NUM SÁBADO, “Jesus entrou na sinagoga, e começou a ensinar. Aí havia um homem cuja mão direita era seca. Os mestres da Lei e os fariseus o observavam, para verem se Jesus iria curá-lo em dia de sábado, e assim encontrarem motivo para acusá-lo” (Lc 6, 6-7). Esta cena do Evangelho destaca a razão de algumas autoridades judaicas seguirem Jesus. Não estão interessados nos Seus ensinamentos, nem ficam felizes quando testemunham um milagre. Em vez disso, procuram a desculpa perfeita para desacreditá-l'O. “Ó fariseu! – diz São Cirilo de Alexandria –, tu O vês fazer obras divinas e curar os doentes em virtude de um poder superior, mas tramas a Sua morte por causa da inveja”[1].
Aqueles que julgam o Senhor nessa cena mostram que não estão preocupados com o homem da mão paralítica. A sua prioridade não é simpatizar com a doença dessa pessoa e, se possível, libertá-la, mas concentram-se apenas na estrita observância da lei do sábado; a única coisa que importa é acusar alguém que não a respeitava, que, neste caso, é Jesus, o autor da lei. Com o seu formalismo, aqueles fariseus “não deixam espaço para a graça de Deus” e detêm-se “em si mesmos, nas suas tristezas, nos seus ressentimentos”, sendo assim incapazes de “levar a salvação, porque fecham a porta”[2].
No fundo, essas pessoas transformaram o caminho amplo da misericórdia de Deus num caminho estreito de legalismo; em vez de ser uma ajuda encorajadora nesse caminhar, são um obstáculo; onde existem pessoas, veem apenas desvios da norma. Perante esta forma de julgar os outros, São Josemaria adverte-nos: “Não se podem oferecer fórmulas pré-fabricadas, nem métodos ou regulamentos rígidos, para aproximar as almas de Cristo. O encontro de Deus com cada homem é inefável e único, e devemos colaborar com o Senhor para encontrar em cada caso a palavra e o caminho apropriados, sendo dóceis e não tentando colocar trilhos à ação sempre original do Espírito Santo”[3].
SÃO LUCAS indica que Jesus conhece os pensamentos desses escribas e fariseus (cf. Lc 6, 8). O Senhor sabe perfeitamente que eles não estão ali para ouvi-l'O com humildade e depois seguir os Seus ensinamentos. Embora exteriormente se comportem como os outros, o seu interior contrasta com a simplicidade do resto dos ouvintes. Eles não acompanham o Senhor com o desejo de mudar as suas vidas e agradar a Deus, mas com o propósito de encontrar algo para acusá-l'O.
“A retidão de intenção está em procurar ‘somente e em tudo’ a glória de Deus”[4], acima da nossa glória pessoal ou do apego aos critérios com os quais julgamos a realidade. A vida cristã não se reduz a "cumprir" certas normas ou regulamentos morais ou religiosos: aqueles fariseus, de fato, eram zelosos adeptos da lei, davam esmolas, passavam horas no templo, jejuavam... Mas Jesus sabia que não o faziam para dar glória ao Seu Pai e, portanto, isso não os aproximava dos outros nem da felicidade autêntica. “Este povo dir-lhes-ia o Senhor noutra ocasião, citando o profeta Isaías honra-Me com os lábios, mas o seu coração está longe de Mim” (Mt 15, 8).
A vida cristã é sempre acompanhada por obras externas. No entanto, é decisivo que essas obras sejam animadas pelo espírito de bondade e santidade que vemos na vida do Senhor, dos apóstolos e dos santos. Deste modo, o cristão pode transformar “em ouro puro, como fazia o rei Midas, tudo o que toca, pela retidão de intenção que, com a graça de Deus, o leva a fazer – daquilo que é indiferente – algo sagrado”[5].
DEPOIS de pedir ao homem da mão paralítica que fosse para o meio, Jesus fez esta pergunta aos escribas e fariseus: “O que é permitido fazer no sábado: o bem ou o mal, salvar uma vida ou deixar que se perca?” (Lc 6, 9). Sem esperar resposta, o Senhor fez o milagre e a mão do homem ficou curada.
Jesus não queria saber de cálculos quando se tratava de fazer o bem. Tinha vindo ao mundo para salvar os homens e dedicou toda a Sua vida a esse propósito. Por isso fez milagres também no sábado, porque queria mostrar que o bem da pessoa sempre está em primeiro lugar. Quando se tratava de salvar alguém, não hesitava em rodear-se de pecadores públicos (cf. Mc 2, 16), visitar as cidades que fossem necessárias (cf. Lc 4, 43), ou entrar nas casas dos gentios (cf. cf. Mt 8, 7). Em suma, a Sua missão redentora não tinha horários ou distinções de qualquer tipo: Jesus estava sempre disponível.
A tarefa de tornar Deus conhecido também nos tira dos nossos esquemas e seguranças. O próprio sentido de missão do apóstolo leva-nos a experimentar “o prazer de ser um manancial que transborda e refresca os outros. Só pode ser missionário quem se sente bem, procurando o bem do próximo, desejando a felicidade dos outros”[6]. Esta é a abertura do coração que Santa Maria experimentou. Nos seus anos na terra, sempre colocou o bem de Jesus em primeiro lugar. E agora mostra essa mesma disponibilidade a todos aqueles que vêm, como bons filhos, pedir a sua ajuda materna.
[1] São Cirilo de Alexandria, Comentário ao Evangelho de S. Lucas.
[2] Francisco, Meditações Matutinas, 1/04/2014.
[3] São Josemaria, Cartas 11, n. 42.
[4] São Josemaria, Forja, n. 921.
[5] São Josemaria, Instrução para a obra de São Gabriel, n. 98.
[6] Francisco, Evangelii Gaudium, n. 272.