Hoje, na festa litúrgica de São Josemaria, aqui junto dos seus restos mortais, na igreja prelatícia de Santa Maria da Paz, pedimos a sua intercessão por todos os que estão sofrendo as consequências do coronavírus, principalmente pelos falecidos e suas famílias. Agora, nosso pensamento se dirige especialmente aos países onde a pandemia continua mais presente. A comunhão dos santos nos leva a tomar como próprio o que afeta os outros, porque “se um membro sofre, todos sofrem com ele”. “Estamos todos neste barco”, disse o Papa Francisco. Estamos “chamados a remar juntos, todos necessitados de nos confortarmos mutuamente”[1].
As leituras da Missa de hoje nos recordam três realidades que São Josemaria tinha no coração: a Eucaristia, o omnia in bonum (tudo é para o bem!) e o sentido de missão.
“Pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mt 20,28). Estas palavras, que leremos na antífona da comunhão, resumem o caminhar terreno de Jesus, que esteve marcado pela entrega aos outros. “Carregou nossos pecados em seu próprio corpo, sobre a cruz, a fim de que, mortos para os pecados, vivamos para a justiça” (1 Pd 2,24). E este sacrifício volta a se fazer presente na santa Missa, onde Cristo entrega-se a nós totalmente. Ele mesmo se oferece como alimento que nos sustenta, enche-nos da sua misericórdia e do seu amor, como o fez no Calvário.
Durante os meses de confinamento, estamos aprendendo a dar mais valor à participação no Sacrifício eucarístico. Em muitas famílias, no meio desta situação difícil, a primeira coisa que se fazia todos os dias era acompanhar a santa Missa pela televisão. Tiravam forças desse momento para enfrentar a jornada e, ao mesmo tempo, aumentavam o seu desejo de receber o Senhor sacramentalmente.
Nestas circunstâncias difíceis do mundo, deste mundo do qual fazemos parte e que amamos como criação de Deus, enchem-nos de consolo estas palavras que lemos na segunda leitura e que São Josemaria meditou tantas vezes: “De fato, vós não recebestes espírito de escravos, para recairdes no medo, mas recebestes um espírito de filhos adotivos, no qual todos nós clamamos: “Abbá, ó Pai!” (Rm 8,15). Sabermo-nos filhas e filhos de um Deus que sabe tudo e pode tudo dá-nos uma profunda alegria que é fruto do Espírito Santo.
Isto não significa que não tenhamos dificuldades e sofrimentos. São Paulo termina o texto que acabamos de ler assim: somos “herdeiros de Deus e coerdeiros de Cristo; se realmente sofremos com ele, é para sermos também glorificados com ele” (Rm 8,17). Estas palavras nos ajudam a entender o sentido da dor. Quando algo nos faz sofrer, podemos unir-nos ao sacrifício de Jesus na Cruz, com a esperança posta na ressurreição. Porque o que cura o homem “não é o evitar o sofrimento, a fuga diante da dor, mas a capacidade de aceitar a tribulação e nela amadurecer, de encontrar o seu sentido através da união com Cristo, que sofreu com infinito amor”[2].
A fé nos dá a segurança de que tudo acontece para o bem: Omnia in bonum!, era o que São Josemaria gostava de repetir com palavras de São Paulo (cfr. Rm 8,28). Sim, tudo acontece para o bem, mesmo que às vezes custe entender o bem que possa trazer uma situação como a que estamos atravessando. Mas o certo é que, neste tempo, presenciamos inúmeras mostras de generosidade, de criatividade, de iniciativa e o trabalho abnegado de tantas pessoas, chegando inclusive a arriscar sua própria vida: profissionais da saúde, forças de segurança, sacerdotes, voluntários... Também conhecemos histórias de pais e mães se desvivendo para cuidar de cada lar durante o confinamento. Estes exemplos de entrega nos fizeram estar mais unidos, ser mais conscientes de que necessitamos dos outros e de que os outros precisam de nós.
No Evangelho de hoje, lemos este convite de Jesus a Simão Pedro, que o impulsiona em sua missão: “avança para águas mais profunda e lança as redes para a pesca” (Lc 5,4). E hoje, Ele dirige essas mesmas palavras a cada um de nós: deixar de lado a própria comodidade para ir ao encontro dos outros e transmitir a alegria do Evangelho, a alegria de uma vida junto de Jesus, que deu a sua vida por amor a cada um de nós.
Para avançar a águas mais profundas é preciso audácia, desejos de mudar o mundo. Mas, acima de tudo, é necessário ter um coração enamorado, deixar que Cristo seja o centro da nossa vida, de maneira que Ele seja “o único motor de todas as nossas atividades”[3].
Depois do convite de Jesus para remar mar adentro, lemos: “Assim fizeram, e apanharam tamanha quantidade de peixes, que as redes se rompiam” (Lc 5,6). A eficácia sobrenatural do nosso trabalho também não depende das nossas qualidades, mas de deixarmos o Senhor agir. “Quando nos colocamos com generosidade ao seu serviço, Ele realiza maravilhas em nós. Assim age em relação a cada um de nós: pede-nos que o recebamos no barco da nossa vida, para voltar a partir com Ele e sulcar um novo mar, que se revela cheio de surpresas”[4]. Este foi o ideal que inspirou a vida de São Josemaria. Sentia que “a Obra nasceu para estender por todo o mundo a mensagem de amor e de paz que o Senhor nos legou”[5]. Que nós também saibamos nos lançar com essa mesma confiança a tudo o que o Senhor nos pedir.
Os que estamos participando desta Santa Missa – de modo presencial ou pelas redes – unimo-nos com carinho e oração a todo sofrimento do mundo e nos confiamos aos falecidos para que do Céu – com São Josemaria, no dia da sua festa – intercedam por todos nós.
Recorramos muito especialmente a Santa Maria, Mãe de Deus e Mãe nossa. Ela, Consoladora dos aflitos, nos ajudará a ver, com os olhos da fé, o amor do seu Filho nas dificuldades pelas quais estamos passando. Ela, Estrela da manhã, nos guiará por esse caminho de amor e confiança em Deus.
Agora me dirijo aos que participaram desta celebração na Basílica de Santo Eugenio. Embora na Itália já tenhamos superado o momento mais crítico da pandemia, em outras partes do mundo o isolamento continua, por causa do coronavírus. Unamo-nos agora em oração por esses países, e ao mesmo tempo rezemos por todos aqueles que nos deixaram nos últimos meses e por suas famílias.
É difícil entender porque Deus permitiu esta situação. São Paulo escreve que “tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus”, e São Josemaria utilizava esta ideia transformando-a em jaculatória: Omnia in bonum! Tudo é para o bem! De cada contrariedade, Deus tira um bem, como, provavelmente, vimos também nós, de alguma forma, nestes meses.
Na festa de São Josemaria, junto dos seus restos mortais, podemos recorrer à sua intercessão para que nos ajude a estar sempre muito unidos entre nós e com todos os que sofrem. Ajudemo-nos uns aos outros por meio da oração, do afeto, do serviço desinteressado. Como dizia o Papa Francisco durante o momento extraordinário de oração pela pandemia, fomos “todos chamados a remar juntos, todos necessitados de nos confortarmos mutuamente. Estamos todos no mesmo barco”. Não nos esqueçamos de rezar pelo Santo Padre e pelo seu ministério na Igreja.
Assim seja.
[1] Francisco, Momento extraordinário de oração em tempos de pandemia, 27-III-2020.
[2] Mensagem de Bento XVI, PARA O 20º DIA MUNDIAL DO DOENTE, 11-II-2013.
[3] São Josemaria, Apontamentos íntimos, n. 1289 (5.10.1935).
[4] Francisco, Ângelus, 10/02/-2019.
[5] São Josemaria, Carta 16/07/1933, n. 3.