Meditações: terça-feira da 22ª semana do Tempo Comum

Reflexão para meditar na terça-feira da 22ª semana do Tempo Comum. Os temas propostos são: maravilharmo-nos perante a autoridade de Jesus; o Evangelho liberta-nos; obedecer: saber escutar.


JESUS queria pregar em Cafarnaum, não apenas porque era o local de origem de vários dos apóstolos, mas também porque lá encontrou abertura para os seus ensinamentos. Era uma pequena povoação, que crescera nas margens do mar da Galileia com grande movimento de comerciantes e guarnições romanas, além de possuir uma importante sinagoga. Era, portanto, um lugar de afluência de judeus e gentios, de nativos e viajantes pelo que havia uma grande convergência de mentalidades.

Em uma ocasião em que Jesus desceu a Cafarnaum, São Lucas destaca a admiração que a sua doutrina produzia “porque falava com autoridade” (Lc 4, 31). Podemos imaginar os diversos ouvintes da pregação do Senhor, a quem prestariam atenção movidos, talvez, pela esperança, o interesse ou a curiosidade. Observariam a relação entre as suas maravilhosas palavras, os seus gestos, as suas reações no convívio com as pessoas, as suas atitudes perante os incidentes da vida do seu povo. Ao contrário do que acontecia com alguns fariseus, o discurso de Cristo transmitia-lhes uma fascinação que emanava da sua autoridade. Não só falava de realidades mais ou menos bonitas, mas viam na sua forma de atuar a confirmação do que ensinava.

Através da leitura e da meditação do Evangelho, nós também podemos nos maravilhar com a figura de Jesus como os seus contemporâneos. “Meu conselho é que, na oração, cada um intervenha nas passagens do Evangelho, como mais um personagem. Primeiro, imaginamos a cena ou o mistério, que servirá para nos recolhermos e meditar. Depois, empregamos o entendimento para considerar este ou aquele traço da vida do Mestre: seu Coração enternecido, sua humildade, sua pureza, seu cumprimento da Vontade do Pai. Depois, contamos-lhe o que nos costuma ocorrer nessas matérias, o que sentimos, o que nos está acontecendo. É preciso permanecermos atentos, porque talvez Ele nos queira indicar alguma coisa: e surgirão essas moções interiores, o cair em si, essas reconvenções”[1].


DURANTE a permanência do Senhor em Cafarnaum, “havia um homem possuído pelo espírito de um demônio impuro, que gritou em alta voz: O que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste para nos destruir? Eu sei quem tu és: tu és o Santo de Deus!!”. E Jesus ordenou-lhe: “Cala-te, e sai dele”. O demônio, arremessando o homem para o meio da assistência, saiu dele sem lhe fazer mal algum”. Dominados pelo espanto, diziam uns aos outros: “Que palavra é essa? Ele manda nos espíritos impuros, com autoridade e poder, e eles saem!” (Lc 4, 33-36).

O Senhor tem poder sobre os demônios. Nessa cena, o diabo o desafia e o chama com impertinência de o Santo de Deus, mostrando que conhece a sua missão e revoltando-se contra a obra da salvação. Apesar da sua aparente força, obedece à ordem de Jesus e, ao som das suas palavras, abandona imediatamente o corpo daquele homem. Algo semelhante se repete em outros momentos do Evangelho: pessoas que durante muitos anos ou mesmo desde o nascimento, estavam escravizadas pelo demônio ou pela doença, o que, em determinadas ocasiões, fazia com que fossem desprezadas por seus contemporâneos. O encontro com o Senhor não só lhes restituiria a saúde como permitiria que tivessem uma nova relação com a vida; poderiam voltar a desfrutar da companhia dos seres queridos e o seu relacionamento com Deus estaria marcado por uma fé renovada.

“O Evangelho é palavra de vida: não oprime as pessoas, ao contrário, liberta quantos são escravos de muitos espíritos malignos deste mundo: o espírito da vaidade, o apego ao dinheiro, o orgulho, a sensualidade... O Evangelho muda o coração, muda a vida, transforma as inclinações ao mal em propósitos de bem. O Evangelho é capaz de mudar as pessoas! É, portanto, tarefa dos cristãos difundir em toda a parte a sua força redentora, tornando-se missionários e arautos da Palavra de Deus”[2].


ALÉM dos ensinamentos do Evangelho, as indicações de Jesus também nos chegam através da Igreja e dos diversos meios de que o Senhor se serve para nos dar a conhecer a sua vontade. Como recordava o Prelado do Opus Dei: “Deus também pode nos fazer ver sua vontade por meio das pessoas ao nosso redor, investidas de maior ou menor autoridade, dependendo do caso e do contexto. Saber que Deus pode nos falar por meio de outras pessoas ou de acontecimentos mais ou menos comuns, a convicção de que podemos escutá-lo ali, gera em nós uma atitude dócil diante de seus desígnios, ocultos também nas palavras de quem nos acompanha em nosso caminho”[3].

A etimologia da palavra “obedecer” procede do latimob-audire, que quer dizer “saber ouvir”. Para seguir a Cristo de perto, às vezes, precisamos verificar as nossas ideias com aqueles que nos conhecem bem, pois nem sempre temos muito claro aquilo que nos convém. Em geral, a vontade de Deus não se apresenta de forma diáfana e evidente. Por isso esse “saber ouvir” implica estar abertos ao que os outros veem. Isto pode ser difícil de aceitar sobretudo se o que deliberamos nos atrai ou nos custa muito. Por isso é essencial uma disposição, constante, para dar importância aos conselhos que recebemos das pessoas que gostam de nós e têm a graça de Deus para nos ajudar; devemos valorizá-los como uma ajuda com que o Senhor conta para sabermos discernir qual é a sua vontade.

Senhor, que queres de mim? Daqui se compreende a grandeza da virtude da obediência. Quem a exercita não se diminui, pelo contrário, torna-se grande pela sua disposição de fazer o que Deus quer, a ponto de não querer se enganar no momento de discernir como colocá-lo em prática. A Virgem Maria, de fato foi grande porque soube escutar o que Deus queria dela e cumprir a sua vontade. “Em Maria não há nada que lembre a atitude das virgens néscias, que obedecem, mas estouvadamente. Nossa Senhora ouve com atenção o que Deus quer, pondera o que não entende, pergunta o que não sabe. Depois, entrega-se por completo ao cumprimento da vontade divina: Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra[4].


[1] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 253.

[2] Francisco, Ângelus, 01/02/2015

[3] Fernando Ocáriz, Carta pastoral, 10/02/2024, n. 6.

[4] São Josemaria, É Cristo que Passa, n. 173.