– Contemplar com fé o mistério do Natal
– Deus quis precisar dos homens
– A nossa contemplação diante do presépio
“UM MENINO nasceu para nós, um Filho nos foi dado!”[1]. Cumpriram-se os anseios que tivemos durante o Advento: Deus se fez homem. O mundo não está às escuras. Jesus veio, e “o mundo inteiro viu o Salvador que nos foi enviado por Deus”[2]. Um Menino sorri para a nossa adoração silenciosa. O nosso olhar se cruza com o do recém-nascido. Tudo é luz, um olhar puro que entra na nossa alma e dissipa as trevas do pecado.
São Josemaria recomendava olhar para “o Menino, nosso Amor, no seu berço, olhar para Ele sabendo que estamos perante um mistério. Precisamos aceitar o mistério pela fé, aprofundar no seu conteúdo. Para isso necessitamos das disposições humildes da alma cristã: não pretender reduzir a grandeza de Deus aos nossos pobres conceitos, às nossas explicações humanas, mas compreender que esse mistério, na sua obscuridade, é uma luz que guia a vida dos homens”[3]. Os céus e a terra foram criados pelo Menino que jaz na manjedoura. Ele estabeleceu os limites da terra e sua plenitude. Que loucura de amor a de Jesus! Aquele que vive no céu reclina-se sobre a palha; Aquele que tudo enche e sustenta com a Sua presença fez-Se carne como a nossa. Podemos pegar no colo Aquele que nos criou: este é o grande mistério que o Natal nos mostra.
Há rumores de festa. Vinde e vede, disseram; vinde e vereis a maravilha. Pastores e reis, ricos e pobres, poderosos e fracos se apertam ao redor do berço. Nós também queremos nos aproximar, prostrar-nos diante dessa criatura indefesa, olhar para Maria e José, cansados, mas felizes como talvez ninguém na Terra tenha sido. Um mistério tão grande não cabe nas nossas cabeças: Deus revestiu-Se da nossa carne.
COMO GOSTARÍAMOS de agradecer por Deus ter se tornado próximo, tocável e vulnerável! Ousamos beijar o Rei do universo, de quem não se poderiam fazer imagens na Antiga Aliança, e que, no entanto, agora se tornou um de nós. Adeste, fideles... Venite, adoremus ... O nosso cantar destes dias é também um convite, um apelo. Fomos chamados, viemos, e agora o nosso coração se alegra: ali está Deus Menino. “Reconhece, ó cristão, a tua dignidade - diz São Leão Magno; foste feito participante da natureza divina: não te queiras degradar com a tua antiga vileza. Lembra-te de que cabeça e de que corpo és membro. Lembra-te de que, arrancado do poder das trevas, foste transportado para a luz e para o reino de Deus”[4]. O Deus Todo-Poderoso nos aparece como um menino recém-nascido na gruta de Belém. “Nem sequer nasce na casa dos seus pais, mas no caminho, para mostrar na realidade que nascia como que por empréstimo daquela humanidade que assumiu”[5].
“Quando chega o Natal, dizia São Josemaria, gosto de contemplar as imagens do Menino Jesus. Essas figuras, que nos mostram o Senhor tão humilhado, recordam-me que Deus nos chama, que o Onipotente quis apresentar-se desvalido, quis necessitar dos homens. Da gruta de Belém, Cristo diz a mim e a ti que precisa de nós; reclama de nós uma vida cristã sem hesitações, uma vida de doação, de trabalho, de alegria.
Não conseguiremos jamais o verdadeiro bom humor, se não imitarmos deveras Jesus, se não formos humildes como Ele. Insistirei de novo: vemos onde se oculta a grandeza de Deus? Num presépio, nuns paninhos, numa gruta. A eficácia redentora de nossas vidas só se produzirá se houver humildade, se deixarmos de pensar em nós mesmos e sentirmos a responsabilidade de ajudar os outros”[6].
ADORAREMOS ESSE DEUS escondido, nestes dias, cada vez que nos aproximarmos para beijar e acariciar o Menino. Ele se fez pobre por nós, deitou-se nas palhas; daremos-Lhe calor, abraçaremos com carinho o menino. Quem não se aproxima de Deus! Quem não se aproxima do Menino, que agora nos estende os braços e precisa dos nossos cuidados? Nestes dias, só teremos olhos para aquele presépio. Como os pastores, deixando o rebanho, nos aproximamos humildemente do berço.
São dias para viver em família, especialmente propícios à contemplação. Podemos rezar diante do presépio e adorar a Deus em silêncio. Purificamos tantas coisas durante estes dias, quando os atos de amor são tão intensos! “Conservai no vosso Natal - dizia São Paulo VI - o caráter de uma festa familiar. Cristo ao vir ao mundo santificou a vida humana em sua primeira idade, a infância; santificou a família e principalmente a maternidade; santificou o lar humano, ninho dos afetos naturais mais queridos e universais (...). Procurai celebrar o vosso Natal, se possível, com os vossos seres queridos, dai o presente do vosso afeto, da vossa fidelidade àquela família de quem recebestes a existência”[7].
Diante do presépio, junto a Maria e José, vemos que “Deus não te ama, porque pensas certo e te comportas bem; ama-te… e basta! O Seu amor é incondicional, não depende de ti. Podes ter ideias erradas, podes tê-las combinado de todas as cores, mas o Senhor não desiste de te querer bem. Quantas vezes pensamos que Deus é bom, se formos bons; e castiga-nos, se formos maus; mas não é assim! Nos nossos pecados, continua a amar-nos. O Seu amor não muda, não é melindroso; é fiel, é paciente. Eis o dom que encontramos no Natal: com maravilha, descobrimos que no Senhor está toda a gratuidade possível, toda a ternura possível. A Sua glória não nos encandeia, nem a Sua presença nos assusta. Nasce pobre de tudo, para nos conquistar com a riqueza do Seu amor”[8]. A Santíssima Virgem e São José são a nossa primeira família com quem queremos viver este novo Natal.
[1] Natal do Senhor, Missa do dia, Antífona da Entrada.
[2] Ib., Antífona da Comunhão.
[3] São Josemaria, É Cristo que passa, n. 13
[4] São Leão Magno, Sermão I sobre a Natividade do Senhor, 3.
[5] São Gregório Magno, Homilias sobre os Evangelhos, 8.
[6] São Josemaria, É Cristo que passa, n. 18.
[7] São Paulo VI, Audiência Geral, 18/12/1963.
[8] Francisco, Homilia, 24/12/2019.

