ensina­mentos.

Em grande parte do mundo, Maio é o mês de Maria por antonomásia. Lembro-me do entusiasmo com que S. Josemaria se preparava todos os anos para dar à sua vida, nestes dias, um tom especialmente mariano. Pensemos, desde já, que flores nos propomos oferecer a Nossa Senhora nas próximas semanas: que pormenores de piedade no trato com Jesus, seu Filho muito amado, e no trato com Ela; que mortificações no trabalho, nas relações com as outras pessoas, no cumprimento dos nossos deveres familiares, profissionais e sociais. Mesmo que nos pareçam habitualmente coisas pequenas, se as realizarmos com amor e por amor, emanarão o bonus odor Christi [6], o bom odor de Cristo que todo o cristão está chamado a difundir com o seu comportamento, para que as outras pessoas também conheçam e amem Jesus. Concretizaste já o teu plano pessoal para honrar a Senhora durante estes dias?

O mês de Maio está cheio de festas de Nossa Senhora e de recordações marianas da história do Opus Dei, que servem para avivar em nós os sentimentos filiais do nosso coração, à medida que passam os dias. Gostaria, com estas linhas, de vos ajudar nisto.

Amanhã, dia 2, é o aniversário daquela peregrinação com que S. Josemaria come­çou o costume da Romaria de Maio. Já passaram 73 anos e, desde esse dia, quantos milhares e milhares de visitas de filhas e filhos recebeu Nossa Senhora, em todo o mundo, seguindo as pegadas da que o nosso Padre fez!

Cuidemos o carácter familiar que S. Josemaria imprimiu a este Costume mariano do Opus Dei, desde o princípio. Referindo-se à peregrinação de 2 de Maio de 1935, escrevia anos mais tarde: não era uma romaria no sentido habitual. Não era ruidosa nem multitudinária. Íamos apenas três. Respeito e estimo essas outras manifestações públicas de piedade, mas, pessoalmente, prefiro tentar oferecer a Maria o mesmo carinho e o mesmo entusiasmo por meio de visitas pessoais, ou em pequenos grupos, com intimidade [7].

São tantas as intervenções da Virgem Maria a favor dos seus filhos! A maior parte das vezes são acções que passam ocultas na história da humanidade mas que iluminam interiormente a vida dos seus destinatários, lhes dão forças para melhorar, para aspirar à árdua, mas acessível, meta da união com Deus, a santidade. Estas intervenções, e as respostas generosas que suscitam, mostrarão toda a sua importância quando forem patentes no último dia. Esforcemo-nos por olhar todos os acontecimentos e circunstâncias como o nosso Padre, com olhos de eternidade.

Mas, além disso, Nossa Senhora não poupa – assim o quer Deus – as suas intervenções em favor das pessoas, sobretudo naquelas épocas da história em que os homens estão mais necessitados. Guadalupe, Lurdes, Fátima..., e outras manifestações marianas reconhecidas pela Igreja, são só uma pequena amostra da solicitude de Maria, que se derrama sobre os seus filhos indigentes; Ela é a boa Mãe que usa todos os recursos para nos levar ao arrependimento, para nos conduzir novamente a Cristo, para nos introduzir mais na intimidade divina.

No dia 13 de Maio recordamos uma daquelas manifestações: a primeira apari­ção da Santíssima Virgem Maria em Fátima. Que ressoe nos nossos ouvidos a mensagem de oração, de conversão, de reparação pelos pecados, que com tanta força se difunde daquele santuário mariano. Como é lógico, agradeçamos especialmente a protec­ção que Nossa Senhora dispensou ao Papa João Paulo II, salvando a sua vida do atentado de 13 de Maio de 1981. E recordemos também, com agradecimento, as muitas vezes que S. Josemaria se prostrou perante Ela na capelinha, impetrando o seu auxílio maternal para a Igreja, para a Obra, para todas as almas. Repetiu frequentemente que aquele lugar era o seu "refúgio".

Falei de Lurdes – comemora-se este ano o 150º aniversário das aparições – e vêm à minha memória as vezes em que o nosso Fundador recorreu à nossa Mãe naquele recanto dos Pirinéus. Peço-lhe que todos os fiéis do Opus Dei e as pessoas que se aproximam dos nossos apostolados cultivem, tal como S. Josemaria, o desejo de crescer diariamente em amor e devoção à Virgem Santíssima.

A advocação de Nossa Senhora de Guadalupe, tão unida à evangelização do Novo Mundo, está muito presente também na história mariana do Opus Dei. Nos próximos dias recordaremos a novena de S. Josemaria a Nossa Senhora, na Basílica da Cidade do Méxi­co, de 16 a 24 de Maio de 1970, que foi a razão principal da sua primeira viagem ao continente americano. Tive a dita – considero-a uma graça muito especial de Deus – de acom­pa­nhar o nosso Padre na sua oração pela Igreja e pela Obra. Anos mais tarde, em finais de Abril de 1983, voltei a Guadalupe, desta vez acompanhando o queridíssimo D. Álvaro, para dar graças a Nossa Senhora por ter escutado a ardente oração do nosso Padre.

São inumeráveis os ensinamentos que podemos tirar daqueles dias de 1970. Convido-vos agora a considerar a grandeza de coração do nosso Fundador. Recordo muito bem o último dia da novena, 24 de Maio. Como em todos os dias, rezámos o Rosário. Antes dos mistérios gloriosos, S. Josemaria animou-nos a pedir pelas neces­si­dades do mundo inteiro. Europa, Ásia, África e Oceania passaram diante dos nossos olhos através das palavras do nosso Padre, enquanto deixávamos nas mãos benditas de Nossa Senhora as necessidades, preocupações e ânsias dos milhões de pessoas que enchem a terra. Imitemo-lo neste anseio de estender os frutos da Redenção de Cristo por todos os lugares e entre todas as pessoas.

O dia 31 de Maio é também festa da nossa Mãe. Mal o Arcanjo Gabriel lhe comunicou o próximo nascimento de S. João Baptista, levantou-se Maria e foi com pressa às montanhas, a uma cidade de Judá. Entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel [8]. Já tendes na imaginação a cena que contemplamos todos os dias no segundo mistério gozoso do terço: a chegada de Maria, as palavras de Isabel, os saltos de júbilo de S. João Baptista ainda não nascido... Depois ficou em casa da sua prima uns três meses, para ajudá-la em tudo o que fosse preciso. Quanto pode a presença de Maria! Comentando este facto, S. Ambrósio escreve: «se só a sua entrada [naquela casa] produziu um efeito tão grande que, com a saudação de Maria, o menino saltou de alegria no seio materno e a mãe ficou cheia do Espírito Santo, em quanto avaliaremos os efeitos da presença de Maria durante tanto tempo?» [9].

Podemos aplicar à nossa resposta ao Senhor as palavras deste Padre e Doutor da Igreja. Se nos esforçarmos por estar muito perto da Virgem Santíssima, neste mês de Maio e sempre, quantas graças se derramarão sobre as nossas almas! Entre outras, a grande alegria de nos sentirmos amigos e filhos de Deus.

A presença da Virgem Maria em cada um dos nossos dias converte-se na melhor escola de oração. Dizia-o o Papa Bento XVI há uns meses. S. Lucas diz-nos duas vezes que Nossa Senhora "guardava todas estas coisas e as meditava no seu coração" (Lc 2, 19; cfr. 2, 51). Era uma pessoa em colóquio com Deus, com a palavra de Deus, e também com os acontecimentos através dos quais Deus lhe falava. O Magnificat é um "tecido" de palavras da Sagrada Escritura e mostra-nos como Maria viveu em colóquio permanente com a palavra de Deus e, assim, com o próprio Deus (...). Aprendamos de Maria a falar pessoalmente com o Senhor, ponderando e conser­vando na nossa vida e no nosso coração a palavra de Deus, para que se converta em verdadeiro alimento para cada um. Deste modo, Maria guia-nos numa escola de oração, num contacto pessoal e profundo com Deus [10].

Antes de acabar quero pedir-vos que rezeis pelos fiéis do Opus Dei que vão receber a ordenação sacerdotal, em Roma, no próximo dia 24. Que Nosso Senhor, por intercessão da sua Santíssima Mãe, os faça santos, doutos e alegres.

No mês que acaba de passar fiz duas breves viagens, uma a Inglaterra e outra à Áustria, para alentar os fiéis e cooperadores da Prelatura no seu trabalho apostólico ao serviço da Igreja. Com a viva recordação do nosso Padre e de D. Álvaro, fui rezar a Nossa Senhora de Willesden, em Londres, e a Maria Pötsch, em Viena. Também nesses lugares – como na Aparecida, em Luján, Lo Vásquez, etc. – S. Josemaria deixou toda a Obra sob o manto de Nossa Senhora. Aprendamos a seguir este caminho de auxílio seguro.

Em Viena, prolongando a oração de S. Josemaria em 1955, recorri à Stella Orientis pedindo a sua ajuda para a tarefa apostólica que já estamos a levar a cabo em bastantes países do centro e do leste da Europa, antes submetidos ao comunismo, e nos outros que esperam por nós: Roménia, Bulgária, Ucrânia, Bielorússia... Pensas acompanhar todos os que, no mundo, recorrerem a Nossa Senhora fazendo romarias? Que dirás às pessoas que te rodeiam sobre a grandeza de Nossa Senhora e sobre a sua omnipotência suplicante? Pensaste no modo de dirigir o teu olhar com mais afecto para as suas imagens? Rezarás com mais piedade as Avé-Marias?

Normalmente, no dia 1 de Maio comemora-se a festa de S. José Operário. Dirijo­‑me ao Santo Patriarca para que nos ensine a ter com a sua Esposa virginal muitas delicadezas ao longo das próximas semanas e sempre.

Com todo o afecto, abençoa-vos

   o vosso Padre

    + Javier

 

Roma, 1 de Maio de 2008

 

[1] S. JOSEMARIA, Santo Rosário, II mistério glorioso.

[2] Cfr. Mc 16, 14.

[3] Cfr. Mt 28, 19-20; Mc 16, 15.

[4] Cfr. Jo 14, 15-18; Mt 28, 20.

[5] S. JOSEMARIA, Santo Rosário, II mistério glorioso.

[6] 2 Cor 2, 15.

[7] S. JOSEMARIA, Cristo que passa, n. 139.

[8] Lc 1, 39-40.

[9] S. AMBRÓSIO, Exposição do Evangelho de S. Lucas, 2, 29.

[10] BENTO XVI, Encontro com sacerdotes em Roma, 22-II-2007.