O que é o bem comum?

Resposta às perguntas mais habituais sobre o bem comum: definição, participação e responsabilidade de todos na sua construção, responsabilidade do Estado; e em que consiste o destino universal dos bens.

Perguntas e respostas sobre o bem comum. Foto de Arisa Chattasa (Unsplash)

Sumário

1. Definição de bem comum
2. Responsabilidade de todos
3. A comunidade política
4. O destino universal dos bens


1. Definição de bem comum

Entende-se como bem comum “o conjunto das condições da vida social que permitem, tanto aos grupos como a cada membro, alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição” (Constituição Pastoral Gaudium et Spes, n. 26).

O bem comum não consiste na simples soma dos bens particulares de cada sujeito do corpo social. Sendo de todos e de cada um, é e permanece comum, porque é indivisível e porque só juntos é possível alcançá-lo, aumentá-lo e guardá-lo. Entre o bem particular e o bem comum existem condicionamentos, mas não necessariamente oposição: o bem particular não se consegue se não for orientado para o bem comum, e o bem comum realiza-se alcançando o bem particular de cada um.

Tal como a atuação moral do indivíduo é feita em conformidade com o bem, assim o ato social alcança a sua plenitude na realização do bem comum. O bem comum pode-se considerar como a dimensão social e comunitária do bem moral.

O bem comum está sempre orientado para o progresso das pessoas, ao qual o progresso social se deve subordinar.

Catecismo da Igreja Católica, 1906,1910-1912, 1922 Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 164

Meditar com S. Josemaria

Um homem ou uma sociedade que não reaja diante das tribulações ou das injustiças e se não esforce por as aliviar, não é um homem ou uma sociedade à medida do amor do Coração de Cristo. Os cristãos - conservando sempre a mais ampla liberdade quando se trata de estudar e de pôr em prática as diversas soluções, segundo um pluralismo bem natural - terão de convergir no mesmo anseio de servir a humanidade. Se não, o seu cristianismo não será a Palavra e a Vida de Jesus: será um disfarce, um embuste feito a Deus e aos homens. Cristo que Passa, 167

Esta é a tua tarefa de cidadão cristão: contribuir para que o amor e a liberdade de Cristo presidam a todas as manifestações da vida moderna: a cultura e a economia, o trabalho e o descanso, a vida de família e a convivência social. Sulco, 302

É necessário que a Universidade incuta nos estudantes uma mentalidade de serviço: serviço à sociedade, promovendo o bem comum através do trabalho profissional e da atuação pública. Os universitários devem ser responsáveis, sentir uma sã inquietação pelos problemas dos outros e um espírito generoso que os leve a enfrentar estes problemas e a procurar encontrar-lhes a melhor solução. É missão da Universidade dar tudo isto aos estudantes. Temas Atuais do Cristianismo, 74


2. Responsabilidade de todos

A pessoa não pode realizar-se isoladamente, isto é, prescindir do seu ser “com” e “para” os outros. Esta verdade impõe-lhe não só uma simples convivência nos diferentes níveis da vida social, mas também a procura incessante, de um modo prático e não só idealista, do bem, quer dizer, do sentido e da verdade que se encontram nas formas de vida social existentes. Nenhuma forma expressiva da sociabilidade – desde a família, passando pelo grupo social intermédio, a associação, a empresa de caráter económico, a cidade, a região, o Estado, até a própria comunidade dos povos e das Nações – pode iludir a questão acerca do próprio bem comum, que é constitutivo do seu significado e verdadeira razão de ser da sua própria subsistência.

A dignidade da pessoa humana implica a busca do bem comum. O bem comum é um dever de todos os membros da sociedade: ninguém está isento de colaborar, de acordo com as suas próprias capacidades, na sua realização e desenvolvimento. Cada um deve preocupar-se por suscitar e sustentar instituições que melhorem as condições da vida humana.

A participação é feita em primeiro lugar com a dedicação às tarefas cuja responsabilidade pessoal se assume: através da atenção dada à educação na própria família, da responsabilidade no seu trabalho, cada pessoa participa no bem dos outros e da sociedade.

Os cidadãos devem, sempre que possível, tomar parte ativa na vida pública. A participação de todos na promoção do bem comum implica, como qualquer dever ético, uma conversão, renovada sem cessar, dos membros da sociedade para acabar com a fraude e outros subterfúgios incompatíveis com as exigências da justiça. É necessário cuidar do desenvolvimento de instituições que melhorem as condições da vida humana.

Catecismo da Igreja Católica, 1913-1917, 1926 Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 165-167

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Como cristão tens o dever de atuar, de não te abster, de prestar a tua própria colaboração para servir com lealdade, e com liberdade pessoal, o bem comum. Forja, 714

Tu, pela tua condição de cristão, não podes viver de costas para nenhuma inquietação, para nenhuma necessidade dos homens, teus irmãos. Forja, 453

Observa todos os teus deveres cívicos, sem te quereres subtrair ao cumprimento de nenhuma obrigação; e exerce todos os teus direitos, em bem da coletividade, sem excetuares imprudentemente nenhum. Também aí deves dar testemunho cristão. Forja, 697

Os filhos de Deus, cidadãos da mesma categoria que os outros, temos de participar "sem medo" em todas as atividades e organizações honestas dos homens, para que Cristo ali esteja presente. Nosso Senhor pedir-nos-á conta estreita se, por desleixo ou comodismo, cada um de nós, livremente, não procurar intervir nas obras e nas decisões humanas, de que dependem o presente e o futuro da sociedade. Forja, 715

Com liberdade, e de acordo com os teus gostos ou qualidades, participa ativa e eficazmente nas associações retas, oficiais ou privadas do teu país, com uma participação cheia de sentido cristão: essas organizações nunca são indiferentes para o bem temporal e eterno dos homens. Forja, 717


3. A comunidade política

A responsabilidade de edificar o bem comum compete, para além das pessoas particulares, também ao Estado, porque é a razão de ser da autoridade política. Cada pessoa, a família, os organismos intermédios não estão em condições de alcançar por si só o seu pleno desenvolvimento; daí advém a necessidade das instituições políticas, cuja finalidade é tornar acessíveis às pessoas os bens necessários – materiais, culturais, morais, espirituais – para gozarem de uma vida autenticamente humana.

Para assegurar o bem comum, o governo de cada país tem o dever específico de harmonizar com justiça os diversos interesses setoriais.

O bem comum exige prudência por parte de cada um, e ainda mais por parte daqueles que exercem a autoridade. Comporta três elementos essenciais:

1. Supõe, em primeiro lugar, o respeito pela pessoa enquanto tal. Em nome do bem comum, as autoridades estão obrigadas a respeitar os direitos fundamentais e inalienáveis da pessoa humana. Em particular, o bem comum reside nas condições necessárias para que se possam exercer as liberdades naturais indispensáveis para o desenvolvimento da vocação humana: direito de agir de acordo com a reta norma da sua consciência, à proteção da vida privada e à legítima liberdade, também em matéria religiosa.

2. Em segundo lugar, o bem comum exige o bem-estar social e o desenvolvimento. Certamente cabe à autoridade decidir, em nome do bem comum, entre os diferentes interesses particulares; mas deve proporcionar a cada um o que necessita para ter uma vida verdadeiramente humana: alimentação, roupa, saúde, trabalho, educação e cultura, informação adequada, direito a constituir família, etc.

3. O bem comum implica, finalmente, a paz, quer dizer, a estabilidade e a segurança de uma ordem justa. Supõe, portanto, que a autoridade assegura, por meios honestos, a segurança da sociedade e a dos seus membros.

A autoridade é exercida de maneira legítima se for aplicada à persecução do bem comum da sociedade. Para alcançá-lo, devem empregar-se meios moralmente aceitáveis.

Catecismo da Igreja Católica, 1906-1909 Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 168-169

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Interpretai, portanto, as minhas palavras como o que são: um chamamento a exercerdes diariamente, não apenas em situações de emergência, os vossos direitos; e a cumprirdes nobremente as vossas obrigações como cidadãos - na vida política, na vida económica, na vida universitária, na vida profissional -, assumindo com coragem todas as consequências das vossas decisões, arcando com a independência pessoal que vos corresponde. E essa mentalidade laical cristã permitir-vos-á fugir de toda a intolerância, de todo o fanatismo. Di-lo-ei de um modo positivo: far-vos-á conviver em paz com todos os vossos concidadãos e fomentar também a convivência nos diversos sectores da vida social. Temas Atuais do Cristianismo, 117


4. O destino universal dos bens

Entre as múltiplas implicações do bem comum adquire relevo imediato o princípio do destino universal dos bens: “Deus destinou a terra com tudo o que ela contém para uso de todos os homens e povos; de modo que os bens criados devem chegar equitativamente às mãos de todos, segundo a justiça, secundada pela caridade”. (Constituição Pastoral Gaudium et spes, 69). Deus deu a terra a todo o género humano, para que ela sustente todos os seus habitantes, sem excluir ninguém nem privilegiar qualquer um. Eis, então, a raiz principal do destino universal dos bens da terra. Esta, pela sua fecundidade e capacidade de satisfazer as necessidades do homem, é o primeiro dom de Deus para o sustento da vida humana.

O princípio do destino universal dos bens da terra está na base do direito universal ao uso dos bens. Todo o homem deve ter a possibilidade de gozar do bem-estar necessário para o seu completo desenvolvimento.

Este princípio dos bens convida a cultivar uma visão da economia inspirada em valores morais que permitam ter sempre presente a origem e fim de tais bens, para assim realizar um mundo justo e solidário. Da mesma forma, implica um esforço comum destinado a conseguir para cada pessoa, e para todos os povos, as condições necessárias para um desenvolvimento integral, de modo que todos possam contribuir para a promoção de um mundo mais humano, “onde cada um possa dar e receber, e onde o progresso de uns não seja obstáculo para o desenvolvimento de outros, nem um pretexto para a sua escravidão.”

Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 171-175

Meditar com S. Josemaria

“Compreende-se muito bem a impaciência, a angústia, os inquietos anseios daqueles que, com uma alma naturalmente cristã, não se resignam perante a injustiça individual e social que o coração humano é capaz de criar. Tantos séculos de convivência dos homens entre si, e ainda tanto ódio, tanta destruição, tanto fanatismo acumulado em olhos que não querem ver e em corações que não querem amar! Os bens da Terra, repartidos entre muito poucos; os bens da cultura, encerrados em cenáculos... E, lá fora, fome de pão e de sabedoria; vidas humanas - que são santas, porque vêm de Deus - tratadas como simples coisas, como números de uma estatística! Compreendo e compartilho dessa impaciência, levantando os olhos para Cristo, que continua a convidar-nos a pormos em prática o mandamento novo do amor.” Cristo que passa, 111.

Para procedermos sempre assim, como essas boas mães, precisamos de esquecer-nos de nós mesmos e de não aspirar a outra superioridade senão a de servir os outros, como Jesus Cristo, que afirmava: o Filho do homem veio, não para ser servido, mas para servir. Isto exige a inteireza da submissão da nossa vontade ao modelo divino, trabalhar para todos, lutar pela felicidade eterna e pelo bem-estar dos outros. Não conheço melhor caminho para ser justo do que uma vida de entrega e de serviço. Amigos de Deus, 173