EM CERTA OCASIÃO, Jesus dirigiu esta advertência aos Seus discípulos: “Que vossos rins estejam cingidos e as lâmpadas acesas” (Lc 12, 35). Na hora de viajar ou fazer certos trabalhos, os judeus costumavam apertar na cintura as roupas largas que usavam. As palavras de Jesus são, portanto, um convite a estar disponível para realizar uma tarefa ou a preparar-se para mudar para outro lugar. Da mesma forma, quem aguardava a chegada de um visitante, ou quem estava vigiando e atento por algum motivo importante, mantinha sua lâmpada acesa.
Com estes exemplos, provenientes da vida cotidiana, o Senhor exortava os seus discípulos à vigilância. Por um lado, ele se refere à disposição dos cristãos que aguardam a vinda final de Jesus; por outro, também pode ser entendido “como a atitude comum a ter na conduta de vida, de tal modo que as nossas boas escolhas, feitas às vezes depois de um discernimento exigente, possam continuar de maneira perseverante e coerente e dar fruto”[1]. É, portanto, uma vigilância que nos leva a guardar o dom da vocação que Deus nos concedeu, para que as nossas ações e sentimentos estejam de acordo com ela.
Pelo contrário, uma alma adormecida é aquela que não se deixa desafiar pelo que a rodeia e confia na sua capacidade de controle. Essa sonolência pode nos levar a nos autocomprazermos na nossa vida satisfeita. “Mas esse embotamento das almas, essa falta de vigilância (...) confere ao maligno um poder no mundo”[2]. Jesus não chama os apóstolos a ficarem tranquilos ou se conformarem com o bem que fazem; em vez disso, convida-os a vigiar em todos os momentos para que os seus corações não se afastem d’Ele. E esta vigilância os leva a ser humildes, pois não colocarão a sua segurança na própria complacência, mas principalmente em Deus, que é o primeiro a cuidar de cada um de nós.
JESUS compara esta vigilância com a atitude dos servos que aguardam a chegada do seu senhor. Eles sabem que mais cedo ou mais tarde chegará e que aquele encontro mudará a sua existência, pois não serão mais tratados como servos, mas como iguais: “ele mesmo vai cingir-se, fazê-los sentar-se à mesa e, passando, os servirá” (Lc 12, 37). Cristo conhece que “precisamos das esperanças – menores ou maiores – que, dia após dia, nos mantêm a caminho. Mas, sem a grande esperança que deve superar tudo o resto, aquelas não bastam. Esta grande esperança só pode ser Deus, que abraça o universo e nos pode propor e dar aquilo que, sozinhos, não podemos conseguir”[3]. Jesus é o Senhor a quem nós, cristãos, estamos aguardando e a Sua chegada nos oferecerá uma vida muito maior do que podemos imaginar.
No dia a dia podemos depositar as nossas esperanças em realidades que nos enchem de entusiasmo: um plano familiar, um momento de esporte com os amigos, a celebração de uma festa, etc. Neste sentido, o prelado do Opus Dei destaca: “Esperar o encontro diário com Jesus no sacrário: isso será sinal de amor verdadeiro”. E acrescenta que também podemos unir essas esperanças mais cotidianas à Eucaristia: “Tornar o sacrário o centro, o ponto de convergência das nossas esperanças, será um caminho seguro para crescer no amor a Cristo”[4]. Somente Jesus pode satisfazer os nossos anseios mais profundos de felicidade. Enquanto esperamos a Sua chegada, podemos começar a desfrutar daquela alegria nas realidades da vida cotidiana, quando as saboreamos unidos a Ele.
“GOSTO de falar de caminho, porque somos viandantes, dirigimo-nos para a casa do Céu, para a nossa Pátria. Mas reparemos que um caminho, embora possa apresentar trechos de dificuldades especiais, embora vez por outra nos obrigue a vadear um rio ou a atravessar um pequeno bosque quase impenetrável, habitualmente é coisa correntia, sem surpresas. O perigo é a rotina: imaginar que Deus está ausente das coisas de cada instante por serem tão simples, tão triviais!”[5]. De fato, às vezes a monotonia pode nos impedir de perceber a grandeza do que estamos fazendo. Como realizamos praticamente a mesma coisa todos os dias, é fácil nos acostumarmos e não perceber que a realidade – trabalho, família, relações de amizade, etc. – é muito maior do que parece à primeira vista: são momentos em que Deus nos espera.
São Paulo termina assim a sua carta aos Coríntios: “Estai vigilantes, permanecei firmes na fé, sede corajosos e fortes. Que, entre vós, tudo se faça com amor” (1Cor 16, 13-14). A vigilância nos leva a colocar amor em tudo o que fazemos. Desta forma, cada dia poderá ser diferente, pois será a expressão de um amor renovado, que se expressa de forma única naquele dia e que tem valor de eternidade. “Ocupa-te dos teus deveres profissionais por Amor. Faz tudo por Amor – insisto – e comprovarás as maravilhas que produz o teu trabalho, precisamente porque amas, embora tenhas de saborear a amargura da incompreensão, da injustiça, da ingratidão e até do próprio fracasso humano. Frutos saborosos, sementes de eternidade!”[6]. Podemos pedir à Virgem Maria que nos ajude a superar a rotina, transformando tudo o que fazemos num ato de amor ao seu Filho.
[1] Francisco, Audiência, 14/12/2022.
[2] Bento XVI, Jesus de Nazaré, segunda parte, Planeta.
[3] Bento XVI, Spe Salvi, n. 31.
[4] Fernando Ocáriz, À luz do Evangelho, “O centro das esperanças”.
[5] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 313.
[6] Ibid., n. 68