Meditações: sexta-feira da 6ª semana da Páscoa

Reflexão para meditar na sexta-feira da 6ª semana da Páscoa. Os temas propostos são: A alegria cristã; O dom da sabedoria; O sábio é o sal da terra.


NA NOITE da Páscoa, a Igreja canta todos os anos o precônio pascal, expressão da alegria pela vitória de Jesus Cristo: “Exulte o céu, e os Anjos triunfantes, mensageiros de Deus, desçam cantando ... Alegre-se também a terra amiga, que em meio a tantas luzes resplandece... Que a Mãe Igreja alegre-se igualmente... e escute, reboando de repente, o Aleluia cantado pelo povo”. Após os dias dolorosos da Paixão, os Apóstolos recuperaram a alegria ao contemplar o rosto do Ressuscitado. Na Última Ceia, Cristo tinha-os prevenido: “ vós ficareis tristes, mas a vossa tristeza se transformará em alegria (...). Eu hei de ver-vos novamente e o vosso coração se alegrará, e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria” (Jo 16, 20-23).

A alegria é uma aspiração gravada no nosso ser. “O nosso coração procura a alegria profunda, plena e duradoura, que possa dar sabor à nossa existência”[1]. Vivendo junto de Jesus, podemos encontrar a alegria que desejamos, mesmo no meio de dificuldades ou sofrimentos: este é um elemento central da experiência cristã. Depois de Pentecostes, a alegria converte-se, para a primeira comunidade, num estilo de vida, porque o gozo é um fruto da presença do Espírito Santo. “Frequentavam diariamente o templo, partiam o pão pelas casas e tomavam a refeição com alegria e simplicidade de coração” (At 2, 46-47), relata o livro dos Atos dos Apóstolos.

A alegria e o amor andam de mãos dadas. “O homem não pode viver sem amor”[2], recordava São João Paulo II no início do seu pontificado. A alegria cristã nasce, em primeiro lugar, de nos sabermos incondicionalmente amados por Deus: Ele acolhe-nos, aceita-nos e ama-nos tal como somos, mesmo quando nos parece que não experimentamos a sua presença. “Alegrai-vos de tal modo – dizia Santo Agostinho – que, seja qual for a situação em que vos encontreis, tenhais presente que o Senhor está próximo; nada vos preocupe”[3].


COMEÇA o costume do Decenário ao Espírito Santo, que nos pode ajudar a preparar a Solenidade de Pentecostes. Numa tradicional invocação ao Paráclito, nós pedimos-Lhe o dom de “conhecer as coisas certas e gozar sempre das suas divinas consolações”. Existe também um vínculo estreito entre a sabedoria e a alegria. O primeiro e maior dos dons do Espírito Santo é o dom de sabedoria, que nos dá um conhecimento profundo do mistério de Deus, um conhecimento novo e cheio de caridade, pelo qual “a alma adquire familiaridade, por assim dizer, com as coisas divinas”[4]. São Tomás de Aquino afirmava que a sabedoria é “um certo sabor”[5] de Deus, um gosto pelo espiritual, que traz sempre alegria.

Diz a Sagrada Escritura: “Por isso desejei, e foi-me dado o bom senso; supliquei, e veio a mim o espírito da Sabedoria. Preferi-a aos reinos e tronos e, em comparação com ela, julguei sem valor as riquezas. A ela não igualei nenhuma pedra preciosa, pois, a seu lado, todo o ouro é um punhado de areia e, diante dela, a prata será avaliada como o lodo” (Sb 7, 7-9). “O verdadeiro sábio não é simplesmente o que conhece as coisas de Deus, mas aquele que as experimenta e vive”[6]. Os santos dão-nos o melhor exemplo desta alegre sabedoria; seguindo os seus passos, aprendemos a impregnar toda a nossa vida com a luz da sabedoria: as vivências, os sentimentos, os sonhos, os projetos.

O dom de sabedoria, “nos faz conhecer e saborear Deus, e nos coloca assim em condições de poder avaliar com verdade as situações e as coisas desta vida (...). Não é que o cristão não enxergue tudo o que há de bom na humanidade, que não aprecie as alegrias puras, que não participe dos anseios e ideais terrenos. Pelo contrário, sente tudo isso no mais recôndito da sua alma e de tudo partilha e tudo vive com especial profundidade, já que conhece melhor que qualquer homem os arcanos do espírito humano”[7]. A sabedoria introduz-nos no sentido profundo da realidade, também no seu constante claro-escuro. Com ela superamos a superfície das coisas para mergulharmos no sentido último do que acontece.


São PAULO permaneceu em Corinto pregando a palavra de Deus durante muito tempo porque, numa visão, o Senhor disse-lhe: “Não tenhas medo; continua a falar e não te cales, porque eu estou contigo. Ninguém te porá a mão para fazer mal” (At 18, 9). A firmeza da fé e do testemunho de Paulo apoiou-se na convicção de que Deus, que conhece todos os corações e todas as coisas, estava junto dele.

O dom de sabedoria ensina-nos “a sentir com o coração de Deus, a falar com as palavras de Deus”[8]. Não é fruto do estudo, nem surge por uma boa atitude intelectual, embora possa apoiar-se neles. É um dom gratuito do doce Hóspede da alma, com Quem descobrimos a bondade e grandeza do Senhor, que enche de sabor a nossa vida para que nos tornemos “sal da terra” (Mt 5, 13). O coração do “sábio” tem o sabor de Deus, de tal modo que se converte para os outros em testemunha da sua presença.

A Sagrada Escritura narra que, no início do seu reinado, Salomão teve um sonho em que Deus o animou a pedir alguma coisa: “Pede o que desejas e eu to darei” (1 Rs 3, 1-15). A este pedido divino, o rei respondeu: “Dá, pois, a teu servo, um coração obediente, capaz de governar teu povo e de discernir entre o bem e o mal”. Foi muito grato aos olhos de Deus que Salomão Lhe tivesse pedido sabedoria, como o maior de todos os tesouros. Seguindo o exemplo do rei sábio, podemos pedir ao Espírito Santo este dom, pois “guiados pela Sabedoria divina, nós entramos confiantes no mundo”[9]. Maria, causa da nossa alegria e sede da sabedoria, acompanha-nos nesta petição.


[1] Bento XVI, Mensagem, 15/03/2012.

[2] São João Paulo II, Redemptor hominis, n. 10.

[3] Santo Agostinho, Sermão “Estai sempre alegres no Senhor”, PL 38, 933-935.

[4] São João Paulo II, Audiência, 9/04/1989.

[5] São Tomás de Aquino, Suma teológica, II-II, q.45, a.2, ad.1.

[6] São João Paulo II, Audiência, 9/04/1989.

[7] São Josemaria, É Cristo que passa, n. 133.

[8] Francisco, Audiência, 9/04/2014.

[9] São João Paulo II, Audiência, 29/01/2003.