No seu falecimento, não aconteceu nada de natureza extraordinária: morreu com a naturalidade com que vivera. Durante os seus últimos meses na terra, havia experimentado uma ânsia crescente de contemplar a Deus face a face, embora, como já disse, não desejasse a morte. Na manhã do dia 26 de junho de 1975, comportou-se com a serenidade e a paz de quem tem a alma completamente mergulhada em Deus. Não deu importância ao mal-estar que o acometera em Castelgandolfo e até brincou sobre a sua pouquidão: Não faço mais do que incomodar. Pediu-nos várias vezes que desculpássemos os contratempos que causava.
Não sei dizer se previu que se avizinhava a sua hora. O que posso assegurar é que reagiu como em outros momentos em que se achara com toda a evidência em eminente perigo de morte: com o seu abandono nas mãos de Deus, persuadido de que Ele – como o Pai mais Amoroso e Onipotente que é – concede sempre o que mais nos convém.
Nunca se insistirá suficientemente em que fundamentou o seu apostolado numa oração contínua e numa perseverante mortificação pessoal, critério que transmitiu aos seus filhos: No Opus Dei, tudo se fez à força de oração.
Em 1972, passamos por Logroño e lá visitou a concatedral, popularmente conhecida como La Redonda; rezou e evocou com verdadeira alegria e gratidão os momentos em que lá permanecera diante do Senhor na sua juventude: Quantas horas passei aqui! Impressionou-me ver como tinha uma recordação tão viva daquela igreja, ao cabo de cinquenta anos. Depois de rezar devotamente diante do Sacrário, percorremos devagar os altares laterais: percebia-se pelo seu olhar, pelos seus gestos e palavras, o carinho com que revivia aqueles anos em que Deus penetrara na sua alma, levando-o a decidir-se pelo sacerdócio.
Em 1956, enviou o padre Álvaro del Portillo à Espanha para tratar de alguns assuntos. Poucos dias depois, o padre Álvaro dizia numa carta que os assuntos se iam resolvendo graças às orações dos que o estavam ajudando. O Fundador do Opus Dei interrompeu nesse ponto a leitura e, levantando os olhos, comentou com o padre Severino Monzó e comigo: É bonito vê-lo escrever isto, porque está persuadido – assim como eu, filhos, também estou e estarei sempre – de que tudo vai saindo graças às nossas orações. Não vos esqueçais de que a oração é o meio que deve preceder, acompanhar e seguir todas as nossas ações humanas: se não fizermos assim, teremos errado de caminho.
Em 1973, insistia conosco mais uma vez: É preciso rezar sempre! No Opus Dei, a oração vai sempre em primeiro lugar. Antes de trabalhar, levantai o coração a Deus e não vos importeis se a gente percebe que sois piedosos: que vejam que estais preparados profissionalmente e que contais com o Senhor para tudo. Insisto: temos que rezar sempre porque, se não, a nossa vida seria uma vida farisaica.
Ficou-me muito gravado o que me disse certa noite, antes de irmos fazer o exame de consciência: Javi, lembra-te durante toda a vida!: o único meio que tivemos no Opus Dei e que teremos sempre é a oração. Rezar!, rezar sempre!, porque, mesmo que em algum momento pareça que contamos com todos os meios humanos, não os temos! Esta é a única essência do Opus Dei: a oração.
Javier Echevarría, Recordações sobre Mons. Escrivá, pp.179-181