Panteão e Santa Maria sopra Minerva

Os restos mortais de Santa Catarina de Sena veneram-se na Igreja de Santa Maria Sopra Minerva. Ali muito perto fica o Panteão, que acolhe a igreja dedicada aos mártires, e é um dos edifícios mais bem conservados da Roma antiga.

Foto: KlausF

Ao entrar na Piazza della Rotonda, o Panteão surge inesperadamente ante os olhos do visitante, como se a sua massa de pedra cinzenta emergisse incólume da profundidade dos séculos. É talvez o edifício mais bem conservado da antiga Roma, e a sua enorme cúpula constitui uma magnificência arquitetônica sem comparação.

Mas o que mais impressiona é quando se atravessa o pórtico de antiquíssimas colunas, se penetra pelas as portas de bronze abertas e se chega ao interior do templo. Descobre-se ali a inesperada maravilha da luz, que aflui da abertura redonda do teto, resvala pelas paredes cilíndricas e invade todo o espaço com a sua serenidade dourada, envolta em majestade e repouso.

O Panteão, como o seu nome indica, era o templo que os romanos tinham dedicado a uma pluralidade de deuses. Na forma que chegou até hoje, foi construído no tempo de Adriano, entre os anos 118 e 128 da nossa era. Séculos mais tarde, quando o Império romano já tinha sido em grande parte evangelizado, o imperador Focas doou-o à Igreja e no ano 609 o Papa Bonifácio IV transformou-o na igreja de Santa Maria ad Martyres. A partir de então, o templo tornou-se também um grande relicário, porque o Papa quis que ficassem aí guardados os restos mortais de milhares de cristãos, muitos deles mártires, que até esse momento se encontravam nas catacumbas.

Nessa época já tardia, nos alvores da Idade Média, a dedicação do antigo Pantheon pagão aos mártires era manifestação do alto grau em que a Igreja se reconhecia devedora daqueles que haviam sido testemunhas de Cristo até ao ponto extremo de entregar a vida pela fé. Crianças como Tarcísio, virgens como Inês e Cecília, mães de família como Perpétua, anciãos como Policarpo… tinham sido, na sua fraqueza, mais fortes que todas as legiões. Tinham triunfado, como o Mestre, na loucura da Cruz, e por isso mereciam ser cantados e venerados nos séculos vindouros.

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Na história da Igreja são muito numerosos os santos que passaram pelo menos uma temporada em Roma e se distinguiram pela sua devoção aos mártires. Um exemplo é Catarina de Sena, que residiu na Cidade Eterna no fim da sua vida – de 28 de Novembro de 1378 a 29 de Abril de 1380 – e gostava de rezar junto das memórias dos Apóstolos e dos primeiros cristãos que tinham dado a sua vida pela fé.

Santa Catarina tinha vindo para Roma acedendo aos pedidos do Papa Urbano VI, necessitado da sua oração e conselho ante a gravíssima crise do Cisma do Ocidente. A Santa residia numa casa muito próxima do Panteão, acompanhada por mais de vinte caterinati – assim chamavam os seus discípulos – que a tinham seguido de Sena.

O Fundador do Opus Dei também alimentou desde muito jovem uma grande devoção aos mártires que tinham sido, em todas as Igrejas, sementes de outros cristãos, assim o recordava num texto mais recente:

"Venero com todas as minhas forças a Roma de Pedro e de Paulo, banhada pelo sangue dos mártires, centro de onde tantos saíram para propagar por todo o mundo a palavra salvadora de Cristo"[1].

Interior da igreja de Santa Maria sopra Minerva, a única igreja de estilo gótico em Roma

Santa Maria sopra Minerva

Por trás do Panteão, e muito perto da rua onde vivia Santa Catarina, encontra-se a igreja de Santa Maria sopra Minerva, onde repousam os sagrados restos da santa, num sarcófago situado sob o altar-mor. Esta igreja – a única de estilo gótico em Roma – conserva no seu interior grande quantidade de obras de arte de autores famosos, mas desde os finais do século XIV tem sido visitada, principalmente, por fiéis desejosos de recorrer à intercessão da grande santa de Sena.

Na Urbe, Catarina entregou-se totalmente ao serviço da Igreja e do Romano Pontífice: a convite do Papa Urbano VI, falou durante um consistório aos cardeais instando-os a confiar no Senhor e a manterem-se firmes na defesa da verdade; escreveu cartas aos reis dos principais países da Europa, para convencê-los a reconhecerem o único Vigário de Cristo; também se dirigiu – em estilo persuasivo, pleno de ardor – a várias personalidades da cristandade daquele tempo, animando-as a que viessem a Roma per fare muro, para criar uma muralha em torno do Papa; e pacificou os próprios habitantes de Roma quando, por causa das intrigas urdidas pelos cismáticos, se produziram tumultos na cidade.

Os sagrados restos de Santa catarina de Sena repousam num sarcófago situado sob o altar-mor da Igreja Santa Maria sopra Minerva.

E, acima de tudo, Catarina dedicou-se a rezar. Ela mesma contava numa carta escrita poucos meses antes de morrer, quando estava gravemente doente, como eram os seus dias: “Já perto das nove, quando saio de assistir à Missa, vereis andar uma morta a caminho de São Pedro e entrar de novo a trabalhar [orando] na nave da Santa Igreja. Ali estou até próximo da hora de vésperas. Não quereria sair dali nem de dia nem de noite, até ver este povo respeitoso e afiançado na obediência do seu Pai, o Papa”[2].

Santa Catarina assumia como seus os sofrimentos da Igreja naquelas horas difíceis. Em Roma, o Senhor quis aceitar o oferecimento da sua vida pela Igreja que a santa lhe tinha oferecido em muitas ocasiões. Assim, esgotada pela dor que oprimia o seu coração por causa do cisma que dilacerava o Corpo Místico de Cristo, e sofrendo, além disso, de grandes moléstias físicas, entregou a alma a Deus rodeada pelos seus discípulos, a quem não se cansava de recomendar que vivessem a caridade fraterna e que também eles estivessem dispostos a dar a vida pela Igreja.

São Josemaria tinha devoção a Santa Catarina de Sena desde a sua juventude: em sua honra, por exemplo, chamou familiarmente catalinas os cadernos onde ia tomando notas da intimidade da sua alma.

Alessandro Casolani, Entrega das chaves do Castel Sant'Angelo ao Papa Urbano VI

Anos mais tarde, perante as dificuldades que a Igreja atravessava, o Fundador do Opus Dei recorreu a quem em situação similar tinha sido uma apaixonada defensora da verdade: "Vou-te contar agora que se me avivou a devoção, que em mim é antiga, por Santa Catarina de Sena" – escrevia numa carta de 1964 – "porque soube amar filialmente o Papa, porque soube servir sacrificadamente a Santa Igreja de Deus e… porque soube falar heroicamente"[3].

Nós, os cristãos, temos de saber falar, para expor de modo vivo e convincente as maravilhas de Deus: a realidade da Igreja, a beleza incomparável da existência cristã, que tem resposta para as aspirações mais profundas do coração humano. Assim, como os fiéis cristãos dos primeiros séculos, mudaremos este nosso mundo; ajudaremos cada vez mais pessoas a aderirem à verdade e a desejarem proclamá-la, para fazerem participantes a outros muitos da liberdade dos filhos de Deus, que conduz ao bem da sociedade humana e das relações entre os povos: "a ignorância é o maior inimigo da nossa Fé, e ao mesmo tempo o maior obstáculo para que se leve a cabo a Redenção das almas”[4], afirma São Josemaria: “Devemos difundir também a verdade, porque veritas liberabit vos, a verdade nos liberta, ao passo que a ignorância escraviza. Cumpre-nos defender o direito, que todos os homens têm, de viver, de possuir o necessário para desenvolver uma existência digna, de trabalhar e descansar, de escolher o seu estado, de formar um lar, de trazer filhos ao mundo dentro do matrimônio e de poder educá-los, de passar serenamente o tempo da doença ou da velhice, de ter acesso à cultura, de associar-se com os demais cidadãos para atingir fins lícitos, e, em primeiro lugar, de conhecer e amar a Deus com plena liberdade, porque a consciência - se for reta - descobrirá as pegadas do Criador em todas as coisas"[5].


[1] São Josemaria, Lealdade à Igreja, 4/06/1972.

[2] Santa Catarina de Sena, Carta 373.

[3] Carta a Florencio Sánchez Bella, citada em A. Vázquez de Prada, Josemaria Escrivá Fundador do Opus Dei, III, p. 485.

[4] São Josemaria, Carta 9/01/1951, n. 8, citada em A. Vázquez de Prada, op. cit. p. 262.

[5] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 171.