A Igreja na terra é, ao mesmo tempo, comunhão e sociedade estruturada pelo Espírito Santo através da Palavra de Deus, dos sacramentos e dos carismas. É comunhão dos filhos de Deus porque todos são batizados e comungam do mesmo Pão, que é Cristo. É sociedade estruturada porque entre os batizados há relações estáveis em que uns têm a missão de guiar os outros. Assim como o pastor guia e cuida do rebanho, levando-o a lugares seguros onde se possa alimentar de boa pastagem, segundo a imagem bíblica (cf. Jo 10,11-18; Sal 22), assim Cristo pede àqueles que designou pastores da Igreja que façam o mesmo[1]. A distinção entre pastor e rebanho e a dedicação vital ao rebanho pelo pastor, como Cristo que deu a vida pelas ovelhas, é uma imagem bíblica que – dentro de suas limitações lógicas – pode ajudar a compreender a presença simultânea da comunhão e de uma estrutura social na Igreja.
Os mesmos sacramentos que compõem a Igreja são os que a estruturam para ser o sacramento universal da salvação na terra. Concretamente, por meio dos sacramentos do Batismo, Confirmação e Ordem, os fiéis participam – de várias maneiras – da missão sacerdotal de Cristo. As três grandes posições históricas encontradas na Igreja surgem da ação do Espírito Santo nos sacramentos e nos carismas: os fiéis leigos, os ministros sagrados (que receberam o sacramento da Ordem e formam a hierarquia da Igreja: os diáconos, sacerdotes e bispos) e religiosos.
O fato de dizer que a Igreja tem uma estrutura hierárquica não significa que uns sejam mais que outros. Todos, pelo Batismo, são chamados à missão de levar os homens e o mundo a Deus. Essa missão vem diretamente de Deus, sem que ninguém precise da permissão de outro para realizá-la. No entanto, para que seja realizada é necessária a graça, porque sem Cristo nada podemos fazer (cf. Jo 15,5). Portanto, é necessário que alguns – a hierarquia – tornem Cristo sacramentalmente presente para os outros, para que todos possam cumprir a missão evangelizadora. O serviço à missão de todos é a razão da existência da função hierárquica na Igreja. A relação entre os fiéis e a hierarquia tem uma dinâmica missionária e é uma continuação da missão do Filho no poder do Espírito Santo. Assim sendo, a hierarquia na Igreja não é o resultado de circunstâncias históricas em que um grupo prevaleceu sobre outro impondo sua vontade.
O Romano Pontífice
O Papa é o bispo de Roma e sucessor de São Pedro, é o princípio e fundamento perpétuo e visível da unidade da Igreja. Cristo deu ao apóstolo São Pedro a tarefa de presidir o colégio apostólico e confirmar os seus irmãos na fé (Lc 22,31-32). Todas as Igrejas particulares estão unidas à Igreja de Roma, e todos os Bispos que presidem estas Igrejas estão em comunhão com o Bispo de Roma, que as preside na caridade. A função deste último é servir à unidade do episcopado e, assim, servir à unidade da Igreja. Por isso, o Papa é o líder do colégio dos bispos e pastor de toda a Igreja, sobre a qual tem, por instituição divina, a plena potestade, suprema, imediata e universal. Este poder do Papa tem um limite interno, porque o Romano Pontífice está dentro e não acima da Igreja de Cristo. Portanto, ele está subordinado à lei divina e à lei natural, como todos os cristãos.
O Senhor prometeu que a sua Igreja permanecerá sempre na fé (Mt 16,19) e garante essa fidelidade com a sua presença, em virtude do Espírito Santo. Esta propriedade pertence à Igreja como um todo (não a cada membro). Por isso, os fiéis, em seu conjunto, não erram quando aderem infalivelmente à fé guiados pelo magistério vivo da Igreja sob a ação do Espírito Santo que guia uns e outros. A assistência do Espírito Santo a toda a Igreja para que não erre na fé também é dada ao magistério, para que ensine fiel e autenticamente a Palavra de Deus na Igreja. Em alguns casos específicos, esta assistência do Espírito garante que as intervenções do magistério não contenham erro, razão pela qual se costuma dizer que em tais casos o magistério participa da mesma infalibilidade que o Senhor prometeu à sua Igreja. “A infalibilidade do Magistério exerce-se quando o Romano Pontífice, em virtude da sua autoridade de supremo Pastor da Igreja, ou o Colégio Episcopal, em comunhão com o Papa, sobretudo reunido num Concílio Ecumênico, proclamam com um ato definitivo uma doutrina que diz respeito à fé ou à moral, e também quando o Papa e os Bispos, no seu Magistério ordinário, concordam ao propor uma doutrina como definitiva. A tais ensinamentos cada fiel deve aderir com o obséquio da fé”[2].
A convicção da responsabilidade que supõe a missão do Romano Pontífice e a autoridade que ele possui para cumpri-la leva os católicos a cultivar uma intensa oração de intercessão por ele. Além disso, a unidade com o Papa os levará a evitar falar negativamente em público sobre o Romano Pontífice ou diminuir a sua confiança nele, mesmo nos casos em que não compartilham algum critério pessoal concreto. Se isso chegasse a acontecer, o desejo de ter critério e de formar-se bem leva o católico a pedir conselhos sobre quaisquer dúvidas que possa ter, rezar e aprofundar o assunto em que encontra alguma dificuldade, procurando compreender as motivações com abertura de espírito, o que pode exigir tempo e paciência. Se a discrepância persistir, é aconselhável permanecer em silêncio[3] e pelo menos “prestar o assentimento religioso do seu espírito”[4] aos seus ensinamentos.
Os Bispos, sucessores dos Apóstolos
A Igreja é Apostólica porque Cristo a edificou sobre os Apóstolos, testemunhas escolhidas da sua Ressurreição e fundamento da sua Igreja. Porque, com a ajuda do Espírito Santo, ensina, guarda e transmite fielmente o depósito da fé recebido dos Apóstolos. É também apostólica por sua estrutura, na medida em que é instruída, santificada e governada, até a volta de Cristo, pelos Apóstolos e seus sucessores, os bispos, em comunhão com o sucessor de Pedro. A sucessão apostólica é a transmissão, através do sacramento da Ordem, da missão e poder dos Apóstolos aos seus sucessores, os bispos. Estes não recebem todos os dons que Deus ofereceu aos Apóstolos, mas apenas os dons que receberam para transmiti-los à Igreja. Graças a esta transmissão, a Igreja permanece em comunhão de fé e de vida com a sua origem, enquanto ao longo dos séculos orienta todo o seu apostolado para difundir o Reino de Cristo na terra[5].
O colégio dos bispos, em comunhão com o Papa e nunca sem ele, exerce também o poder supremo e pleno sobre a Igreja. Os bispos receberam a missão de ensinar como autênticas testemunhas da fé apostólica; de santificar dispensando a graça de Cristo no ministério da Palavra e dos sacramentos, em particular a Eucaristia; e de governar o povo de Deus na terra[6].
Cristo instituiu a hierarquia eclesiástica com a missão de torná-lo presente a todos os fiéis pelos sacramentos e pela pregação da Palavra de Deus com autoridade em virtude do mandato recebido d’Ele. Os membros da hierarquia também receberam a missão de guiar o povo de Deus (Mt 28,18-20). A hierarquia é composta pelos ministros sagrados: bispos, presbíteros e diáconos. O ministério da Igreja tem uma dimensão colegial, ou seja, a união dos membros da hierarquia eclesiástica está a serviço da comunhão dos fiéis. Cada bispo exerce o seu ministério como membro do colégio episcopal – que sucede ao colégio apostólico – e em união com o seu líder, que é o Papa, participando com ele e os outros bispos na solicitude pela Igreja universal. Além disso, se uma Igreja particular lhe foi confiada, ele a governa em nome de Cristo com a autoridade que recebeu, com poder ordinário, próprio e imediato, em comunhão com toda a Igreja e sob o Santo Padre. O ministério também tem caráter pessoal, porque cada um é responsável perante Cristo, que o chamou pessoalmente e lhe conferiu a missão pelo sacramento da Ordem.
A participação do presbitério no ministério dos bispos
O ministério na Igreja é único, porque o ministério apostólico é único, mas, por instituição divina, é participado em três graus: episcopado, presbiterado (sacerdócio) e diaconato. Essa unidade do ministério se manifesta na relação interna entre seus três graus, que são cumulativos. Com efeito, não há três classes ou tipos de ministros, mas graus do mesmo e único ministério, de um único sacramento da Ordem. Quem recebeu o grau de episcopado não deixa de ser também sacerdote e diácono, quem recebeu o sacerdócio não deixa de ser diácono. Além disso, este sacramento tem uma unidade eclesial. É um ministério de comunhão porque se exerce em favor da comunhão e porque se estrutura internamente como comunhão ministerial com aqueles que receberam o mesmo sacramento em seus vários graus.
Em sua missão na Igreja particular, o bispo conta com os sacerdotes incardinados, que são seus principais e insubstituíveis colaboradores. Os presbíteros são revestidos do único e mesmo sacerdócio ministerial de que o bispo possui a plenitude. Eles o recebem através do sacramento da Ordem, com a imposição das mãos pelo bispo e a oração de consagração. A partir de então, passam a fazer parte do presbitério, colégio estável formado por todos os sacerdotes que, juntamente com o bispo, compartilham a mesma missão pastoral em favor do povo de Deus.
Portanto, quando o bispo associa os presbíteros a seu serviço e responsabilidade, não o faz como algo opcional ou conveniente, mas como uma consequência necessária da partilha da mesma missão, da qual é o líder e que provém do sacramento da Ordem. Os presbíteros são os auxiliares mais diretos do bispo na pastoral do povo de Deus que lhe foi confiado. Eles fazem presente a solicitude do bispo em determinado lugar ou região, pregam a Palavra de Deus e celebram os sacramentos, especialmente o sacramento da Eucaristia.
Por que somente homens têm acesso ao sacerdócio?
A Igreja sempre chamou à ordem do sacerdócio apenas homens batizados. No período patrístico houve algumas seitas que defenderam um sacerdócio feminino, mas já então foram condenadas por Santo Irineu, Santo Epifânio e Tertuliano. Chamar apenas homens ao sacerdócio é uma prática da Igreja que não mudou ao longo de seus mais de vinte séculos de missão. Além disso, não há nenhum ensinamento conhecido contra isso por parte dos pastores, apesar do fato de que a missão cristã muitas vezes foi realizada em um ambiente onde as religiões conheciam um sacerdócio feminino.
A razão fundamental para esta decisão vem da Revelação. A Igreja sempre se sentiu ligada à vontade de Cristo, que escolheu como apóstolos apenas homens. Ele poderia ter escolhido para aquele colégio apostólico a criatura mais excelsa, sua Mãe Santíssima, mas não o fez. E também poderia ter escolhido as mulheres que o acompanhavam em sua vida pública, algumas das quais eram mais fiéis e mais fortes do que alguns dos Apóstolos, mas não o fez. Os Apóstolos, por sua vez, contaram com a colaboração de homens e mulheres, mas sentiram-se ligados à vontade do Senhor na hora de eleger os seus sucessores na missão pastoral, para a qual escolheram apenas homens. Pode-se pensar que isso é fruto da mentalidade judaica, mas em nenhum caso Cristo mostrou sinais de atuação condicionada por categorias culturais no relacionamento com as mulheres, a quem muito valorizou, ensinando a igual dignidade entre homem e mulher. De fato, seu comportamento contrastou com o que era comum entre os judeus da época, e o mesmo aconteceu com os apóstolos, que seguiam o Mestre também nessa forma de agir.
Em vários momentos levantou-se a possibilidade do acesso das mulheres ao sacerdócio. Por um lado, esta opinião ganha força com o desejo de corresponder a situações culturais que, de forma legítima, querem dar mais importância ao papel da mulher na sociedade e na família. Esta maior atenção é o resultado de uma compreensão mais profunda da mensagem do Evangelho, que proclama a igual dignidade de todos os seres humanos. Mas, por outro lado, esta opinião olha para a forma sacramental da Igreja, com a sua estrutura hierárquica, como se fosse uma forma meramente humana de se organizar. Em essência, afirmam que se os cristãos se organizam para a missão inspirando-se nas formas culturais em que vivem, podem agora incorporar as mulheres nessa estrutura social. Desta forma, mostrariam melhor a atenção às mulheres que já se encontra presente no Novo Testamento, e isso seria útil para a missão porque estaria mais de acordo com a mentalidade do homem moderno.
Certamente há coisas na organização da Igreja que são fruto da criação ou absorção de formas sociais em que os homens se organizaram, mas há outras que foram escolhidas e desejadas por Cristo. As primeiras são fruto da criatividade humana em sua resposta a Deus, as segundas são dadas por Deus. As primeiras podem ser alteradas dependendo da utilidade para a missão. As segundas não estão disponíveis para mudanças substanciais, porque vêm de uma vontade positiva de Cristo. Ao longo da história, a Igreja discerne quais pertencem ao primeiro grupo e quais correspondem ao segundo. Às vezes o discernimento não é uma tarefa fácil, requer paciência, estudo, meditação da Palavra de Deus e uma disposição aberta ao seu desígnio. Em seu momento, São Paulo VI e São João Paulo II, depois de terem estudado o assunto, reconheceram que a Igreja não tem o poder de admitir mulheres ao sacerdócio ministerial. Em 1994, o Papa São João Paulo II afirmou que este tema é um ensinamento definitivo da Igreja, que não é mais passível de revisão. No ano seguinte, reconhecendo que isso sempre foi ensinado por pastores espalhados pelo mundo em suas respectivas igrejas ao longo dos séculos, a Congregação para a Doutrina da Fé afirmou que era um ensinamento que usufrui da infalibilidade que Deus prometeu à sua Igreja no seu magistério ordinário e universal.
Miguel de Salis
Bibliografia básica
—Catecismo da Igreja Católica, 871-896.
— Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, 177-187, 333.
[1] Evangelii Gaudium, n. 24: “Os evangelizadores contraem assim o ‘cheiro das ovelhas’, e estas escutam a sua voz”.
[2] Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, 185.
[3] Cf. Instrução Donum veritatis, n. 31.
[4] Código de Direito Canônico, 752. Cf. Catecismo da Igreja Católica, 892.
[5] Catecismo da Igreja Católica, 861-862
[6] Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, 184, 186 e ss.