Homilia na ordenação diaconal em Roma (20.II.2010)

Homilia do Prelado do Opus Dei na cerimónia de diaconado de dois fiéis do Opus Dei. A celebração teve lugar na paróquia de S. Josemaria (Roma).

1. Queridos irmãos e irmãs:

Queridíssimos Josep Maria e Mario, que vos preparais para receber a ordenação diaconal.

Enquanto agradecemos ao Céu esta ordenação diaconal, consideramos com serenidade e alegre esperança que, como todos os anos no começo da Quaresma, a Igreja convida-nos a iniciar um itinerário de conversão, de união mais profunda com Nosso Senhor. É este efectivamente o significado do tempo litúrgico que acabamos de começar. É verdade que, como ensina S. Josemaría Escrivá de Balaguer, «a conversão é coisa de um instante. — A santificação é obra de toda a vida»[1]. Portanto, temos de pensar que não é possível alcançar a santidade se não se cultiva o desejo de converter-se de novo, dia após dia, em coisas pequenas mas concretas.

Vem-me à memória que, como o Papa João Paulo II gostava de dizer, o conhecimento autêntico do Deus misericordioso e nosso Pai é «uma constante e inesgotável fonte de conversão, não somente como acto momentâneo interior, mas também como disposição estável, como estado de ânimo»[2]; ao ponto dos cristãos sermos convidados a viver in statu conversionis, convertendo-nos constantemente a Ele. «É este estado — prosseguia João Paulo II — que traça a componente mais profunda da peregrinação de todo o homem pela terra in statu viatoris»[3], quer dizer, enquanto caminhamos para a nossa morada definitiva. Mas nunca temos de dar um sentido negativo a este convite; pelo contrário: conversão é amar ainda mais a Deus, é aproximar-se da fonte do amor.

A imagem da peregrinação terrena está presente em toda a Quaresma e, concretamente, na liturgia de hoje. Escutámos as palavras de Moisés ao povo de Israel, antes de entrar na terra prometida, recordando-lhes as diversas vicissitudes por que tinham passado desde o momento do êxodo e inclusive antes — as perseguições por parte dos seus dominadores, as dificuldades da longa caminhada, as repetidas tentações de regressar à terra donde tinham saído e de cair de novo na escravatura; o profeta recorda-lhes que em todas essas circunstâncias tinham recebido a ajuda do Senhor. Em particular, «graças à mediação de Moisés — comenta Bento XVI — aprenderam a escutar a voz de Deus, que os chamava a converterem-se no Seu povo santo»[4].

Também no novo Israel, na Igreja peregrina sobre a terra, todos estamos chamados à santidade. Contamos com todos os meios, dispostos pelo nosso Pai Deus, para alcançar esse objectivo. Em primeiro lugar a Sua graça e, além disso, a presença de ministros sagrados que, em nome de Jesus Cristo e com a Sua autoridade, nos indicam o caminho da verdade e, com a celebração dos sacramentos, nos obtêm as forças de que necessitamos.

Agradeçamos este dom ao Senhor e supliquemos-lhe que muitos homens escutem a chamada ao sacerdócio ministerial. Faltam ainda vários meses para o termo do Ano sacerdotal convocado pelo Papa e podemos perguntar-nos, com sinceridade, se a petição de santos e abundantes sacerdotes foi continuamente objecto das nossas orações diárias.

2. O Evangelho do primeiro Domingo da Quaresma faz-nos escutar a narração das tentações de Jesus. São Lucas recorda que o Senhor, depois de ter recebido o Baptismo de João, partiu do Jordão e foi conduzido pelo Espírito ao deserto, onde esteve quarenta dias e foi tentado pelo demónio (Lc 4, 1-2). À primeira vista, poderia assombrar-nos o facto de que o Filho de Deus tenha querido submeter-se a esta prova. Os Padres da Igreja explicam que o fez por nós, para que aprendamos a vencer o demónio e a superar as tentações.

Queridos irmãos e irmãs: unidos a Cristo pela fé e pela caridade podemos vencer todas as dificuldades, provas e tentações. Com efeito, São Paulo ensina na epístola aos Romanos: irmãos, que diz a Escritura? "Perto de ti está a palavra, na tua boca e no teu coração". Esta é a palavra da fé que pregamos. Porque, se confessares com a tua boca o Senhor Jesus e creres no teu coração que Deus O ressuscitou dos mortos, serás salvo (Rm 10, 8-9).

A fé alimenta-se com o estudo da doutrina católica e reforça-se comunicando-a aos outros. Formação pessoal e zelo apostólico são as coordenadas de uma existência verdadeiramente cristã. Esta é, no fundo, a exortação que nos dirige a Igreja no começo a Quaresma. Recordai que na oração colecta, voltados para o Senhor, rezámos assim: que a celebração desta Quaresma, sinal sacramental da nossa conversão, nos leve a progredir no conhecimento de Cristo e a testemunhá-lo com uma digna conduta de vida[5].

O itinerário quaresmal será eficaz se se fundamenta, em primeiro lugar, na base de um melhor conhecimento das razões da nossa fé. Para isso é muito útil ler, com mais profundidade, o Catecismo da Igreja Católica ou o Compêndio. Dedicar um pouco de tempo a esta leitura poderia constituir um bom propósito para as próximas semanas e, além disso, ajudar-nos-á a preparar melhor as nossas confissões

sacramentais.

Falava de uma segunda coordenada do tempo de Quaresma: ocupar-nos concretamente na salvação das almas. Esforcemo-nos por acrescentar o nosso afã apostólico, ajudando os amigos, os parentes, os conhecidos que tenham necessidade de se aproximarem da fé ou de frequentar com maior assiduidade os sacramentos. Podemos rezar mais intensamente por eles e oferecer alguma pequena mortificação; e podemos também, com a ajuda do Senhor, provocar um diálogo que os impulsione a receber o perdão de Deus no sacramento da Penitência, a frequentar a Missa dominical, a encarar a possibilidade de iniciar um caminho de formação mais completo, mediante a leitura de livros adequados, o recurso à direcção espiritual e, inclusive, a participação nos meios de formação espiritual que a Prelatura põe à disposição de todos, etc.

3. Dirijo-me agora, de modo especial, aos ordenandos diáconos. Começais esta nova fase da vossa vida dentro do Ano sacerdotal convocado pelo Papa em memória do Santo Cura d’Ars e poucos dias depois de ter começado um ano mariano na Prelatura do Opus Dei. Dedicando este tempo à Virgem, queremos dar graças a Deus pelo octogésimo aniversário do início do trabalho apostólico da Obra entre as mulheres. Acompanha-vos e continuará a acompanhar-vos, agora e em todo o momento, a oração das vossas famílias, dos fiéis da Prelatura e de tantos Cooperadores e amigos que se unem a nós nesta celebração, que constitui uma grande festa para a Igreja santa.

Dentro de seis meses recebereis o presbiterado; mas, a partir de agora, com o diaconado, converteis-vos em ministros sagrados, destinados ao serviço da palavra, do altar e da caridade, cooperando com o Bispo e os presbíteros nas suas funções específicas. De certo modo, aplicam-se também a vós as palavras que S. Josemaria escrevia a propósito do sacerdócio, quando recordava que a ordenação «leva a servir a Deus num estado que não é, em si mesmo, nem melhor, nem pior do que outros: é distinto. Mas — acrescentava — a vocação de sacerdote aparece revestida de uma dignidade e de uma grandeza que nada na terra supera»[6].

Nos próximos meses tereis muitas ocasiões de pregar a Palavra de Deus, de administrar a Comunhão, de expor o Santíssimo Sacramento para a adoração dos fiéis. Não esqueçais o que o nosso Padre escreveu: os sacerdotes — e o mesmo se pode dizer dos diáconos — são «instrumento imediato e diário dessa graça salvadora que Cristo nos ganhou»[7].Quando se medita profundamente esta verdade — como recomendava S. Josemaria — «no silêncio activo da oração», não é possível considerar o sacerdócio como uma perda, mas antes como um lucro incalculável.

O Santo Padre recordou várias vezes que «ao sacerdote não se lhe pede para ser perito em economia, na arte da construção ou em política». Os fiéis esperam dos ministros sagrados «somente uma coisa: que sejam especialistas em promover o encontro do homem com Deus»[8]. Deixando de lado a profissão que tenhais exercido até agora, sereis ministros de Cristo a cem por cento. As horas dos vossos dias serão sempre poucas para cumprir os vossos novos deveres, que constituem a partir de agora a matéria da vossa santificação pessoal e o eixo do vosso zelo apostólico.

Peçamos à Virgem, Mãe da Igreja, que obtenha abundantes graças para o Papa, os Bispos e todos os ministros sagrados; dirijamos-lhe esta petição especialmente no tempo que ainda resta do Ano sacerdotal. Esforcemo-nos todos, leigos e sacerdotes, por cultivar com amor a alma sacerdotal que está em nós pelo Baptismo, para obter — com a graça de Deus — frutos de santidade e de apostolado, para o bem da Igreja. Assim seja.

[1] S. Josemaria, Caminho, n. 285.

[2] João Paulo II, enc. Dives in misericordia, 30-XI-1980, n. 13.

[3] Ibid.

[4] Bento XVI, Discurso no Angelus do primeiro Domingo da Quaresma, 5-III-2006.

[5] Missal Romano, Domingo I da Quaresma, Colecta.

[6] S. Josemaria, Sacerdote para a eternidade, 13-IV-1973.

[7] Ibid. [8] Bento XVI, Discurso aos sacerdotes, 25-V-2006.