O Prelado no 50º aniversário do IESE em Madri: “Santificar o trabalho, transformar o mundo: uma liderança com sentido cristão”

Conferência de Mons. Ocáriz

No contexto do 50º aniversário do início das atividades do IESE em Madri, Mons. Fernando Ocáriz, Grão-Chanceler da Universidade de Navarra e prelado do Opus Dei, visitou o campus e proferiu esta conferência perante um auditório com mais de 600 funcionários e ex-alunos.

Reproduzimos a seguir a conferência completa do Prelado.


É para mim um prazer e um orgulho estar com vocês por ocasião do 50º aniversário das atividades do IESE em Madri, motivo de profunda alegria ao ver o desenvolvimento de uma iniciativa de formação que ajudou muitas pessoas a crescer profissionalmente e a descobrir o sentido profundo (humano, social, cristão) do trabalho, tema muito querido por São Josemaria. Precisamente, nesta intervenção, vou me concentrar principalmente em alguns dos seus textos.

Vocês construíram uma das escolas de administração de empresas mais prestigiadas do mundo, portanto, a julgar pelos resultados externos, vocês fizeram um bom trabalho. Gostaria de encorajá-los a que, juntamente com seus sucessos externos comprovados pelos rankings das escolas de administração de empresas mais relevantes, vocês também se empenhem em alcançar outros sucessos internos que têm ainda mais valor para cada um de vocês da perspectiva de Deus. Esses sucessos internos, que são compatíveis com os sucessos e fracassos do ponto de vista dos negócios, são fruto do trabalho bem feito por amor.

Para esses sucessos internos, importa não apenas o que fazemos e com quais resultados, mas também como trabalhamos e por quê. É através desses sucessos internos que o impacto desta escola chegará ainda mais longe.

Realidade e valor humano do trabalho

Como dizia São Josemaria: “O trabalho, todo o trabalho, é testemunho da dignidade do homem, do seu domínio sobre a criação; é meio de desenvolvimento da personalidade; é vínculo de união com os outros seres; fonte de recursos para o sustento da família; meio de contribuir para o progresso da sociedade em que se vive e para o progresso de toda a humanidade”[1].

São Josemaria fala aqui do porquê do trabalho em geral. Para vocês, o porquê do seu trabalho reflete-se na missão do IESE: “Formam líderes que aspiram a ter um impacto profundo, positivo e duradouro nas pessoas, nas empresas e na sociedade através da excelência profissional, da integridade e do espírito de serviço”.

Verdadeiramente, se vocês cumprirem bem esse propósito tão inspirador, chegarão ao coração da sociedade. Irão melhorar o mundo a partir de dentro. Pois esse propósito tão nobre que vocês perseguem pode ser vivido em todas as suas atividades, não apenas naquelas com maior valor estratégico que vocês assumem no IESE a partir da alta diretoria. Todo trabalho pode ter um grande valor do ponto de vista interior.

Já na própria ordem natural, “a dignidade do trabalho depende não tanto do que se faz, mas de quem o faz; e, no caso do homem, é um ser espiritual, inteligente e livre”[2].

A dignidade natural do trabalho radica, portanto, na dignidade espiritual da pessoa humana, e será maior ou menor em função da maior ou menor qualidade ou bondade que esse trabalho tenha como ação espiritual. Ora, essa qualidade ou bondade depende essencialmente da liberdade: do amor — não como paixão ou sentimento — mas como dilectio ou amor eletivo do fim, como ato próprio da liberdade[3].

Como Juan Antonio Pérez López explicava, trata-se de fomentar em nós e nas pessoas que lideramos os motivos transcendentais: o interesse em servir bem os clientes, a conexão humana com as pessoas, o compromisso com o propósito da empresa. Isso é, em grande parte, o que nos estimula a servir mais e melhor. E isso pode ser feito ao mesmo tempo em que se alcançam os resultados estratégicos de que as empresas precisam e as pessoas adequadas desenvolvem as competências necessárias.

Também neste contexto, as seguintes palavras de São Josemaria são muito esclarecedoras e certamente exigentes: “Convém não esquecer, portanto, que esta dignidade do trabalho se baseia no Amor. O grande privilégio do homem é poder amar, transcendendo assim o efêmero e o transitório. O homem pode amar as outras criaturas, dizer um ‘tu’ e um ‘eu” cheios de sentido. E pode amar a Deus, que nos abre as portas do céu, que nos constitui membros da sua família, que nos autoriza a falar-lhe também de tu a Tu, face a face”.

Em outras palavras, fomos feitos para o Amor, e o trabalho é uma das plataformas sobre as quais o Amor pode crescer dentro de nós mesmos e na sociedade. Nisso consiste boa parte da vocação do cristão no mundo, na sociedade. “Por isso, o homem não se deve limitar a fazer coisas, a construir objetos. O trabalho nasce do amor, manifesta o amor, orienta-se para o amor”[4]

Recentemente, recebi uma história inspiradora publicada há muitos anos na revista Forbes que ilustra essa conexão humana, esse amor manifestado através do trabalho. Ela foi escrita por uma enfermeira do pronto-socorro de um hospital americano que testemunhou um ato surpreendente de liderança:

“Eram aproximadamente 22h30. O quarto estava uma bagunça. Eu estava terminando de trabalhar no prontuário antes de ir para casa. O médico com quem eu adorava trabalhar estava treinando um novo médico, que tinha feito um trabalho muito respeitável e competente, dizendo-lhe o que ele tinha feito bem e o que poderia ter feito de maneira diferente. Então, ele colocou a mão no ombro do jovem médico e disse: ‘Quando você terminou, viu o jovem da limpeza que entrou para limpar o quarto?’. O jovem olhou para ele sem entender. O médico mais velho disse: 'O nome dele é Carlos. Ele está aqui há três anos. Faz um trabalho fabuloso. Quando entra, limpa o quarto tão rapidamente que você e eu podemos atender nossos próximos pacientes rapidamente. Sua esposa se chama Maria. Eles têm quatro filhos'. Em seguida, ele citou o nome de cada um dos quatro filhos e disse a idade de cada um. O médico mais velho continuou dizendo: “Ele mora em uma casa alugada a cerca de três quarteirões daqui, em Santa Ana. Eles vieram do México há cinco anos. O nome dele é Carlos”, repetiu. Em seguida, disse: “Na próxima semana, gostaria que você me contasse algo sobre Carlos que eu ainda não saiba. Tudo bem? Agora, vamos ver como estão os outros pacientes”.

A enfermeira ficou surpresa: “Lembro-me de ficar ali parada, escrevendo minhas anotações de enfermagem, atônita, e pensar: Acabei de testemunhar uma liderança impressionante”.

Às vezes, podemos perder de vista esse tom humano quando pensamos no trabalho sob a perspectiva de competir com outras empresas para obter mais lucros, em vez de pensar em servir às pessoas com atenção e cuidado, com amor.

Obviamente, as empresas também não podem perder de vista a estratégia e o lucro, que são sinais de um serviço de qualidade prestado de forma responsável e eficiente. Mas tão importante quanto os resultados econômicos, ou mais, é servir com amor ao trabalho e com amor às pessoas.

O valor sobrenatural: a santificação do trabalho

Para um cristão, essas perspectivas se ampliam e se expandem. Porque o trabalho aparece como participação na obra criadora de Deus, que, ao criar o homem, o abençoou dizendo-lhe: “Crescei e multiplicai-vos, e enchei a terra e submetei-a, e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves do céu, e sobre todos os animais que se movem sobre a terra. E porque, além disso, ao ser assumido por Cristo, o trabalho se nos apresenta como realidade redimida e redentora: não é apenas a esfera em que o homem se desenvolve, mas também meio e caminho de santidade, realidade santificável e santificadora”[5].

O que significa santificar o trabalho?

Consideremos dois aspectos fundamentais essencialmente ligados entre si, e nos quais o Fundador do Opus Dei insistiu inúmeras vezes. Em primeiro lugar, é evidente que a dimensão sobrenatural do trabalho não é algo justaposto à sua dimensão humana natural: a ordem da Redenção não acrescenta algo estranho ao que o trabalho é em si mesmo na ordem da Criação; é a própria realidade do trabalho humano que é elevada à ordem da graça; santificar o trabalho não é “fazer algo santo” enquanto se trabalha, mas precisamente tornar santo o próprio trabalho.

O segundo aspecto, inseparável e, de certa forma, consequência do anterior, é que o trabalho santificado é santificador: o homem não só pode e deve santificar-se e cooperar na santificação dos outros e do mundo enquanto trabalha, mas precisamente através do seu trabalho, fazendo-o humanamente bem, servindo as pessoas por amor a Deus.

Este espírito cristão na realização do trabalho deve preparar o mundo para reconhecer melhor a Deus e, assim, contribuir também para a sustentabilidade, a paz e a justiça social. “É necessário”, lembra Leão XIV, “esforçar-se para remediar as desigualdades globais, que veem a opulência e a indigência traçar sulcos profundos entre continentes, países e mesmo no interior de cada sociedade”.

Como explicava São Josemaria, há uma relação necessária entre a santificação do trabalho profissional e a reconciliação do mundo com Deus: “Unir o trabalho profissional à luta ascética e à contemplação – coisa que pode parecer impossível, mas que é necessária para contribuir com a reconciliação do mundo com Deus – e converter esse trabalho normal em instrumento de santificação pessoal e de apostolado. Não é este um ideal nobre e grande pelo qual vale a pena dar a vida?”[6]

Podemos viver no trabalho, seja qual for, ter sempre essa perspectiva de servir a sociedade, “A world to change”, como vocês dizem na sua publicidade. Gosto de ver que no seu propósito vocês falam de liderança que seja boa para as pessoas, para as empresas e também para a sociedade.

Nas empresas, é possível fazer muito bem à sociedade, embora também seja verdade que nem tudo o que a sociedade precisa pode ser obtido através das empresas, uma vez que estas estão limitadas pela necessidade de oferecer um serviço limitado e concreto e de gerar lucros, o que faz parte do seu objetivo.

Também são necessários Estados, comunidades e famílias responsáveis. Em sua formação, portanto, esforcem-se por alcançar a pessoa em sua totalidade, também em sua dimensão espiritual, para que, a partir dessas pessoas bem formadas, possamos contribuir para servir a sociedade, também em todas as suas dimensões. Este é o fruto distante da santificação de seu trabalho bem feito por amor.

Para transformar o mundo, temos que começar por nós mesmos e deixar espaço para Deus em nossas vidas. O trabalho é um dos espaços em que Deus quer estar presente em nossas vidas e motivações. Há algumas palavras conhecidas do Fundador do Opus Dei que resumem de forma breve e essencial o conceito de santificação do trabalho, na forma de um conselho prático: “Põe um motivo sobrenatural na tua atividade profissional de cada dia, e terás santificado o trabalho”[7]. Não se trata de fazer coisas diferentes, como trabalhar em entidades beneficentes sem fins lucrativos, mas de fazer as mesmas coisas de sempre de maneira diferente, com um motivo sobrenatural que nos estimula a colocar mais esforço e mais amor.

Ou seja, a atividade de trabalhar torna-se santa quando é realizada por um motivo sobrenatural. Mas essa afirmação não deve ser entendida como uma espécie de “moral da mera intenção”; não se trata, em termos clássicos, de dar primazia ao finis operantis como independente do finis operis, que ficaria privado de sua própria relevância.

O finis operantis é a motivação de quem trabalha, que pode ser movida por motivos de diversa natureza. O finis operis é o que se pretende alcançar com a atividade, que pode ser servir o cliente, terminar um relatório, atingir uma meta. Para servir eficazmente com nosso trabalho, não basta ter boas intenções, mas sim chegar a fatos concretos. “Para servir, servir”, como dizia São Josemaria.

A ordem sobrenatural assume e eleva essa realidade humana, de modo que o trabalho é santo se “nasce do amor, manifesta o amor, se ordena ao amor” e se esse amor é aquela “caridade de Deus que foi derramada em nossos corações, pelo Espírito Santo que nos foi dado”[8]. Quando vivemos essa unidade de vida de que tanto falava São Josemaria, essa caridade de Deus derrama-se por todas as atividades do nosso trabalho: relatórios, telefonemas, pequenos detalhes feitos com amor. O finis operantis penetra e informa de dentro o finis operis todo o nosso agir.

O trabalho é santo, é santificado, quando é regido e informado pelo amor a Deus e aos outros por Deus. Esta é a essência daquele “motivo sobrenatural” que basta colocar no trabalho para santificá-lo; e entendemos ainda melhor que essa “intenção” tende por si mesma à perfeição humana do próprio trabalho: “Não podemos oferecer ao Senhor uma coisa que, dentro das pobres limitações humanas, não seja perfeita, sem mancha, realizada com atenção até nos mínimos detalhes: Deus não aceita trabalhos “marretados”. Não apresentareis nada de defeituoso, admoesta-nos a Escritura Santa, pois não seria digno dEle[9]. Por isso o trabalho de cada qual - essa atividade que ocupa as nossas jornadas e energias - há de ser uma oferenda digna aos olhos do Criador, operatio Dei, trabalho de Deus e para Deus; numa palavra, uma tarefa acabada, impecável”[10].

Mas não se deve confundir trabalhar com perfeição com o perfeccionismo que pode surgir do orgulho e da falta de ordem. Devemos trabalhar bem, dentro do razoável, sabendo que temos muitas ocupações que exigem nossa atenção, às quais também devemos levar o amor de Deus.

O trabalho santificado não é apenas trabalho por Deus e para Deus, mas é, ao mesmo tempo e necessariamente, trabalho de Deus, porque é Deus quem santifica; é Ele quem ama primeiro e torna possível o nosso amor por meio do Espírito Santo, de quem nossa caridade é uma participação.

Para que Deus trabalhe em nós e através do nosso trabalho (para que o nosso trabalho seja opus Dei), é necessário abrir espaços para Deus no nosso dia, espaços de oração e escuta — em casa, no escritório, na rua, na igreja — para alcançar essa unidade com Deus que permite que Deus entre em todas as nossas ações.

Santificar o trabalho, no sentido objetivo, externo, estrutural (por exemplo, finanças ou contabilidade), é inseparável não só de santificar com o trabalho (no dia a dia, através do esforço concreto para alcançar metas específicas e servir determinadas pessoas) mas também de santificar-se no trabalho (crescendo em amor), que é a consequência necessária e imediata de santificar o trabalho em seu aspecto subjetivo (como ação da pessoa).

Certamente, um trabalho subjetivo não santificado pode cooperar para a santificação do mundo, na medida em que contribui para o estabelecimento de estruturas sociais, econômicas, etc., naturalmente eficazes e justas, o que é parte indispensável da ordenação dessas estruturas de acordo com Deus. Pensem aqui, por exemplo, nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.

No entanto, somente um trabalho subjetivo santificado e, portanto, santificador de quem o realiza, coopera necessariamente não só para configurar um mundo justo, mas também para dar-lhe forma com a caridade de Cristo, santificá-lo. Naturalmente, essa santificação do mundo a partir de dentro requer não uma, mas muitas pessoas que santifiquem seu trabalho e se santifiquem em seu trabalho em todas as profissões.

São Josemaria já o dizia quando afirmava que se abriram os caminhos divinos da terra e são necessários muitos e muitas que queiram percorrer esses caminhos para elevar o mundo a partir de dentro, não através de campanhas organizadas e possivelmente ideológicas, que podem ser polarizadoras, mas através do crescimento interior de cada um no seu próprio lugar, aberto às pessoas ao seu redor e acolhendo assim a graça de Deus que quer derramar fé, esperança e caridade ao nosso redor.

A relevância peculiar do trabalho de gestão

Vocês têm pela frente um grande propósito: formar líderes empresariais que criarão o contexto no qual muitas outras pessoas trabalharão e se desenvolverão como indivíduos por meio de seu trabalho. É uma grande responsabilidade preparar pessoas com tanta responsabilidade.

Muitas vezes, eles não terão receitas claras sobre como interpretar um problema ou resolver uma situação. Em geral, o trabalho de gestão envolve um conjunto de atividades, como prever, organizar, coordenar e controlar o desenvolvimento e os resultados da atividade de uma organização.

Diante de uma realidade tão complexa e variável, é compreensível que, ao teorizar sobre a natureza ou analisar a prática do trabalho de gestão, surjam interpretações mais ou menos diversas[11].Por eso, la formación de un directivo no requiere solo memorizar principios o recolectar herramientas de marketing, finanzas, estrategia o contabilidad, sino llegar a un entendimiento prudencial que normalmente se va adquiriendo con una experiencia bien asimilada.

A responsabilidade de um executivo exige prudência, que é a virtude mais própria do trabalho diretivo. Lembro-me de uma famosa afirmação de São Tomás de Aquino: “que os sábios nos ensinem, que os santos rezem por nós, que os prudentes nos governem”.

Através das suas aulas com o método do caso, os seus alunos aprendem a exercer a prudência, a fazer as perguntas-chave, a aprofundar os argumentos, a compreender os pontos de vista dos outros sem preconceitos e a mudar de opinião.

Em sua expressão mais geral, a ação prudente requer um conhecimento suficiente do passado (os precedentes dos assuntos), a atenção às circunstâncias que delimitam o assunto presente e a previsão dos efeitos futuros das possíveis decisões.

“A prudência, além de ser o hábito aperfeiçoador desse tipo de atividade (praxis), é a única virtude intelectual cujo objeto é moral, ou seja, atua como uma espécie de “ponte” entre ambas as dimensões, permitindo conciliar o pensamento com a ação.

Exercitando a prudência na hora de liderar, os participantes de seus programas crescerão moral e intelectualmente e serão capazes de criar ambientes nos quais outras pessoas cresçam, contribuindo assim para melhorar a sociedade.

Outras características de um bom trabalho de gestão, na minha opinião, são a abertura e a flexibilidade. Abertura de mente, para aprender com a experiência e com o estudo. Abertura para compreender as mudanças que são necessárias nos novos tempos. Abertura para acolher e valorizar sugestões ou explicações de outros, sem pressa e sem admitir preconceitos. Saber ouvir.

Abertura para não cortar iniciativas arbitrariamente, mas promovê-las e canalizá-las. Abertura para captar e aceitar oportunidades de mudança; em particular, abertura mental para mudar de opinião: como dizia São Josemaria, “não somos como os rios que não podem voltar atrás”.

Enfim, abertura de coração, para compreender e amar os outros. Essa abertura nos leva a aceitar os outros como são, sem julgar e sem nos deixarmos levar por preconceitos, ao mesmo tempo em que podemos desafiá-los a serem melhores. Consiste também em ser uma ponte para pessoas que pensam de forma diferente. É possível trabalhar muito bem com pessoas de outra religião ou sem religião, e que seguem estilos de vida que podem chocar, pessoas que têm sempre, ou quase sempre, uma boa base sobre a qual se pode construir uma amizade e um projeto comum dentro da empresa.

No que diz respeito à flexibilidade, é óbvio que ela se opõe à rigidez, mas não se opõe à força. Trata-se da capacidade de aceitar e decidir exceções necessárias ou convenientes. Nesse contexto, parece-me interessante mencionar também a importância de promover a liberdade interior dos colaboradores de todos os níveis profissionais, explicando o motivo das instruções dadas.

Trata-se de fazer com que queiram fazer bem o seu trabalho para servir melhor. Nesse mesmo sentido, um bom trabalho de gestão evita o controle excessivo e o excesso de detalhes ao delegar uma tarefa. A microgestão como forma de liderança cria marionetes, não pessoas maduras com critério próprio.

Também vale a pena mencionar a importância de saber delegar, atendendo às circunstâncias das pessoas e dos ambientes. Lembro-me do que escreve São Josemaria, num contexto mais amplo: “Não se pode empregar os mesmos meios com todos. Também nisto é necessário imitar o comportamento das mães: sua justiça é tratar de maneira desigual os filhos desiguais”[12].

Alguns, os mais jovens, precisam de acompanhamento e feedback para adquirir o mais rápido possível a experiência necessária para fazer bem seu trabalho. Outros, mais maduros, precisam de coaching para aprender a tomar suas próprias decisões. E chega um momento em que podem trabalhar sem nenhum acompanhamento, porque o gestor pode delegar-lhes com total confiança e sem preocupações. Mas uns e outros precisam da confiança, proximidade e amizade de seus gestores.

A atividade diretiva exige normalmente canalizar elementos e ações em si mesmos diversos para um objetivo comum. É necessária, portanto, uma capacidade de síntese suficiente que, mantendo a atenção que distingue os diversos elementos da questão, consiga uni-los em uma dimensão final comum. Aqui entra o que muitos chamam de propósito da empresa, que inclui prestar atenção aos seus muitos stakeholders para que a atividade diretiva unifique os esforços de todos.

A relevância peculiar do trabalho diretivo reside, obviamente, no fato de que desse trabalho depende em grande parte a eficácia do trabalho de outras pessoas, seu crescimento pessoal através do trabalho e a cultura e o tom da empresa. Daí um aspecto peculiar da responsabilidade dos diretores.

A posição de diretor não é um privilégio, mas um serviço e uma responsabilidade que consiste em criar um contexto eficaz para o trabalho dos outros. Portanto, um gestor deve fomentar a disposição interior que o leva a cumprir decididamente os seus deveres.

Vocês educam esses gestores não só através das aulas e do trabalho em equipe, mas também criando um tom de trabalho bem feito — jardins bem cuidados, lousas limpas, aulas bem preparadas com finalizações impactantes e claras — e de alegria e proximidade humana, de cuidado com as pessoas.

Esse tom de amizade em que todos percebem que realmente importam, que são amados, explica a abertura e a alegria que se vê em sua escola e nas reuniões de ex-alunos.

Muito obrigado

[1] São Josemaria, É Cristo que passa, n. 47.

[2] São João Paulo II, Discurso, 3/07/1986, n. 3.

[3] Sobre a escolha existencial do fim último, como ato de liberdade, cf. C. Fabro, Riflessioni sulla libertà, Maggioli, Rimini 1983, pp. 43-51; 57-85.

[4] São Josemaria, É Cristo que passa, n. 48.

[5] São Josemaria, É Cristo que passa, n. 47.

[6] São Josemaria, Instrução, 19/03/1934, n. 33.

[7] São Josemaria, Caminho, n. 359.

[8] cf. Rm 5, 5.

[9] Cfr. Lev 22, 20.

[10] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 55.

[11] Cf., por exemplo, G. Scalzo e S. García Álvarez, El Management como práctica: una aproximación a la naturaleza del trabajo directivo, en “Empresa y humanismo”, XXI (2018) pp. 95-118.

[12] São Josemaria, Carta 29/09/1957, n. 25.

Fernando Ocáriz, prelado do Opus Dei