Meditações: 29º domingo do Tempo Comum (Ano B)

Reflexão para meditar no 29º domingo do Tempo Comum (Ano B). Os temas propostos são: os fins e os meios; um caminho paradoxal; oferecer a compaixão de Jesus.


O EVANGELHO deste domingo nos mostra como João e Tiago se aproximam do Senhor e fazem um pedido ousado: “Deixa-nos sentar um à tua direita e outro à tua esquerda, quando estiveres na tua glória” (Mc 10, 37). A resposta de Jesus é tão profunda quanto é ousada a exigência dos filhos de Zebedeu: “Vós não sabeis o que pedis. Por acaso podeis beber o cálice que eu vou beber? Podeis ser batizados com o batismo com que vou ser batizado?” (Mc 10, 38).

É muito provável que, ao formular seu pedido, João e Tiago estivessem agindo com uma visão que talvez fosse humana demais. Apesar desta perspectiva reduzida, que provoca a indignação dos outros apóstolos, os filhos de Zebedeu estão pedindo, mesmo que talvez sem perceber, algo objetivamente grande: sentar à direita do Senhor no seu reino, contemplar a sua glória, desfrutar da máxima proximidade com Deus. Este é o maior desejo a que o ser humano pode aspirar. “O caminho da vida me indicareis; em vossa presença há plena alegria, à vossa direita, delícias eternas” (Sl 15, 11). João e Tiago estão interessados numa boa meta. Eles anseiam por um fim que em si mesmo é nobre, mas não se perguntam sobre os meios que levam a ele. Jesus lhes diz que eles não sabem o que estão pedindo, porque não conhecem os meios para alcançar o que procuram.

A resposta que Cristo dá aos apóstolos não põe em causa a grandeza da finalidade, mas nos convida a nos perguntar sobre os meios autênticos que conduzem a ele. Porque os grandes desejos podem ser uma motivação na medida em que nos levam a descobrir e a seguir os caminhos que conduzem a eles. A questão do fim está indissociavelmente ligada à questão dos meios. Um atleta que pretende conquistar o ouro olímpico, mas não pensa em como alcançá-lo, ou não está disposto a seguir um determinado plano, é uma pessoa com um desejo superficial. Jesus, com a sua vida e a sua pregação, não só encarna e propõe a todos a santidade, mas também vive os meios que conduzem a ela. O convite do Senhor se baseia num desejo ardente do fim e no desejo de encontrar e percorrer, com a ajuda da sua graça, os caminhos que levam a ele. Assim explicou São Josemaria: “Quia hic homo coepit aedificare et non potuit consummare! – começou a edificar e não pôde terminar! Triste comentário, que, se quiseres, não se fará de ti, porque tens todos os meios para coroar o edifício da tua santificação: a graça de Deus e a tua vontade”[1].


TIAGO e João não compreenderam a proposta do Senhor. Mas não foram os únicos. Os outros apóstolos ficaram indignados com os filhos de Zebedeu, provavelmente porque tinham ido pedir a Jesus algo que eles também desejavam. “Os discípulos caíram na fraqueza humana e puseram-se a discutir uns com os outros qual deles seria o chefe, ficando superior aos outros. (…) Isto aconteceu e foi-nos narrado para nosso proveito. (…) O que sucedeu aos santos Apóstolos pode revelar-se, para nós, um estímulo à humildade”[2]. Jesus quer aproveitar esta circunstância para mostrar que o ideal de glória é muito diferente daquele que eles tinham em mente.

“Vós sabeis que os chefes das nações as oprimem e os grandes as tiranizam. Mas, entre vós, não deve ser assim: quem quiser ser grande, seja vosso servo; e quem quiser ser o primeiro, seja o escravo de todos” (Mc 10, 42-45). A afirmação do Senhor é paradoxal: para atingir um fim, indica meios que, aparentemente, não são muito coerentes. “Domínio e serviço, egoísmo e altruísmo, posse e dom, lucro e gratuidade: estas lógicas, profundamente contrastantes, defrontam-se em todo o tempo e lugar. Não há dúvida alguma sobre a estrada escolhida por Jesus: e não Se limita a indicá-la por palavras aos discípulos de ontem e de hoje, mas vive-a na sua própria carne”[3].

Os apóstolos aspiram à glória e o caminho parece ser a humilhação; procuram a autoafirmação, e a proposta parece ser a afirmação dos outros; planejam servir um rei dominador, e o seu Senhor revela-lhes que vive para servir todos os homens. De fato, “a vida de Jesus é, portanto, uma existência para os outros, uma existência que culmina numa morte-pelos-outros, entendendo-se por "outros" a inteira família humana com todo o peso das culpas que traz consigo desde o princípio”[4]. Aquela vida para os outros que Cristo vive é uma vida que nos resgata; É a vida que nós também podemos encarnar, porque vivendo para Deus e para os irmãos, a nossa existência torna-se também um resgate para muitos.


NA SEGUNDA leitura da Missa, o autor da carta aos Hebreus afirma que “Temos um sumo sacerdote eminente, que entrou no céu, Jesus, o Filho de Deus.

Por isso, permaneçamos firmes na fé que professamos. Com efeito, temos um sumo sacerdote capaz de se compadecer de nossas fraquezas, pois ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado. Aproximemo-nos, então, com toda a confiança, do trono da graça, para conseguirmos misericórdia e alcançarmos a graça de um auxílio no momento oportuno” (Heb 4, 14-16). Quando com o salmista suplicamos: “No Senhor nós esperamos confiantes, porque ele é nosso auxílio e proteção!” (Sl 33, 20), é impressionante considerar que esta ajuda e este escudo são, em grande medida, a compaixão do Filho de Deus. Meditando estas palavras, é possível que nasça nos nossos corações o desejo de oferecer aos que nos rodeiam a compaixão de Jesus.

Precisamente através do serviço ao próximo, o cristão vive aquela compaixão pelos outros que, tal como a de Jesus Cristo, penetra no céu e cativa o olhar misericordioso de Deus: “não tendo cada um em mira os próprios interesses, mas todos e cada um exatamente os interesses dos outros. Tende entre vós os mesmos sentimentos, que estão em Cristo Jesus” (Flp 2, 4-5). Ao viver atentos aos que nos rodeiam como Jesus fez, através de grandes ou pequenos pormenores de serviço, não só daremos ajuda material ou moral, como mostraremos a compaixão de Jesus para com eles. Talvez ao realizar um ato de serviço o que percebemos de imediato é a dificuldade que isso acarreta ou o impacto da ajuda que prestamos, mas por trás de tudo isto, mais discreto e imperceptível, mas não menos real, está a mão estendida de Deus, a compaixão de Jesus que está presente através do nosso gesto. É fácil imaginar a reação dos bons pais ao perceberem o cuidado autêntico e altruísta de um dos seus filhos ou filhas para com outro dos seus irmãos: eles se sentirão compelidos a ajudar o filho necessitado e logicamente ficarão ternamente comovidos perante o primeiro.

“A nossa fidelidade ao Senhor depende da nossa disponibilidade para servir. E isto, sabemos, custa, pois "sabe a cruz". Mas à medida que os nossos cuidados e disponibilidade para com os outros crescem, tornamo-nos mais livres por dentro, mais semelhantes a Jesus. Quanto mais servimos, mais sentimos a presença de Deus. Sobretudo quando servimos aqueles que nada têm para nos devolver, os pobres, abraçando as suas dificuldades e necessidades com terna compaixão: e assim descobrimos que somos, por nossa vez, amados e abraçados por Deus”[5]. A Virgem Maria, como uma boa mãe, poderá nos incentivar a nos desdobrarmos para ajudar nossos irmãos, sabendo que este é o caminho que nos leva à glória.


[1] São Josemaria, Caminho, n. 324.

[2] São Cirilo de Alexandria, Comentário a Lucas, 12,5,15: PG 72,912.

[3] Bento XVI, Homilia, 18/02/2012.

[4] São João Paulo II, Audiência, 14/09/1983.

[5] Francisco, Ângelus, 19/09/2021.