O meu nome é Krishna, nasci numa comunidade Hare Krishna e passei de fumar haxixe a ir à Missa todos os dias.
Quero contar-vos um pouco o meu testemunho. Nasci numa aldeia de Guadalajara e numa comunidade Hare Krishna porque os meus pais estavam encantados com essa espiritualidade. Quando tinha dois anos, mudei-me para Boadilla del Monte (Madrid); tive uma pneumonia e fomos residir para lá, porque o clima era melhor.
Passei quase toda a minha vida em Madrid. A minha infância foi muito bonita até aos 5 anos. Os meus pais estavam muito bem, tinham muitos negócios na Índia, traziam prata, pedras semipreciosas, produtos, recebiam encomendas de toda a Espanha… A vida corria-lhes bastante bem.
Quando eu tinha 5 anos, o meu pai faleceu e deixou algumas dívidas. A minha mãe ficou sozinha com três filhos e teve de sustentar a família. Ela foi uma guerreira, amou-nos sempre com loucura e a verdade é que lhe devo tudo. Há coisas da nossa infância que nos fazem ser um pouco diferentes: eu sempre tive tendência para a asneira, para chamar a atenção, fazer o que é proibido, quebrar as regras, etc. Isto levou-me a ter certas amizades que não eram as melhores; sempre me deixei influenciar muito.
Droga e litros de cerveja
No 6.º ano do ensino básico, com os amigos da minha urbanização, experimentei os charros (cigarros total ou parcialmente cheios de cannabis) e o tabaco também. A minha mãe apanhou-me com um pouco de marijuana. Com 12 anos já se via onde é que eu ia parar, não é verdade? A minha mãe previu o que poderia acontecer e disse: “este miúdo tem de ser posto nalgum sítio”. E pôs-me num “colégio de padres”, como ela lhe chamava. Fui para o colégio Andel (em Alcorcón), onde fiz o ensino secundário.
Nessa altura, não gostava nada daquilo. Dizia para mim: “Oh, estes betinhos com gravata! O que é que vai ser esta gente?”. Mas a verdade é que me ajudou muito e agora olho para trás e vejo que foi ótimo: os professores que tive ensinaram-me a trabalhar, a estudar. De facto, apoiam muito os alunos, tratam-nos muito bem. Dão-lhes formação católica, podem ir à Missa, se quiserem, falar com um padre... Tiram-lhes todas essas vergonhas de recorrer a um sacerdote. Creio que me salvaram a vida ao ter a possibilidade de, sem vergonha, ir ter com ele sempre que necessário.
No ESO (Ensino Secundário Obrigatório), já fumava tabaco e charros com os amigos, deixava-me influenciar e a verdade é que nem sequer pensei nisso quando mos ofereceram pela primeira vez. Recordo que foi num descampado, onde tínhamos uma toca construída com móveis roubados, para onde íamos sempre.
Não parei para pensar se gostava ou não. Simplesmente experimentava e ria-me com eles. Mas pouco a pouco, aos 14 anos, o meu plano de fim de semana começou a consistir em beber litros de cerveja. Quando me apercebi, já estava a gastar 5 euros em cerveja todos os dias e o plano durante a semana era esse e fumar charros. Aos fins de semana, comprávamos o dobro de tudo e bebíamos cubatas com os amigos de festa, em descampados, e chegávamos a casa à meia-noite.
Quando chegava, tinha problemas todos os dias; era uma situação um pouco conflituosa. A minha mãe sempre foi antidroga, anticharros, antiálcool... Todas as semanas tinha alguma discussão com ela e a verdade é que a pobre teve de lidar primeiro com o problema do meu pai, uma história que também dá para uma tertúlia. Ela sempre esteve alerta. Mais tarde descobri que, nessa altura, ela deixou o Hare Krishna e começou a ir à Missa e a rezar o terço com a minha avó todos os dias para pedir por mim. Tinham um grupo de oração onde rezavam para que eu me afastasse de todos estes vícios.
No 4º ano do ESO mudaram-me para a escola pública, onde me dei bem com todos os meus amigos. Aí notei que era outra coisa: não se é tão acompanhado pelos professores, as pessoas não prestam uma atenção personalizada, os colegas são um pouco mais maus. Eu entrava na aula muito pedrado e eles riam-se de mim. A verdade é que acho que foi o pior ano da minha vida.
Comecei a “enlouquecer” com os charros, com o álcool e comecei a pensar que as pessoas se riam de mim. Deixei de fumar porque me caía muito mal e comecei a experimentar outras coisas. Aos 16 anos, infiltrávamo-nos em discotecas, bebíamos álcool às escondidas porque não tínhamos dinheiro, usava um cartão de cidadão falso, etc.
Repeti um ano académico por ter más notas, mudaram-me uma vez mais de escola e as brigas com a minha mãe continuavam. Tivemos de nos mudar de Boadilla del Monte para Valdebebas, outro bairro de Madrid.
A última bala... um Pai-Nosso
Recordo que, antes de nos mudarmos, na casa que deixávamos, houve uma noite em que eu estive muitíssimo mal, a tal ponto que usei a única, a última bala que me restava na culatra, porque tinha tentado tudo, tinha tentado tudo o que o mundo oferece para se ser feliz: drogas, raparigas, popularidade... tudo o que o mundo oferece, e a verdade é que não me preenchia. Eu estava muito triste. Então, nessa noite, engoli o meu orgulho e lembro-me que rezei um Pai-Nosso, dizendo: “Preciso de Ti”.
Comi o meu orgulho e a soberba de que eu podia tudo e mudei o chip para reconhecer que estava mal e que necessitava de ajuda; por isso pedi-a a Deus. No dia seguinte não mudou nada, mas foi um ponto de viragem em que foram acontecendo coisas pequenas, ou grandes, e que me ajudaram a mudar de vida.
Uma videochamada de Bilbau
Terminei o ensino secundário em Madrid e continuei a sair para festas com os amigos. Durante o último ano, já não consumia drogas. Mudei-me para Bilbau e comecei a estudar, e a trabalhar na cozinha de um restaurante. O bom da cozinha é que se trabalha todos os fins de semana e não se pode sair para festas porque se trabalha até tarde. Pouco a pouco, comecei a ir à Missa aos domingos, a ler o Evangelho enquanto ia ou voltava da escola, etc. Ligava a rádio e ouvia. As leituras chamavam-me muito a atenção e enchiam-me.
Um dia decidi confessar-me e foi fenomenal. Continuei a ir à Missa aos domingos e encontrei, na casa para onde nos tínhamos mudado em Bilbau, um livro chamado ‘A Imitação de Cristo’, de Tomás Kempis, que era muito potente. Dizia coisas sobre o cristianismo que faziam muito sentido, e à noite facilmente podia passar duas horas de joelhos a rezar. Era impressionante, enchia-me muitíssimo, mas sentia que me faltava algo mais, precisava sempre de algo mais: ia à Missa, confessava-me, falava com um padre, mas faltava-me algo.
Depois veio a pandemia e eu rezava, mas bebia umas cervejas e ficava acordado até às 4 da manhã em videojogos. Quando a pandemia acabou, um dia fizemos uma videochamada com antigos membros do clube do Opus Dei que eu frequentava quando era miúdo, quando andava no quinto e sexto ano do ensino básico. Falámos de tudo e de nada.
Quando acabou, disse: “Não haverá algo parecido a isto em Bilbau?”. Lembrei-me que me sentia muito bem com esta gente... e que, além disso, rezava. Então escrevi ao meu monitor e ele pôs-me em contacto com uma pessoa do Opus Dei em Bilbau. Comecei a falar com esse rapaz e a primeira vez que falei com ele, pus-me a chorar porque lhe contei a minha vida: que estava péssimo apesar de ir à Missa, que ainda tinha feridas para sarar.
Ele animou-me a rezar mais, a rezar o terço, etc., mas houve uma coisa que mudou a minha vida e pela qual hoje estou aqui. Disse-me: “Tu, Krishna, podes ser santo”. Eu pensei: “Este homem ainda me não conhece”. E insistiu-me: “Não, não! Tu podes ser santo e estás chamado a ser santo. Todos somos chamados a ser santos e não és tu que vais fazê-lo, é Deus que o faz em ti”, e isso deixou-me perplexo.
Feliz com maiúsculas
A partir daí, começámos a falar e eu fazia o que me diziam: começava a semana muito bem, depois baixava, subidas, quedas, as coisas do costume, mas no fim ligam-se os pontos: de repente, caí num clube do Opus Dei, falaram-me de santidade no meio do mundo e, num dado momento, propuseram-me pedir a admissão no Opus Dei e entregar-me a Deus.
A verdade é que me custou um pouco a ideia do celibato; dizemos “gosto muito das mulheres; talvez isto não seja para mim”, mas claro que todos gostamos delas, mas Deus precisa de gente, chama-nos como aos Apóstolos, embora não estejamos à espera.
Custou-me um pouco, muitas pessoas rezaram várias novenas por mim e, no final, atirei-me para a piscina e confiei. A verdade é que, quatro anos depois, continuo muito feliz. Continuo a lutar, não nas mesmas coisas, obviamente, mas tem de haver sempre luta. Quando pedi a admissão, disse: “Cheguei, está tudo feito, é ótimo”. Mas não, eu acabava de começar tudo e hoje, sim, posso dizer que sou feliz, com maiúsculas.
Perceber que Deus te ama, que está pendente de ti, que tem para ti um objetivo e uma missão concreta... é impressionante! A liberdade que te dá para fazeres o que quiseres... Cada dia não posso fazer outra coisa senão dar graças à minha família que rezou tanto por mim: à minha mãe, que bem pode ser Santa Mónica, a mãe de Santo Agostinho, e igualmente à minha avó.