“O que é um Recolhimento?”

De uma entrevista realizada com certo preconceito em relação ao Opus Dei nasceu uma amizade que levou a descobrir o amor do Senhor.

Foto: Tim Gouw/ Pexels

Todas as semanas vou com um sacerdote a uma cidade italiana para desenvolver e acompanhar as atividades apostólicas e formativas do Opus Dei. Nunca nos faltou a ajuda do Senhor e o trabalho, graças a Deus, cresceu bastante. Há alguns anos, estava num hotel uma tarde, à espera de ir para um recolhimento mensal* quando um amigo me avisou que estava à minha espera no hall um jovem jornalista da imprensa online que queria fazer-me uma entrevista sobre o Opus Dei.

Começa a entrevista e o jornalista faz-me uma série de perguntas um pouco absurdas, pelas quais deduzo que não sabe quase nada sobre a Obra e que tem uma atitude ligeiramente hostil; mas imediatamente acho-o simpático. Respondo a tudo num tom positivo e disponível e quando me pergunta: “Mas o que é um recolhimento? Que é que se faz?”, convido-o para a recolhimento que está prestes a começar; aceita e vem. Terminado o recolhimento, indico-lhe quando é o próximo. Cumprimenta-me e sai, noto que fica muito pensativo.

Um mês depois estava em frente à igreja onde estava sendo o recolhimento, à espera dos participantes. Vejo chegar uma Vespa, que se detém a alguns metros da entrada da igreja, mas não consigo reconhecer o motorista por causa do capacete.

Passados alguns segundos o motociclista liga o motor e vai-se embora. “Quem seria”, me perguntei.

Na manhã seguinte, recebi este e-mail:

“Peço desculpa por não ter estado presente ontem à tarde. Para dizer a verdade, saí da minha terra e cheguei à cidade, passei em frente à igreja do Espírito Santo e não tive coragem de entrar, senti que era inadequado, acontece-me muitas vezes desde que deixei de frequentar a igreja assiduamente.

Tinha uma forte experiência de fé que acompanhou a minha vida até aos 20 anos, depois algo aconteceu e afastei-me, sei o grande que pode ser o amor de Deus, sei como o Espírito age, tive provas tangíveis da misericórdia do Senhor, agora sinto-me indigno precisamente porque...O abandonei.

Espero encontrar a força de me reaproximar de Jesus, procuro viver a minha vida seguindo o caminho do bem mas sei que não é suficiente, falta alguma coisa no meu coração. Espero que não me leve a mal”.

Respondi o seguinte:

“Caro amigo, entendo e respeito a sua decisão. Mas tomo a liberdade de o encorajar. O Senhor aproxima-se sempre, seja o que for que tenhamos feito ou há quanto tempo o tenhamos abandonado. Pede apenas um pouco de disponibilidade para ouvir. Uma tigela virada ao contrário não pode guardar a água que derramamos sobre ela; para sabermos se enche, basta ter a coragem de a virar para o lado certo. Talvez o Senhor peça apenas este gesto de disponibilidade. Vou avisando as datas dos recolhimentos mensais... até que me diga para... parar! Cumprimentos e votos de uma feliz Páscoa”.

Aqui está a sua resposta:

“Obrigado pelas palavras de encorajamento, vou pôr todo o meu empenho em virar a tigela para o lado certo. Pareceu-me boa pessoa, geralmente nunca erro e, à primeira vista, deixou-me logo uma impressão positiva, por isso não lhe menti e não tentei justificar a minha ausência no recolhimento. Gostaria de conversar com você também sobre a experiência com Deus que vivi, nunca falo com ninguém sobre isso, nenhum dos meus amigos entende”.

Passaram cinco anos, ficamos amigos muito próximos e ele finalmente virou a tigela para o lado certo, acolhendo a graça de Deus em seu coração. Tem dois filhos pequenos, ama muito a sua família e iniciou um pequeno negócio que lhe permite ganhar apenas o necessário para sobreviver.

Mas está feliz por oferecer o seu trabalho a Deus e recusa-se a publicar livros contrários à fé ou à moral cristã. Na última vez em que nos encontramos, disse-me: “Veja, pelo meu trabalho, assinei algumas revistas. Gosto particularmente de uma que me custa 100 euros por ano. Como percebi que não tinha dinheiro para contribuir para as atividades apostólicas, decidi cancelar a assinatura. Aqui estão os 100 euros que poupei”.


* O recolhimento é uma atividade de formação cristã levado a cabo pelo Opus Dei, que consiste em dedicar algumas horas à oração pessoal e à meditação sobre diferentes temas da vida cristã, como virtudes, doutrina ou o bom uso do tempo.