- Santo Padre, o jovem do Evangelho perguntou a Jesus: bom mestre, que devo fazer para ter a vida eterna? Não sei sequer o que é a vida eterna. Não consigo imaginá-la, mas sei uma coisa: não quero desperdiçar a minha vida, quero vivê-la profundamente e não estar só. Tenho medo de que isto não aconteça, tenho medo de pensar só em mim própria, de me equivocar em tudo e de me encontrar sem uma meta que atingir, vivendo só o dia-a-dia. É possível fazer da minha vida algo belo e grande?
Queridos jovens, antes de responder à pergunta gostaria de agradecer do coração pela vossa presença, por este maravilhoso testemunho de fé, de querer viver em comunhão com Jesus, pelo vosso entusiasmo em seguir Jesus e viver bem. Muito obrigado!
E agora a pergunta. Disse-me que não sabe o que é a vida eterna e que não é capaz de a imaginar. Nenhum de nós é capaz de imaginar a vida eterna, porque está fora da nossa experiência.
Contudo, podemos começar a compreender o que é a vida eterna e creio que, com a sua pergunta, nos deu uma descrição do essencial da vida eterna, quer dizer, da verdadeira vida: não desperdiçar a vida, vivê-la em profundidade, não viver para si mesmo, não viver só o dia-a-dia, mas viver realmente a vida na sua riqueza e na sua totalidade. E como fazer? Esta é a grande questão, com a qual também o rico do Evangelho foi ter com o Senhor (cfr Mc 10,17). À primeira vista, a resposta do Senhor parece muito seca. Resumidamente, diz: observa os mandamentos (cfr Mc 10,19). Mas por detrás, se reflectirmos bem, se escutarmos bem o Senhor, na totalidade do Evangelho, encontramos a grande sabedoria da Palavra de Deus, de Jesus. Os mandamentos, segundo outra Palavra de Jesus, resumem-se neste único: amar a Deus com todo o coração, com toda a mente, com toda a existência e amar o próximo como a si mesmo.
Amar a Deus, implica conhecer Deus, reconhecer Deus. E este é o primeiro passo que devemos dar: procurar conhecer Deus. E assim sabemos que a nossa vida não existe por acaso, não é um acaso. A minha vida é querida por Deus desde a eternidade. Eu sou amado, sou necessário. Deus tem um projecto comigo na totalidade da história; tem um projecto precisamente para mim. A minha vida é importante e mesmo necessária. O amor eterno criou-me em profundidade e espera-me. Portanto, este é o primeiro ponto: conhecer, procurar conhecer a Deus e compreender assim que a vida é um dom, que é bom viver. Depois o essencial é o amor. Amar este Deus que me criou, que criou este mundo, que governa por entre todas as dificuldades do homem e da história e que me acompanha. E amar o próximo.
Os dez mandamentos que Jesus indica na Sua resposta, são apenas uma explicitação do mandamento do amor. São, por assim dizer, regras do amor, indicam o caminho do amor com estes pontos essenciais: a família, como fundamento da sociedade; a vida, que há que respeitar como dom de Deus; a ordem da sexualidade, da relação entre homem e mulher; a ordem social e finalmente, a verdade.
Estes elementos essenciais explicitam o caminho do amor, explicitam como amar realmente e como encontrar o caminho recto. Portanto, há uma vontade fundamental de Deus para todos nós, que é idêntica para todos. Mas a sua aplicação é diversa em cada vida, porque Deus tem um projecto preciso com cada homem .
São Francisco de Sales disse uma vez: a perfeição, quer dizer, ser bom, viver a fé e o amor, é substancialmente uma, mas com formas muito distintas. Muito diversa é a santidade de um cartuxo e de um político, de um cientista ou de um camponês, etc. E assim, para cada homem, Deus tem o Seu projecto e eu tenho que encontrar, nas minhas circunstâncias, a minha maneira de viver esta única e comum vontade de Deus, cujas grandes regras estão indicadas nesta explicitação do amor.
E, portanto, procurar também realizar o que é a essência do amor, ou seja, não tomar a minha vida para mim, mas dá-la; não “ter” a vida, mas fazer da vida um dom, não me procurar a mim mesmo mas dar-me aos outros. Isto é o essencial e implica renúncias, quer dizer, sair de mim próprio e não me procurar a mim. E é precisamente não me procurando a mim próprio, mas entregando-me a coisas grandes e verdadeiras, que encontro a verdadeira vida .
Assim cada um encontrará, na sua vida, as diferentes possibilidades: comprometer-se num voluntariado, numa comunidade de oração, num movimento, nas acções da sua paróquia, na sua própria profissão. Encontrar a minha vocação e vivê-la em cada lugar é importante e fundamental, quer seja um grande cientista quer seja um camponês. Tudo é importante aos olhos de Deus: é belo se é vivido em profundidade com esse amor que realmente redime o mundo.
Para terminar gostaria de vos uma pequena história de santa Josefina Bakhita, esta pequena santa africana que em Itália encontrou Deus e Cristo e que me causa sempre uma grande impressão. Era freira num convento italiano; um dia, o Bispo da Diocese visitou esse mosteiro, viu esta pequena freira negra, de quem, ao que parece, nada sabia, e disse: “Irmã, o que é que faz aqui?” E Bakhita respondeu: “O mesmo que o Senhor, Eminência”. O Bispo, visivelmente irritado, disse: "Mas, irmã como é que faz o mesmo que eu?”. “Sim – diz a freira – ambos queremos fazer a vontade de Deus, não é verdade?”.
Este é, no fim, o ponto essencial: conhecer, com a ajuda da Igreja, da Palavra de Deus e dos amigos, a vontade de Deus, quer nas suas grandes linhas, comuns a todos, quer na minha vida pessoal concreta. Assim a vidatorna-se, talvez não demasiadamente fácil, mas bela e feliz. Oremos ao Senhor para que nos ajude sempre a encontrar a Sua vontade e a segui-la com alegria.
- O Evangelho disse-nos que Jesus olhou para aquele jovem e o amou. Santo Padre, que quer dizer ser olhado por Jesus com amor; como podemos nós ter hoje também esta experiência? É de facto possível viver esta experiência também nesta vida de hoje?
Naturalmente direi que sim, porque o Senhor está sempre presente e olha-nos a cada um de nós com amor. Só que nós temos que encontrar esse olhar e encontrarmo-nos com ele. Como fazer?
Diria que o primeiro ponto para nos encontrarmos com Jesus, para ter a experiência do Seu amor, é conhecê-Lo. Conhecer Jesus implica vários caminhos. Uma primeira condição é conhecer a figura de Jesus como aparece nos Evangelhos, que nos dão um retrato muito rico da figura de Jesus, nas grandes parábolas, pensemos no filho pródigo, no samaritano, em Lázaro, etc. Em todas elas, em todas as suas palavras, no sermão da montanha, encontramos realmente o rosto de Jesus, o rosto de Deus até na cruz, onde, por amor a nós, se dá totalmente até à morte e pode, afinal, dizer: nas Tuas mãos Pai entrego a minha vida, a minha alma (cfr Lc 23,46).
Portanto: conhecer, meditar Jesus juntamente com os amigos, com a Igreja e conhecer Jesus não apenas de uma forma académica, teórica, mas com o coração, ou seja, falar com Jesus na oração. Não se pode conhecer uma pessoa da mesma maneira que se estuda matemática. Para a matemática é necessária e suficiente a razão, mas para conhecer uma pessoa, ainda mais a grande Pessoa de Jesus, Deus e homem, também é necessária a razão, mas ao mesmo tempo, também o coração. Só com a abertura do coração a Ele, só com o conhecimento do conjunto de quanto disse e quanto fez, com o nosso amor, com o nosso ir até Ele, podemos pouco a pouco conhecê-Lo cada vez mais e assim ter a experiência de ser amados.
Portanto: escutar a Palavra de Jesus, escutá-la na comunhão da Igreja, na sua grande experiência e responder com a nossa oração, com o nosso colóquio pessoal com Jesus, onde lhe dizemos o que não conseguimos entender, as nossas necessidades, as nossas perguntas.
Num verdadeiro colóquio, podemos encontrar cada vez mais este caminho do conhecimento, que se converte em amor. Naturalmente, não só pensar, não só rezar, mas fazer também uma parte do caminho para Jesus: fazer coisas boas, comprometer-se pelo próximo.
Há diversos caminhos; cada um conhece as suas próprias possibilidades, na paróquia e na comunidade em que vive, para se comprometer também com Cristo e pelos outros, pela vitalidade da Igreja, para que a fé seja verdadeiramente força formativa do nosso ambiente e em consequência da nossa época.
Portanto, referiria estes elementos: escutar, responder, entrar na comunidade crente, comunhão com Cristo nos sacramentos, onde se dá a nós, tanto na Eucaristia como na confissão, etc., e, finalmente agir, concretizar as palavras da fé para que se convertam em força da minha vida e também a mim apareça verdadeiramente o olhar de Jesus e o Seu amor me ajude, me transforme.
- Jesus convidou o jovem rico a deixar tudo e a segui-Lo, mas ele foi-se embora triste. Também a mim como a ele me custa segui-Lo, porque tenho medo de deixar as minhas coisas e, às vezes, a Igreja pede renúncias difíceis. Santo Padre como posso encontrar a força para escolhas corajosas e quem me pode ajudar?
Bom, comecemos com esta palavra dura para nós: renúncias. As renúncias são possíveis e, no fim, toprnam-se também belas se têm um fundamento e se esse fundamento justifica depois também a dificuldade da renúncia. São Paulo usou, neste contexto, a imagem das olimpíadas e dos atletas empenhados nas olimpíadas (cfr 1Cor 9,24-25). Diz: Eles, para chegarem finalmente à medalha – naquela época à coroa – devem viver uma disciplina muito dura, devem renunciar a muitas coisas, devem exercitar-se no desporto que praticam e fazem grandes sacrifícios e renúncias porque têm uma motivação que vale a pena. Ainda que no final, talvez, não estejam entre os vencedores, é, no entanto, muito interessante terem-se disciplinado a si mesmos e terem sido capazes de fazer estas coisas com uma certa perfeição.
A mesma coisa que vale, com esta imagem de São Paulo, para as olimpíadas, para todo o desporto, vale também para todas as outras coisas da vida. Uma boa vida profissional não se consegue atingir sem renúncias, sem uma preparação adequada, que exige sempre disciplina, exige que se deva renunciar a qualquer coisa ,e assim também também na arte e em todos os elementos da vida.
Todos nós compreendemos que para alcançar um objectivo, profissional, desportivo, artístico, cultural, devemos renunciar, aprender para avançar. Precisamente também a arte de viver, de sermos nós próprios, a arte de ser homem exige renúncias e as renúncias verdadeiras, que nos ajudam a encontrar o caminho da vida, a arte da vida, são-nos indicadas na palavra de Deus e ajudam-nos a não cair – digamos – no abismo da droga, do álcool, na escravidão da sexualidade, na escravidão do dinheiro, da preguiça. Todas estas coisas, num primeiro momento, aparecem como actos de liberdade. Na realidade não são actos de liberdade, mas o início de uma escravidão que se torna cada vez mais difícil de superar.
Conseguir renunciar à tentação do momento, avançar para o bem cria a verdadeira liberdade e torna a vida preciosa. Neste sentido, parece-me, devemos ver que sem um “não” a certas coisas não cresce o grande “sim” à verdadeira vida , como a vemos na figura dos santos. Pensemos em São Francisco, pensemos nos santos do nosso tempo, na Madre Teresa, em Dom Gnocchi e tantos outros, que renunciaram e que venceram, que se tornaram não só livres eles próprios, mas também uma riqueza para o mundo e nos mostram como se pode viver.
Assim à pergunta “quem me ajuda”, diria que nos ajudam as grandes figuras da história da Igreja, ajuda-nos a Palavra de Deus, ajuda-nos a comunidade paroquial, o movimento, o voluntariado, etc. E ajudam-nos as amizades de homens que “vão à frente”, que já fizeram progressos no caminho da vida e que podem convencer-me de que caminhar assim é o caminho justo.
Oremos ao Senhor para que nos dê sempre amigos, comunidades que nos ajudem a ver o caminho do bem e a encontrar, assim, a vida bela e alegre.