Criança e Vida

O CEV nasceu no Porto, para as crianças que vagueavam pela rua, sem alimentação nem assistência educativa. Era necessário começar algo que tivesse como grande objectivo ocupar as crianças nos seus tempos livres e lançar-se à formação humana e cristã das famílias. Assim nasceu um projeto, que mais tarde se denominou Associação Criança e Vida (CEV).

No centro histórico do Porto, perto da Torre dos Clérigos, seu ex-libris, fica o Jardim da Cordoaria. No princípio dos anos 70 era corrente ver ali dezenas de crianças que, indiferentes ao movimento da Faculdade de Ciências, ao Hospital de Santo António e à beleza das duas igrejas contíguas, passavam horas e horas na rua.

Eram crianças provenientes dos bairros vizinhos de Miragaia e da Ribeira. Muitas andavam praticamente sozinhas, sem família. Nalguns casos os pais saíam para trabalhar e deixavam-nas encerrados em casa ou vagueando pelas ruas. Outras vezes tinham sido abandonadas pelos pais e a sua família era, na realidade, a de quem os tivesse acolhido como se fossem seus ou, noutros casos, a de algum parente idoso que cuidava delas.

Naquela época, entre os que passavam pela Cordoaria com frequência, estava Elisabeth Richardson, uma mulher inglesa que vivia em Gaia - do outro lado da ponte sobre o rio Douro -, com o marido e os seus seis filhos.

Um dia, quando atravessava o Jardim, decidiu que ela própria tinha de fazer qualquer coisa por aquelas crianças. Começou com o que tinha ao alcance da mão: levá-las a passear por outras zonas da cidade.

Com o passar do tempo conheceu algumas das situações dramáticas em que viviam esses miúdos. E continuava a pensar: Não haverá gente que queira dar do seu tempo e do seu bolso para as fazer felizes e cidadãs de primeira?

Era necessário começar algo que tivesse como grande objectivo ocupar as crianças nos seus tempos livres e lançar-se à formação humana e cristã das famílias.

Elisabeth rapidamente se deu conta de que não podia estar sozinha nessa tarefa. Começou por atrair para a sua causa uma jovem, Teresa Resende, então a leccionar na Faculdade de Ciências da Universidade. Ambas tinham conhecido S. Josemaria numa das suas vindas a Portugal e sabiam que o fundador do Opus Dei estimulava a promoção de iniciativas que servissem para melhorar socialmente, de acordo com a dignidade humana, as pessoas, e para formar bons cristãos. Seria a Teresa, com a Elisabeth, a Filó e muitos outros amigos, quem daria continuidade ao projecto, que mais tarde se denominou Associação Criança e Vida (CEV). Ao ver as necessidades das crianças – alimentação, apoio escolar, diversão – Teresa fez do CEV a sua opção de voluntariado.

Uma sala pequena e uma casa depois

Começa-se como se pode! "O que nasce grande, é monstruoso e morre" (Josemaria Escrivá, Caminho, n. 821).

O CEV começou como pôde, num pequeno local emprestado. Ali se organizaram as primeiras atividades. O projeto ganhou autonomia: à sala inicial sucedeu-se a primeira casa emprestada, na Rua do Rosário.

A Associação foi legalizada em 1979, e depois oficialmente reconhecida como Instituição Particular de Solidariedade Social. Com a ajuda de muitos particulares e de algumas entidades foi possível ampliar as instalações e aumentar o número de pessoas atendidas. Entre 1986 e 2001, o CEV ocupou duas casas, situadas na Rua do Breiner, e na Rua Miguel Bombarda, onde ainda se mantém. O crescimento institucional, no entanto, não apagou a dimensão familiar.

Mãos à obra

No CEV as crianças chegam cedo, trazidas por algum familiar, a caminho do seu trabalho. Atualmente mantém em funcionamento, todos os dias úteis, das 7.30 horas às 19.30 horas: creche e infantário, um centro de atividades de tempos livres, uma escola de ensino básico, e ainda atividades para jovens.

Desde o início tem-se procurado proporcionar educação em matérias básicas, como o cuidado no modo de comer, acompanhamento dos trabalhos de casa, desenvolvimento de capacidades manuais, mas o segredo da eficácia do CEV é o acompanhamento pessoal de cada criança. Nádia, uma das “veteranas”, recorda: “Tinha eu 2 anos de idade, era das primeiras a entrar no CEV, depois, já quando frequentava o ensino secundário, ia para lá, depois das aulas até ao final da tarde. Havia aulas de culinária, de ginástica e também catequese. Nos dois últimos da Faculdade, decidi apoiar, por minha vez, o CEV: estudava à noite e, de dia, ajudava como auxiliar de acção educativa”.

Para todos, há diversas atividades extraordinárias, passeios, campos de férias, convívios, festas de Natal e de Fim de Ano, etc. Os filhos das famílias mais carenciadas têm sempre prioridade nas vagas. As comparticipações mensais dependem do rendimento per capita da família dos utentes. Muitas pagam só uma mensalidade simbólica, e o CEV ainda lhes faz chegar alimentação diversa e vestuário para a família.

As famílias não são esquecidas: tomam parte nas festas, têm reuniões de pais, cursos de Orientação Familiar e acompanhamento na educação dos filhos. Quando as mães vêm buscar as crianças ao final da tarde são atendidas, uma a uma. Algumas famílias, à beira da ruptura, reconstituíram-se, graças a essas conversas vespertinas. E não faltam aqueles que encontraram emprego depois de expor a sua situação.

Natália Pacheco, da Direção do CEV, lembra os vários casos de pais de hoje, antigos alunos, que trazem os seus filhos para esta instituição, apesar dos sacrifícios e de maiores deslocações, por considerarem a boa formação e educação que se lhes oferece. E acrescenta: “Nestes tempos de grande crise econômica e social, há muitos pais que estão desempregados. Alguns, envergonhados por não poderem pagar as mensalidades atrasadas, não queriam que os filhos continuassem a frequentar as atividades. O problema teve solução explicando aos pais que se arranjaram uns “padrinhos” que passariam a pagar as despesas. Assim se conseguiu, por exemplo, que dois irmãos, a Francisca e o Joel, deixassem de ficar sem almoço, porque têm as refeições no CEV; e a Marta e a Susana voltem no próximo ano lectivo, esperando o CEV ansiosamente encontrar mais padrinhos”.

Uma casa do bairro Miragaia

O estado das instalações pedia também mãos à obra. E parte da ajuda chegou do país vizinho, a Espanha. Desde 1995, grupos de estudantes de Madri e de Bilbao, em contacto com a ONG Cooperação Internacional, têm vindo em período de férias fazer trabalhos como pintar, esfregar, limpar e embelezar os edifícios. Futuras arquitectas, psicólogas... colaboram também nas férias das crianças, levando-as à praia, ensinando-lhes canções, jogos, representações de teatro, etc.

As aulas e atividades atingem sempre a capacidade máxima. A razão? A Teresa Resende, tesoureira da Direção, explica: “Nestes trinta anos de realizações, aqui na zona, já somos bastante conhecidos. Muitas pessoas perguntam informações em lojas, farmácias, ou a colegas de emprego, outras porque já lá andaram em pequenos, outras porque, familiares ou amigos têm lá os filhos. Também nos procuram porque sabem que se educam as crianças nos valores familiares tradicionais e segundo uma perspectiva cristã da vida”.

A este propósito a Rita Oliveira, Coordenadora Geral, diz: “Quase todos os anos várias crianças são preparadas para o batismo, com a anuência e o acompanhamento dos pais, muitas vezes nas cerimônias da Vigília Pascal, na Igreja de Cedofeita, que é a nossa paróquia. Há também grupos de crianças que se integram nas cerimônias da Primeira Comunhão. Recentemente, passamos a beneficiar de um sacerdote da Prelatura do Opus Dei que periodicamente vem à nossa capela confessar crianças e adultos”.

Mais tarde surgiu ainda o apoio domiciliário a idosos da zona: funciona com pessoal especializado que faz a higiene pessoal e da habitação, o tratamento da roupa, fornece refeições, acompanha em deslocações, compras, etc.

A Associação Criança e Vida, ao longo de todos estes anos, tem-se debatido sempre com problemas para fazer face ás despesas correntes. E agora, devido aos novos requisitos legais de construção de edifícios para fins sociais e escolares, procura um espaço que possa vir a ser adaptado, bem como apoios de mecenas para realizar as obras exigidas…

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