Um milagre de Universidade

Indro Montanelli visitou a Universidade de Navarra, em Pamplona (Espanha), em 1977, quando o Fundador do Opus Dei tinha falecido havia apenas dois anos. Quando regressou, Indro Montanelli relatou a sua experiência no semanário Oggi.

Indro Montanelli visitou a Universidade de Navarra, em Pamplona (Espanha), em 1977, quando o Fundador do Opus Dei tinha falecido havia apenas dois anos e o processo de canonização ainda não tinha sido iniciado. Quando regressou, Indro Montanelli relatou a sua experiência no semanário Oggi. Convém recordar que, naqueles tempos, não era habitual que os jovens ouvissem um adulto sem o contestar. Apresentamos alguns excertos daquele relato.

Nestes dias, tive de fazer uma viagem de quatro dias à Espanha por razões de trabalho jornalístico.

Aquilo que mais me impressionou foi a experiência que vivi numa Universidade, a Universidade de Navarra, com sede em Pamplona, onde tinha sido convidado para falar sobre a imprensa italiana face à crise que atravessa o nosso país.

Encontrei um centro de estudos como não me lembro de ter visto, pelo menos desde há uns trinta anos a esta parte e como não imaginava que existisse ainda. Ou melhor dito, existem e eu também os conheço, mas são Escolas de longa tradição que, graças, precisamente, aos seus séculos de história, conseguiram resistir ao estado geral das coisas, retirando-se do seu tempo.

A Universidade de Navarra não é assim. Nasceu há menos de 25 anos, em 1952, numa cidade sem tradição acadêmica e não por iniciativa estatal, mas fruto da iniciativa privada de uma sociedade que não é uma ordem religiosa, porquanto é formada sobretudo por leigos, mas comporta-se como se o fosse, no sentido mais elevado e nobre da palavra: o Opus Dei. Tem uma filial também em Itália mas a sua ‘fortaleza’ é em Espanha, porque espanhol era o seu fundador, o Padre Escrivá, um simples sacerdote que nunca quis ser outra coisa senão sacerdote.

Não sei se o Padre Escrivá será um santo, como creem (ainda que não o digam) os seus seguidores, mas o certo é que aqui ele já fez um milagre. Outra coisa não pode ser considerada uma Universidade de sete mil estudantes onde não há greves, onde não se vê uma casca de laranja no chão, onde não se ouve uma palavra menos própria, onde os alunos enchem as bibliotecas (que são várias, conforme as faculdades) e, para descansarem do estudo, vão para a sala de concertos ouvir Bach (não Modugno) e para a sala de conferências.

Era nesta que era suposto eu ter falado, mas dada a afluência de ouvintes voluntários, teve de se recorrer à Aula Magna. Pela primeira vez, numa sede universitária, embora falando uma língua estrangeira, entrei imediatamente em contacto direto com os jovens, que me avaliavam mas sem me recusarem a priori. Senti, desde logo, que as minhas palavras atingiam o alvo, no sentido de que eu e eles lhes dávamos o mesmo significado. Tanto assim foi que não se contentaram com aquela conferência, e os estudantes da Faculdade de Jornalismo quiseram um debate só para eles. Ao debate seguiu-se um almoço em que se continuou a debater e, depois do almoço, uma tertúlia, que é como os espanhóis chamam às conversas mais informais.

Quando voltei para o carro, as minhas cordas vocais estavam reduzidas a uma crosta de ferrugem, mas não me importei. Tinha voltado a ver uma Universidade digna desse nome, tinha encontrado estudantes que estudavam, que não reivindicavam outra coisa que não fosse aprender. Tinha encontrado finalmente jovens, talvez divididos entre si por posições políticas mas unidos (todos) por esta inquebrantável convicção: que não se vem ao mundo só para dizer que aqui se esteve, mas para fazer alguma coisa, pequena ou grande, não importa, mas qualquer coisa.

Não sei se o Padre Escrivá será santo, mas o milagre já o fez.

Indro Montanelli

Suplemento de Il Tempo, Roma, 6-X-2002