O sentido da filiação divina. Reflexões sobre o ensinamento de São Josemaria Escrivá

“Vivemos como se o Senhor estivesse lá longe, onde brilham as estrelas, e não consideramos que também está sempre ao nosso lado”. O fundador do Opus Dei dizia que devemos ter consciência ser filhos de Deus. Não uma consciência abstrata, mas viva, que afeta e compromete a pessoa.

Tradução do artigo de José Luis Illanes, publicado no número 16 da revista “Studia et Documenta”.

Resumo:O artigo oferece uma visão panorâmica, de caráter histórico-cronológico, do surgimento das expressões ‘filiação divina’ e ‘sentido da filiação divina’ nos escritos de Josemaria Escrivá, completando a exposição com parágrafos finais nos quais se expõem as linhas centrais de uma análise de caráter teológico.

Palavras-chave:Filiação divina – Espiritualidade – Opus Dei – Josemaria Escrivá


“Vivemos como se o Senhor estivesse lá longe, onde brilham as estrelas, e não consideramos que também está sempre ao nosso lado. E está como um Pai amoroso – quer mais a cada um de nós do que todas as mães do mundo podem querer a seus filhos – ajudando-nos, inspirando-nos, abençoando... e perdoando”, escreve São Josemaria Escrivá no ponto 267 de Caminho. E acrescenta uma recomendação em tom urgente: “Necessário é que nos embebamos, que nos saturemos de que Pai e muito Pai nosso é o Senhor que está junto de nós e nos céus”[1].

Trata-se de um dos muitos textos de Escrivá que falam da filiação divina, e um dos mais significativos. Não apenas por ser em si mesmo muito expressivo, mas também por manifestar claramente o tom vital de seu ensinamento. Em sua pregação e em seus escritos, São Josemaria não procede como um teólogo que apresenta um enunciado de fé desenvolvendo-o com considerações e aplicações práticas, mas parte da experiência viva, e daí chega ao ensinamento da fé sobre a qual esta experiência se fundamenta. Esta realidade condiciona, logicamente, toda tentativa de analisar seus escritos e sua doutrina, também, e talvez especialmente, sobre o tema do qual vamos nos ocupar.

Muitos estudos sobre a filiação divina e o sentido da filiação em São Josemaria já foram escritos[2]. Nossa intenção não é acrescentar um novo estudo, nem realizar um balanço dos já publicados, e sim algo mais modesto: tentar uma visão panorâmica, de caráter histórico-cronológico, sobre como as duas expressões mencionadas no título, ‘filiação divina’ e ‘sentido da filiação divina’, foram aparecendo em seus escritos; completando a exposição com uns parágrafos finais nos quais apresentaremos o que consideramos as linhas centrais de uma análise de caráter teológico[3].

A filiação divina na experiência espiritual de Josemaria Escrivá (1931)

Com frequência, ao evocar os acontecimentos que gravaram em sua alma o que designou com a expressão ‘sentido da filiação divina’ e que o levaram a colocar nisso o fundamento de sua vida espiritual e o daqueles que o seguiram (quer dizer, os membros do Opus Dei), São Josemaria começava evocando a formação cristã e a vida de piedade que havia aprendido no lar de seus pais. Foi lá que aprendeu a rezar o Pai nosso, que soube que Deus é nosso Pai e onde começou a tratá-lo com a familiaridade, a simplicidade e a confiança próprias do cristão. Sua profunda consciência da paternidade de Deus e de nossa relação filial com Ele não se imprimiu em sua alma, porém, como fruto de uma reflexão sobre a catequese recebida, antes como consequência de uma experiência espiritual que chegou ao seu cume em 1931, quando ele já tinha trinta anos. E no seio daquilo que já vinha sendo, desde 1928, o acontecimento em torno ao qual toda sua vida girava e continuou girando.

A história que levou de modo imediato a essas experiências tem início no inverno de 1918[4]. Josemaria Escrivá morava então na cidade de Logroño, para onde sua família, deixando Barbastro tinha se mudado uns anos antes. Aquele inverno foi particularmente frio. Uma camada de neve cobria as ruas. Certo dia, saindo de sua casa, Escrivá viu marcas de pés descalços sobre a neve[5], que o impressionaram vivamente. “Se alguém pode suportar esse frio por amor a Cristo, eu, que devo fazer? ”, disse a si mesmo. Após um período de reflexão, tomou uma decisão firme: ordenar-se sacerdote, uma vez que isso pareceu-lhe o caminho mais indicado a fim de estar disponível para o que Deus quisesse dele.

Recebeu a resposta à pergunta implícita nessa decisão dez anos mais tarde, em 2 de outubro de 1928, quando já era sacerdote e morava em Madri. Naquele dia compreendeu que sua vocação consistia em difundir entre cristãos comuns, ocupados no meio do mundo nas tarefas humanas comuns, a plena consciência do que implica ser cristão, e em promover uma instituição que acabou chamando Opus Dei, formada por pessoas das mais diversas profissões e de todos os países, que se comprometessem a viver segundo essa chamada e esse espírito, difundindo assim, mediante o testemunho e a palavra, a chamada universal à santidade e ao apostolado[6].

A mensagem e a missão fundacionais eram claras desde 2 de outubro de 1928. Ao mesmo tempo, também ficava claro que a missão encomendada a ele requeria um trabalho imenso: não se tratava apenas de criar uma linguagem – a chamada universal à santidade e ao apostolado não era, naqueles anos, claramente compreendida – mas também delinear, além disso, um itinerário espiritual, um estilo apostólico, um modo de viver plenamente adequados à chamada à santidade no meio do mundo. Não sem um certo temor, mas sobretudo com uma grande fé, Josemaria Escrivá, então jovem sacerdote, enfrentou essa tarefa, iniciando assim uma aventura para a qual não lhe faltaram luzes particulares.

Uma dessas luzes deu-se em 14 de fevereiro de 1930. Percebeu nesse dia, enquanto celebrava a Missa, que não só homens deveriam formar parte do Opus Dei, como havia pensando até então, mas também mulheres. Compreendeu igualmente que devia superar sua resistência à ideia de dar vida a uma nova fundação (já havia, em sua opinião, excessivas fundações), e consequentemente parar com toda tentativa de verificar se já existia alguma instituição que correspondesse ao que ele tinha visto para, se fosse o caso, colaborar com ela. Nesse 14 de fevereiro de 1930, compreendeu que devia abandonar qualquer procura nessa linha e lançar-se com energia à promoção de uma nova realidade [7].

E foi o que fez. A tarefa não era fácil. Conversou com muitas pessoas, seculares e sacerdotes, apresentando-lhes com singular vibração o horizonte que lhe abria a missão que Deus lhe estava confiando: cristãos e cristãs das mais diversas nações, decididos a santificar sua vida cotidiana e a comunicar esse anseio a todos os que os rodeavam. Suas palavras encontravam eco, mas foram bem poucos – apenas três ou quatro – as pessoas que, naqueles primeiros tempos se comprometeram firmemente a compartilhar esse ideal. Comentou certa vez que “as almas escapavam como enguias”.

Um ano e meio depois do dia 14 de fevereiro de 1930, em 7 de agosto de 1931 exatamente, teve uma experiência importante em seu espírito. Celebrava-se nesse dia na diocese de Madri a festa da Transfiguração do Senhor. Durante a celebração da Eucaristia, umas palavras de Jesus vieram à sua mente com uma força e uma luz novas. Completemos essa narração com estas palavras com que o próprio São Josemaria registrou em seus Apontamentos íntimos[8]: “No momento de elevar a Sagrada Hóstia, sem perder o devido recolhimento, sem distrair-me [...] veio ao meu entendimento, com força e clareza extraordinárias, aquilo da Escritura si exaltatus fuero a terra omnia traham ad me ipsum (Jo 12, 32). E compreendi que serão os homens e as mulheres de Deus que levantarão a Cruz com as doutrinas de Cristo sobre o pináculo de toda atividade humana... E vi triunfar o Senhor atraindo a Si todas as coisas”[9].

Em um texto posterior, em uma de suas Cartas, evocava a própria emoção ao “sentir dentro da alma essa locução divina”. E acrescentava que, ao mesmo tempo, percebeu claramente o significado que Cristo queria dar, naquele momento, às palavras da Escritura. Não já anunciar sua morte na Cruz, mas antes, pressupondo essa morte e a glorificação que a acompanha, convocar todos os cristãos a participar em sua missão redentora[10]. Entendeu claramente, em suma, que, através dessas palavras do Evangelho de São João, Cristo queria recordar-lhe, e recordar a todos os cristãos, e em particular aos cristãos comuns, que trabalham no meio do mundo, que com suas vidas, com seu exemplo e com suas palavras deviam colocar Cristo no cume de todas as atividades humanas, pequenas ou grandes, brilhantes ou anódinas, que lhes coubesse desenvolver[11].

Algumas semanas depois, em setembro de 1931, deram-se dois acontecimentos que se gravaram em sua alma e reforçaram essa consciência viva da paternidade de Deus que designou com as palavras ‘sentido da filiação divina’. O contexto próximo não foi, nessas duas ocasiões, uma celebração litúrgica e sim uma oração intensa que brotou em sua alma enquanto caminhava pelas ruas de Madri. Citemos as palavras textuais que anotou em seus Apontamentos íntimos: Estive considerando as bondades de Deus comigo e, cheio de alegria interior, teria gritado pela rua, para que todo mundo tomasse conhecimento de meu agradecimento filial: Pai! Pai! E – não gritando – mas baixinho, caminhei chamando-o assim (Pai!) muitas vezes, certo de que o agradava[12].

Dia de Santa Edwiges 1931: Quis fazer oração, depois da Missa, na quietude de minha igreja. Não consegui. Em Atocha, comprei um jornal (o ABC) e tomei o bonde. Neste momento, quando escrevo isto, não pude ler senão um parágrafo do jornal. Senti afluir a oração de afetos, copiosa e ardente. Passei o tempo assim no bonde e até minha casa. Isto que estou fazendo, esta nota, é uma continuação, interrompida apenas para trocar duas palavras com as pessoas da minha casa – que só sabem falar da questão religiosa – e para beijar muitas vezes minha Vigem dos Beijos e nosso Menino[13].

Essas duas passagens dos Apontamentos íntimos refletem a profundidade da experiência espiritual que ele viveu. Ambas têm um alcance e um conteúdo idênticos, mas há matizes. O primeiro destaca a afirmação da alegria e do deleite, derivados de uma profunda consciência da paternidade divina. O segundo mostra essa mesma alegria, nota-se, porém, no fundo, que Josemaria Escrivá atravessava nesses meses de 1931 momentos difíceis. A dura situação da Igreja na Espanha, presidida por um governo de orientação laicista e anticatólica; mudanças em seu trabalho pastoral; o fato de que o problema de sua incardinação na diocese de Madri continuasse sem solução e a incerteza sobre o futuro que daí se seguia; a penúria econômica (depois da morte de seu pai em 1925, toda a família – sua mãe e seus dois irmãos – dependia dele em todos os aspectos)... provocavam uma situação de inquietação e desalento que o impulsionavam a confiar inteiramente em Deus.

O que ele narrou nos Apontamentos íntimos manifesta que o aprofundamento de Escrivá na paternidade divina estava unido a um análogo aprofundamento na união com Cristo e na participação em sua missão redentora. Comentava-o ele mesmo em uma meditação pregada em 1963, em que rememora os acontecimentos do outono de 1931 com as palavras: Quando o Senhor me dava aqueles golpes, lá pelo ano trinta e um, eu não entendia. E de repente, no meio daquela amargura tão grande, essas palavras: ‘Tu és meu filho’ (Sl 2, 7), tu és Cristo. E eu só sabia repetir ‘Abba, Pater!; Abba!; Abba!’ Tu fizeste, Senhor, que eu entendesse que ter a Cruz é encontrar a felicidade, a alegria. E a razão – vejo-o com mais clareza que nunca – é esta: ter a Cruz é identificar-se com Cristo, é ser Cristo e, por isso ser filho de Deus[14].

Com palavras parecidas, reitera-o em uma de suas Cartas, acrescentando, porém, outros detalhes: Senti a ação do Senhor que fazia germinar em meu coração e em meus lábios, com a força de algo imperiosamente necessário, esta terna invocação: Abba! Pater! Eu estava na rua, num bonde [...]. Provavelmente fiz aquela oração em voz alta. E andei pelas ruas de Madri, talvez uma hora, talvez duas, não posso dizer, o tempo passou sem que eu o sentisse. Devem ter-me tomado por louco. Estive contemplando com luzes que não eram minhas, essa assombrosa verdade, que ficou acesa em minha alma, para nunca se apagar[15].

“Para nunca se apagar”. Não foi uma emoção transitória, e sim uma luz que o fez compreender, de forma existencial e concreta, a força e o valor da fé, e o moveu a apoiar-se na paternidade de Deus em todas as circunstâncias. E ainda, levou-o a perceber que esta atitude espiritual deveria informar não só sua própria vida, mas também a vida de todos os membros do Opus Dei.

Nas passagens de Apontamentos íntimos em que descreve os acontecimentos de setembro e outubro de 1931, Josemaria Escrivá não faz referência à experiência espiritual de 7 de agosto. Contemplando esses fatos à distância do tempo, a conexão parece clara. Aquele si exaltatus fuero a terra do dia 7 de agosto, havia confirmado mais uma vez e com força especial, a luz do dia 2 de outubro, a perspectiva de um profundo trabalho apostólico entre cristãos comuns de todos os países e condições, movendo-os a santificar sua vida cotidiana e a convidar outros a seguir esse mesmo caminho. Os acontecimentos do outono de 1931 completavam essa mensagem deixando clara a têmpera de alma, a atitude de espírito com que devia enfrentar tal missão.

A partir de então afirmou decididamente que “a filiação divina é o fundamento do espírito do Opus Dei”[16]. E o sentido da filiação divina, a consciência viva da paternidade de Deus e a confiança plena nele a todo momento e em qualquer situação, ocuparam um lugar de primeiro plano em sua pregação e em seus escritos.

A filiação divina nos primeiros escritos de Josemaria Escrivá (1932-1939)

Em dezembro de 1931 São Josemaria redigiu a versão original da primeira de suas obras: Santo Rosário, profundamente inspirado no trato filial com Nossa Senhora de modo que por Maria se chegasse a Jesus, e em Jesus se encontrasse a Deus Pai. Pouco depois, em janeiro ou fevereiro de 1932, decidiu publicá-la para servir-lhe de apoio no trabalho apostólico com os jovens que tratava. Essa primeira edição, bem modesta, foi feita com um mimeógrafo, uma multicopiadora a álcool em uso naquela época.

Em dezembro do mesmo ano publicou, também com mimeógrafo, Considerações espirituais que, com acréscimos e mudanças estruturais, acabou dando origem em 1939, a Caminho,um de seus mais importantes livros. Esta obra é estruturada do princípio ao fim por referências a “nosso Pai-Deus” (grafada assim, com hífen, convertendo as duas palavras em uma só) e por exortações para reagir, como corresponde a quem se sabe filho de Deus nas situações mais variadas: desde o convite para tomar consciência da proximidade de Deus e viver em diálogo constante com Ele até a audácia na ação apostólica, a confiança no auxílio ou no perdão divinos, a generosidade na entrega, a fraternidade, a alegria...

Vamos reproduzir, como exemplo – introduzindo alguns retoques – a compilação de citações de Caminho que oferecemos já faz alguns anos na revista da Pontifícia Academia de Teologia[17], fazendo notar que, se tivéssemos em conta os pontos de Caminho em cuja redação afloram sentimentos filiais, deveríamos reproduzir quase toda a obra:

  • Filiação divina e tomada de consciência da grandeza da vocação cristã: Padre – dizia-me aquele rapagão (que será feito dele?), bom estudante da Central –estava pensando no que o senhor me falou...que sou filho de Deus! E me surpreendi, pela rua de corpo ‘emproado’ e soberbo por dentro... Filho de Deus! Aconselhei-o, com segura consciência, fomentar a ‘soberba’ (n.274; ver também nn. 892 e 919).
  • Filiação divina e consciência da proximidade amorosa de Deus: É preciso convencer-se de que Deus está junto de nós continuamente. – Vivemos como se o Senhor estivesse lá longe, onde brilham as estrelas e não consideramos que também está sempre ao nosso lado. E está como um Pai amoroso – quer mais a cada um de nós do que todas as mães do mundo podem querer a seus filhos – ajudando-nos, inspirando-nos, abençoando... e perdoando. [...]. Necessário é que nos embebamos, que nos saturemos de que Pai e muito Pai nosso é o Senhor que está junto de nós e nos céus. (n.267; ver também nn. 93, 246, 880 e 884).
  • Filiação divina e diálogo constante com Deus: A nossa vontade, com a graça, é onipotente diante de Deus. --Assim, à vista de tantas ofensas ao Senhor, se dissermos a Jesus, com vontade eficaz, indo no ônibus por exemplo: ‘Meu Deus, quereria fazer tantos atos de amor e desagravo quantas as voltas de cada roda deste carro’, naquele mesmo instante, diante de Jesus tê-lo-emos realmente amado e desagravado conforme nosso desejo. Esta ‘ingenuidade’ não está fora da infância espiritual; é o eterno diálogo entre a criança inocente e o pai, doido por seu filho: – Quanto me queres? ... Fala! – E o garotinho diz, marcando as sílabas: – Mui-tos mi-lhões! (n. 897; ver também n. 115 e vários dos números que citamos a seguir e o 267, recém reproduzido).
  • Filiação divina, e perseverança simples e confiante nos tempos dedicados à oração: “Sei que te distrais na oração. – Procura evitar as distrações, mas não te preocupes se, apesar de tudo, continuas distraído. Não vês como na vida natural, até as crianças mais sossegadas se entretém e divertem com o que as rodeia, sem atender muitas vezes às palavras de seu pai? – Isso não implica falta de amor nem de respeito; é a miséria e pequenez própria do filho. Pois olha: tua és uma criança diante de Deus” (n. 890).
  • Filiação divina, fonte de alegria, também nos momentos de prova: “A alegria que deves ter não é essa que poderíamos chamar fisiológica, de animal são, mas uma outra, sobrenatural, que procede de abandonar tudo e te abandonares a ti mesmo nos braços amorosos do nosso Pai-Deus” (n. 659). “A provação desta vez é longa. – Talvez – e mesmo sem ‘talvez’ – não a tenhas aceitado bem até agora... porque ainda procuravas consolos humanos. – E teu Pai-Deus os arrancou pela raiz, para que não tenhas outro arrimo fora dEle”. (n. 722)
  • Filiação divina e confiança plena em Deus: “Diante de Deus, que é Eterno, tu és uma criança menor do que, diante de ti, um garotinho de dois anos. – E, além de criança, és filho de Deus. – Não o esqueças” (n. 860). “Como é bom ser criança! – Quando um homem solicita um favor, é preciso que ao requerimento junte a folha de seus méritos. Quando quem pede é um menininho, como as crianças não têm méritos, basta-lhe dizer: – Sou filho de Fulano. Ah, Senhor – diz-lhe com toda a tua alma! – Eu sou... filho de Deus! (n. 892; ver também nn. 864, 867 e 870).
  • Filiação divina, simplicidade e generosidade na entrega: “Não te preocupes se te aborreces quando fazes essas pequenas coisas que Ele te pede. – Ainda chegarás a sorrir... Não vês com que pouca vontade dá o menino simples a seu pai, que o experimenta, a guloseima que tinha nas mãos? – Mas dá; venceu o amor” (n. 881) “Sofres nesta vida de cá, que é um sonho...breve. – Alegra–-te porque teu Pai Deus te ama muito e, se não levantares obstáculos, após este sonho ruim, te dará um bom despertar” (n. 692; ver também n. 669).
  • Filiação divina e convite a comportar-se como filho de Deus: “Os filhos...como procuram comportar-se dignamente quando estão diante de seus pais! E os filhos de Reis, diante de seu pai o Rei, como procuram guardar a dignidade da realeza! E tu... não sabes que estás sempre diante do Grande Rei, teu Pai-Deus?” (n. 265)
  • Filiação divina e decisão na ação apostólica: “Deus e audácia! – Audácia não é imprudência – audácia não é temeridade” (n. 401) “Querendo-te apóstolo, o Senhor te lembrou, para que nunca o esqueças, de que és ‘filho de Deus’ (n. 819). “Dizes que na ação de graças, depois da Comunhão, a primeira coisa que te vêm aos lábios, sem o poderes evitar, é a petição: Jesus, dá-me isto! Jesus, aquela alma; Jesus, aquela atividade... – Não te preocupes nem te violentes; não vês que, sendo o pai bom e o filho criança simples e audaz, o garotinho mete as mãos no bolso do pai, à procura de guloseimas, antes de lhe dar o beijo de boas-vindas? – Então...” (n. 896).
  • Filiação divina, fundamento da fraternidade: “Distrair-te. – Precisas distrair-te... abrindo muito os olhos, para que entrem bem as imagens das coisas, ou fechando-os quase, por exigências da tua miopia... – Fecha-os de todo! Tem vida interior, e verás, com cor e relevo inesperados, as maravilhas de um mundo melhor, de um mundo novo: e terás intimidade com Deus... e conhecerás a tua miséria... e te endeusarás... com um endeusamento e, aproximando-te de teu Pai, te fará mais irmão dos teus irmãos, os homens”. (n. 283; ver também n. 440).
  • Filiação divina e confiança na misericórdia e no perdão de Deus: “Estás cheio de misérias. – Cada dia as vês mais claramente. – Mas que não te assustem. – Ele bem sabe que não podes dar mais fruto. – As tuas quedas involuntárias – quedas de criança – fazem com que teu Pai-Deus tenha mais cuidado, e que tua Mãe, Maria, não te largue da sua mão amorosa. – Aproveita-te disso e, quando diariamente o Senhor te levantar do chão, abraça-O com todas as tuas forças e encosta a tua cabeça miserável no seu peito aberto, para que acabem de enlouquecer-te os latejos do seu Coração amabilíssimo” (n. 884; ver também n. 887).
  • Filiação divina, realidade que exclui todo o temor: “Não tenhas medo da morte. – Aceita-a desde agora, generosamente... quando Deus quiser... como Deu quiser... onde Deus quiser. – Não duvides; virá no tempo, no lugar e do modo que mais convier... enviada por teu Pai-Deus. Bem-vinda seja nossa irmã, a morte” (n. 739; ver também n. 746, assim como nn. 326 e 435, nos quais sublinha que diante de Deus não cabe temor em sentido próprio, mas apenas ‘temor filial’, quer dizer, o desejo de não o ofender nunca).

Um parêntesis: notas para uma consideração teológica da filiação divina

As palavras com que São Josemaria descreve em seus Apontamentos íntimos as experiências de setembro de 1931 põem em evidência que as luzes então recebidas não foram como um meteorito que cai na terra que lhe é alheia: elas encontram, com efeito, uma alma preparada para recebê-las. A amplitude e a variedade dos contextos em seus primeiros escritos referentes à consideração de Deus como Pai e à do cristão como filho de Deus, confirmam essa realidade e mostram que a oração que a tinha precedido continuou a se desenvolver e a completar-se em anos posteriores.

Houve, certamente uma novidade no outono de 1931: a força de uma luz que gravou em sua alma a afirmação da filiação divina até fazer dessa consideração o fundamento da vida espiritual. Houve, porém, ao mesmo tempo, uma continuidade com a doutrina pregada pela Igreja sobre a condição do cristão como filho de Deus com a qual havia alimentado sua oração e com a qual continuou a alimentar-se no futuro. Convém, por isso, a nosso ver, que antes de continuar abramos um parêntesis de caráter teológico, para expor, mesmo sumariamente, as linhas estruturais dessa doutrina.

Indiquemos, antes de mais nada, que o aprofundamento teológico na compreensão da filiação divina do cristão requer dar atenção a três dogmas fundamentais: a criação, a chamada dirigida ao homem a entrar em comunhão com Deus e, finalmente, a encarnação da segunda pessoa da Santíssima Trindade.

“No princípio, Deus criou o céu e a terra”[18]. Com estas palavras o Gênesis inicia a narração da criação do universo. No princípio: quer dizer, no próprio instante em que o universo, e com ele o espaço e o tempo, começaram a ser; no próprio instante em que a palavra onipotente de Deus tirou do nada, de onde nada existia, o universo inteiro, dotando-o de uma densidade e de uma energia que – mantidas por Deus no ser – permitiram-lhe evoluir e desenvolver-se.

A onipotência divina não é, no entanto, a realidade que agora devemos sublinhar, mas sim as diferenças de tom que se percebem ao longo deste primeiro capítulo do Gênesis. Nos primeiros versículos o autor sagrado destaca o poder que a palavra divina possui, à qual se segue, sem solução de continuidade, o aparecimento de tudo que evoca: “Faça-se a luz! E a luz foi feita... Deus fez o firmamento e separou as águas que estavam debaixo do firmamento daquelas que estavam em cima. E assim se fez”. Quando a narração progride e chega o sexto dia, o tom muda. A passagem inicia-se com um plural de majestático, ‘Façamos’, ao qual se segue a enunciação do que foi decidido: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança [...] Deus criou o homem à sua imagem, criou-o à imagem de Deus; criou o homem e a mulher”[19].

O ser humano não é um elemento a mais entre os inumeráveis que constituem o universo. Não surge como consequência do desenvolvimento de energias e leis impessoais. Não é um ser lançado à existência pelo encontro arbitrário do acaso e da necessidade. Nem tampouco uma partícula desgarrada da divindade, destinada, depois de percorrido seu ciclo, a voltar à unidade da qual saiu e diluir-se nela. Trata-se de um ser concreto, trazido a este mundo, chamado a este mundo, por um amor que o antecede. O amor dos pais, sem dúvida, mas sobretudo o de Deus, assumindo-o (ou, eventualmente, suprindo-o), rege e governa a totalidade do acontecer, outorga a cada ser humano inteligência e vontade e abre diante dele horizontes de eternidade.

Dotado de inteligência, o ser humano tem consciência de si e de tudo o que o rodeia. Ele se percebe como um ‘eu’ circundado não apenas por seres impessoais, mas também por outros seres capazes, como ele, de pronunciar um ‘eu’ ou um ‘você’, com os quais pode entabular relações. E, mais ainda, como um ser que pode transcender seu entorno até elevar-se à afirmação de um Ser supremo do qual tudo depende, inclusive seu próprio destino. Ou seja, Deus.

A partir de uma perspectiva antropológica, o dogma cristão da criação, implica, entre outras coisas, afirmar que o homem pode enfrentar a existência confiando na bondade divina, dirigindo-se a Deus com uma atitude não só de adoração e de reverência, mas também de impetração e de esperança. De confiança, mais concretamente, em uma onipotência que Deus colocou a serviço de seu amor. O dogma da criação leva, em outras palavras, à afirmação de uma paternidade divina, entendida como cuidado amoroso de Deus para com o homem.

Porém há mais: Deus interveio na história. O capítulo doze do Gênesis narra que Deus dirigiu-se a Abrão em Ur da Caldeia e lhe disse: “Deixa tua terra, tua família e a casa de teu pai e vai para a terra que eu te mostrar. Farei de ti uma grande nação; eu te abençoarei [...]; todas as famílias da terra serão benditas em ti”[20]. Todos os outros livros do Antigo Testamento dão testemunho do amor de Deus a Israel que ele guia até fazer dele um grande povo, que perdoa as suas infidelidades e socorre em suas desventuras. Aquele que, em suma, Ele ama com amor de Pai.

Em sua pregação Jesus Cristo não só reafirma a atitude paternal de Deus com relação ao ser humano, mas o faz com uma força singular. Deus – proclama – não só cuida do povo, da coletividade, mas de cada um dos seres humanos, com um amor paterno que chega aos menores detalhes: “se ele veste assim a erva que hoje está no campo e amanhã será cortada, quanto mais a vós homens de pouca fé!”[21]; já que – insiste outro texto – “Até os cabelos de vossa cabeça estão todos contados”[22]. E quando os apóstolos lhe pediram que lhes ensinasse a rezar, disse que o fizessem recorrendo precisamente à palavra ‘Pai’: “Quando orardes, dizei: Pai, santificado seja o vosso nome; venha o vosso Reino...”[23].

Trata-se de afirmações com um sentido profundo e pessoal que vão mais longe do que vemos no Antigo Testamento. Mas, se parássemos aí, não teríamos chegado ao núcleo do Evangelho, já que não teríamos mostrado a raiz da que procede esse modo de falar de Jesus. Para consegui-lo é preciso dar um passo em frente e contemplar o mistério da Encarnação, diante de “o Filho de Deus fazer-se homem para que os homens chegássemos a ser filhos de Deus[24].

Jesus Cristo, que em sua pregação convidou a tratar a Deus como pai e a dirigir-se a Ele com plena confiança, insistiu ao mesmo tempo na peculiaridade de sua relação com o Pai: “Meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus”[25], afirmou em diversos momentos. E proclamou solenemente: “Ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelá-lo”[26]. Jesus não é um filho, mas o Filho, que tem uma relação com seu Pai Deus distinta de qualquer outra. Cristo deu a conhecer que Deus é Uno e inseparavelmente Trino. Que no seio da divindade há paternidade e filiação, e que da mútua referência entre o Pai e o Filho procede uma terceira pessoa, o Espírito Santo.

E diz isso não como um profeta que, com uma linguagem abstrata e desencarnada, transmite uma informação ou uma mensagem, e sim afirmando de si mesmo que é o Filho. O mistério da Trindade e o da Encarnação são-nos revelados ao mesmo tempo. E ainda, Jesus, que revela o mistério da paternidade eterna de Deus e o de sua própria divindade, afirma também que o homem é chamado a participar na vida divina. Marca a singularidade de sua relação com o Pai, porém convida ao mesmo tempo a tratar o Pai com a intimidade com que Ele mesmo o trata; a chamá-lo Pai, Abbá, com a intimidade com que Ele o faz. E promete que, uma vez morto e ressuscitado, enviará o Espirito para que nos identifique com Ele, o Filho, de modo que tanto o Filho como o Pai venham a ter em nós sua morada[27].

A descrição do processo de manifestação da paternidade divina com relação ao homem que acabamos de fazer foi não apenas breve, mas esquemática, suficiente, porém, para nosso propósito. Continuemos, pois, assentando algumas proposições – sete concretamente – que sintetizam o que este processo manifesta e implica[28].

Antes de mais nada, a densidade ontológica do vocábulo ‘pai’ aplicado a Deus. Ao longo da história são muitos os que pronunciaram a palavra ‘pai’ referindo-se à divindade para indicar que Deus atua com relação aos homens como os pais atuam, com o carinho próprio dos pais; quer dizer de forma analógica e inclusive metafórica. Jesus também faz assim em algumas passagens. Em outras, porém, não: Cristo revela que Deus não só atua como um pai, mas é Pai; que no seio da divindade há uma verdadeira geração: Deus, o Pai, engendra um Filho, igual a Ele, consubstancial com Ele.

Ao mesmo tempo – segunda proposição – o Evangelho revela que essa geração eterna se prolonga no tempo e na história. O Filho eterno do Pai se fez homem e fazendo-se homem, incorporou a humanidade a seu mistério. Somos, no Filho, filhos do Pai. Deus não só atua em relação ao homem como um pai, mas é seu Pai; Deus não só lhe outorga o ser e o protege com sua providência, mas comunica-lhe sua vida. Em suma, a paternidade de Deus com relação ao homem e a filiação do homem com relação a Deus, transcendem o plano afetivo e o moral – o cuidado, a proteção, o carinho manifestado em obras – para situar-se no nível ontológico. Há em Deus, vamos dizê-lo com palavras de São Josemaria, “uma corrente trinitária de amor” que chega até os homens[29].

A filiação divina tal e como a fé cristã a proclama é – terceira proposição – um dom que brota de Deus como manifestação supremamente livre do amor divino. São Paulo, ao unir na Carta aos Gálatas, e em outros lugares paralelos, os vocábulos ‘filiação’ e ‘adoção’[30], marca tanto a verdade da comunicação de vida divina aos homens como o fato de que essa comunicação brota de uma livre doação divina. O homem não é filho de Deus em virtude de uma exigência de sua natureza, e sim como fruto de uma adoção, quer dizer, de uma livre decisão divina que vai além do que a natureza reclama.

O amor de Deus – quarta proposição – é criador. A decisão divina de adotar o ser humano transforma-o, modificando-o e elevando-o a partir do interior de seu espírito. A comunicação de Deus, sendo absolutamente gratuita, não devida, é, ao mesmo tempo, em virtude do dom da graça, conatural ao homem que a recebe.

A filiação divina, como é testemunhada pela fé cristã, transcende – quinta proposição – o nível histórico-providencial para situar-se no metafísico, mas, ao transcendê-lo não o exclui, e sim o reafirma. Mostra, com efeito que o horizonte último, a razão de ser, do cuidado amoroso do homem por parte de Deus ao longo da história presente é, precisamente, a plena união com Deus – e em Deus, com os outros homens – que se alcançará no reino dos céus. E implica, portanto, que este horizonte, como todo horizonte último, se reverte sobre o hoje e o agora, sustentando e potenciando esse trato pessoal e íntimo entre o homem e Deus que a consciência da filiação divina está destinada a provocar.

A filiação divina, da mesma forma que outras realidades cristãs – sexta proposição – é submetida à tensão entre o ‘já’ e o ‘ainda não’, entre o presente e a escatologia. Somos filhos de Deus, mas, como diz a Primeira Carta de São João na passagem antes mencionada, “não se manifestou ainda o que havemos de ser”[31]. Agora sabemos que somos filhos de Deus, mas não na visão, e sim na fé, nessa fé que, como indica a Carta aos Hebreus, é “o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê”[32]. Podemos, pois, afirmar com plena certeza que somos filhos de Deus, mais ainda, experimentar o que esta realidade implica, mas ainda, como diz São Paulo, “como por um espelho, confusamente”[33], e, portanto, experimentando também, de um modo ou outro, a limitação e a obscuridade, ou melhor, o claro-escuro.

Somos constituídos filhos de Deus – sétima proposição – incorporando-nos a Cristo; segundo a expressão clássica, somos ‘filhos no Filho’. A filiação divina tem um horizonte teologal, mas também, e inseparavelmente, cristológico. Tornamo-nos partícipes da vida trinitária em virtude da ação santificadora do Espírito Santo que, ao incorporar-nos a Cristo, abre-nos por Cristo, com Cristo e em Cristo à comunhão com Deus Pai.

Esta arraigamento cristológico implica – oitava e última proposição – que, no hoje da história, participamos da missão redentora de Cristo, contribuindo assim com nossas vidas para o caminhar da humanidade rumo à plenitude dos céus. Um caminhar que conhece alegrias e dissabores, mas que, para um cristão, está sempre iluminado pela providência amorosa de Deus e pela vitória de Cristo que, tendo morrido e ressuscitado, venceu a morte e outorga sua graça para tirar da morte, vida.

A filiação divina nos escritos de Josemaria Escrivá posteriores a 1939

Concluímos assim o parêntesis teológico e agora dirijamos nossa atenção aos textos de São Josemaria. A consideração da abundante pregação de Escrivá nos anos que vão de 1940 até o momento de sua morte em 1975, assim como a dos escritos que publicou durante este tempo, confirmam o que o texto de Caminho,já manifestou: a variedade de situações e atitudes que São Josemaria relaciona com a consciência da paternidade de Deus e seu correlato, a condição de seus filhos. Uma análise detalhada desses escritos não contribuiria, neste ponto de vista, com novidades especiais, embora pudesse acrescentar novas situações, novas atitudes e novos matizes.

Realizar esta análise, ainda que não modificasse as conclusões que a análise de Caminho traz, teria, portanto, interesse. Mas infelizmente, trata-se de uma tarefa que no momento atual não se pode realizar com pleno rigor científico-histórico. Com efeito, grande parte da pregação de São Josemaria daqueles anos, em Roma ou durante as suas viagens apostólicas a diversos países (meditações, homilias, palestras...) ainda não foi publicada. Está, sem dúvida, aberta a possibilidade de se trabalhar com os livros já publicados pelo fundador do Opus Dei (Entrevistas, É Cristo que passa, Amigos de Deus...), e foi o que fizeram os autores dos trabalhos sobre o sentido da filiação divina segundo São Josemaria publicados até a data, como já informamos no começo destas páginas. Porém, para um estudo de caráter histórico como este que aqui aspiramos a realizar, essa via também está excluída, já que não é fácil precisar a datação de uma parte importante dos textos incluídos nesses livros. Preferimos por isso renunciar a isso e remeter-nos aos trabalhos já publicados sobre o sentido da filiação, especialmente a dois deles: os de Fernando Ocáriz e de Ernst Burkhart e Javier López, que são recomendados por seu caráter sistemático e seu maior acesso às fontes.

Há, no entanto, dois pontos que não queremos deixar de mencionar. Por um lado, a evolução de sua linguagem. Nos textos dos anos trinta, e concretamente em Caminho, aparecem frequentemente as expressões ‘nosso Pai-Deus’, ‘Deus é nosso Pai’, ‘somos filhos de Deus’ e outras similares, mas os substantivos abstratos ‘paternidade’ e ‘filiação’ brilham por sua ausência[34]. Trata-se de um detalhe que poderia ser considerado irrelevante por se situar em um nível linguístico e remeter a um conteúdo conceitual equivalente, mas não deixa de ser significativo. Relaciona-se, além disso, com o fato de que, diferentemente do que acontece em Caminho, cujo tom é exortativo ou prático, nas meditações, homilias e entrevistas posteriores aos anos quarenta e cinquenta, predomina um tom expositivo.

Esse tom, e essa intenção, são dois dos fatores que levaram São Josemaria a passar do implícito ao explícito e chegar aos textos sintéticos de seus escritos das décadas de 1960 e 1970. Apresentamos a seguir dois, que nos parecem especialmente significativos e que, sendo complementares, oferecem uma visão bastante completa de sua doutrina.

O primeiro se encontra em um dos livros há pouco mencionados, É Cristo que passa, e forma parte de uma homilia dedicada à festa de Cristo Rei. Apresenta tons histórico-salvíficos. Cristo, subindo aos céus – afirma Escrivá – não se afastou da história, mas continua empenhado na obra da salvação dos homens e da criação inteira. Continua na obra da salvação “deste nosso mundo, que é bom porque saiu bom das mãos de Deus. Foi a ofensa de Adão, o pecado da soberba humana, que rompeu a divina harmonia da Criação. Mas Deus Pai, quando chegou a plenitude dos tempos, enviou seu Filho Unigênito, que, por obra do Espírito Santo, tomou carne em Maria sempre Virgem para restabelecer a paz, para que, redimindo o homem do pecado, adoptionem filiorum reciperemus [Gl 4, 5] fôssemos constituídos filhos de Deus capazes de participar da intimidade divina; para que assim fosse concedido a este homem novo, a esta nova estirpe os filhos de Deus [cfr. Rm 6, 4-5], o poder de libertar todo o universo da desordem, restaurando em Cristo todas as coisas [cfr Ef. 1, 9-19], que por Ele foram reconciliadas com Deus [cfr Cl. 1, 20]. Foi para isso – conclui – que nós, os cristãos fomos chamados, essa é a nossa tarefa apostólica e a preocupação que deve consumir a nossa alma: conseguir que o Reino de Cristo se torne realidade, que não haja mais ódios nem crueldades, que estendamos pela terra o bálsamo forte e pacífico do amor”[35].

A Criação, chamada à comunhão com Deus, pecado e redenção constituem o pano de fundo sobre o qual se situa a realidade da filiação divina do cristão, que é, em consequência apresentada em termos de missão. Criado por Deus, o homem é, em Cristo, feito partícipe da vida divina, chamado a penetrar na intimidade divina e, consequentemente, situado diante de um horizonte de eternidade. Esse horizonte, porém, não separa do atuar presente, mas se reverte sobre ele, impulsionando à ação de modo que o hoje e o agora da história manifestem a realidade e a força da redenção operada por Cristo, e antecipem, ainda que com as limitações próprias da condição humana, esse ‘bálsamo forte e pacífico do amor’ que encontrará sua plenitude nos céus.

O segundo dos textos que escolhemos forma parte de uma meditação correspondente ao primeiro domingo da quaresma, incluída também em É Cristo que passa. O tom não é histórico-salvífico, mas antes antropológico. São Josemaria convida nele seus ouvintes, cristãos “plenamente metidos em seu trabalho comum, entre os outros homens, seus iguais”, a um relacionamento sincero e confiado com Deus. Nesse contexto oferece uma visão panorâmica da plenitude de sentido que brota da consciência da filiação divina.

A filiação divina – são palavras dele – é uma verdade feliz, um mistério consolador. A filiação divina empapa toda a nossa vida espiritual, porque nos ensina a procurar, conhecer e amar o nosso Pai do Céu, e assim cumula de esperança a nossa luta interior e nos dá a simplicidade confiante dos filhos pequenos. Mais ainda: precisamente por sermos filhos de Deus, esta realidade leva-nos também a contemplar com amor e admiração todas as coisas que saíram das mãos de Deus Pai Criador. E deste modo somos contemplativos no meio do mundo, amando o mundo[36].

A ênfase não está agora na missão, mas antes na proximidade de Deus. A vida concreta que todo homem vive implica, sem dúvida, uma missão. Dando, porém, essa realidade por pressuposta, o foco do texto citado se dirige ao próprio Deus, considerado não como um ser longínquo do qual tudo provém, e sim como um Pai presente no hoje e agora da história, como um ser que nos fala através do acontecer diário e nos convida a compartilhá-lo com Ele, de modo que, também na vida no mundo – nas condições normais do existir dos homens – ação, trabalho e oração se entretecem, dotando de sentido não apenas o conjunto do existir, mas todas e cada uma de nossas ações, de modo que, tanto as importantes, como as que caberia qualificar de pequenas, sejam vividas com consciência da proximidade de um Deus que tem coração de pai e espera ser reconhecido como tal.

Sentido da filiação divina

As duas expressões que encontramos nos textos de São Josemaria comentados até agora, “filiação divina” e “sentido da filiação divina”, estão, obviamente, muito relacionadas entre si, até o ponto de que não é raro que em um mesmo parágrafo passe-se de uma a outra sem solução de continuidade. Isto não impede, no entanto, que cada uma delas tenha seu significado próprio.

A expressão “filiação divina” indica uma realidade concreta: o fato de que, como dissera São João na primeira de suas epistolas o cristão pode não apenas chamar-se “filho de Deus”, mas também ter consciência de que “o é”[37]. A expressão “sentido da filiação divina” remete, por sua vez, a uma percepção viva por parte do homem da realidade de sua filiação a Deus; uma consciência sentida e profunda do amor de Deus, nosso Pai e de sua proximidade.

Até agora falamos principalmente da primeira dessas duas expressões: “filiação divina”. A segunda, “sentido da filiação divina”, esteve sempre presente não só porque o título do presente artigo remete a ela, mas também porque de fato tudo o quanto dissemos pressupunha que chegaria um momento – o de agora – em que nos ocuparíamos diretamente de sua caracterização.

O verbo ‘sentir’ significa experimentar, perceber, advertir imediatamente. O substantivo ‘sentido’ remete – é um dos primeiros significados que os dicionários trazem – aos órgãos e às percepções (visão, audição, olfato, paladar, tato) que, informando-nos sobre as realidades materiais em que nos situamos, abrem-nos para o mundo. Na linguística, recorre-se a este termo para indicar que há sons que não são meros conjuntos de ruídos desconexos, mas unidades dotadas de ordem e significados, de sentido. Em outros contextos indica que um sujeito possui capacidade e destreza para mover-se de forma adequada: sentido do equilíbrio, de orientação etc.

A expressão “sentido da filiação divina” entronca com o segundo e o terceiro dos usos da palavra “sentido” que acabamos de mencionar. Tal como São Josemaria a emprega, indica que um sujeito tomou consciência de sua condição de filho de Deus. Mais concretamente, uma consciência não abstrata e impessoal (um mero saber), mas viva, que afeta e compromete a própria pessoa. Entre outros possíveis exemplos, remetemos a um ponto de Caminhojá citado: “Padre” – dizia-me aquele rapagão (que será feito dele?) bom estudante da Central – “estava pensando no que o senhor me falou... que sou filho de Deus! E me surpreendi, pela rua, de corpo ‘emproado’ e soberbo por dentro... Filho de Deus!” Aconselhei-o, com segura consciência a fomentar a ‘soberba’[38].

Nós, seres humanos, ao sermos gerados, recebemos de nossos pais qualidades e conhecimento, mas, previamente e sobretudo, a vida. O mesmo acontece no existir cristão, quer dizer, no existir do homem enquanto chamado por Deus a participar da vida divina. A condição de filho de Deus não remete a um ou outro aspecto do viver, mas ao viver em sua totalidade, melhor ao sujeito desse viver considerado na totalidade de suas dimensões. Ao falar de sentido de filiação divina não fazemos referência a virtudes definidas por ações específicas que impulsionam e proporcionam (a eficiência e o aproveitamento do tempo, no caso da laboriosidade; a moderação na comida, na sobriedade; a aceitação de mandatos ou conselhos, no da obediência, etc.), e sim a uma disposição geral do espírito, a uma convicção e a uma decisão que redundam em todos os momentos do viver. “Não podemos ser filhos de Deus só por momentos”[39], escreve São Josemaria: devemos sê-lo sempre em todo lugar. O cristão pode e deve aspirar a que a consciência de sua filiação divina chegue a “informar a existência inteira”, a estar “presente em todos os pensamentos, em todos os desejos, em todos os afetos”[40].

Escrevemos “convicção” e não foi por acaso. Para captar o que implica o sentido da filiação alguns autores recorrem à comparação com a virtude da piedade e, especialmente, com o dom de piedade. Sem deixar de ver que essa consideração é pertinente, parece-nos que para ir plenamente à raiz, é preciso partir das realidades que São Paulo coloca na primeira das cartas dos Corintos acima dos “carismas melhores”[41] e que a tradição teológica qualifica como virtudes teologais: a fé, a esperança e a caridade. E sobretudo a fé, entendida com toda a força que essa virtude teologal possui: ou seja, seguindo a reflexão agostiniana, não um simples credere, um simples aceitar a verdade que as palavras ouvidas enunciam, mas um credere in: um crer que projeta o espírito rumo à realidade em que se crê até unir-se a ela; um crer, em suma, que se prolonga em esperança e em amor.

Falar do sentido da filiação divina é, pois, falar de fé no anúncio evangélico que proclama que Deus quis que fossemos seus filhos. Mais concretamente, de uma fé que, confessando com firmeza essa verdade, impulsiona a assumi-la até impregnar (‘empapar’ diz o ponto de Caminho com o qual começávamos estas páginas) com ela todas as potências e, em consequência, a totalidade do ser e do viver.

Uma descrição completa das implicações de tudo que acabamos de assentar requereria pôr às claras as atitudes que daí derivam, o que além de reiterar o que já está dito em páginas anteriores em referência a Caminho, excede nossas possibilidades tanto por sua amplitude como por razões já mencionadas ao considerar o estado das fontes. Limitemo-nos, pois, a enunciar algumas – não o fazer deixaria a exposição no plano genérico – embora implique repetições:

  • Consciência viva da proximidade de Deus; de um Deus que cuida de cada homem com o amor com que um pai cuida de cada um de seus filhos; e que espera de cada homem uma resposta filial;
  • Vida interior, responder ao amor que Deus manifesta aos homens com um amor total e sincero, que desemboca em um diálogo pessoal, íntimo, com Ele, sabendo que os escuta e os ama;
  • Abertura a grandes ideais e decisão, confiando na ajuda de Deus, de assumi-los com audácia, decisão e entrega;
  • Abandono nas mãos de Deus, aceitando em tudo sua vontade, afastando afãs e preocupações inúteis ou desproporcionadas, e encontrando nEle a força para superar o cansaço e evitar o desânimo;
  • Impulso para superar inteiramente o egoísmo, fomentando o amor e o espírito de serviço aos outros homens reconhecendo sua condição de filhos de Deus e, portanto, de irmãos;
  • Consciência da própria debilidade, e reconhecimento das falhas e deficiências pessoais, abrindo com prontidão o coração a Deus, confiando em sua misericórdia e em seu perdão;
  • Alegria a todo momento, também nas situações difíceis e dolorosas, sabendo que Deus, com seu amor e onipotência, pode tirar bens de todos os males.

Poderíamos completar a enumeração, porém, não parece necessário. Mais necessário é dedicar algumas palavras ao que podemos denominar o “dinamismo do sentido da filiação divina”. Somos filhos de Deus, mas “não se manifestou ainda o que havemos de ser”[42], comentávamos mais acima citando a Primeira Carta de São João e a fim de trazer à consideração a tensão escatológica entre o “já” e o “ainda não” que marca a filiação divina como o conjunto das realidades cristãs.

Completamos esse ponto assinalando que o intervalo de tempo entre o agora de nosso existir histórico e a plenitude da escatologia não é, no que se refere à filiação divina, somente um tempo de espera, mas um tempo no qual a consciência da proximidade amorosa e paternal de Deus e de nosso sentido de filiação com relação a Ele devem ir informando cada vez mais profundamente a experiência espiritual. “Todos os homens são filhos de Deus”, escreve São Josemaria, para acrescentar a seguir: “mas um filho pode reagir de muitas maneiras diante de seu pai”[43]. O sentido da filiação divina está destinado a crescer, dando origem a uma consciência cada vez mais profunda da condição de filhos de Deus.

A consideração dos textos de São Josemaria põe em relevo a existência de duas vias fundamentais para esse crescimento. Em primeiro lugar, a meditação viva, não meramente intelectual, dos textos da Escritura e da tradição espiritual testemunha e glosa a paternidade de Deus com relação aos homens. Uma meditação, portanto, que produza um deslumbramento diante do dom recebido e se prolongue então, em gratidão, em humildade, em ações de graças, em desejos de corresponder. Uma meditação que se alimente da contemplação da vida e da paixão de Cristo, na qual nos é revelado até que extremo chega o amor de Deus Pai pelos homens. Uma meditação que receba impulso da contemplação da vida de Jesus em Belém e em Nazaré, na qual fica evidente que as atividades comuns e normais podem ter ressonâncias divinas. Uma meditação que inclua também a consideração de Santa Maria, na qual ficam patentes os tons maternais que a filiação implica.

Porém, dizíamos antes, junto à oração há outra via através da qual se progride no sentido da filiação divina: nossa própria vida, que oferece momentos cheios de alegria interior, e outros marcados pela experiência da dor ou do fracasso. Ambos devem levar a radicar-se em Deus, seja através da ação de graças, já que Deus é a fonte última de todos os dons, seja, quando for o caso, através da aceitação rendida de tudo o que Deus quer ou permite, embora custe e embora às vezes não se consiga vislumbrar o motivo. A experiência de São Josemaria face aos acontecimentos e situações que constituíram o contexto de seu aprofundamento na filiação divina no outono de 1931 comprova tudo isso.

Seja qual for a nossa vida e os acontecimentos que a pontuam, somos chamados a aspirar a “ser filhos dos que procuram perceber que, ao querer-nos como filhos, o Senhor fez com que vivêssemos em sua casa no meio deste mundo, que fôssemos da sua família, que as suas coisas fossem nossas e as nossas suas”[44]. E assim é em todo momento e em qualquer situação. Encerremos por isso nossa exposição com uma citação de São Josemaria, que, ao evocar a vida cotidiana, feita em grande parte de acontecimentos pequenos, mas aberta a aspirações grandes, unifica e sintetiza, de certa forma, o que foi dito até agora: Quando a fé fraqueja, o homem tende a imaginar Deus como se estivesse longe e mal se preocupasse com os seus filhos. Pensa na religião como algo justaposto, para quando não há outro remédio; sem saber por quê, espera manifestações aparatosas, acontecimentos insólitos. Em contrapartida, quando a fé vibra na alma, descobre-se que os passos do cristão não se separam da própria vida humana corrente e habitual. E que essa santidade grande, que Deus nos reclama, se encerra aqui e agora, nas coisas pequenas de cada jornada[45].


José Luis Illanes. Professor emérito de Teologia Moral e Espiritual na Faculdade de Teologia da Universidade de Navarra desde 2004, da qual foi decano durante muitos anos. Foi o primeiro diretor do Istituto Storico San Josemaria Escrivá (2001-2017). Prelado de honra de Sua Santidade e membro da Pontifícia Academia de Teologia, bem como de diversas associações científicas internacionais.

e-mail: jlillanes@unav.es


[1] Sobre a gênese deste ponto de Caminho, ver Josemaría ESCRIVÁ, Caminho, Caminho. Edição comentada, Quadrante, São Paulo, 2016 (daqui em diante Caminho – OC).

[2] Entre os estudos de conjunto sobre a filiação divina em Josemaría Escrivá, merecem especial menção: Fernando OCÁRIZ, La filiación divina, realidad central en la vida y en la enseñanza de Mons. Escrivá de Balaguer, em Ip., Naturaleza gracia y gloria, Pamplona, Eunsa, 2000, pp. 175-221 (publicado antes como artigo em “Scripta Theologica” 13 {1981}, pp. 513-552); Jutta BURGGRAF, Il senso della filiazione divina, em Santitá e mondo. Atti del Congresso teologico di studi sugli insegnamenti del beato Josemaría Escrivá, (Roma 12-14 ottobre 1993), Città del Vaticano, Libreria Editrice Vaticana, 1994 pp. 85-100; Johannes STÖHR, La vida del cristiano según el espíritu de filiación divina, “Scripta Theologica” 24 (1992), pp´879-893; Javier SESÉ, La conciencia de la filiación divina, fuente de vida espiritual, em “Scripta Theologica” 31 (1999) pp 471-493; Ernst BURKHART – Javier LÓPEZ, Vida cristiana y santidad en la enseñanza de San Josemaría. Estudio de teología espiritual, vol. II, Madri, Rialp, 2011, pp 11-159.

[3] Por nossa parte, além das referências à filiação divina segundo a doutrina de São Josemaría incluídas em La santificación del trabajo (Madri, Palabra, primeira edição 1965, décima edição ampliada 2001), dedicamos já a esse estudo dois artigos: Filiación divina: ontologia y vivencia existencial, em El Dios y Padre de nuestro Señor Jesucristo. Actas del XX Simposio Internacional de Teologia, Facultad de Teología, Universidad de Navarra, Pamplona, Eunsa, 2000, pp 537-545, e Experiencia cristiana y sentido de la filiación divina en san Josemaría Escrivá de Balaguer, PATH 7 (2008), pp. 461-475. Na presente exposição tivemos em conta esses dois artigos, retomando inclusive, às vezes, algumas passagens, tendo-as revisado e completado.

[4] Para o que se segue e outros acontecimentos posteriores, remetemos às biografias já publicadas, especialmente à mais longa e completa: Andrés VÁZQUEZ DE P, O Fundador do Opus Dei, Vida de Josemaría Escrivá, 3 vols., São Paulo, Quadrante, 1997-2003, vol. I (daqui em diante VdP).

[5] Essas pegadas eram de um frei carmelita.

[6] Sobre o dia 2 de outubro de 1928, remetemos a VdP, vol. I, pp. 288-298 e ao que nós mesmos escrevemos em Dois de outubro de 1928: alcance e significado de uma data, “Scripta Theologica” 13 (1981), pp. 411-451 (consta em José Luis ILLANES, Existencia cristiana y mundo. Jalones para una reflexión teológica sobre el Opus Dei, Pamplona, Eunsa, 2003, pp. 51-98). Para uma visão de conjunto dos momentos essenciais do processo de fundação do Opus Dei, ver Antonio ARANDA, Fundación del Opus Dei, en José Luis ILLANES (coord.), Diccionario de San Josemaría Escrivá de Balaguer, Roma-Burgos, Istituto Storico San Josemaría Escrivá – Monte Carmelo, 2013, pp. 552-561 (daqui em diante DSJ).

[7] Cfr. VdP, vol. I, pp. 315-324, e Francisca RODRÍGUEZ QUIROGA, 14 de fevereiro de 1930: a transmissão de um acontecimento e uma mensagem.

[8] Sobre os Apontamentos íntimos, ver Pedro RODRÍGUEZ, Apontamentos íntimos, em DSJ, pp. 131-135.

[9] Apontamentos íntimos, n. 217

[10] Cfr. Josemaría ESCRIVÁ, Carta n.3, em Ip.,Cartas (I), edição crítica e anotada, preparada por Luis CANO, Coleção de Obras Completas de Josemaría Escrivá, Istituto Storico San Josemaría Escrivá – Rialp, Roma- Madri2020, pp. 162-163. Sobre as Cartas e a datação, frequentemente simbólica em parte, ver José LUIS ILLANES, Cartas, em pp. 204-211.DSJ

[11] Um estudo profundo desta realidade espiritual em Pedro RODRÍGUEZ, ”Omnia traham ad meipsum”. O sentido de João 12, 32 na experiência espiritual de Mons. Escrivá de Balaguer, ‘Romana’ 7 (1991), pp. 331-352 (versão italiana, ampliada em “Annales Theologici” 6 [1992], pp.5-34).

[12] Em seus Apontamentos íntimos, 22 de setembro de 1931, n. 296. Esse texto e o outro que segue assim com outros desse mesmo período que citaremos depois, encontram-se, dentro do contexto histórico, na biografia antes citada, VdP, vol I, pp. 387-392.

[13] Apontamentos íntimos, 16 de outubro de 1931, n. 334. A Virgem dos Beijos era uma imagem de Nossa Senhora que tinha em seu quarto e que costumava beijar ao entrar e sair de lá. A expressão ‘nosso Menino’, o Menino Jesus obviamente, alude provavelmente a uma imagem do Menino Jesus que foi conservada pelas monjas agostinianas do Convento de Santa Isabel, que ele atendia; trata-se de uma imagem que representa o Menino Jesus com os braços cruzados no peito, que, por manifestar de modo plástico a realidade de um Deus que se faz pequeno e deseja receber carinho e consolo, comoveu profundamente São Josemaría.

[14] Anotações de uma meditação de 28 de abril de 1963 (AGP, PO1, dezembro de 1963, pp. 12-13).

[15] Carta 9/01/1969, n. 60, cit. em VdP vol. I, pp. 389-390.

[16] Josemaria ESCRIVÁ DE BALAGUER, É Cristo que passa, edição crítico-histórica preparada por Antonio ARANDA, Roma-Madri, Istituto Storico San Josemaria Escrivá – Rialp, 2013 (daqui em diante ECqp-OC), n. 64b, p.411.

[17] Cfr. ILLANES, Experiencia, pp. 461-475.

[18] Gn. 1, 1.

[19] Gn. 1, 26-27.

[20] Gn. 12, 1-3

[21] Mt. 12,28

[22] Mt. 10, 30.

[23] Lc 11, 1-4

[24] Santo Atanásio, Oratio de Incarnatione Verbi, 54 (PG XXV, col. 192) e Tomus ad Antiochenos, 7 (PG XXVI, col. 803).

[25] Jo, 20, 17

[26] Mat. 11, 27.

[27] Cfr. Jo. 14, 19.20.23.

[28] A seguir recolhemos, retocadas, considerações em parte já feitas em ILLANES, Filiação divina, citado na nota 2.

[29] A expressão “corrente trinitária de amor” aparece em diversos textos de São Josemaría: ECqp – OC, n. 85, p 497; Josemaría ESCRIVÁ DE BALAGUER, Amigos de Deus, edição critico-histórica preparada por Antonio ARANDA, Roma-Madri, Istituto Storico San Josemaría Escrivá – Rialp, 2019 (AdD – OC), n. 252, p. 732.

[30] Gl. 4, 4-7; Rm 8, 23; Ef. 2, 7

[31] 1 Jo 3,2. Há afirmações análogas em São Paulo: 1 Cor. 13, 12

[32] Hb. 11, 1

[33] 1 Cor. 13,12

[34] O substantivo ‘filiação’ aparece uma vez em Caminho (n. 955), mas referido não a Deus e sim à unidade que se deve viver com quem tem o cargo de direção numa instituição apostólica.

[35] É Cristo que passa, n. 183. A homilia data de 22 de novembro de 1970; para dados sobre a versão original e a reelaboração, data da década de 1960-1970, ver ECqp – OC, pp. 90-929.

[36] É Cristo que passa, n. 65. A homilia está datada de 2 de março de 1952; para dados sobre a versão original e a reelaboração, que data da década de 1960, ver ECqp – OC, pp. 375-380.

[37] 1 Jo 3,1.

[38] Caminho – OC, n. 274, p.456.

[39] Josemaria ESCRIVÁ DE BALAGUER, Conversaciones con Monseñor Escrivá de Balaguer. Edição critico-histórica preparada por José Luis ILLANES – Alfredo MÉNDIZ, Roma – Madri, Istituto Storico San Josemaria Escrivá – Rialp, 2012, n. 102, p.447.

[40] AdD – OC, n. 146, pp. 480-481.

[41] 1 Cor 12, 31

[42] 1 Jo 3, 2. Afirmações análogas em São Paulo: 1 Cor 13, 12.

[43] ECqp – OC, n. 64, p. 411

[44] Ibid.

[45] Amigos de Deus, n. 312, p.869