"Temos problemas, mas não é necessário que os outros percebam"

Marta Tuñón. Madri. Estudante de Ciências Empresariais. "Quando decidi ir ao Quênia no Verão, descobri um facto que me tinha passado desapercebido durante anos: São Josemaria começou a fazer o Opus Dei trabalhando entre os pobres e os doentes de Madri".

Já conhecia a sua mensagem e a sua vida desde pequena. Tinha estudado num colégio fomentado pelos seus ensinamentos e, além disso, vários membros da minha família pertencem a esta instituição da Igreja. Porém, fazia-me falta vê-lo feito realidade em África para me dar conta de que a pobreza é um aspecto essencial na vida de São Josemaria e no Opus Dei.

Agora que regressei, vejo que aqui se passa o mesmo que lá, que os seus membros vivem a vocação cristã nas circunstâncias normais de cada país e que o espírito é exatamente o mesmo. Mas a minha passagem pelo Quênia fez com que visse mais para além do colégio e do que tinha estado a receber durante toda a vida.

Fiquei instalada numa residência universitária que se chama Keri. Vivíamos aí umas trinta residentes. Quando entrei no quarto que me destinaram, encontrei duas coisas: uma cama e uma estante. A casa, bem arranjada, tinha uma decoração sóbria mas elegante. Não havia nada demais, só o indispensável para fazer daquela vivenda um lar.

"Parece que ninguém está passando mal"

Uma das pessoas com quem mais aprendi foi Frankie. Encarregou-se de me mostrar todo o projeto Kimlea e pediu-me que despertasse a generosidade noutras pessoas que pudessem ajudar financeiramente este projeto. Numa altura contou-me a traços largos algumas das histórias das meninas que aí estudavam. Contou-me de uma cujos pais tinham sida; de outra que tem muitos irmãos e vivem na miséria; havia outra que fez para o jantar uma sopa só com uma cebola e foi o que toda a família comeu; outra que só come uma vez por dia, etc. Eu via como trabalhavam, como se riam e como normalmente eram alegres, e devo ter comentado qualquer coisa como: “Parece que ninguém está a passar mal” e ela respondeu-me: “Temos problemas, mas não é necessário que os outros saibam”.

Todas se ajudavam, aprendiam, estudavam muito, faziam grandes sacrifícios, tais como andar vários quilômetros a pé para ir à escola e, no dia a dia, cada uma acarreta os seus problemas discretamente. O que ressaltava no ambiente é que, confiando em Deus, os problemas se tornam mais pequenos.

Objetivo

O objetivo da minha viagem era trabalhar num orfanato do Estado que estas pessoas do Opus Dei conheciam. Porque fazem voluntariado não só em iniciativas promovidas por elas próprias, mas onde quer que se detectem carências que possam aliviar, pelo menos um pouco. De facto, na universidade de Strathmore, - dependente do Opus Dei - há uma série de créditos que os estudantes ganham quando realizam um trabalho social e, entre outras obras, prestam frequentemente assistência nos refeitórios da Madre Teresa para ajudar as religiosas. Todos os projetos do Opus Dei estão ao serviço do país.

Um Euro por doze horas de trabalho

Aulas de cozinha, de costura, de Inglês.. são pinceladas da formação que se proporciona em Kimlea. A maior parte das assistentes provêm do ensino primário e do campo. Vivem nas plantações de chá e, a partir do momento em que o ensino deixa de ser gratuito, começam a trabalhar nessas plantações onde a remuneração é de um Euro por dia, por doze horas de trabalho. Kimlea enfrenta essa situação oferecendo-lhes uma formação mais qualificada para poderem arranjar uma profissão que traga mais prosperidade às suas famílias. A formação aqui tem um preço irrisório ou pede-se às candidatas que trabalhem em troca da formação. É a única forma de valorizarem o que se lhes dá: aprender a trabalhar bem Qualquer alternativa é melhor do que ganhar só um Euro por dia. Com o dialecto dessas aldeias não conseguem ir a lado nenhum, por isso é essencial aprender Inglês

Também há infantários gratuitos para os filhos das que frequentam Kimlea. Desde há quatro anos no próprio recinto de Kimlea há uma clínica ambulatória, porque a saúde pública não é gratuita. São atendidas e recebem os remédios. Quem pode, paga, quem não pode, trabalha.

Acima de tudo... a liberdade

Além disso, em Kimlea proporciona-se formação espiritual a quem quiser. E neste aspecto há de tudo: umas decidem batizar-se quando descobrem a fá católica, outras não. E não é condição. Aqui cabe tudo e cabem todas. Acima de tudo, como sempre, está a liberdade. No próprio Centro Kimlea atendem-se estas meninas e as suas mães. A estas proporcionam-se aulas de costura gratuitas. O professorado de Kimlea é constituído por pessoas do Opus Dei que vieram para o Quênia para desenvolver o trabalho apostólico e, agora que já passou tempo suficiente, pelas próprias antigas alunas de Kimlea (nascidas no Quênia).

Numa ocasião tive oportunidade de ser recebida pelo Embaixador da Espanha no Quênia. Quando lhe perguntei se conhecia o Opus Dei, a sua resposta surpreendeu-me: "Como não havia de conhecer, com tudo o que estão a fazer por este país".