Santidade com alcance universal

"A riqueza do que ensinou, a sua vida virtuosa e atraente, e a presteza com que atende aos que recorrem à sua intercessão conferem a Josemaría Escrivá a marca da devoção universal: pedem a sua ajuda inúmeras pessoas, para assuntos os mais variados".

Na manhã de domingo, a Praça de São Pedro foi o palco de um acontecimento marcante: a canonização de Josemaría Escrivá, diante de uma multidão de pessoas de todos os cantos do planeta. Ao refletir na pessoa do novo santo e na transcendência desse evento para a Igreja, ocorreu-me uma idéia muito simples, mas que me parece apropriada para pautar estas considerações: a universalidade da mensagem de São Josemaría Escrivá e da devoção que se tem por ele.

De fato, a universalidade é uma característica inequívoca do fundador do Opus Dei, e uma universalidade, por assim dizer, de “mão dupla”: é um santo que disse algo a pessoas de todas as latitudes, idades e condições; e é um santo a quem recorrem pessoas de todas as condições, idades e latitudes.

A vida de São Josemaría Escrivá é indissociável da Obra que fundou e do espírito que difundiu, a chamada universal à santidade. O Opus Dei propõe-se a favorecer a procura da santidade e o exercício do apostolado por parte dos cristãos que vivem em meio do mundo, seja qual for o seu estado ou condição. “A Obra – diz São Josemaría Escrivá – nasceu a fim de contribuir para que esses cristãos, inseridos no tecido da sociedade civil — com sua família, suas amizades, seu trabalho profissional, suas aspirações nobres — compreendam que a sua vida, tal como é, pode vir a ser ocasião de um encontro com Cristo.” (Questões Atuais do Cristianismo, n. 60).

Aquilo que comunicou, e que estava fortemente gravado na sua alma, não se destina somente a alguns católicos. Como expressa a Constituição Lumen gentium, “todos os fiéis, qualquer que seja o seu estado ou condição, estão chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade”. Afinal, qualquer cristão pode – e deve – lutar por ser santo, por viver a sua fé plenamente, consciente de que, como ensina o Papa João Paulo II, “a verdadeira história da humanidade identifica-se com a história da santidade” (citado no artigo “Por que a Igreja canoniza hoje”, do Cardeal José Saraiva Martins).

Essa idéia permaneceu ignota, para muitas pessoas, durante séculos, até Deus se servir de Escrivá para recordá-la com firmeza. Escreveu em seu livro mais conhecido: “A santidade ‘grande’ está em cumprir os ‘deveres pequenos’ de cada instante. Faz o que deves e está no que fazes.” (Caminho, 817). Ou seja, algo acessível a qualquer um, e recomendável a qualquer um.

Um santo que se dirigiu a muitos, e um santo a quem se dirigem muitos. A riqueza do que ensinou, a sua vida virtuosa e atraente, e a presteza com que atende aos que recorrem à sua intercessão conferem a Josemaría Escrivá a marca da devoção universal: pedem a sua ajuda inúmeras pessoas, para assuntos os mais variados.

Muitos dos que lotaram a praça de São Pedro para assistir à sua canonização – só do Brasil, mais de dois mil, dos quais a grande maioria teve de vencer dificuldades de monta para conseguir recursos, liberação do trabalho, etc. –. Basta olhar as imagens do histórico evento para confirmar a universalidade do novo santo: lá estava gente de todos os continentes.

Por que essa compenetração tão abrangente? Por um lado, porque o modelo de santidade que São Josemaría oferece está ao alcance do homem da rua. O próprio Papa João Paulo II salientou a importância de os leigos poderem encontrar nos altares aquelas pessoas que deram “testemunhos de virtudes heróicas praticadas nas condições comuns e correntes da existência humana” (Exortação Apostólica Christifideles laici). E a existência terrena do novo santo pode ser resumida numa das frases que compõem a oração para a sua devoção, ou seja, soube iluminar os caminhos da terra – as ruas por onde passou, em Roma, Madri, Paris ou São Paulo; as estradas européias e americanas que percorreu e, principalmente, o escritório onde trabalhou – com o resplendor da fé e do amor.

Tal compenetração entre esse santo e seus devotos se explica também pela constatação do Papa Paulo VI, de que o homem “presta mais atenção aos testemunhos do que aos mestres; ou, se escuta os mestres, o faz porque são testemunhos.” O fundador do Opus Dei viveu coerente e plenamente aquilo que pregou, e isso atrai como imã. A sua autenticidade de homem que ama a Deus está quase que na categoria da evidência para quem o conhece. Assim entende o Cardeal Ratzinger: “Josemaría Escrivá diz-nos que todos podemos chegar a ser santos, e no-lo mostra com a sua experiência de haver deixado Deus agir através de si mesmo, de ter sido seu amigo, de não ter soltado nunca a sua mão, convencido de que Deus é o verdadeiro amigo de todos”. (Entrevista ao Avvenire, 15-03-2002).

    José Carlos Campos Hidalgo // Gazeta do Povo (Curitiba)