10 ideias para comunicar a fé

Quem quer comunicar a experiência cristã precisa de conhecer a fé que deseja transmitir, e precisa de conhecer também as regras de jogo da comunicação pública.Há princípios a seguir. Sobre a mensagem que se quer difundir, sobre a pessoa que comunica e sobre o modo de transmitir.

Juan Manuel Mora

A transmissão da fé é uma questão antiga, presente nos dois mil anos de vida da comunidade cristã, que sempre se considerou mensageira de uma notícia que lhe foi revelada e é digna de ser comunicada. É uma questão antiga, mas também é um tema de candente actualidade. Desde Paulo VI até Bento XVI, os Papas não deixaram de assinalar a necessidade de melhorar a transmissão da fé.

Esta questão relaciona-se frequentemente com a “nova evangelização”. Nesse contexto, João Paulo II afirmou que a transmissão da fé tem de ser nova "no seu ardor, nos seus métodos, na sua expressão". Aqui referiremos particularmente a novidade nos métodos.

Há factores externos, que constituem um obstáculo à difusão da mensagem cristã, sobre os quais é difícil influir. Mas compete-nos avançar noutros factores que estão ao nosso alcance. Nesse sentido, quem pretende comunicar a experiência cristã precisa de conhecer a fé que deseja transmitir, e também deve conhecer as regras de jogo da comunicação pública.

Partindo, por um lado, dos documentos mais relevantes da Igreja e, por outro, da bibliografia essencial no âmbito da comunicação, os primeiros referem-se à mensagem que se pretende difundir; os seguintes, à pessoa que comunica; e os últimos, ao modo de transmitir essa mensagem à opinião pública. Antes de mais, a mensagem deve ser positiva. O público acolhe informações de todo o género, e toma boa nota dos protestos e das críticas. Mas colabora sobretudo em projectos, propostas e causas positivas.

Características da mensagem 1. Positiva

João Paulo II afirma na encíclica “Familiaris consortio” que a moral é um caminho para a felicidade e não uma série de proibições. Esta ideia tem sido frequentemente repetida por Bento XVI, de diferentes maneiras: Deus dá-nos tudo e não nos tira nada; os ensinamentos da Igreja não são um código de limitações, mas uma luz que se recebe em liberdade.

A mensagem cristã tem de ser transmitida como o que realmente é: um sim imenso ao homem, à mulher, à vida, à liberdade, à paz, ao desenvolvimento, à solidariedade, às virtudes... Para a transmitir adequadamente aos outros, é necessário primeiro entender e experimentar a fé desse modo positivo.

Neste contexto adquirem particular valor umas palavras do Cardeal Ratzinger: “A força com que a verdade se impõe tem de ser a alegria, que é a sua expressão mais clara. Os cristãos deveriam apostar nela e nela dar-se a conhecer ao mundo”. A comunicação através da irradiação da alegria é a mais positiva das exposições.

2. Relevante

Em segundo lugar, a mensagem deve ser relevante, significativa para quem escuta, não somente para quem fala. S. Tomás de Aquino afirma que há dois tipos de comunicação: a locutio, um fluir de palavras que não interessam absolutamente nada aos que escutam; e a illuminatio, que consiste em dizer algo que ilustra a mente e o coração dos interlocutores sobre algum aspecto que realmente os afecta.

Transmitir a fé não é discutir para vencer, mas dialogar para convencer. O desejo de persuadir sem derrotar marca profundamente a atitude de quem comunica. A escuta converte-se em algo fundamental: permite saber o que interessa, o que preocupa o interlocutor. Conhecer as suas perguntas antes de propor as respostas. O contrário de relevância é auto-referência: limitar-se a falar de si próprio não é uma boa base para o diálogo.

3. Clara

Em terceiro lugar, a mensagem deve ser clara. A comunicação não é principalmente aquilo que o emissor explica, mas o que o destinatário entende. Acontece em todos os campos do saber (ciência, tecnologia, economia): para comunicar é preciso evitar a complexidade argumentativa e a obscuridade da linguagem. Também em matéria de religião convém procurar argumentos claros e palavras simples. Neste sentido, seria necessário reivindicar o valor da retórica, da literatura, das metáforas, do cinema, da publicidade, das imagens, dos símbolos, para difundir a mensagem cristã.

Por vezes, quando a comunicação não funciona, transfere-se a responsabilidade para o receptor: considera-se que os outros são incapazes de entender. Porém, a norma deve ser o oposto: esforçar-se por ser cada vez mais claro, até conseguir o objectivo que se pretende.

Qualidades da pessoa que comunica 1. Credibilidade

Para que um destinatário aceite uma mensagem, a pessoa ou organização que a propõe deve merecer credibilidade. Assim como a credibilidade se fundamenta na veracidade e na integridade moral, a mentira e a suspeita anulam o processo de comunicação na sua base. A perda de credibilidade é uma das consequências mais sérias de algumas crises que se produziram nestes anos.

2. Empatia

O segundo princípio é a empatia. A comunicação é uma relação que se estabelece entre pessoas, não um mecanismo anónimo de difusão de ideias. O Evangelho dirige-se a pessoas: políticos e eleitores, jornalistas e leitores. Pessoas com os seus próprios pontos de vista, os seus sentimentos e as suas emoções. Quando se fala de modo frio, aumenta a distância que separa do interlocutor. Uma escritora africana afirmou que a maturidade de uma pessoa está na sua capacidade de descobrir que pode “ferir” os outros e de agir consequentemente. A nossa sociedade está superpovoada de corações feridos e de inteligências perplexas. É necessário aproximar-se com delicadeza da dor física e da dor moral. A empatia não implica renunciar às convicções próprias, mas pôr-se no lugar do outro. Na sociedade actual, convencem as respostas que sejam cheias de sentido e de humanidade.

3. Cortesia

O terceiro princípio relativo à pessoa que comunica é a cortesia. A experiência mostra que nos debates públicos proliferam os insultos pessoais e a desqualificação mútua. Nesse campo, se não se cuida a forma, corre-se o risco de que a proposta cristã seja vista como mais uma das posturas radicais que estão no ambiente. Correndo embora o risco de parecer ingénuo, penso que convém demarcar-se deste enfoque. A clareza não é incompatível com a delicadeza.

Com delicadeza pode-se dialogar; sem delicadeza, o fracasso está de antemão garantido: quem era partidário antes da discussão, continuará a sê-lo depois, e quem era contrário raramente mudará de posição.

Recordo um cartaz situado à entrada de um “pub” perto do Castelo de Windsor, no Reino Unido. Dizia, mais ou menos: “Neste local são bem-vindos os cavalheiros. E um cavalheiro é-o antes de beber cerveja e também depois”. Poderíamos acrescentar: um cavalheiro é-o quando lhe dão razão e quando sucede exactamente o contrário.

Princípios quanto ao modo de comunicar

1. Profissionalismo

A “Gaudium et Spes” recorda que cada actividade humana tem a sua própria natureza, que é preciso descobrir, utilizar e respeitar, se se pretende participar nela. Cada campo do saber tem a sua metodologia; cada actividade, as suas normas; e cada profissão, a sua lógica. A evangelização não se produzirá a partir de fora das realidades humanas, mas a partir de dentro: os políticos, os empresários, os jornalistas, os professores, os guionistas, os sindicalistas, são aqueles que podem introduzir melhorias práticas nos seus respectivos âmbitos.

S. Josemaria recordava que é cada profissional, comprometido com as suas crenças e com a sua profissão, que há-de encontrar as propostas e soluções adequadas. Se se trata de um debate parlamentar, com argumentos políticos; se de um debate médico, com argumentos científicos; e assim sucessivamente. Este princípio aplica-se às actividades de comunicação, que estão a conhecer um desenvolvimento extraordinário nos últimos anos, tanto pela crescente qualidade das formas narrativas, como pelas audiências cada vez mais amplas e pela participação cívica, cada dia mais activa.

2. Transversalidade

O segundo princípio poderia denominar-se transversalidade. O profissionalismo é imprescindível quando as convicções religiosas pesam num debate. A transversalidade, quando pesam as convicções políticas.

Neste ponto, vale a pena mencionar a situação de Itália. Ao fazer a declaração de rendimentos, mais de 80% dos italianos assinala o espaço correspondente à Igreja, porque deseja apoiar economicamente as suas actividades. Isto significa que a Igreja merece a confiança de uma grande maioria de cidadãos, não somente dos que se revêem numa tendência política.

3. Gradação

O terceiro princípio relativo ao modo de comunicar é a gradação. As tendências sociais têm uma vida complexa: nascem, crescem, desenvolvem-se, modificam-se e morrem. Consequentemente, a comunicação de ideias tem muito a ver com a “cultura”: semear, regar, podar, limpar, esperar, antes de colher.

O fenómeno da secularização foi-se consolidando nos últimos séculos. Processos de tão longa gestação não se resolvem em anos, meses ou semanas. O cardeal Ratzinger explicava que a nossa visão do mundo costuma seguir um paradigma “masculino", onde o importante é a acção, a eficácia, a programação e a rapidez. E concluía que convém dar mais espaço a um paradigma “feminino", porque a mulher sabe que tudo o que tem a ver com a vida requer espera, exige paciência.

O contrário deste princípio é a pressa, que leva à impaciência e muitas vezes também ao desânimo, porque é impossível conseguir objectivos de entidade a curto prazo.

4. Caridade

A estes nove princípios seria necessário acrescentar outro, que afecta todos os aspectos mencionados: a mensagem, a pessoa que comunica e o modo de comunicar. O princípio da caridade.

Alguns autores destacaram que, nos primeiros séculos, a Igreja se expandiu de forma muito rápida porque era uma comunidade acolhedora, onde era possível viver uma experiência de amor e liberdade. Os católicos tratavam o próximo com caridade, cuidavam das crianças, dos pobres, dos idosos, dos enfermos. Tudo isso se converteu num íman de atracção irresistível.

A caridade é o conteúdo, o método e o estilo da comunicação da fé; a caridade converte a mensagem cristã em algo positivo, relevante e atractivo; proporciona credibilidade, empatia e amabilidade às pessoas que comunicam; e é a força que permite actuar de forma paciente, integradora e aberta. Porque o mundo em que vivemos é também com demasiada frequência um mundo duro e frio, onde muitas pessoas se sentem excluídas e maltratadas e esperam algo de luz e de calor. Neste mundo, o grande argumento dos católicos é a caridade. Graças à caridade, a evangelização é sempre, e verdadeiramente, nova.

* Juan Manuel Mora é Vice-Reitor de Comunicação Institucional da Universidade de Navarra. Entre 1991 e 2006 trabalhou no Departamento de Comunicação do Opus Dei em Roma. Na sua especialidade, a Comunicação Institucional, combinou a actividade profissional e a consultoria com a docência e a investigação.

Artigo publicado em L’Osservatore Romano Fotos: As imagens são do álbum fotográfico da Universidad de Navarra.

Juan Manuel Mora

Juan Manuel Mora/L’Osservatore Romano