Meditações: 24º domingo do Tempo Comum (Ano A)

Reflexão para meditar no 24º domingo do Tempo Comum (Ano A). Os temas propostos são: Deus liquida a nossa dívida na Confissão; Perdoar, ato libertador; O mais divino na vida do cristão.

- Deus liquida a nossa dívida na Confissão

- Perdoar, ato libertador

- O mais divino na vida do cristão


JESUS contou certa vez a história de um rei que quis ajustar as contas com os seus servos (cfr. Mt 18, 23-35). Trouxeram-lhe então um que lhe devia dez mil talentos. Era de um valor exorbitante, diríamos hoje em dia que é uma dívida mais própria de uma grande empresa do que de uma pessoa. Como não tinha como devolver o valor, o Senhor ordenou que se fizesse o que era habitual na época nesses casos: “que fosse vendido como escravo, junto com a mulher e os filhos e tudo o que possuía, para que pagasse a dívida”. O servo então lançou-se a seus pés e lhe suplicava: “Dá-me um prazo! e eu te pagarei tudo”. O senhor, compadecido daquele servo, mandou soltá-lo e perdoou-lhe a dívida.

O servo havia pedido simplesmente mais tempo para devolver a quantia emprestada. No entanto, sua atitude havia conseguido mover o coração do rei. Ele não se limitou a prorrogar o tempo, mas perdoou todas as suas dívidas. Podemos imaginar que os ouvintes da parábola ficaram desconcertados. Pois bem, algo tão real como essa história acontece cada vez que recebemos o sacramento da Reconciliação, embora a dívida seja muito grande. Quando confessamos nossos pecados “Deus nos perdoa, esquece todo o mal que fizemos. Alguém comentou: ‘É a doença de Deus’. Não tem memória, é capaz de perder a memória nestes casos. Deus perde a memória das histórias más de tantos pecadores, dos nossos pecados. Perdoa-nos e segue em frente”[1].

Era praticamente impossível que aquele servo pudesse devolver a quantia emprestada: apenas um gesto de piedade como o do rei podia liberá-lo. Por nossas próprias obras também não poderíamos saldar a dívida que temos com o Senhor por nossos pecados. Não só pela importância das ações cometidas, mas por ser Deus quem é. O Senhor, de qualquer forma, concede-nos, gratuitamente, o seu perdão através da Confissão, e nos libera de tudo o que possa afastar-nos dele. Essa é a medida divina do seu amor. A Igreja recomenda, por isso, recorrer a esse sacramento regularmente, pois “ajuda a formar a consciência, a lutar contra nossas más tendências, a deixar-nos curar por Cristo, a progredir na vida do Espírito. Recebendo mais frequentemente, por meio deste sacramento, o dom da misericórdia do Pai, somos levados a ser misericordiosos como ele”[2].


QUANDO aquele servo saiu da presença do rei encontrou um companheiro que lhe devia cem denários. Não era uma quantia tão pequena – o salário correspondente a três meses de trabalho – mas insignificante comparada com a que o seu senhor tinha lhe perdoado. Quando aquele homem lançou-se a seus pés e lhe pediu um pouco mais de tempo, o servo negou-se a conceder-lhe uma nova prorrogação: mandou que o colocassem no cárcere até que pagasse a dívida. Seus companheiros, presenciando tudo, ficaram indignados e contaram ao rei o que tinha acontecido. Este, vendo a dureza de coração de seu súdito, “mandou jogá-lo na prisão, até que pagasse o que devia” (Mt 18, 34).

Perdoar o próximo é um ato libertador no qual o primeiro beneficiado é a própria pessoa. Se aquele servo tivesse perdoado a dívida, haveria uma dupla alegria: a de seu companheiro, porque já não teria que devolver nada; e a dele, pois poderia continuar desfrutando da sua liberdade. Pelo contrário, via-se agora encarcerado e obrigado a devolver uma importância exorbitante. De modo análogo, quando perdoamos alguém, livramo-nos de um possível rancor e ódio no coração e abraçamos a paz e a alegria que Deus nos oferece. “Suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos mutuamente, se um tiver queixa contra o outro – escrevia São Paulo – que a paz de Cristo reine em vossos corações” (Col 3, 13-15).

Podemos perdoar os outros porque Deus nos perdoou antes. E também poderíamos dizer o contrário: Deus nos perdoa porque vê que nós temos essa mesma atitude de misericórdia com os outros. Podemos pedir ao Senhor neste tempo de oração a graça de saber perdoar “desde o primeiro instante”, sabendo “que por grande que seja o prejuízo ou a ofensa que te façam, mais te tem perdoado Deus a ti”[3].


SÃO JOSEMARÍA afirmou certa vez que a coisa mais divina na vida dos cristãos é perdoar aqueles que os prejudicaram. O próprio Deus se fez homem precisamente para perdoar os pecados de todos os homens. Por isso, podemos dizer que “nada nos assemelha tanto a Deus como estar dispostos ao perdão”[4].

Na maior parte das vezes esse perdão será mais por conflitos pequenos e próprios da vida cotidiana: uma reação desagradável, uma brincadeira fora de hora, um mal-entendido, um esquecimento, etc. Muitas vezes, não se sabe quem deveria perdoar ou quem deveria pedir perdão. Outras vezes, pelo contrário, não há muitas dúvidas. Tanto num caso como no outro, é bom considerar, como sugere o prelado do Opus Dei, que “um sincero gesto de petição de perdão é, muitas vezes, a única maneira de restabelecer a harmonia no relacionamento, embora pensemos – com ou sem razão – que nós fomos a parte mais ofendida”[5].

Uma das últimas frases que o Senhor pronunciou antes de morrer foi, precisamente, de perdão aos que o tinham crucificado. E podemos imaginar que a Virgem Maria, ao ouvir essas palavras, estendeu também o seu perdão àquelas pessoas. “O Coração dulcíssimo de Maria deve ter sofrido muito ao presenciar aquela crueldade coletiva, aquele encarniçamento que foi, da parte dos verdugos a Paixão e Morte de Jesus. Mas Maria não fala. Como seu Filho, ama, cala e perdoa. Essa é a força do amor”[6].


[1] Francisco, Homilia, 17/03/2020.

[2] Catecismo da Igreja Católica, n. 1458.

[3] São Josemaría, Caminho, n. 452.

[4] São João Crisóstomo, Comment. In Matthaeum, Homilia XIX, n. 7: PG 57, 283.

[5] Mons. Fernando Ocáriz, Carta pastoral, 16/02/2023, n. 8.

[6] São Josemaría, Amigos de Deus, n. 237.