Hoje, penso que tudo foi para o bem

Entrevista com Carlos Gaspar Koch, pertencente à ONG Teléfono de la Esperanza. Sem importar-se com sua cegueira, estende uma mão a pessoas com crises psicológicas. “Viver é uma grande aventura”, afirma.

O que significa, para uma pessoa como você, viver sem ver a vida?

Para mim, viver é essencialmente uma grande aventura onde cada dia é um novo episódio: a aventura da minha felicidade e da felicidade dos demais. Ajudou-me muito considerar a Deus como um pai e como um amigo, aquele que melhor me conhece. Desse modo, a vida adquire uma dimensão nova: viver significa então renovar essa íntima relação através dos acontecimentos da vida cotidiana. Além do mais, sei que sempre poderei ser útil a alguém. Atualmente posso fazer isso no Teléfono de la Esperanza, uma ONG com a qual colaboro. Nesse processo, os ensinamentos de São Josemaría foram um estímulo importante; por exemplo, existe um ponto de Caminho que diz: “Não podes viver de costas para a multidão. É preciso que tenhas ânsias de torná-la feliz”.

E que consequências teve a cegueira na sua vida?

A perda da visão foi um momento crítico na minha vida. Hoje, penso que tudo foi para o bem. Essa crise ajudou-me a repensar questões de fundo e pôs-me cara a cara com a minha realidade de então: minha postura diante da vida. Devido à cegueira, descobri temas e opiniões que devia reconsiderar, e percebi coisas em mim que até então não conhecia. É difícil explicar como aprendi a relativizar a importância dos acontecimentos e, ao mesmo tempo, a dar mais valor a minha própria existência ao defrontar-me com a de Deus.

Como você encontrou a Deus?

É uma história longa e difícil de resumir. Quando fiquei cego, a primeira reação foi de surpresa, um sentimento que depois transformou-se em angústia e uma certa solidão. Quem eu era...? Toda a minha segurança foi feita em pedaços... Mas depois, quando me senti pessoalmente compreendido e acolhido, experimentei uma grande serenidade. Vislumbrei a partir de onde e até onde minha existência tinha uma explicação: penso que é justo dizer que encontrei a Deus no amor.

Com o tempo, Deus foi sugerindo também o modo de dar um sentido pleno à minha vida. Comprovei na própria pele como Deus convida, pede e dispõe as ajudas necessárias para nosso caminho: uma pessoa do Opus Dei cruzou a minha vida, e sua amizade e ajuda naqueles dias motivaram minha aproximação das atividades espirituais e formativas da Prelazia, até o momento em que discerni minha própria vocação ao Opus Dei.

Em que consiste sua colaboração à ONG Teléfono de la Esperanza?

Fundamentalmente, sou agente da ONG e atuo como voluntário, estendendo uma mão a pessoas com crises psicológicas. Atendo muitas consultas telefônicas e também recebo visitas na própria sede da organização. Para desenvolver essa atividade com profissionalismo, ingressei no curso de Psicologia, o que me dá grande alegria, porque adquiri conhecimentos que são muito valiosos para esse projeto.

E sua esposa, o que diz disso tudo?

Stella, que é psicóloga formada, apóia-me completamente e é uma grande ajuda. Além do mais, juntos esforçamo-nos para levar adiante um grupo de formação para casais. No momento, parece-nos vital defender a união conjugal como um vínculo de amor, como um projeto comum que se consolida a cada dia. Além disso, Stella e eu pensamos que o trabalho dos pais é importantíssimo na educação dos filhos, uma responsabilidade que não é possível delegar a ninguém. Mas sobretudo, queremos transmitir uma visão muito mais alta do matrimônio, uma vocação, como dizia o fundador do Opus Dei, um caminho divino.