Uma semeadura de paz e de alegria

Reproduzimos o artigo de D. Javier Echevarria, Prelado do Opus Dei, publicado no jornal Folha de São Paulo no dia em que se completam 80 anos da fundação do Opus Dei.

Hoje completam-se 80 anos da data em que São Josemaria fundou -por inspiração divina, como afirmou João Paulo II- o Opus Dei. Por isso, elevo meu coração em agradecimento à Santíssima Trindade, que quis abrir um caminho de santificação no trabalho profissional e nas circunstâncias comuns da vida que pode ser percorrido por mulheres e homens de todos os tempos.

O papa Bento XVI, quando ainda era o cardeal Joseph Ratzinger, numa homilia pronunciada em 1992, afirmava que "Josemaria Escrivá considerou essa chamada não só algo dirigido a si mesmo mas, sobretudo, uma tarefa a ser transmitida aos demais: estimular a santidade e reunir para Cristo uma comunidade de irmãos e irmãs".

Consciente dessa responsabilidade -continuava Ratzinger-, "viajou incansavelmente por vários continentes estimulando as pessoas a serem santas, a viver a aventura de serem cristãos, fosse qual fosse o lugar de cada um na vida. Assim, chegou a ser um grande homem de ação, que vivia da vontade de Deus e estimulava os outros a fazer o mesmo".

A Santa Sé, ao outorgar, no pontificado de Pio XII, as primeiras aprovações canônicas ao Opus Dei, fez sua essa afirmação: "Qualquer membro do Opus Dei, onde quer que esteja, leva sempre consigo a paz de Cristo e a alegria, plena e estável, no Senhor e as oferece amistosamente a todos os homens de boa vontade: além disso, esforça-se por contagiar a todos, sem exceção, com essa paz e essa alegria, e impulsiona com suavidade cada um a aceitar e saborear esses dons tão suaves da bondade divina".

Bento XVI afirmou que, para aquele que crê, a palavra "paz" é um dos nomes mais belos de Deus, um pai que deseja a concórdia entre todos os seus filhos. Ao dizermos "a paz esteja convosco", desejamos que Deus esteja com todos e com cada um e cada uma. Como Cristo -no dizer de são Paulo- é a nossa paz, esse desejo se manifesta em apresentar Cristo aos outros, ajudando-os a compreender que o relacionamento pessoal com Jesus, a amizade com Ele, traz à alma aquela alegria e aquela paz que o mundo não pode dar.

"Peço a Deus que essa parte da igreja cumpra sempre a missão que Ele lhe confiou."

Fui testemunha de como são Josemaria não só pregava e difundia o evangelho da paz mas também o levava constantemente no coração. Não faltaram, no decorrer da sua existência, temporadas de risco à sua integridade física ou de inquietação espiritual pelo destino da igreja e da sociedade civil; no entanto, nunca o vi perder a serenidade nem deixar de fazer algo para comunicá-la aos outros.

Estava convencido de que anunciar o evangelho trazia consigo, necessariamente, uma semeadura generosa de paz e de alegria e estimulava o encontro com Cristo, sempre com o máximo respeito pela liberdade das consciências. Sabia que essa tarefa é benéfica para a humanidade, também porque o conhecimento da doutrina de Cristo e o compromisso cristão aperfeiçoam a liberdade humana e nos predispõem a servir os outros.

Dar a conhecer Cristo é também uma semeadura de alegria. O gozo dos filhos de Deus não provém de circunstâncias exteriores favoráveis nem tem uma origem meramente psicológica. Como qualquer outra pessoa, o homem e a mulher de fé experimentam o cansaço e a doença, a dificuldade e a aflição, a dúvida e a contrariedade. Mas, em todas essas situações, sabem-se filhos muito queridos de Deus, são conscientes de que podem se apoiar n'Ele e, com sua ajuda, recuperar a alegria, se chegarem a perdê-la.

Mesmo a experiência da própria fraqueza espiritual não é incompatível com a alegria, porque sempre pode ser sanada pela misericórdia divina. A parábola do filho pródigo acaba com a festa do reencontro do amor.

O humano e o divino se entrelaçam na tarefa de evangelização cristã: a preocupação pelos demais, a caridade, o respeito à liberdade alheia. Assim o propunha, mais uma vez, são Josemaria na Argentina, em encontro com milhares de pessoas em 1974: "Semeiem a paz e a alegria por todos os cantos; não digam nenhuma palavra desagradável a ninguém; saibam caminhar com os que não pensam como vocês. Não se maltratem jamais; sejam irmãos de todas as criaturas, semeadores de paz e de alegria".

Cada aniversário é uma oportunidade de olhar para o futuro. Ao se completarem agora 80 anos da fundação do Opus Dei, peço a Deus que essa pequena parte da igreja, que é a Prelazia da Santa Cruz e Opus Dei, cumpra sempre, no seio da sociedade civil, a missão que Ele mesmo lhe confiou em 1928: realizar nas almas uma semeadura generosa da paz e da alegria do evangelho, que impregne também as estruturas da sociedade, tornando-as mais humanas.

    Folha de São Paulo