A última entrevista antes de ser sacerdote!

Fábio Quartulli foi ordenado sacerdote no passado 26 de Maio. Nesta sua entrevista antes de ser ordenado, traça-nos o percurso que o conduziu ao sacerdócio.

Fábio vai ser ordenado sacerdote do Opus Dei dentro de poucos dias. Tem 37 anos, um doutoramento em biologia molecular e celular. Porque esperou tanto tempo para escolher o sacerdócio?

Não fui eu que esperei tanto tempo para escolher o sacerdócio, mas Deus! Quando Deus entrou na minha vida tinha eu 20 anos, fez-me logo sentir a inquietação da vocação para o Opus Dei. Senti que Deus não pretendia que abandonasse os meus estudos e projectos profissionais, mas que me santificasse onde Ele me veio procurar: nos meus estudos e depois na minha profissão. Doutorei-me, depois trabalhei procurando pôr em prática os ensinamentos de S. Josemaría sobre a santificação da vida corrente.

O seu percurso é pouco comum: duma célula comunista ao sacerdócio no Opus Dei. Falámos disso num artigo recente. Chegou alguma vez a pensar no sacerdócio antes?

Durante os anos que precederam a minha vinda para Roma para estudar teologia – cheguei a Roma em 2002 – pensei no sacerdócio, não no meu, mas no dos outros. Rezava como o fazem todos os fiéis do Opus Dei, pela santidade dos sacerdotes e para que o Senhor não deixe de chamar homens para o ministério sacerdotal. Tenho consciência de que se foi possível converter-me e perseverar na minha vocação, foi porque o Senhor me alimentou com o Seu Corpo todos os dias na Missa e me fez entender a Sua palavra de perdão pelos meus pecados na confissão. Sem sacerdotes isso não teria sido possível!

Que teria respondido se lhe tivessem falado disso?

  Na realidade, falaram-me disso. As pessoas que conhecem o meu compromisso em viver um cristianismo coerente tinham o reflexo «tradicional» de me perguntarem se eu queria ser sacerdote ou entrar para um convento. Eu aproveitaria para lhes explicar, como o recorda o Concílio Vaticano II, que na realidade todos somos chamados à santidade.

Que diria a um jovem que se encontre na situação que conheceu ou simplesmente que hesita em ser sacerdote?

Para fazer conhecer a sua vontade, o Senhor utiliza diversas vias. Para me fazer conhecer o Opus Dei, colocou no meu caminho um fiel da Prelatura de que já falei [vid. entrevista precedente]. Para me chamar ao sacerdócio no Opus Dei, foi preciso que o Prelado me dissesse que, se fosse da minha vontade, ele pensava ordenar-me diácono e depois sacerdote. Diria então a um jovem que não deixasse passar a oportunidade que Deus lhe dá, porque responder «sim!» livremente, é a garantia da felicidade já desde aqui em baixo. S. Josemaría repetia muitas vezes que Deus não se deixa ganhar em generosidade; devo dizer que a minha experiência pessoal o confirma.

S. Josemaría dizia que queria sacerdotes santos, sábios e desportivos. Que espera do sacerdócio? Qual vai ser a sua missão pastoral?

Devo ocupar-me especificamente das missões que me serão confiadas pela Prelatura do Opus Dei. Mas o coração dum sacerdote deve ser como o coração d’Aquele que representa: aberto a todos os que passem ao seu lado. Espero sinceramente poder dar provas incontestáveis a todas as pessoas que o meu ministério sacerdotal ponha no meu caminho, toda a realidade da misericórdia de Deus, de que eu próprio pude fazer a experiência. 

  Em que pensa que a sua formação profissional o pode ajudar?

Vai-me ajudar, sem dúvida, a compreender as dificuldades que qualquer pessoa pode encontrar para pôr em prática o seu desejo de ter um diálogo contínuo com o Senhor. Por experiência, sei quanto os esforços que se desenvolvem para fazer um trabalho bem feito parecem um obstáculo à santidade. Nos laboratórios onde trabalhei, mais que uma vez tive a impressão de que o esforço de concentração para montar bem uma determinada experiência me impediam de falar com o Senhor. Custou-me perceber, com efeito, para alguém que o deseje fazer em tais circunstâncias, esta concentração é precisamente o diálogo que Ele espera. Uma vez isto percebido, o trabalho torna-se mais leve, porque todas as coisas muito humanas que o motivam desaparecem do horizonte.

O que ficou do militante comunista?

Aí está uma pergunta à qual não é fácil responder! A primeira resposta que me ocorre não é muito positiva; tenho tendência para não deixar às pessoas muito espaço de manobra para explicarem as suas opiniões. Quando era comunista, infeliz daquele que procurasse defender uma opinião política oposta à minha! Depois da minha conversão – e mesmo agora – ainda que em menor grau, infeliz do que se oponha à fé cristã! E isso apesar dos meus esforços para mudar! Creio que os que me conhecem duvidarão de tais esforços!

Para não terminar esta nota com pessimismo, ficou-me uma grande preocupação pelos países da Europa de Leste que acabaram por sair do jugo comunista. Reconheço ter um fraco pela Rússia! Diria um fraco «romântico» porque influenciaram o meu gosto os autores russos como Dostoïevski, Pouchkine ou Tourgueniev. E depois, também um fraco pelo Vietname, dado que a célula comunista em que militava se chamava Ho Chi Minh!  Tenho também um fraco por todas as iniciativas sociais que os fiéis da Prelatura promovem com os seus amigos em todo o mundo. Esperemos que estas divagações não façam com que as minhas orações por estes países e estas iniciativas não sejam ouvidas junto de Deus!