«Nada se perde!»: aula do Prelado sobre a esperança

Partilhamos uma aula de Mons. Fernando Ocáriz, dada em Roma em novembro de 2024, na qual faz uma reflexão sobre a virtude da esperança, por ocasião do Ano Jubilar.

A bula de convocação do Jubileu 2025, publicada pelo Papa Francisco, começa com umas palavras de São Paulo dirigidas aos Romanos, que dão também nome ao documento: «A esperança não engana» (Rm 5, 5), Spes non confundit. Estas palavras encerram um conteúdo muito profundo. Quando temos verdadeira esperança, esta não falha. Podemos falhar nós, mas a esperança nunca, porque Deus é fiel ao seu amor por nós e às suas promessas.

É verdade que, por vezes, podemos ter esperança em coisas que não acontecem: por exemplo, confiamos na eficácia de uma determinada iniciativa apostólica ou no resultado de uma conversa, e pode suceder que os frutos não apareçam. Significa isto que a esperança nos enganou? Não, porque a esperança que se fundamenta no amor de Deus por nós permite-nos afirmar com segurança, como dizia São Josemaria: «Nada se perde!»[1]. O que fazemos pelo Senhor, o que realizamos seguindo a vontade de Deus, é sempre eficaz, mesmo que não vejamos de imediato os resultados. Talvez os vejamos de outra forma, noutro momento, ou até não os vejamos nesta vida. Talvez seja um fruto diferente do que esperávamos. Assim, podemos ter a segura esperança de que nada se perde.

Depois desta breve introdução, esta aula consistirá, basicamente, em reler alguns textos do Papa – da bula de convocação do Jubileu 2025 –, de São Josemaria e, naturalmente, da Sagrada Escritura. A minha intenção, ao lê-los e comentá-los brevemente, é que nos deem ocasião de fomentar uma disposição na alma que permita que a nossa esperança cresça. A esperança sobrenatural é um dom de Deus; não se pode alcançar apenas com as forças humanas, mas podemos preparar a alma para receber os dons de Deus, especialmente a fé, a esperança e a caridade.

Que é a esperança?

A esperança é uma virtude que nos leva a confiar em que vamos alcançar um bem futuro, mais ou menos árduo, mas possível. Estes são os três requisitos: futuro, árduo e possível. Não teria sentido uma esperança que não cumprisse estes critérios. Por exemplo, não posso dizer que tenho esperança de viajar amanhã à Lua; seria uma esperança “louca”, porque não é possível. Também não é esperança desejar algo que não é árduo. Não tenho esperança, em sentido estrito, de que dentro de três horas estarei em minha casa. Embora nesta vida nada seja absolutamente certo, há coisas que, humanamente falando, não são propriamente objeto de esperança.

A esperança é uma virtude humana fundamental, porque todos esperamos alguma coisa. Estamos sempre à espera dos frutos do nosso trabalho, de bens possíveis, do desfecho de todo o tipo de situações. Mas, como recordei no início, a esperança é também uma virtude sobrenatural, teologal. E que se espera com a virtude sobrenatural da esperança? A vida eterna, a união com Deus, a salvação, a felicidade imensa do Céu. Essa é a grande esperança. Participar na vida de Deus é uma realidade possível, porque é o próprio Deus que no-la oferece.

Já existe no coração de toda a pessoa uma esperança humana, natural, necessária. Escreve o Papa: «No coração de cada pessoa, encerra-se a esperança como desejo e expetativa do bem, apesar de não saber o que trará consigo o amanhã»[2]. A esperança, mesmo que não seja de algo certo humanamente, também não é de algo impossível; é uma expetativa do bem, uma possibilidade de que esse bem chegue...

O objeto da esperança teologal, que leva à plenitude também a natural, é a salvação, a felicidade eterna com Deus. Diz São Paulo: «A esperança que vos está reservada nos Céus» (Cl 1, 5). Esta esperança na felicidade do Céu está unida à fé no amor de Deus por nós e nos meios que Ele nos deu para chegarmos ao Céu: a Eucaristia, a oração…

Tão importante é a esperança na vida eterna, que o Concílio de Trento condenou os que afirmavam que era errado ter esperança na vida eterna e que se devia agir bem sem pretender alcançar a recompensa do Céu. O concílio afirma: «Se alguém disser que uma pessoa justificada peca ao agir corretamente movida pela esperança da recompensa eterna, seja anátema»[3]. A esperança na recompensa eterna não só não é má, como é algo que Deus quer e que está unida à fé e à caridade.

O fundamento da esperança

Qual é o fundamento da esperança? A resposta é simples: a fé. Como se expressa na Carta aos Hebreus: «A fé é garantia das coisas que se esperam» (Hb 11, 1). Que fé é esta? A fé no amor de Deus por nós. Uma fé que dá segurança à esperança, porque se fundamenta em algo que nunca falha: o amor inquebrantável de Deus por cada um.

O Papa afirma que «a esperança nasce do amor e funda-se no amor que brota do Coração de Jesus trespassado na cruz»[4]. E cita de imediato São Paulo, na Carta aos Romanos: «Se, quando éramos inimigos, fomos reconciliados com Ele pela morte de seu Filho, com muito mais razão, uma vez reconciliados, havemos de ser salvos pela sua vida» (Rm 5, 10). Assim, a esperança nasce da segurança da fé no amor de Deus por nós.

Precisamos de fomentar na nossa vida esta fé no amor de Deus, que é um amor concreto. Não se trata de um amor abstrato pela humanidade em geral, mas de um amor pessoal, dirigido a cada um de nós, agora e sempre. O Senhor olha-nos, está em nós pela graça que nos eleva e santifica, e ama-nos de modo muito pessoal. Este amor é a nossa força, a que nos leva a esperar em algo que, sendo árduo, é possível: chegarmos a ser santos, que é a meta do que esperamos – a união definitiva e plena com Deus.

É importante recordar que, na vida espiritual, na luta ascética, ao começar e recomeçar, é sempre necessário viver de esperança. Uma esperança com fundamento. Não nas nossas forças, como se fosse uma luta que tivéssemos de vencer a todo o custo, mas fundamentada no amor de Deus. Deus conta com a nossa fraqueza, mas sobretudo conta com a sua infinita potência, que se identifica com o seu amor por nós.

É também importante considerar que em Deus se identificam o conhecimento e o amor. Ele conhece-nos e ama-nos infinitamente. E, em concreto, o espírito do Opus Dei leva-nos a considerar que o amor de Deus nos torna verdadeiramente filhas e filhos seus. Esta consciência da filiação divina fortalece a nossa esperança, como explica São Josemaria numa homilia: «A mim, e desejo que a vós vos suceda o mesmo, a segurança de me sentir – de me saber – filho de Deus enche-me de verdadeira esperança que, por ser virtude sobrenatural, ao ser infundida nas criaturas, se acomoda à nossa natureza e é também virtude muito humana»[5].

A virtude sobrenatural da esperança eleva a capacidade natural humana de esperar no bem, ainda que difícil. Sabermo-nos filhos de Deus leva-nos a ter uma esperança segura na meta. A experiência das próprias misérias poderia, quando muito, levar a aspirar apenas a salvar-se, como se a salvação não coincidisse com a santidade, considerando a santidade uma “utopia ascética”. Ser santo é o fim, e se a vida terminar sem santidade suficiente, passar-se-á pelo purgatório até alcançá-la. É difícil chegar à santidade sem esforço, por isso a vida de santificação é exigente, mas a esperança de a alcançar torna-se possível com a graça de Deus.

Como acabei de recordar com palavras do nosso Padre [São Josemaria], o tom da nossa esperança está marcado pela filiação divina. Temos um motivo extraordinário para ter esperança em ser santos, em acreditar na eficácia da nossa vida: somos filhas e filhos amados por Deus. Tantas vezes o recordamos, agora com palavras de São João: «Nós conhecemos o amor que Deus nos tem, pois cremos nele» (1Jo 4, 16). Isto é da essência da vida segundo o Evangelho: conhecer e acreditar no amor de Deus por nós, sabendo que somos filhos de Deus graças ao seu amor. E atualizar esta fé.

Esta fé no amor de Deus leva a vivermos confiantes na Providência. Isto é, sabendo que não estamos abandonados ao acaso no mundo. Não é que Deus nos ame muito e depois nos deixe sozinhos. Deus ama-nos e, respeitando a nossa liberdade, acompanha-nos constantemente. O seu não é um amor distante, mas providente. O Papa Bento XVI, na encíclica sobre a esperança, Spe salvi, escreve: «Deus é o fundamento da esperança – não um deus qualquer, mas aquele Deus que possui um rosto humano e que nos amou até ao fim: cada indivíduo e a humanidade no seu conjunto»[6]. A fé neste amor concreto de Deus por nós é o fundamento da nossa esperança. Em contraste, São Paulo, na Carta aos Efésios, descreve os gentios como pessoas «sem esperança e sem Deus no mundo» (Ef 2, 12). A esperança está baseada em Deus, no seu amor concreto e pessoal. Embora existam esperanças humanas, limitam-se a esta vida e não vão além dela. Sem Deus, não se pode ter verdadeira esperança em algo definitivo.

A certeza de que Deus está empenhado

A esperança cristã tem uma característica aparentemente contraditória: a certeza. Podemos ter certeza de algo que é possível, mas não imediato nem completamente seguro? Sim: temos uma esperança certa, fundamentada na vontade de Deus, em que Ele é fiel ao amor que tem por nós.

«Esta é a vontade de Deus: a vossa santificação» (1Ts 4, 3). Isto não significa apenas que Deus queira que sejamos santos, mas que Ele próprio está empenhado – por assim dizer – na nossa santificação. Deus não só nos dá os meios – a revelação, os sacramentos… – como, sem forçar a nossa liberdade, nos concede também todas as graças necessárias para que cheguemos à meta. Temos a esperança certa de alcançar a meta se quisermos, porque a graça não nos faltará: Deus é fiel.

Como sintetizam as palavras de São Paulo na Epístola aos Efésios: «Deus, que é rico em misericórdia, pelo amor imenso com que nos amou, precisamente a nós, que estávamos mortos pelas nossas faltas, deu-nos a vida com Cristo – é pela graça que vós estais salvos – com Ele nos ressuscitou e nos sentou no alto do Céu, em Cristo» (Ef 2, 4-7). O Apóstolo não diz «há de fazer-nos sentar no alto do Céu», mas «nos sentou no alto do Céu». Esta força da esperança leva à certeza, sem deixar de ser esperança

São Josemaria escreveu: «Sou feliz com a certeza do Céu que alcançaremos, se permanecermos fiéis até ao fim»[7]. Embora pareça contraditório «estar certo de algo que não é certo», na realidade não é. É nisso que consiste a verdadeira esperança cristã. Temos tal segurança no amor de Deus que podemos ter uma esperança certa e firme. Esta esperança sobrepõe-se às nossas misérias e defeitos, e leva-nos à certeza de que, como dizia o nosso Padre, ainda que morramos com defeitos, podemos ser santos porque o Senhor, com a nossa correspondência, nos levará a uma santidade que consiste na plenitude do amor. E a plenitude do amor é plenamente compatível com ter defeitos, desde que esses defeitos não sejam aceites nem queridos, mas combatidos por amor, uma e outra vez, ainda que não se consiga vencê-los totalmente.

Portanto, temos a certeza de que iremos para o Céu se formos fiéis, se permanecermos no seu amor. E, além disso, temos a segurança de que seremos fiéis se quisermos, se perseverarmos livremente no amor, porque a graça de Deus não nos faltará.

A certeza do impossível

A esperança cristã não é uma esperança quimérica, porque contamos com a graça de Deus. Por isso, no plano sobrenatural, pensando tanto na nossa santificação pessoal como na eficácia permanente do trabalho apostólico da Obra – tanto na vida pessoal como no nosso esforço por levar o Opus Dei para a frente – devemos ter em conta o que dizia São Josemaria sobre «a certeza do impossível»[8]. A esperança torna possível «ter a certeza do impossível».

A certeza do impossível é, antes de mais, a de sermos santos, porque, quando experimentamos a nossa fraqueza ou a nossa limitada capacidade, parece impossível que possamos chegar a sê-lo. No entanto, temos a certeza de que podemos, porque possuímos a fé no amor de Deus, que é o fundamento da esperança.

É também muito bonito o que São Paulo recorda na sua Epístola aos Romanos a propósito da figura de Abraão, que acreditou contra toda a esperança. São Josemaria gostava muito de recordar esta expressão: «Esperar contra toda a esperança». Dito assim, parece uma contradição, mas, bem entendido, é a plenitude da esperança. Significa que podemos esperar mesmo quando, humanamente, não há motivo.

A esperança cristã, portanto, tem um fundamento firme: o próprio Deus oferece a união com Ele, que será a glória do Céu. Mas essa esperança manifesta-se também em muitos aspetos da vida quotidiana. É muito importante a esperança apostólica. Como escreve São Paulo na Primeira Epístola aos Coríntios: «Sabendo que o vosso trabalho não é inútil no Senhor» (1Cor 15, 58). O nosso Padre quis colocar as palavras latinas deste texto no dintel de pedra de uma porta da Villa Vecchia, em Roma: Semper scientes quod labor vester non est inanis in Domino. Nada do que fazemos é vão diante de Deus.

O Papa, na Spes non confundit, convida a transmitir esperança, quando escreve: «Oxalá não falte a atenção inclusiva por todos aqueles que, encontrando-se em condições de vida particularmente extenuantes, experimentam a sua própria fragilidade»[9]. É muito importante dar esperança, porque muitas pessoas parecem não a ter. Viver sem esperança, viver sem verdadeiras metas que valham a pena, é paralisador. É preciso dar esperança no apostolado, ao atender as pessoas de Casa a quem ajudamos, de um modo ou de outro. Temos de ser pessoas que dão esperança, que não colocam mais ênfase nas dificuldades do que nas soluções. É preciso sermos positivos, sermos transmissores de esperança.

Precisamos de viver de esperança também quando experimentamos dificuldades pessoais. Todos temos dificuldades de um modo ou de outro: perante a experiência dos próprios defeitos, no trabalho, na saúde, de todo o tipo. Na vida podemos encontrar, e encontramos, dificuldades. O Papa, na Spes non confundit, cita longamente o texto da Epístola aos Romanos: «Quem poderá separar-nos do amor de Cristo? A tribulação, a angústia, a perseguição, a fome, a nudez, os perigos, a espada? Mas em tudo isto saímos mais do que vencedores, graças Àquele que nos amou. Estou convencido de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem as potestades, nem a altura nem o abismo, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, Senhor nosso» (Rm 8, 35-39). É um texto extraordinário, para meditar muitas vezes na oração.

O Papa comenta brevemente: «Por isso mesmo esta esperança não cede nas dificuldades: funda-se na fé e é alimentada pela caridade»[10]. E, deste modo, torna possível que continuemos em frente na vida. Assim é, por muitas dificuldades que atravessemos. Que nos vai separar do amor de Deus? Os principados, as potestades, a morte, a vida, a espada, os perigos, a fome? Nada nos pode afastar, se não quisermos afastar-nos nós próprios. Porque «nada poderá separar-nos do amor de Deus – diz São Paulo – que está em Cristo Jesus» (Rm 8, 39). Só nós podemos separar-nos do amor de Deus. Só nós. Nem o demónio, nem a doença, nem as contrariedades. Apenas a nossa liberdade. Por isso, perante as dificuldades, podemos ter sempre uma grande esperança no amor de Deus, manifestado em Cristo Jesus.

Onde está a tua esperança?

Também neste contexto, é ótimo reler o seguinte texto do nosso Padre, na Instrução para o trabalho de São Rafael: «“Trabalhai, cheios de esperança: plantai, regai, confiando n’Aquele que dá o crescimento, Deus” (1Cor 3, 7). E, quando vier o desânimo – se o Senhor permitir esta tentação –, perante factos aparentemente adversos; ao considerar, nalguns casos, a ineficácia dos vossos trabalhos apostólicos de formação; se alguém, como ao pai de Tobias, vos perguntar: “ubi est spes tua?, onde está a tua esperança?…”, erguendo os vossos olhos sobre a miséria desta vida, que não é o vosso fim, respondei com aquele varão do Antigo Testamento, forte e esperançado: “quoniam memor fuit Domini in toto corde suo” (Tb 1, 13), porque sempre se lembrou do Senhor e O amou de todo o coração: “Filii sanctorum sumus, et vitam illam expectamus, quam Deus daturus est his, qui fidem suam nunquam mutant ab eo”; “somos filhos de santos, e esperamos aquela vida que Deus há de dar àqueles que nunca abandonaram a sua fé n’Ele” (Tb 2, 18)»[11]. Perante as dificuldades, temos de trabalhar cheios de esperança; temos de plantar, confiando em Deus, que dá o crescimento. Não confiando nas nossas forças, mas colocando-as ao serviço do Senhor em todo o trabalho apostólico. Mais uma vez, sabendo que a nossa esperança está na segurança do amor de Deus por nós.

Portanto, esperança na entrega, com generosidade. Vale a pena sermos generosos no apostolado, em tudo o que implica o esforço de ir ao encontro das pessoas. Também a mortificação pelo trabalho apostólico, que supõe dedicação de tempo, superar dificuldades, etc.

São Josemaria, estando na Venezuela, comentou: «Lembrava-me de quando começámos o trabalho há tantos anos. Comecei com três, e agora são tantos milhares, centenas de milhares. Mas havia esperança. Contam de Alexandre Magno que, enquanto se preparava para uma batalha, antes repartiu todos os seus bens entre os capitães. E um deles disse-lhe: “Mas, senhor, e a ti, o que te resta?”. Ao que ele respondeu: “A mim resta-me a esperança”». E acrescentou: «Eu olho para vós, e resta-me a esperança»[12]. Assim é. Estas palavras podem levar-nos a ter esperança nos outros. Quando experimentardes a vossa própria fraqueza, podeis encher-vos de esperança ao ver os vossos irmãos. E essa esperança está chamada a estender-se ao mundo inteiro.

Paz, oração, alegria

O Papa fala de ter esperança na paz no mundo, uma paz que está muito ausente. Não só pelas principais guerras que existem, que são tremendas e tristes, mas também pela falta de paz em muitos ambientes da sociedade. Dizia o nosso Padre: «Não há paz nas consciências»[13]. O Papa menciona «que o primeiro sinal de esperança se traduza em paz para o mundo, mais uma vez imerso na tragédia da guerra»[14]. Esperança de que o mundo vá melhorar, certamente, porque é também esperança na eficácia do apostolado. Mas com realismo: não sabemos o que acontecerá, não podemos prever o futuro.

Na verdade, o Apocalipse e as previsões que o Senhor faz no Evangelho sobre o fim do mundo são muito dramáticas. Mas isso não nos tira a esperança; pelo contrário, impele-nos a fazer com que, no que depender de nós, tudo vá para melhor. Pensando na situação atual, em alguns países vivemos em ambientes muito descristianizados. Cada vez há mais pessoas que, sendo católicas, não frequentam os sacramentos. Há cidades, em países tradicionalmente crentes, onde havia uma prática religiosa amplíssima, e onde agora apenas uma pequena percentagem da população vai à Missa ao domingo. Mas, ao mesmo tempo, há outros lugares onde as coisas estão muito melhor. E, nuns e noutros, podemos ter a convicção de que as pessoas são boas, como dizia D. Javier: «Quanta gente boa há no mundo!». Em tantas ocasiões, o que falta é formação. Por isso, as dificuldades que encontremos no trabalho apostólico nunca devem ser motivo de desânimo, mas ocasião para rezar mais, para nos lançarmos, para nos aproximarmos das pessoas e podermos ajudá-las, com amizade e confidência. Quanto mais difícil for o ambiente, mais conta o Senhor connosco; não porque sejamos melhores, mas porque Ele nos deu muita formação, apesar de sermos tão pouca coisa. Portanto, fortes na esperança!

E isto aplica-se a tudo. Que esperança temos na oração? O Senhor disse: «Pedi e recebereis» (Jo 16, 24). É impressionante. Pedi e recebereis – são palavras absolutamente verdadeiras. É certo que, por vezes, pedimos e não recebemos, mas podemos pensar que recebemos de outra forma, ou que não pedimos bem. Outras vezes pedimos bem e parece que não recebemos. Por exemplo, pedimos por uma intenção apostólica determinada ou para que uma pessoa se cure, e ela não se cura… Então, foi inútil a oração? Não. Ainda que não tenhamos obtido o que pedíamos, essa oração não foi ineficaz. Podemos estar seguros na esperança, pela fé na palavra de Deus. Nada se perde.

Por último, esperança com alegria. «Alegres na esperança» (Rm 12, 12), diz São Paulo. E não se trata de uma esperança de romance cor-de-rosa, de tudo bonito; por isso, acrescenta: «Alegres na esperança, pacientes na tribulação, perseverantes na oração». São Josemaria dizia-nos assim: «Otimistas, alegres: Deus está connosco! Por isso, diariamente me encho de esperança»[15]. Otimistas, alegres, porque Deus está connosco. A virtude da esperança faz-nos ver o positivo, o belo da vida, porque vemos em tudo, mesmo sem compreender, o amor de Deus. Por isso, quando nos sentirmos um pouco desanimados, pessimistas, tristes, vamos reagir prontamente, com um grande ato de fé no fundamento desta esperança alegre: hoje, agora, Deus está a amar-me com loucura. Cada um tem de dizer isto, pensá-lo com um ato de fé profundo. E isso levanta-nos.

Falando de esperança, vem-nos ao pensamento e ao coração a Santíssima Virgem, Spes nostra. Ela é a Mãe da nossa esperança, a que nos alcança do Senhor esta graça da esperança, para a termos e para a darmos, como diz São Pedro: «Estai sempre dispostos a dar a razão da vossa esperança» (1Pd 3, 15).

* * *

Termino com a esplêndida frase de São Paulo: «Que o Deus da esperança vos encha de toda a alegria e paz na fé, para que transbordeis de esperança pela força do Espírito Santo» (Rm 15, 13). Aconselho-vos a lê-la e meditá-la muito. Que estejamos contentes e, quando houver motivos humanos para não o estarmos, pensemos que, por cima de todo o motivo humano, há um muito maior, que é o fundamento da nossa esperança: o amor de Deus por nós.


[1] São Josemaria, Forja, n. 278.

[2] Francisco, Spes non confundit, n. 1.

[3] Concílio de Trento, sess. VI, cân. 31.

[4] Francisco, Spes non confundit, n. 3.

[5] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 208.

[6] Bento XVI, Spe salvi, n. 31.

[7] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 208.

[8] São Josemaria, Carta 29, n. 60.

[9] Francisco, Spes non confundit, n. 11.

[10] Francisco, Spes non confundit, n. 3.

[11] São Josemaria, Instrução 09/01/1935, n. 19, recolhido em Crónica de fevereiro de 2025; cf. AGP, Biblioteca, P01.

[12] São Josemaria, Apontamentos de uma meditação, 10/02/1975.

[13] São Josemaria, Em diálogo com o Senhor, n. 101.

[14] Francisco, Spes non confundit, n. 8.

[15] Javier Echevarría, Lembrando o Beato Josemaria Escrivá, p. 96.

Mons. Fernando Ocáriz, prelado do Opus Dei