Meditações: 16º Domingo do Tempo Comum (Ano C)

Reflexão para meditar no domingo da 16ª semana do tempo comum. Os temas propostos são: Um cansaço feliz; santificar-se descascando batatas; a tendência à comparação.

-Um cansaço feliz

-Santificar-se descascando batatas

-A tendência à comparação


MARTA e Maria receberam Jesus e os apóstolos em sua casa. Não sabemos se a visita foi uma surpresa; talvez eles tivessem avisado alguns dias antes de sua chegada. De qualquer forma, Marta, como boa anfitriã que é, sente-se responsável por tornar a estadia de seus convidados o mais agradável possível. Ela se esforçaria para que tudo estivesse em ordem, que não faltassem bebidas e alimentos para recuperar as forças, que os presentes estivessem confortáveis...

No entanto, aos poucos ela começa a perceber que não consegue dar conta de tudo; que o que ela tem que fazer é muito maior do que o tempo disponível. E sua irmã parece ter se esquecido de seus deveres: em vez de lhe dar uma mão, ela está aos pés do Senhor ouvindo suas palavras. Por isso, quando já não aguenta mais, se aproxima de Jesus e, indignada, diz: “Senhor, não te importas que minha irmã me deixe sozinha, com todo o serviço? Manda que ela me venha ajudar”. E Jesus responde: “Marta, Marta! Tu te preocupas e andas agitada por muitas coisas. Porém, uma só coisa é necessária. Maria escolheu a melhor parte e esta não lhe será tirada” (Lc 10, 40-42).

A experiência de Marta pode se assemelhar muitas vezes à nossa. Sentimos que, em nosso dia a dia, há muitas coisas que exigem nossa atenção: o cuidado da própria família, projetos de trabalho, compromissos sociais, imprevistos... Talvez tenhamos a impressão de que não conseguimos fazer tudo e, por isso, podemos experimentar um certo sentimento de vazio no final do dia, pois não conseguimos fazer o que nos propusemos. O problema, porém, “não é sempre o excesso de atividades, mas sobretudo as atividades mal vividas, sem as motivações adequadas, sem uma espiritualidade que impregne a ação e a torne desejável. Daí que as tarefas cansem mais do que o razoável e, às vezes, nos adoeçam. Não se trata de um cansaço feliz, mas tenso, pesado, insatisfeito e, em definitiva, não aceito”[1].

A proposta de Jesus a Marta não consiste em deixar de lado suas obrigações, mas em realizá-las sem esquecer o essencial: encontrar-se com o Senhor. Ou seja, que ela não veja em seus convidados simplesmente corpos a serem atendidos, mas que procure se unir a Jesus em tudo o que faz. Dessa forma, o cansaço não nos rouba a paz nem a felicidade, pois experimentamos que temos o essencial e que o temos em abundância: a proximidade de Cristo. “O Mestre passa, uma vez e outra vez, muito perto de nós. Olha-nos… E se O olhas, se O escutas, se não O repeles, Ele te ensinará o modo de dares sentido sobrenatural a todas as tuas ações… E então também tu semearás, onde quer que te encontres, consolo, paz e alegria”[2].


EXISTEM muitas maneiras de cumprir nossas obrigações. Podemos terminar um trabalho – enviar um e-mail, redigir um relatório, preparar um prato – com vontade de nos livrar dele o mais rápido possível, ou com o desejo de buscar o bem daqueles que se beneficiarão dele. Um serviço pode ser realizado com cara feia, porque não há outra escolha, para que pensem bem de nós, ou para dar glória a Deus e amar a outra pessoa. Nestas pequenas lutas diárias, como Marta, somos chamados a encontrar o Senhor. E, como Maria, podemos prestar atenção ao que Ele quer nos dizer no meio de nossas atividades.

Saber transcender a materialidade do que temos em mãos é algo que São Josemaria difundiu desde que fundou o Opus Dei. “Escreves-me na cozinha, junto ao fogão, começa a tarde. Faz frio. A teu lado, a tua irmãzinha - a última que descobriu a loucura divina de viver a fundo a sua vocação cristã - descasca batatas. Aparentemente - pensas - o seu trabalho é igual ao de antes. Contudo, há tanta diferença! - É verdade: antes ‘só’ descascava batatas; agora, santifica-se descascando batatas”[3].

Quando procuramos buscar a Deus no que fazemos e nos entregamos sinceramente aos outros, experimentamos na alma uma humildade cheia de alegria. Porque a vida cristã não consiste em acumular esforços que um dia, no céu, se traduzirão em uma recompensa, mas já na terra começamos a receber o cento por um. E esse cem por um é, afinal, a vida vivida junto a Jesus. “Deus quer nos tornar participantes de sua alegria, divina e eterna, fazendo-nos descobrir que o valor e o sentido profundo de nossa vida estão em sermos aceitos, acolhidos e amados por ele. (...) Este amor infinito de Deus por cada um de nós se manifesta plenamente em Jesus Cristo. Nele se encontra a alegria que buscamos”[4].


MARTA não perdeu a paz apenas pela quantidade de coisas que tinha que fazer, mas também pela comparação: ela não concebia que tivesse que se encarregar de tudo, enquanto sua irmã estava tão tranquila. Independentemente de que Marta tivesse mais ou menos razão, trata-se de uma reação que também pode acontecer conosco: tendemos a comparar nossa carga de trabalho com a das pessoas ao nosso redor. E se percebemos que há um desequilíbrio, com frequência tendemos a nos indignar, assim como Marta. Procuramos então encontrar uma maneira de gerar uma divisão mais equitativa das tarefas ou que a outra pessoa nos ajude. Em muitos casos, essa é uma oportunidade para refletirmos sobre como vemos e realizamos o trabalho que temos em mãos. Se eu concebo essa ocupação como um fardo ou um castigo, é lógico que fique irritado se o outro não colabora, mas se eu a considero uma forma de glorificar a Deus e ajudar os outros, independentemente de poder haver uma redistribuição de tarefas, poderei me convencer um pouco mais da alta missão de serviço que desempenhamos com nossa vida.

As comparações podem ocorrer em vários âmbitos: aspecto físico, virtudes e defeitos, posição social, situação familiar ou econômica... Esses pensamentos costumam nos trazer inveja, tristeza ou raiva, como Marta, se acreditarmos que saímos perdendo; ou podem causar uma alegria superficial se nos parecer que saímos vencedores. Em qualquer caso, é fácil que gerem insegurança, pois em vez de agradecermos o que Deus nos deu: um trabalho a fazer, alguns talentos a frutificar, algumas pessoas a ajudar; damos mais importância ao valor que os outros nos atribuem, que é sempre mutável. Em contrapartida, quando olhamos para a nossa vida com olhos divinos (“Deus ama-nos como somos, não como gostaríamos de ser”),[5] experimentamos o amor mais sólido que existe, e que nenhuma comparação pode derrubar. Nossa Senhora, como boa mãe, nos ama incondicionalmente, como se não houvesse mais ninguém. “Não existe coração mais humano que o de uma criatura transbordante de sentido sobrenatural. Pensa em Santa Maria, a cheia de graça, Filha de Deus Pai, Mãe de Deus Filho, Esposa de Deus Espírito Santo: no seu Coração, cabe a humanidade inteira sem diferenças nem discriminações. - Cada um é seu filho, sua filha”[6].


[1] 1 Francisco, Evangelii Gaudium, n. 82.

[2] São Josemaria, Via Sacra, 8ª estação, n. 4.

[3] São Josemaria, Sulco, n. 498.

[4] Bento XVI, Mensagem, 15/03/2012.

[5] Francisco, Discurso, 3/08/2023.

[6] São Josemaria, Sulco, n. 801.