A vida humana necessita do amor

Na Audiência desta quarta-feira o Santo Padre abordou novamente o quinto Mandamento, recordando que aos olhos de Deus a vida humana é preciosa, sagrada e inviolável.

Hoje gostaria de prosseguir a catequese sobre a quinta Palavra do Decálogo, “Não matarás”. Como já salientamos, este mandamento revela que aos olhos de Deus a vida humana é preciosa, sagrada e inviolável. Ninguém pode desprezar a vida do próximo, nem sequer a própria; com efeito, o homem traz em si a imagem de Deus e é objeto do seu amor infinito, independentemente da condição em que foi chamado à existência.

No trecho do Evangelho que há pouco ouvimos, Jesus revela-nos um sentido ainda mais profundo deste mandamento. Ele afirma que, diante do tribunal de Deus, até a ira contra o irmão é uma forma de homicídio. Por isso, o Apóstolo João escreverá: “Quem odeia o seu irmão é assassino” (1 Jo 3, 15). Mas Jesus não se limita a isto, e na mesma lógica acrescenta que até o insulto e o desprezo podem matar. E é verdade que nós estamos habituados a insultar. Em nós o insulto nasce espontâneo como se fosse uma respiração. Mas Jesus diz-nos: “Detém-te, porque o insulto faz mal, mata!”. O desprezo. ‘Mas eu... desprezo estas pessoas’. E esta é uma forma de matar a dignidade de uma pessoa. Como seria bom se este ensinamento de Jesus entrasse na mente e no coração, e cada um de nós dissesse: ‘Nunca insultarei ninguém’. Seria um bom propósito, porque Jesus nos diz: ‘Olha, se você desprezar, insultar, odiar, isto é um homicídio’.

Nenhum código humano equipara gestos tão diferentes, atribuindo-lhes o mesmo grau de juízo. E, coerentemente, Jesus convida até a interromper a oferenda do sacrifício no templo, se nos recordarmos que um irmão está ofendido conosco, a ir à sua procura para nos reconciliarmos com ele. Também nós, quando vamos à Missa, deveríamos ter esta atitude de reconciliação com as pessoas com as quais tivemos problemas. Só pensar mal delas, já é um insulto. Muitas vezes, enquanto esperamos que o sacerdote chegue para celebrar a Missa, bisbilhotamos um pouco e falamos mal do próximo. Mas não se pode fazer isto! Pensemos na gravidade do insulto, do desprezo, do ódio: Jesus coloca-os no nível do assassinato.

Para aniquilar um homem basta ignorá-lo.
A indiferença mata.

O que Jesus quer dizer, ampliando a tal ponto o âmbito da quinta Palavra? O homem tem uma vida nobre, muito sensível, e possui um eu recôndito não menos importante que o seu ser físico. Com efeito, para ofender a inocência de uma criança é suficiente uma frase inoportuna. Para ferir uma mulher, pode bastar um gesto de insensibilidade. Para partir o coração de um jovem, é suficiente negar-lhe a confiança. Para aniquilar um homem basta ignorá-lo. A indiferença mata. É como se disséssemos a outrem: ‘Para mim você está morto’, porque você o matou no seu coração. Não amar é o primeiro passo para matar; e não matar é o primeiro passo para amar.

No início da Bíblia lê-se aquela frase terrível que saiu dos lábios do primeiro homicida, Caim, depois de o Senhor lhe ter perguntado onde está o seu irmão. Caim respondeu: “Não sei! Sou porventura eu o guardião do meu irmão?” (Gn 4, 9)[1]. Assim falam os assassinos: ‘Não me diz respeito’, ‘são problemas seus’, e outras frases semelhantes. Procuremos responder a esta pergunta: somos nós guardas dos nossos irmãos? Sim, somos! Somos guardas uns dos outros! E este é o caminho da vida, é a vereda do não assassinato.

O amor ao qual não podemos renunciar é aquele que perdoa, que acolhe quem nos fez mal.

A vida humana precisa de amor. E qual é o amor autêntico? É aquele que Cristo nos mostrou, ou seja, a misericórdia. O amor ao qual não podemos renunciar é aquele que perdoa, que acolhe quem nos fez mal. Nenhum de nós pode sobreviver sem misericórdia; todos têm necessidade do perdão. Portanto, se matar significa destruir, suprimir, eliminar alguém, então não matar quer dizer cuidar, valorizar, incluir. E também perdoar.

Ninguém se pode iludir, pensando: ‘Estou tranquilo, pois não faço nada de mal’. Um mineral ou uma planta têm este tipo de existência, mas um homem não. Uma pessoa — um homem ou uma mulher — não! Exige-se mais de um homem ou de uma mulher. Há o bem a fazer, preparado para cada um de nós, cada qual o seu, que nos torna nós mesmos até ao fundo. ‘Não matarás’ é um apelo ao amor e à misericórdia, é uma chamada a viver segundo o Senhor Jesus, que deu a vida por nós, e por nós ressuscitou. Certa vez repetimos todos juntos, aqui na Praça, uma frase dum Santo sobre isto. Talvez nos ajude: ‘Não praticar o mal é algo bom. Mas não praticar o bem não é bom’. Devemos praticar sempre o bem. Ir além!

Ele, o Senhor que, encarnando-se, santificou a nossa existência; Ele que, com o seu sangue, a tornou inestimável; Ele, “o Autor da vida” (At 3, 15), graças ao qual cada pessoa é um dom do Pai. N’Ele, no seu amor mais forte do que a morte, e pelo poder do Espírito que o Pai nos confere, podemos acolher a Palavra “Não matarás” como o apelo mais importante e essencial: ou seja, não matarás significa um apelo ao amor.

Saudações

Saúdo os peregrinos vindos de Portugal e do Brasil, particularmente os fiéis de Itu, Várzea Paulista e Tubarão. Queridos amigos, cuidar do irmão, especialmente de quem passa necessidade ou é esquecido pela cultura do descarte, significa crer que cada homem e cada mulher é um dom de Deus. Não poupemos esforços para que todas as pessoas possam sentir-se sempre acolhidas e amadas nas nossas comunidades cristãs. Que Deus vos abençoe!

Hoje se celebra a memória litúrgica de Santo Inácio de Antioquia, Bispo e Mártir em Roma. Aprendamos deste Santo Bispo da antiga Síria a testemunhar a nossa fé com coragem. Por sua intercessão, o Senhor conceda a cada um de nós a força da perseverança, não obstante as adversidades e as perseguições.


Recursos relacionados com esta catequese do Papa Francisco

O que são os dez mandamentos? Quais são?

Explicação de cada um dos 10 Mandamentos:

1. Amar a Deus sobre todas as coisas
2. Não tomar seu santo nome em vão
3. Guardar domingos e festas de guarda
4. Honrar Pai e Mãe
5. Não matar
6. Não pecar contra a castidade
7. Não roubar
8. Não levantar falso testemunho
9. Não desejar a mulher do próximo
10. Não cobiçar as coisas alheias


[1] Cf. Catecismo da Igreja Católica, 2.259: “A Sagrada Escritura, na narrativa da morte de Abel por parte do seu irmão Caim, revela, desde os primórdios da história humana, a presença no homem da cólera e da inveja, consequências do pecado original. O homem tornou-se inimigo do seu semelhante. Deus denuncia a perversidade deste fratricídio: ‘Que fizeste? A voz do sangue do teu irmão clama da terra por mim. No futuro, serás maldito sobre a terra, que abriu a sua boca para beber, da tua mão, o sangue do teu irmão’ (Gn 4, 10-11)”.