A canonização de João XXIII e de João Paulo II é um grande acontecimento eclesial e um sinal de esperança para o mundo, porque onde floresce a santidade, as crises não têm a última palavra.
Quando há santidade existe um fundamento sólido sobre o qual construir o futuro. No cristianismo, e de modo particular nos santos, encontramos respostas aos problemas mais profundos do homem e da sociedade, que têm, com frequência, a sua origem num afastamento de Deus.
É motivo de gratidão a Deus observar que, no decurso das últimas décadas (em que tanto se falou de “crises” económicas, culturais, políticas, sociais, religiosas) a Igreja tenha sido conduzida pela santidade, quer dizer, por pessoas santas: dois dos três pontífices já falecidos (João XXIII e João Paulo II) serão canonizados este domingo, e o processo para a beatificação do terceiro deles (Paulo VI) está muito avançado.
João XXIII é, sobretudo, o Papa que convocou o Concílio Vaticano II. Como sucessor de Pedro conduziu a Igreja, com mão firme e paterna, a essa experiência extraordinária de fé e de renovação pessoal e coletiva que foi, e é, esse acontecimento eclesial: tratava-se de falar ao coração do homem da nossa época, como sublinhou a Constituição Gaudium et Spes. O Papa Roncalli ajudou a colocar a vocação à santidade na própria raiz da condição cristã. Podemos recorrer hoje à sua intercessão para rogar ao Senhor que marque profundamente na consciência de toda a mulher e de todo o homem cristãos esta verdade proclamada pelo Vaticano II: que a santidade está ao alcance dos cristãos, e que não é meta para uns poucos privilegiados.
Para a humanidade, João XXIII é também o Papa da paz, porque num momento histórico delicadíssimo não duvidou – seguindo o exemplo dos seus predecessores – em empregar os meios oportunos para evitar a guerra, envolvendo a sua autoridade moral e religiosa na elaboração de uma doutrina universal, sobre os pressupostos da paz e sobre a dignidade do ser humano.
João Paulo II era um sacerdote apaixonado por Deus e pelos homens, criados à imagem de Deus em Cristo. Movido pela caridade, convocou toda a Igreja para a “nova evangelização”, vincando por sua vez o papel que cabe aos leigos nesta tarefa de tornar presente Deus na vida das pessoas e dos povos. Durante os anos do seu pontificado aprofundámos, com luzes novas a bondade e a misericórdia de Deus. As suas palavras, os seus gestos, os seus escritos, a sua entrega pessoal — na saúde e na doença — foram instrumentos de o Espírito Santo se serviu, para aproximar muitíssimas pessoas da fonte da graça, e para que milhares de jovens respondessem afirmativamente à chamada de Cristo para o sacerdócio, para a vida religiosa, para o matrimónio e para o celibato apostólico laical.
O Papa polaco conduziu-nos do segundo para o terceiro milénio, deixando um imponente legado sobre a dignidade da pessoa humana, sobre o valor da vida e da família, o serviço aos pobres e necessitados, a promoção dos direitos dos trabalhadores, o amor humano e a dignidade da mulher, e sobre tantos outros aspetos que são cruciais na promoção de uma existência digna. Os seus escritos e a sua pregação formam um conjunto de ensinamentos com enorme potencialidade de futuro. Estou convencido de que a sua mensagem social e humana – que surge de uma profunda resposta espiritual a Deus – se agigantará com o passar dos anos.
A canonização destes dois grandes pastores acontece às portas do mês de maio, mês de Maria. É um traço comum aos dois novos santos: o seu amor terno e profundo por Nossa Senhora. João XXIII recorria frequentemente à “maternidade universal” de Nossa Senhora, “a Mãe comum, cabeça de todos os homens, todos irmãos no mesmo Cristo primogénito” (12-X-1961). Em João Paulo II, a consciência da proximidade e da intercessão da nossa Mãe, representava um pólo de atração permanente no seu próprio caminhar espiritual e humano, e convidava os outros a descobrir a “dimensão mariana” dos discípulos de Cristo. A filiação à Santíssima Virgem — dizia – é “um dom que o próprio Cristo faz pessoalmente a cada homem” (cf. Redemptoris Mater, n. 45).
A Virgem Santíssima ocupa um lugar relevante na vida espiritual de cada fiel, mas também na própria edificação da Igreja. Por isso, neste marco que são as canonizações de domingo, é com gosto que recordo estas palavras de São Josemaría Escrivá de Balaguer: «É difícil ter uma autêntica devoção a Nossa Senhora, e não se sentir mais vinculados aos outros membros do Corpo Místico, mais unidos também à sua cabeça visível, o Papa. Por isso gosto de repetir: omnes cum Petro ad Iesum per Mariam! Todos, com Pedro, a Jesus por Maria!» (Cristo que passa, n. 139). Alegra-me que seja o Papa Francisco, Papa também mariano, quem tenha decidido estas duas canonizações. Os três mostraram que o conteúdo da caridade não é meramente humano, mas que se trata de dar Cristo aos outros, que é o que levou a cabo Santa Maria em serviço de toda a humanidade.
Em pouco tempo nos acostumaremos a referir-nos a estes dois pastores como São João XXIII e São João Paulo II. Ao canonizá-los, o Papa Francisco, Vigário de Cristo, está a ajudar-nos a ver que, para Deus, Angelo Roncalli e Karol Wojtyla são, sobretudo, duas pessoas santas, fator fundamental na vida de cada homem, de cada mulher. São João XXIII e São João Paulo II foram dois sacerdotes de grande cordialidade, de amor inflamado a Deus e a todas as criaturas humanas. Santos de uma só peça, unidos por um terno amor a Maria, Mãe de Deus e Mãe nossa.
+Javier Echevarría
Prelado do Opus Dei