Homilia de D. Javier Echevarría na Jornada Mariana da Família em Torreciudad de 2007

Queridíssimos irmãos e irmãs:

Damos-Te graças Deus Uno e Trino, também a ti Santa Maria, pelo dom que nos dás de participar nesta décima oitava Jornada Mariana da família, no Santuário de Torreciudad.

Sentimo-nos bem unidos, pela Comunhão dos Santos, a todas as famílias de Espanha, do mundo, pedindo a bênção mais copiosa do Céu para cada lar. O amor e a proximidade da Nossa Mãe, que o Fundador do Opus Dei, São Josemaria Escrivá de Balaguer, viveu e nos inculcou apaixonadamente, será sempre recurso seguro, para nós e para as famílias, enquanto percorremos os caminhos desta terra. É lógico que acudamos especialmente à Virgem Maria com o fim de aproveitar estas jornadas ao amparo da Família de Nazaré, modelo perpétuo e próximo da verdadeira família. Mas, além disso, hoje acresce uma circunstância, que é motivo de particular alegria, com toda a Igreja celebramos a grande festa da Natividade da Mãe de Deus. 

O lema escolhido para este ano é A família, santuário da vida. São palavras que estão muito de acordo com a festividade hodierna, porque a Nossa Mãe é o primeiro santuário da Vida. Ditosa és, e digna de todo o louvor: «de ti saiu o sol da justiça, Cristo, nosso Senhor», como expressa a antífona de entrada da Missa.  

Enchemo-nos de gozo porque comemoramos a vinda a este nosso mundo, de Maria, a Mãe de quem é a Vida, com maiúscula. Nos desígnios amorosos de Deus, correspondeu-Lhe a dita e o cumprimento do que já tinha anunciado o Senhor pelo Profeta: «a Virgem conceberá e dará à luz um filho e lhe porá o nome de Emanuel». Por isso, Maria é também a porta por onde se acede à Vida, por onde se aprofunda no caminho de amar santamente Cristo. Muito obrigado Mãe porque, como nos ensinava São Josemaria, com essa Tua palavra –“fiat” – fizeste-nos irmãos de Deus e herdeiros da sua glória. Bendita sejas! «Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida», diz o Senhor (Jn 14,6) e comenta Santo Agostinho: «Ele é a Vida por a ter desde toda a eternidade junto do Pai (cfr. Jn 1,4) e porque nos faz, mediante a graça, participantes dessa mesma vida divina» (De verb. Dom. Serm. 54). Aqui radica a nossa segurança, ainda que se levantem muitas dificuldades no decurso da nossa passagem por esta terra. 

Com toda a clareza no-lo confirma o apóstolo São Paulo, na sua carta aos Romanos: «sabemos que, aos que amam a Deus, tudo lhes serve para o bem». Com uma intensa fé e esperança teologais, São Josemaria resumia-o com três palavras, omnia in bonum!para os que amam a Deus todas as coisas são para bem. Não nos assuste a abundância de mal. Deus pode mais! É omnipotente, misericordioso, fiel às suas promessas; é, como escreve São João, um Deus «que nos amou até ao extremo». E, para que não tenhamos dúvida alguma, São Mateus conclui o evangelho que acabamos de ler com o significado do nome Emanuel, «Deus connosco».

Queridas famílias: peçamos à Santíssima Virgem de Torreciudad que todas as famílias do mundo aprendam a ser santuário da vida; em primeiro lugar, que acolham gozosamente – “porque é uma bênção divina” – cada filha ou filho que Deus lhes envia. Recordo-vos umas palavras do meu queridíssimo predecessor D. Álvaro del Portillo: «o Senhor compraz-Se nas famílias numerosas, hoje mais necessárias do que nunca. Com a cultura do bem-estar material – “do egoísmo” – apoiando-se em mil sem-razões, organizou-se a propaganda do medo aos filhos; a recusa à prole que o Senhor concede estendeu-se a tantos lugares e de modo mais alarmante nos países onde impera o hedonismo; perverteu-se a ordem natural, para dar lugar a uma apologia dos instintos (…). Vós – “concluía D. Álvaro” – todos, temos por diante uma tarefa maravilhosa. Pedi ao Senhor que vos abençoe com uma coroa de criaturas, para as educar como bons filhos de Deus».  

Ocupemo-nos sempre de que as famílias se esmerem também em aceitar e em acrescentar, cada dia com mais ardor, a vida divina que Jesus Cristo nos trouxe com a Redenção; e de modo particular, que desejem ardentemente – “e supliquem a Deus com constância e insistência” – que o Senhor chame os seus filhos para o Seu serviço para o que Ele queira, através de uma conduta sinceramente cristã. Estes são os melhores tesouros que se guardam nos lares.

Sabeis de sobra que a família é imprescindível para a sociedade e para a Igreja, porque é o ambiente da formação integral e da transmissão da fé. Como recordava o Papa Bento XVI,  «as famílias cristãs constituem um recurso decisivo para a educação na fé, para a edificação da Igreja, (…) bem como para ser levedura, em sentido cristão, na cultura generalizada e nas estruturas sociais». Agora, queridíssimos irmãos, nesta altura, em que as realidades da família e do matrimónio de um homem com uma mulher, se encontram submetidas a grandes perigos e ameaças, apresenta-se-nos a ocasião de  demonstrar com palavras e com actos a grandeza destas verdades fundamentais.

Por isso, pedi a Deus uma descendência numerosa, insisto. Mas não vos conformeis só com que esses filhos venham ao mundo. Continuai a dar – como o estais a fazer – a vossa existência inteira por cada um deles. Dai-lhes também, constantemente, o vosso amor e sentido sobrenatural para que se saibam conduzir como bons cristãos e, portanto, como bons cidadãos. Não vos conformeis nunca com o que já fizestes, por muito que tenha sido. Tende em conta que, como repete com frequência o Santo Padre, «na actualidade, um obstáculo particularmente insidioso para a obra educativa é a maciça presença, na nossa sociedade e cultura, do relativismo que, ao não reconhecer nada como definitivo, deixa como última medida apenas o próprio eu com os seus caprichos; e, sob a aparência de liberdade, transforma-se, para cada um, numa prisão, porque separa uns dos outros, deixando cada um encerrado dentro do seu próprio "eu"».

Com certa frequência, comenta-se que, nestes tempos, correm ventos difíceis para a educação dos filhos. Com um notado pessimismo, ouve-se, por vezes que, inclusivamente quando os pais e irmãos o procuram fazer bem, não é possível evitar que algum filho se torça; acrescentam que é quase uma utopia que todos prossigam com vida recta. Não desanimeis, com a graça de Deus, sempre se pode alcançar esse bom objectivo; há muitos exemplos de inumeráveis lares que, com firmeza e esforço, com optimismo cristão e humano, conseguiram esse ambiente familiar que verdadeiramente formou magnificamente os seus filhos.

 

Neste sentido, queria comentar brevemente um aspecto particularmente importante, se estiverdes interessados – estou certo que estais interessados! Que as vossas casas sejam santuários da vida, onde se respire esse óptimo clima; tende muito em conta, como explica Bento XVI, que «para uma autêntica obra educativa não basta transmitir uma boa teoria ou uma doutrina. Faz falta algo muito maior e mais humano, a proximidade, vivida diariamente, que é própria do amor e que tem o seu espaço mais propício, antes de tudo, na comunidade familiar».

Portanto, se desejais conseguir essa proximidade com cada filha, com cada filho, dedicai-lhes o melhor do vosso tempo – os filhos são o mais importante: mais importante que os negócios, do que o trabalho, do que descanso, repetia São Josemaria; escutai-os sem pressas; mostrai-lhes confiança; dialogai com eles; almoçai e jantai com eles sempre que possais – fazendo tudo o que estiver nas vossas mãos para o conseguir; procurai participar juntos nas celebrações litúrgicas e nas festas de família; convivei, ajudai-os no compasso do «dia a dia». Através da unidade familiar quotidiana aprendereis vós em primeiro lugar e, além disso, com o vosso exemplo – os pais educam fundamentalmente com a sua conduta– crescerão as virtudes nessas criaturas. Apreciareis, ao mesmo tempo, como elas e eles amadurecem; também como os mais velhos vão puxando para cima os pequenos e agradecereis a Deus esse vosso lar, verdadeiro semeador de vida. Sem esquecer que, como prémio da vossa generosidade e da vossa entrega, serão capazes de responder à sua vocação cristã, na forma que lhes proponha o Senhor.  

Neste sentido, atrevo-me a transmitir-vos um desejo, que trago no meu coração: ambicionai que Deus ofereça o dom do celibato apostólico às vossas filhas ou filhos, se for essa a Sua Vontade. Vede-o sempre como algo gozoso, porque realmente o é. Comentava numa ocasião São Josemaria: um cristão que procura santificar-se no estado matrimonial, e é consciente da grandeza da sua própria vocação, espontaneamente sente uma especial veneração e um profundo carinho pelos que são chamados ao celibato apostólico e quando algum dos seus filhos, pela graça do Senhor, empreende esse caminho, alegra-se sinceramente.

Além disso, recordo-vos que, ao realizar o vosso trabalho de mães e de pais, não estais sós. Contais com a ajuda de tantas pessoas que rezam por vós e que estão dispostas a ajudar-vos na educação dos jovens. Mas, sobretudo, contais com o auxílio de Deus. O Senhor acompanha-vos constantemente. Nesta tarefa da formação e da transmissão da fé, devemos cuidar, em primeiro lugar, os meios sobrenaturais, a oração, o trato assíduo com o Senhor, a recepção dos sacramentos. Rezai, falai dos vossos filhos com Deus. Acrescento o que assinalava com frequência São Josemaria: Se tivesse que dar um conselho aos pais, dar-lhes-ia sobretudo este: que os vossos filhos vejam (…) que procurais viver de acordo com a vossa fé, que Deus não está só nos vossos lábios, mas que está nas vossas obras; que vos esforçais por ser sinceros e leais, que vos amais e que os amais deveras.  

Deus connosco. O próprio Cristo ficou realmente presente, «todos os dias até ao fim do mundo», na Sagrada Eucaristia. Ele é o Pão da Vida: «Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Se alguém comer deste pão viverá eternamente». Alimentai e apoiai a vossa vida familiar com este tesouro divino, para que tenham vida todos os seus membros. Procurai participar, ao menos, na missa dominical; mas se o puderdes fazer todos os dias, tanto melhor. Ide adorar Jesus Sacramentado, com visitas breves, acompanhando-O a partir do vosso lar, do local de trabalho.  

Comportai-vos de modo que os vossos filhos sintam a vossa fé e a vossa piedade diante da presença real de Jesus Cristo, quando fazeis uma genuflexão diante do sacrário; quando seguis com atenção e devoção cada uma das partes da Santa Missa, ou quando vos preparais com dignidade e reverência – mesmo na apresentação pessoal – para receber o Senhor na Sagrada Comunhão. D. Álvaro del Portillo, costumava recordar que a Santíssima Virgem "para que fosse digna de chegar a ser Mãe de Deus, foi concebida sem mancha de pecado original, preservada imune de qualquer culpa pessoal, por leve que pudesse parecer e enriquecida com todo o tipo de dons e graças pelo Espírito Santo»: Ela foi o primeiro santuário de vida.

Queridas famílias, volto a repetir-vos: Não tenhais medo da vida! A força divina mostra-se sempre muito mais poderosa do que todas as dificuldades! Essa força entrega-se-nos do modo mais incomparavelmente grande na Eucaristia, como dizia João Paulo II repetindo-o desde o início do seu Pontificado e acrescentava: «o futuro da humanidade forja-se na família».

Recorremos à intercessão da Sagrada Família de Nazaré, que seja para todos e para os nossos lares ponto de referência, objecto de oração constante e confiada. E, ao mesmo tempo, que seja um modelo no nosso empenho de dar testemunho de Cristo e de levar aos que nos rodeiam, a vida dos filhos de Deus. Assim seja.