Em outubro de 2025, o Centro de Estudos Josemaria Escrivá (CEJE) fez 30 anos, às portas do centenário do Opus Dei. Começou como um fundo bibliográfico exaustivo sobre as publicações acerca de Josemaria Escrivá, do Opus Dei e dos seus membros, e é agora um espaço que integra documentação bibliográfica, investigação e divulgação.
Atualmente, sob a direção de Santiago Martínez, o centro almeja um futuro mais global e digital. Ao longo do seu percurso, o CEJE tem vindo a incorporar novas ferramentas e estratégias para estabelecer ligação com públicos mais amplos e diversificar as suas linhas de trabalho. Nesta entrevista, Martínez fala-nos sobre a evolução das abordagens de investigação, dos desafios de estudar uma instituição com projeção internacional e dos projetos que marcarão os próximos anos do centro.
Como nasceu o Centro de Estudos Josemaria Escrivá (CEJE)?
O atual CEJE, então designado Centro de Documentação Josemaria Escrivá, surgiu por iniciativa de Javier Hervada (1934-2020), catedrático de Direito Canónico da Universidade de Navarra. Após a beatificação de Josemaria Escrivá, em 1992, Hervada propôs à Reitoria a criação de um centro dedicado à figura de Escrivá e à instituição que fundou. A ideia consistia em reunir e conservar a bibliografia publicada sobre o Opus Dei e o seu fundador, em diferentes línguas e países. Essa proposta levou à criação do Centro e à aquisição de numerosas obras centradas em ambos os temas.
Quais foram os marcos mais importantes no percurso do CEJE? Que projetos marcaram um antes e um depois?
A história do CEJE pode sintetizar-se em três áreas: documentação, investigação e divulgação. A primeira começou com a constituição de um fundo bibliográfico na Biblioteca da Universidade de Navarra. Estávamos nos anos 90, num mundo anterior à internet, em que a consulta de livros e publicações em bibliotecas universitárias era essencial para os investigadores.
O segundo momento decisivo ocorreu em 2010, quando o Centro de Documentação Josemaria Escrivá – então denominado Centro de Documentação e Estudos Josemaria Escrivá – iniciou a sua atividade de investigação, alargando assim a finalidade do centro: já não apenas conservar bibliografia – livros, não arquivos –, mas também produzir estudos próprios sobre a história do Opus Dei e do seu fundador.
O terceiro marco situa-se entre 2022 e 2023, com a incorporação da divulgação dessas investigações como uma nova linha de trabalho. Isto permitiu transmitir à sociedade as nossas investigações e também a bibliografia acumulada ao longo de décadas sobre a história do Opus Dei, aproximando o seu conhecimento a públicos mais vastos.
Ao longo destas décadas, mudaram as abordagens historiográficas com que trabalham os investigadores do CEJE?
Trinta anos equivalem, mais ou menos, a uma geração. Atualmente, no CEJE convivem duas gerações de investigadores: alguns rondam os 50 anos e outros estão próximos dos 30. Cada geração traz as suas próprias perguntas e também as suas respostas – e isso faz-se sentir.
Mais do que falar de mudanças nas abordagens historiográficas, diria que o que se alterou – ou melhor, o que se reforçou – foi a atenção ao contexto. Hoje existe um esforço consciente por situar o Opus Dei na realidade religiosa, cultural, universitária, social ou política dos lugares onde nasceu e se desenvolveu.
A isso juntam-se três linhas ou abordagens temáticas que ganharam relevância: a história das mulheres do Opus Dei; a dimensão biográfica – pois compreender vidas concretas ajuda a entender como se viveu uma mensagem –; e os estudos sobre a chegada e o crescimento do Opus Dei num determinado país, área que tem registado um avanço significativo.

E que diria a quem afirma que o Opus Dei é um tema difícil de estudar do ponto de vista académico?
Diria que têm parte de razão… e parte não. Há uma dimensão institucional do Opus Dei que é relativamente acessível ao investigador: a sua configuração jurídica, a sua história fundacional, a sua expansão, os seus documentos oficiais. Tudo isso pode ser estudado com métodos clássicos e com bastante clareza.
A dificuldade surge quando passamos à vivência da mensagem na biografia das pessoas. Aí entram matizes, percursos individuais, experiências espirituais e sociais – e isso é sempre mais complexo de narrar e de medir. As biografias ajudam, mas não são um terreno tão fácil de delimitar.
A isto soma-se outro desafio: a expansão geográfica. O Opus Dei nasce em Espanha, mas muito cedo se estende pela Europa, América, África e Ásia. Torna-se uma instituição global e, portanto, o seu relato nem pode nem deve ser escrito a partir de uma perspetiva espanhola. Precisamos de historiadores com sensibilidade local – argentina, chilena, nigeriana, chinesa, australiana… – que conheçam por dentro os contextos em que a Obra lançou raízes. É por isso que estamos a promover redes académicas que permitam construir essa história com vozes provenientes de diferentes lugares.
Como é que o CEJE se adaptou às novas formas de comunicação? Como está a tentar alcançar não só especialistas, mas também um público mais vasto?
Temos avançado de acordo com as nossas possibilidades. Destacaria dois marcos claros. O primeiro foi em 2010, com o lançamento da Biblioteca Virtual Josemaria Escrivá e Opus Dei. O seu objetivo foi disponibilizar ao público a produção bibliográfica existente: não apenas referências de livros e artigos, mas também, sempre que possível, os textos completos em PDF, incluindo muitos materiais já fora de catálogo. Esse projeto está diretamente ligado à origem do centro e à sua vocação de reunir e difundir bibliografia.
O segundo impulso chegou, como já referi, em 2022, com a produção do podcast Fragmentos de História e com a divulgação de material audiovisual nas redes sociais, o que nos permitiu alcançar audiências fora do mundo universitário.
Agora, em 2025, estamos concentrados em duas linhas de trabalho. Por um lado, criar um site dedicado à história do Opus Dei, pensado para formatos digitais variados. Por outro, explorar a inteligência artificial, que permite muitas possibilidades de gerar conteúdos originais e de proporcionar um acesso mais inovador e apelativo.
O CEJE está a viver o seu 30.º aniversário pouco antes do centenário do Opus Dei (2028-2030). Como se estão a preparar para essa data?
Com grande entusiasmo. O nosso objetivo é prosseguir essas três linhas de trabalho que definem o centro: localizar e conservar o que foi publicado, promover investigação própria e difundir esses conteúdos.
Além disso, queremos comemorar este aniversário com um projeto especial: estamos a preparar uma exposição sobre a história do Opus Dei e o seu impacto, tanto dentro da instituição como na Igreja e nos diversos países onde lançou raízes ao longo de quase um século.
Como imagina os próximos dez anos para o CEJE?
Gostaria que todas as pesquisas e publicações que realizámos sobre a história do Opus Dei servissem como influência para a narrativa de outros estudiosos sobre o catolicismo e sobre esta instituição.
Conto também que possamos chegar a públicos mais vastos, não apenas os de língua espanhola. Queremos expandir o nosso alcance nos mundos de língua inglesa e francesa e conquistar espaço noutras línguas amplamente faladas, como o chinês e o russo. A ideia é partilhar histórias pessoais, análises da mensagem do Opus Dei e estudos sobre a sua expansão. Como realidade global, também merece um alcance global, e ambicionamos que o CEJE esteja à altura deste desafio.

