Madrid 2011, ponto de partida

Artigo publicado pelo prelado do Opus Dei por ocasião da Jornada Mundial da Juventude Madrid 2011

Desde que o Beato João Paulo II teve a intuição de promover há 26 anos a primeira Jornada Mundial da Juventude, em Roma, poderia dizer-se que cada um destes encontros significou um ponto de partida na vida de milhares de jovens; raparigas e rapazes que conheceram melhor Jesus Cristo e se decidiram a dar um novo rumo à sua vida, orientando-a de modo consciente e maduro para Deus e para os outros, com uma visão cristã otimista, própria de quem se sabe filho de Deus. Para alguns, com o tempo, aquele entusiasmo inicial encontrou os obstáculos habituais do caminhar terreno mas, com a graça de Deus, muitos chegaram à felicidade da fidelidade; duas palavras que rimam, como dizia São Josemaría Escrivá de Balaguer. A fidelidade não é outra coisa senão a maturidade do amor no tempo. De facto, muitos dos participantes nas primeiras jornadas mundiais contavam-se entre os milhões de pessoas que deram o último adeus a João Paulo II, um “a Deus” que era ao mesmo tempo um “obrigado” e uma petição: “continua a ajudar-nos!”.

Passaram os anos e, com Bento XVI, as jornadas mundiais da juventude mantêm a sua extraordinária capacidade de convocatória. Possuem um magnetismo que não é artificial pois, com o sucessor de Pedro, é o próprio Cristo que passa. Cristo que se fixa em muitos, sim, mas sobretudo em cada pessoa, e esse olhar é cautério que purifica e amor que chama. Muitas decisões de entrega virão, não duvido, para atingir a elevada medida da santidade cristã em todas as circunstâncias; na vida matrimonial, no celibato apostólico, sem mudar de estado, ou abraçando o sacerdócio ou a vida religiosa. O “obrigado”, “continua a ajudar-nos”, através de Pedro, chega ao Céu para se converter em obras: “aqui estou! Conta comigo!”. É esta a resposta cristã à exortação de Paulo aos Colossenses: “Assim como recebestes Cristo Jesus, Senhor, vivei n’Ele” ( Col 2, 6).

Na defesa da fé que São Paulo faz, na passagem da sua carta eleita como lema para esta nova Jornada Mundial, o Apóstolo fala das “filosofias inúteis e enganadoras” ( Col 2, 8). As jornadas da juventude, neste nosso mundo, tão desgarrado por guerras e por revoltas ligadas às incertezas e injustiças da vida, neste mundo, que simultaneamente nos toca amar porque é o lugar onde Deus nos ama com o Seu amor infinito, as jornadas mundiais trazem-nos uma lufada de ar fresco. A própria sociedade global, tecnológica, sempre em mudança, mostra-se também sensível à verdade e à esperança. E vê no seu seio essa multidão de católicos que, de repente, na rua, se descobrem, se conhecem, e se apercebem de que contam para alguma coisa, para muito; hão-de ser a alma da sociedade. Acreditamos no amor de Deus, dizem-nos e aqui estamos.

A juventude é o tempo da esperança e da aventura, o tempo da generosidade. Um momento em que é mais fácil ver Cristo como “plenitude do homem e cumprimento do sua ânsia de justiça e de paz”, como dizia Bento XVI no passado dia 1 de maio. Madrid, como antes Roma, Sidney, Colónia, Cracóvia, Toronto, Paris, Denver, Manila ou Buenos Aires – dentre outras cidades – será para muitos, não duvido, uma apelo a construir sobre Jesus Cristo, não para nos ensimesmarmos mas para converter a própria existência em serviço aos outros.

Há mais de 80 anos, Madrid foi para S. Josemaria o lugar de um especialíssimo encontro com Deus. Em 1928, viu que Deus lhe pedia que fundasse o Opus Dei e costumava rememorar o episódio fazendo referência à chamada de Cristo a Saulo de Tarso, a caminho de Damasco: “Madrid foi o meu Damasco – afirmava – porque aqui caíram as escamas dos olhos da minha alma e aqui recebi a minha missão”. Então, o jovem sacerdote de 26 anos, começou a trabalhar incansavelmente entre operários e estudantes. Procurou a sua força nos doentes e nos pobres da capital espanhola; horas e horas pelos bairros da periferia da cidade, todos os dias, a pé de um lado para o outro. Enquanto servia e alentava uns e outros, pedia-lhes que oferecessem as suas penas e dores pelas almas dos jovens que atendia. A oração das crianças, dos pobres e dos doentes é especialmente grata a Deus; estou persuadido de que aquelas orações dos doentes dos anos 30, como as de tantos que hoje se unem com o coração à Jornada Mundial, apoiarão os que se preparam para o seu encontro com Pedro nas ruas de Madrid. Manifestam a força invisível que fará de Madrid um novo Damasco para muitos.

Naqueles anos, S. Josemaria ofereceu, um dia, a um jovem estudante de Arquitetura, um livro sobre a Paixão de Cristo; na primeira página, escreveu esta dedicatória:

“+ Madrid, 29-V-33

Que procures a Cristo

Que encontres a Cristo

Que ames a Cristo”.

Nestas poucas palavras estão resumidas, penso, as experiências destas jornadas mundiais, que desembocam em levar Cristo até ao último canto do mundo.

“Procurar a Cristo” define o primeiro passo. O amor começa sempre como uma procura, que conduz a um convívio pessoal, na intimidade: “Acontece como no noivado – explicava S. Josemaria a esses jovens –: o convívio é necessário, porque, se duas pessoas não se relacionam, não podem chegar a querer-se. E a nossa vida é de Amor” ( Forja , n. 545). É necessária uma abertura do coração, não é algo mecânico, programável; rezo para que se verifique em muitos, com a graça do Espírito Santo e a ajuda da autêntica amizade humana.

“Encontrar a Cristo” é já enraizar-se cada vez mais n’Éle, como o sarmento à videira ( Jo 15, 1-8). “Estar enraizados em Cristo — explica Bento XVI na Mensagem para a XXVI Jornada Mundial da Juventude — significa responder concretamente à chamada de Deus, fiando-se d’Ele e pondo em prática a Sua Palavra (…); escutá-l’O como ao verdadeiro Amigo com quem compartilhar o caminho da vossa vida”.

“Amar a Cristo”, por fim, supõe gozar já dessa seiva que dá sentido e força para amar os outros e desejar amá-los cada vez mais; é estar já “edificado” em Cristo, deixar que o Espírito Santo construa em nós a imagem do Verbo encarnado que se oferece por todos. O novo dinamismo a que o Papa nos chama significa procurar o perdão no Sacramento da Reconciliação, para receber esse amor, um sacramento que o próprio Bento XVI celebrará em Madrid, como eloquente testemunho da misericórdia divina. E esse amar exige deixar-se amar por Jesus na Eucaristia, para O levar depois a muitas outras pessoas.

Peço à Virgem da Almudena, Mãe de Deus e Mãe nossa, para mim e para todos, a alegria de uma nova conversão, um partir de novo no caminho da fé, para que, sabendo-nos débeis mas ao mesmo tempo “fortes na fé” ( Col 2, 7), acreditemos no amor de Deus Pai e nos sintamos realmente filhas e filhos de Deus em Cristo.

+ Javier Echevarría

Prelado do Opus Dei

D. Javier Echevarría // La Razón